terça-feira, 26 de abril de 2016

Ariella - Capítulo 8

Olívia convidou Ariella a entrar em um quarto. Convite esse que Ariella aceitou por não ter alternativa. Era um ambiente tipicamente masculino, claro e muito arejado. No ar era possível sentir o perfume de Diego. Ele deseja desconhecer aquele cheiro, mas esse estava gravado em sua memória. Sim, ele tinha a petulância de esperar que dividissem o mesmo quarto, a mesma cama.

- Então você o viu crescer? Deve tê-lo assistido se transformar em um monstro. – Ariella disse para Olívia, que apenas a observava com certo pesar no olhar. Aquela pena irritou a argentina ainda mais. – Não me olhe assim. Não pense que sou um cão acuado. Diego vai pagar caro pelo que está fazendo.

Algo na expressão, ao mesmo tempo dura e delicada, da esposa de Diego, fez Olívia acreditar naquela ameaça. Ela é sim delicada, com um aspecto frágil, mas parecia uma guerreira de cabelos de fogo. Podia até estar enganada, mas, sua intuição dizia que Ariella não se encaixava no papel de vítima e Diego não teria águas tranquilas para navegar por sua vingança.
Apesar de não ter passado mais do que alguns minutos junto da jovem, Olívia a compreendeu muito bem. Ariella estava pronta a iniciar uma tempestade. Já tinha relevado demais de seu marido, mentiroso e manipulador. Pessoalmente, pensava que não tinha nada a perder. A gota final de desespero foi quando Diego lhe apresentou o contrato que ela, ingenuamente, havia assinado na cerimônia de casamento civil. Ela estava ligada a Diego até que lhe oferecesse um filho. Depois disto poderia ir embora, mas não poderia levar a criança.

- Você é um demente. Um psicopata. – Afirmou encarando-o nos olhos, assim que ele entrou no quarto.
- Longe disso, querida. Sou um obstinado. Luto pelo que desejo. Apenas isso.
- E me deseja tanto assim?
- Não seja prepotente, Ariella. Não desejo você. Desejo a justiça, ou a vingança, caso prefira chamar assim.  Coisas que só você pode me dar. Apenas isso. – A frieza dele calou fundo dentro de Ariella.

As coisas não estavam acontecendo como imaginava, pensou Diego. Teria que tomar muito cuidado com o que sua esposa faria. Ariella estava se mostrando muito esperta e o fato de estar tão calada não demonstrava aceitação, mas sim que já estava pensando em como ludibriá-lo para escapar da armadilha. Ariella era menos ingênua do que imaginava e muito mais corajosa. Seus planos, organizados passo a passo com muito cuidado, foram modificados assim que Ariella pôs os pés naquele lar. Não fariam os Bueno serem humilhados novamente.
Com segurança, ele lhe afirmou que não haveria chance de fuga. Com o tempo ela se habituaria à vida de casada e poderia lhe dar algumas liberdades, mas, por agora, todos os seus passos seriam vigiados. Porém, tinha pouca esperança de que ela aceitaria aquilo fácil. Ariella parecia indócil demais para isso.
Enquanto isso, ao menos uma parte do plano foi cumprida à perfeição e lhe trouxe um gigantesco prazer. Afonso havia se mostrado desesperado por não saber onde a filha estava e quando soube do casamento e de quem se tratava o noivo, ficou tenso. Diego até mesmo imaginou que ele iria se oferecer para devolver o dinheiro, mas, ao que parecia, seu amor pela filha não era tão grande quanto ao apego pelo dinheiro.



- É Ariella quem irá fazer com que você pague pelo que fez! – Avisou numa breve ligação telefônica feita assim que Ariella foi instalada em seu quarto.
-Não! – Todo seu desespero não havia ajudado em nada. Teve de aceitar que sua jovem filha ficaria na Espanha, com o marido, por muito tempo. E que se desejasse notícias, teria de ser um sócio muito bem disposto na empresa, que agora também lhe pertencia.

Diego não podia negar que as reações de Ariella o estavam deixando louco. Ele a encontrou novamente mais tarde, após deixá-la sozinha por várias horas. Afonso implorou para falar com a filha novamente e ter certeza de que estava viva e bem, então Diego concordou em colocá-los em contato mais uma vez. Esperava que enfim ela extravasasse a raiva, o ódio ou o medo. Acreditou que após aquele falso show de coragem, ela enfim mostraria alguma fraqueza. E surpreendeu-se, mais uma vez. Ao invés de chorar e pedir socorro como qualquer outra jovem faria, Ariella mostrou já ter armado seu escudo. Ela havia muito cedo percebido que sua intenção era deixar Afonso preocupado e durante todo o telefonema foi uma mulher controlada. Até mesmo aparentou gostar de estar na Espanha.




- Fique tranquilo, papai. – Teve a ousadia de afirmar.
- Como tranquilo? Não sei como você está sendo tratada!
- Muito bem, papai. Diego é um príncipe ao falar comigo. E independente das divergências entre vocês, eu o amo e ele me ama. Por isso, não faça nada apenas para me salvar de meu marido. Eu fico aqui quanto tempo for necessário.

Logo após desligar ela começou uma discussão e terminou mandando-o sair da suíte. Deixou-o envergonhado mais uma vez. No primeiro dia de casada, sua mulher, que deveria estar assustada, acuada por tudo o que lhe fez, mostrava coragem e petulância o bastante para desafiá-lo. O que seus empregados iam pensar?

- Chega de fiascos! Basta! Não quero mais ouvir nenhum grito. Já chega desse seu showzinho ao telefone. – Diego afirmou segurando-a pelo braço.
- Ou o que? Vai me bater. Bata! É só o que falta mesmo. Mas mesmo que o faça, saiba que eu não cairei em sua armadilha. Não vou ajudá-lo a chantagear meu pai. Você foi atrás da vítima errada, Diego Bueno!

Ele deveria tê-la agarrado ali mesmo e a feito engolir as palavras, rendendo-se ao casamento. Mas não o fez. E agora estava sentado, à beira da piscina, com uma garrafa de whisky ao lado, e com uma esposa revoltada deitada em sua cama.
O tempo passou e a garrafa, dose por dose, foi se esvaziando. A cada gole surgia uma nova lembrança e, aos poucos, elas foram se embaralhando. Lembrava da infância solitária e também dos momentos junto de Ariella. Recordava-se da tristeza do pai e logo depois o sorriso da esposa preenchia aquele vazio. Sentia raiva, depois vinha o afeto. E ele ficava cada minuto mais afogado no álcool e nos sentimentos embaralhados.



Quando voltou para o quarto estava inseguro quanto à maneira de enfrentar aquela situação. Pensava que iria encontrar uma esposa adormecida. Ariella o havia observado da janela do quarto e por mais revoltada que se sentisse, não conseguiu expulsar de seu coração a pena que sentia dele. Não poderia de maneira alguma dizer em voz alta, mas sabia amar aquele homem e acreditar em seu casamento. E, lá no fundo, pensava na triste infância que Diego deve ter tido quando a mãe acabou com o casamento ao trair seu pai com Afonso.
Claro que isso não lhe dava o direito de sair por aí sequestrando pessoas. Porém, era algo capaz de bagunçar a cabeça de qualquer um. E o pai de Diego não parecia ter sido do tipo que supera a dor em nome da prole. Não apenas seguiu sofrendo, como deixou sua dor alcançar e marcar Diego terrivelmente.
Quando ele chegou ao quarto, Ariella fingiu estar adormecida e ficou ouvindo o som vindo do chuveiro até que ele saiu e a viu desperta. Ariella tinha os cabelos despenteados e profundas marcas de cansaço nos olhos. Era reflexo da viagem e da exaustão emocional em que se encontrava.

-Esperando seu marido para mais uma parte da lua de mel? Quer ir direto para o sexo ou prefere champanhe e uma sessão de massagem? – O álcool o deixava mais amargo e debochado.
-Você está tão bêbado que não conseguiria me massagear!
-Mas você poderia! - Ele foi se aproximando da cama aos poucos e sabia não estar tão bêbado ao ponto de não conseguir satisfazer sua mulher. – Mas podemos deixar isto para outro dia e ir direto ao sexo.
-Não o quero! – Mentirosa, pensava. – Não depois de tudo que disse hoje.
-Quero seu corpo e você também quer. Deseja extravasar o ódio que sente de mim. E sexo é a melhor maneira. Não ouse negar, eu posso ver nos seus olhos. – Ele já passava as mãos por suas curvas. – Além disso, tenho que colaborar para que você esteja grávida logo. – Diego disse e arrependeu-se quando a sentiu enrijecer.
-Está delirando se pensa que vou gerar uma criança e deixá-la para trás com alguém feito você para lhe criar.

Talvez fosse o álcool em excesso, mas Diego a achou ainda mais bela assim, defendendo seus direitos por uma criança que nem mesmo fora gerada. Por um, apenas um, instante, comparou-a com Silvana. A mãe que deixou-o para trás seguindo as ordens de Ramón e foi correr atrás de Afonso sem pensar duas vezes. Se não tivesse encontrado com a morte no meio do percurso, poderiam ter passado anos juntos e felizes, enquanto ele sofria sozinho. Nesse caso, Afonso talvez nunca conhecesse Martina e Ariella nunca teria nascido. O destino, no entanto, fez outras escolhas e cumpriu outros caminhos e ali estavam ele e Ariella, loucos para satisfazer um ao outro, mesmo quando não havia chance deles serem nada mais do que inimigos.

- Não disse em nenhum momento que precisa ir embora, somente lhe ofereci esta opção. – Enquanto falava coisas tão duras, suas mãos eram carinhosas e Ariella percebeu que já estava com a camisola enrolada em um tira envolta a sua cintura. – Mas chega de conversa.

Ariella não queria responder. Desejava poder gritar e se rebelar contra ao que ele estava fazendo, mas as lembranças de tantas noites felizes em seus braços estavam vívidas em sua mente. Quando ele tocou seus lábios, de alguma forma, houve mais carinho que rancor.

- Não minta pra você mesma, Ariella. Você quer. É inegável.
- Eu quero...mas eu vou deixar de te amar. – A frase foi dita quase como uma promessa.

A noite foi longa e prazerosa, cheia de descobertas entre o casal. Era como se eles realmente fossem um casal entre aqueles lençóis, desde que esquecessem todo o resto. E eles conseguiram isso. Não pensaram, apenas tocaram. Ariella adormeceu nos braços do marido, que também logo entregou-se ao sono. Quem não os conhecesse poderia jurar que eram um casal. Um completo engano.
Quando o amanhã chegou, todas as desconfianças vieram junto com o sol. Ariella abriu os olhos já sozinha no leito. Foi surpreendida com uma batida na porta e a entrada de Olívia, carregando uma enorme bandeja de café da manhã. Ela ficou vermelha enquanto escondia o corpo com o lençol.

- Eu trouxe seu café da manhã, Srª Ariella. – Disse a empregada, um tanto constrangida.
- Só Ariella, por favor. Onde está meu marido, Olívia?
- Trabalhando. Saiu logo cedo e pediu que lhe trouxesse o café e avisasse que não vem almoçar. Disse também que a senhora não tem autorização para deixar a casa, nem fazer ligações fora da sua presença. – A cada absurdo dito, mais constrangida Olivia se tornava. – Se eu puder fazer algo para...
- Para tornar meu cativeiro menos sofrido? Eu avisarei caso me lembre de algo. Não se preocupe.

Depois de despachar a mulher com um tímido agradecimento, Ariella provou de todas aquelas delícias e se vestiu para sair. O fato de estar proibida pouco lhe interessava. E, no mínimo, alguns contratempos geraria ao marido. Diego estava muito enganado se pensava que ela permaneceria ali, quieta e discreta enquanto ele retomava a vida de executivo. No mínimo todos na Espanha saberiam que ele escondia uma mulher em cárcere privado.
Ao voltar para a sala de estar da bela casa que administrava, Olívia estava pálida e assustada. Ao ver a esposa, Ítalo pensou que ela passava mal. Mas não. Olívia estava apenas em choque por tudo o que acontecia naquele lar. Estranhamente, ela que sempre julgou conhecer o jovem patrão quase como uma mãe reconhece o filho, percebia agora que ele fazia coisas perigosas e beirava a crueldade.
Se fosse justa com o que acreditava, deixaria aquela casa e ajudaria Ariella a escapar daquele cativeiro. Acima disso, no entanto, estava sua lealdade para com os Bueno. Principalmente Silvana. Ela lhe pediu para cuidar de Diego minutos antes de entrar naquele carro. Morreu. E as atitudes de Diego eram prova de em algum momento errou com aquele menino. Não conseguiu suprir sua carência de ou. Ou ele não teria se tornado esse homem amargo e vingativo. E agora, por mais que ele estivesse errado, não podia abandoná-lo.

- Temos que ajudá-lo a melhorar, a superar isso. – Olívia afirmou. – Ou ele vai se destruir, Ítalo. Sei que vai. E não vou aguentar.
- Nós não podemos fazer mais nada, Olívia. Lhe demos afeto e atenção durante todos esses anos. E ele nunca conseguiu tirar esse rancor de dentro do coração.
- Como? Se Ramón nutriu esse sentimento dia após dia? Diego não é mau, sei que não. É apenas um menino perdido no mundo.
- A decisão agora é dele, meu amor. Se ele seguir por esse caminho, nada poderemos fazer. – Ítalo abraçou a esposa e mudou de assunto. – Murilo está? Quero vê-lo. Senti sua falta por todos esses dias.
- Está tomando café. Tem uma reunião com Diego logo cedo na administração dos hotéis. Diego está dando mais responsabilidade ao nosso menino. Ele, apesar de tudo, tem um lado muito bom.

- Vou vê-lo antes que saia. Sossegue seu coração. Tudo irá se acertar. – Ítalo disse à esposa quando bem lá no fundo também não acreditava.

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