domingo, 27 de março de 2016

Dica de leitura: Rota 66


Esse é um livro muito diferente dos que normalmente coloco nesse espaço. Ele tem um estilo mais denso, mais pesado. Quanto mais páginas são viradas, mais revoltado você fica. E tem um grande diferença: é real. É amargamente real. E tudo o que você deseja ao ler é que fosse apenas ficção. Não! Aconteceu. Ainda acontece. E só conhecendo é que se consegue lutar para mudar.

O livro do jornalista Caco Barcellos conta a história de um batalhão da Polícia Militar de São Paulo em que alguns policiais matam. Não é que matem bandidos não. Matam inocentes, trabalhadores que estão no lugar errado no momento errado. Não é um livro contra a polícia, apenas contra alguns que envergonham a farda.

Fica a sugestão de leitura.
bjs 

sábado, 26 de março de 2016

Alguém Para Perdoar - Capítulo 1

Após tantos meses de espera, chega a hora de começarmos as postagens de Alguém Para Perdoar. A sequência de Alguém Para Amar começa agora. Por que demorou tanto? Bom, a promessa sempre foi começar as postagens em março. Mas planejávamos que fosse lá no início do mês, assim que Alguém Para Amar fosse colocada na Amazon. Porém, a revisora do livro atrasou prazos, muito, tanto que tivemos de trocar de revisora e só teremos o primeiro livro revisado em abril. Ficamos MUITO chateadas. E diante desses problemas tivemos bloqueio criativo. É chato escrever a sequência enquanto nosso primeiro livro fica trancado por uma profissional ruim. Ainda assim, começamos a postar agora e esperamos que gostem. Não estamos com muitos caps prontos então peço paciência caso não haja postagem em algum final de semana.
Aproveito para convidá-las a ler nossos outros livros. Vida Roubada / Ariella estão sendo postados e muitos outros estão concluídos. Bjs e lá vamos nós.




O caminho que Nathan acreditava jamais tornar a fazer foi cumprido em muitas horas de viagem. De Milão até Bento Gonçalves, passando por São Paulo e Porto Alegre. Viagem longa, cansativa e feita com o coração pesado de lembranças e arrependimentos. Quatro anos atrás, após um período curto, porém de grande felicidade, ele deixou na Serra Gaúcha uma história inacabada que até hoje lhe fazia falta. Chegara a hora de recomeçar.
            Há quatro anos conheceu Milena Vicentin, fundou um restaurante e deu início uma vida paralela. Mas tudo desmoronou quando percebeu que vidas paralelas não existiam. Teria de escolher uma ou outra. Escolheu com a cabeça, não o coração. E após deixar o Brasil, pouco fez por seu restaurante. Por isso, sabia ter uma dívida pesada de carregar para com Emily Fruett, sua amiga e sócia. Quando a convidou para abrir um restaurante em parceria, deixou claro que seguiria vivendo em Milão. Mas não lhe falou que passaria quatro anos sem colocar os pés no investimento. Fora a sócia a cuidar de tudo, resolver cada dificuldade e atualizá-lo do que se passava. Por toda a sua dedicação, Emily foi financeiramente recompensada. Ainda assim, ele se sentia em falta com ela.
            A vida, porém, tomou rumos jamais pensados. Lhe tomou as poucas certezas obtidas e apresentou novas possibilidades. Olhando sua vida agora, ela lhe parecia como uma folha em branco. E, ao mesmo tempo que vislumbrava nela a possibilidade de escrever o que bem desejasse, também via retratado o vazio em que se encontrava. Há quatro anos, quando conheceu o sul do Brasil, tinha em sua vida três compromissos que o prendiam a Milão. O primeiro era o seu restaurante e renome como chefe de cozinha em toda a Itália. Depois sua vida boêmia e livre. E, em terceiro, suas responsabilidades para com a esposa, em estado vegetativo há tantos anos. Apesar de tudo, dar uma vida digna a Valentina era sua obrigação.
            Conhecer Milena Vicentin, cunhada de Emily, foi uma alegria. De sorriso puro e voz doce, cruzar com Milena foi como encontrar um anjo que o fez ser feliz como não ocorria há muito tempo. Foram alguns encontros em poucas semanas, mas mudaram sua vida e a forma de encarar o mundo. Mas tudo mentindo e enganando-a. Quando revelou ser casado precisou afastar-se. Envolver-se com Milena foi um risco grande demais. Ainda assim, deixou o Brasil sem saber como faria para desfazer-se de todos aqueles sentimentos.



            Enfim chegara a hora de voltar. E após dirigir em meio aos infinitos parreirais cruzou a porteira de madeira nobre entalhada que anunciava serem aquelas as terras dos Vicentin. Quando esteve ali pela primeira vez, disse a todos ter se encantado pelos vinhos. Eram realmente maravilhosos. Mas nunca foram eles a atraí-o. Ainda assim, seriam a desculpa utilizada novamente. Veio ali para adquirir lotes de vinhos.

            - Buongiorno. – Disse ao primeiro homem que avistou no caminho. Depois lembrou-se de falar português. Apesar de parecer-se muito, não estava na Itália. – Eu vim ver alguns vinhos. Os proprietários da vinícola estão?
            - Estão sim. Hoje está todo mundo aí. Mas não marcaram nenhuma visitação. – Era sábado a tarde e o funcionário sabia muito bem que negócios não seriam firmados. Era um sábado de festa familiar. – É melhor voltar outro dia.
            - Não posso. Eu já esperei tempo demais pra rever essa terra. Pode ligar e avisar para Milena que Nathan Johnson está indo encontrá-la na casa.

            Guilherme, o funcionário da Vinícola, ligou para avisar. Mas não a Milena, já que ela apesar de ser uma Vicentin não era responsável pela venda de vinhos e também porque naquele dia ela não estava ali a trabalho, como fez questão de dizer logo pela manhã ao chegar.
            Quando aproximou-se da casa da família Nathan teve uma surpresa. Imaginou se deparar com Milena lhe recepcionando com um sorriso, meio que desconfiado, mas feliz em tê-lo ali. Porém, numa área mais afastada e sob um toldo viu muitas pessoas reunidas e na frente da casa quem veio recepcioná-lo foi Lorenzo Vicentin. Sabia ser ele o administrador da vinícola, mas, até onde lembrava-se, ele havia se casado e morava em São Paulo agora. O mesmo ocorria com o seu irmão e também proprietário das terras, Jonas, casado com Emily e administrador também de uma construtora civil, ele não passava mais do que um final de semana por mês no Rio Grande do Sul. Quem vivia ali e tocava o dia a dia do negócio era Milena ao lado dos pais e avós. Foi quase impossível para Nathan disfarçar a decepção em ver Lorenzo.

            - Nathan. Pensei que Guilherme havia se enganado quando ligou. Você veio de Milão comprar vinhos aqui? Em um sábado à tarde?



            Essa desculpa serviria bem para enganar os pais de Lorenzo. Até porque, ele vinha negociando por e-mail com o administrador a aquisição dos lotes e realmente precisaria vir assinar o contrato. Só não havia avisado quando. E por isso Lorenzo o encarava com surpresa.

            - Decidi vir passar alguns dias no Brasil. Mais tempo em São Paulo, é claro. O Calderone, meu restaurante em parceria com Emily é... o principal foco da minha viagem. – Mentiu. – Mas preferi começar pelas obrigações pelo sul. Lá em Milão estão ansiosos pelos vinhos Vicentin. Espero não estar atrapalhando nada.
            - Não...apenas uma festa familiar. Estão todos aí, Emily vai adorar sua visita. Pelo que ela me disse, faz algum tempo que você não aparece.
            - É verdade, bastante tempo. – E ele não esperava encontrá-la ali. – Qual a razão da festa?
            - É aniversário da filha de minha irmã. – Lorenzo afirmou e Nathan perdeu o chão.
           
            O tempo pareceu parar naquele exato instante. Aquilo era tudo o que Nathan não esperava ouvir. Não que tivesse esperança de alguém bela e agradável como Milena tivesse ficado à sua espera nesses quase quatro anos de ausência. Mas lhe soava como uma rasteira do destino ela ter formado uma família justamente quando ele tornou-se livre para reencontrá-la.



            Poderia ter mantido contato com Milena. Não o fez porque não viu futuro a eles. Seria injusto dizer-lhe para esperá-lo eternamente enquanto ele seguia casaco com Valentina. Mas então, após uma década sem falar, andar ou sequer abrir os olhos, o coração de Valentina enfim desistiu de seguir batendo. E ao saber da notícia Nathan não soube quais sentimentos prevaleceram.
            Viu aquela bela mulher com quem se casou destruir sua vida com drogas cada vez mais fortes. Até que não houve mais como reverter o caminho e, após uma parada cardiorrespiratória, a vida de Valentina soou a todos como um castigo e não uma benção. Dependente para tudo e sem nenhuma perspectiva de melhora, Valentina definhou aos poucos e se, apesar de tratar-se desde o início de um casamento por interesse e não por sentimentos que os uniam, em algum momento ele teve esperança de ser feliz ao seu lado, isso logo terminou. Desde que o laudo médico informou que Valentina poderia viver muitos anos, mas sem nenhuma perspectiva de melhora, ele também sentiu-se um pouco morto. Estava amarrado nela e dele dependia seu bem estar, mesmo que aos olhos de todos nada que fizesse fosse bom o bastante.
            De que adiantava pagar pelos melhores médicos e enfermeiras se Valentina jamais melhoraria? De que servia manter seu corpo bem cuidado quando ela nunca deixaria a cama? Aquela era uma tristeza que não sarava e, aos poucos, Nathan afastou-se da esposa. A casa que dividiam mais parecia um hospital. Tinha o cheiro dos remédios e agora mais profissionais da saúde vestindo branco do que funcionários. Ele passou a ter ódio daquele lugar. Por algum tempo chegou a odiar a Itália e todas as suas revistas de fofocas que lucraram com a tragédia nas vidas dele e de Valentina.
            Nathan não tinha família na Itália. Apenas um avô e alguns tios que há muito não via e viviam nos EUA. Seu pai, americano, e a mãe, italiana, morreram quando ele tinha 19 anos e deixaram o filho único bem encaminhado na vida e sem irmãos. Ele escolheu viver na Itália justamente por preferir não ter família com quem conviver. Considerava melhor assim. Casou-se com Valentina porque ela também era uma herdeira sozinha no mundo. A companhia dela lhe agradava, eram amigos e não cobravam um ao outro. E a união encobria outros relacionamentos dele e dela, sem que a imprensa descobrisse. Teriam tido paz das páginas de revistas se ela não tivesse se deixado afundar pelas drogas. Ela não teve de lidar com o assédio e os intermináveis pedidos de entrevistas sobre o caso. Ele sim. E não foi fácil.
            Depois superou e aprendeu a sobreviver em meio a tudo aquilo. Primeiro deixou a casa e passou a viver um apartamento solitário. Depois descobriu formas de encontrar sexo e companhia sem chamar a atenção da imprensa. Dedicou-se ao seu restaurante e também a produção de um livro de culinária que fez muito sucesso. As mulheres pareciam encantar-se por homens que sabiam cozinhar. Assim passaram-se os primeiros 10 anos de ‘quase morte’ de Valentina. Ele sentia-se livre, porém, sabia seguir amarrado nela.
            Nada disso servia de desculpa para o que fez a Milena. Ela não merecia ser abandonada daquela forma e ele ainda ressentia-se da própria atitude. Foi embora prometendo jamais voltar e, ainda assim, nunca a esqueceu. Há três meses tudo começou a mudar. Estava atarefado no restaurante quando lhe telefonaram de sua casa informando que sem nenhuma razão aparente o coração de Valentina parou de bater. Era hora dele recomeçar a viver e só o rosto de Milena aparecia à sua frente como um convite a felicidade. Fez a compra dos vinhos, programou sua viagem e chegou ali cheio de expectativa. E desmoronou frente ao comentário de Lorenzo.

            - A filha de Milena faz aniversário hoje? – Parecia tão duro aceitar que a vida dela seguiu e, agora, quando finalmente ele era livre, ela estava comprometida. – Desculpe. Eu...não quis atrapalhar. Eu vou embora...
            - Não. Claro que não. Eu vou pegar o contrato e, enquanto isso, por que não se junta aos convidados na festa? Tenho certeza que irá gostar.




            Protegidos por uma grande estrutura de ferro e lona, muitos adultos conversavam e crianças corriam. Nathan não demorou a reconhecer muitos rostos ali presentes. Mas não se deu ao trabalho de ir cumprimentar ninguém. Procurou Milena com os olhos por cada canto. Precisava vê-la com o marido e a filha. Saber se era feliz e se ele realmente nada tinha a fazer naquela vinícola. Se fosse assim, a deixaria seguir com a vida sem interferir em nada. Não era correto tornar a bagunçar sua vida quando ela lhe ofereceu tudo e ele disse não.
            Quando a viu seu coração pareceu se iluminar. Milena sorria abraçada à menina, muito pequena e tão parecida com ela. A mesma cor nos cabelos e nos olhos. O mesmo sorriso largo no rosto. Sim, elas eram felizes e ele teria de aceitar que outro homem soube aproveitar melhor a oportunidade que a vida lhe deu.

            - Nathan! O que faz aqui? – Foi a voz de Emily a tirá-lo daquela paralisia.
           
            Emily conhecia Nathan há tempo o suficiente para saber que ele olhava-a tentando formular um raciocínio. Ela desconfiava, há muito tempo, que ele teve um motivo muito especial para deixar o Brasil daquela estranha forma. Por algum tempo acreditou que ele voltaria a Bento Gonçalves. Mas com o passar dos anos ela deixou de acreditar que isso ocorreria e, talvez, até duvidou das próprias desconfianças. Agora tudo se reavivava.



            - Fale, Nathan! – Emily insistiu. – O que o fez vir aqui após quatro anos sem nem aparecer em São Paulo para vistoriar o Calderone?
            - Confio em você demais para precisar fazer vistorias, Emily. É uma grande chefe e empresária. Sei que meu empreendimento está nas melhores mãos.
            - Pode ser. Mas elogios não respondem minha pergunta. Obviamente, você não veio curtir a Serra Gaúcha pelo final de semana.
            - É claro que não! – Nathan não gostava de ser pressionado. – Você sabe que meu restaurante em Milão vai muito bem e que os vinhos Vicentin fizeram muito sucesso por lá. Há tempos venho negociando com Lorenzo a entrega de novos lotes e vim cuidar dos contratos. Pretendia lhe fazer uma surpresa e segunda-feira encontrá-la no Carderone. Mas fui eu a ser surpreendido.
            - É, percebi. – Emily ainda não estava convencida. – Quer se sentar conosco?
            - Sim, claro. Lorenzo foi pegar o contrato. Espero que não demore.
            - Imagino que todas essas crianças por perto lhe irritem.
            - Não diga isso. Não sou pai, mas também não as abomino. – Nathan esclareceu. – E os seus? Como estão?

            Emily enfim sorriu. Esse assunto sempre fazia seu coração se alegrar.

            - Lindos. Vida já tem cinco anos e está na pré-escola. Fala pelos cotovelos em português e italiano. E Bernardo tem quase quatro e é o menino mais maravilhoso do mundo, aos meus olhos um tanto comprometidos nesse julgamento, é claro.
           
            Antes de ir sentar-se com a amiga e sócia junto dos Vicentin, Nathan disse que precisava ir ao banheiro. Queria na verdade ficar observando Milena e a menina. Pareciam tão perfeitas juntas. Mas quando enfim encontrou-as novamente, Nathan percebeu algo diferente. Elas conversavam agilmente, mas não com a voz e sim por gestos. Era tão rápido que Nathan não conseguia nem tentar acompanhar.
            Sem resistir, ele se aproximou das duas. A menina o viu primeiro e desconcentrou-se dos sinais feitos pela mãe. Foi isso que fez Milena virar-se para olhá-lo. A alegria sumiu de seus olhos naquele instante. Antes que Nathan tivesse a chance de falar qualquer coisa ou perguntar da menina, ele viu Milena voltar-se a filha novamente e fazer alguns gestos. Logo depois a pequena saiu correndo pelo salão, desviando de pessoas e cadeiras. Nathan viu Milena erguer-se do chão e abrir a boca para lhe dizer algo. Ele não esperava por tamanho ressentimento.

            - Saia daqui. E não se aproxime da minha família. – Milena disse sem erguer a voz. Logo depois deu-lhe as costas e saiu caminhando pela festa.


            Todos sorriam e pareciam felizes. Menos Nathan. E naquele momento ele sentiu-se ainda mais excluído.

Ariella - Capítulo 4

A aula havia sido desafiadora como todas as outras e apesar do sono que tomava conta de seu corpo, Ariella conseguiu se concentrar nos conceitos passados pelo professor de história da arte. Ainda assim, por alguns instantes seu pensamento viajava para Diego, seus sussurros de amor e beijos acalorados. Uma mensagem de Dulce questionava como foi a noite. Teve de responder, ou a amiga a infernizaria durante todo o dia.

[Ele é gostoso pra caramba. Perfeito até demais. Ainda procuro um defeito. Rsrsrs Agora me deixe estudar]

                        [O defeito é morar na Europa, Ariella. Use e abuse do gato. Mas não se apegue. A malinha dele deve tá pronta e logo ele deixa Buenos Aires. Não se esqueça.]

[Chupou limão essa manhã? Ontem você estava me incentivando!]

                    [E continuo incentivando! A transar com ele até dizer chega. Mas não a se apaixonar, querida.]

[Pode parar por aí. Não sou essa carente e dependente que você fala.]

[Ótimo então. Não quero lágrimas de despedida então. Ok????]

[Ok Dulce! Vá achar um namorado e larga do meu pé!]


            Ariella até tentou dar ouvidos a amiga. Mas desistiu quando passou em casa por poucos minutos para se trocar e correr ao escritório do pai e encontrou uma caixa de bombons esperando por ela na recepção. Ele não parava de mimá-la. Era mais atencioso a cada momento. E estava sim conseguindo o objetivo. “Para adoçar seu dia, mi sol”, dizia o cartão sem assinatura. Ela estranhou isso, principalmente porque as flores também não tinham remetente no cartão, mas logo esqueceu o fato.

            - Isso não é coisa de homem que está de mala pronta. Ele me quer! Ele me quer mesmo! – Ariella saltitou pelo apartamento, largou o material escolar e se preparou para ver seu pai.

            Não estava particularmente ansiosa pelo encontro. Afinal, ela e Afonso sempre tiveram uma relação estranha. Ele não era o mais carinhoso dos pais, mas jamais permitia que lhe faltasse nada. Ao contrário, dava-lhe muito e não exigia nada em troca. Muitos pais teriam reclamado dela jamais ter manifestado interesse em ajudar na empresa nem preocupar-se com o próprio patrimônio. Simplesmente usava a mesada robusta que caía em sua conta a cada virada de calendário e, se precisasse de alguma coisa extra, pedia ao pai. Ele nunca lhe disse não.
            Naquela reunião, como a secretária chamava os encontros normalmente bi ou trimestrais que tinha com Afonso, pretendia lhe contar como estava adorando a faculdade e lhe garantir que todo o dinheiro investido naquela formação não seriam desperdício. Ela estava segura de que poderia sustentar-se da arte no futuro. Talento tinha e agora estava lapidando-o.

            - Papai! Como está? – Ela abraçou-o como fazia a cada encontro.
            - Como sempre, minha linda filha. Acho que não me cabe mais dizer que você cresceu. Mas posso afirmar que está cada vez mais bela.
            - Bobagem sua, papai. Vamos almoçar? Estou com muita fome hoje e tenho muito o que lhe contar da faculdade. – A agitação dela deixava clara sua felicidade.
            - Vamos sim, é claro. – Afonso respondeu, pegando o casaco das costas da cadeira e deixando o escritório.



            Após contar ao pai, em detalhes, cada uma de suas aulas e receber comentários animados em retorno, Afonso mudou o rumo da conversa. Começaram a falar do que sempre falavam, ou seja, como estava sua vida objetivamente e sua segurança. E Ariella ficou com a sensação que tudo o que falou antes logo seria esquecido pelo pai.

            - O prédio segue bem frequentado? Não recebi nenhuma queixa mas...
            - Tudo como sempre, papai. Não precisa se preocupar.

            A questão segurança sempre foi importante para Afonso. E piorou quatro anos atrás, quando ela sofreu um sequestro. Nada de muito grave aconteceu. Alguns homens a pegaram na saída da escola, quando viria passar o final de semana em casa. Levaram-na para um lugar deserto e pediram resgate. O pai pagou e ela foi abandonada no meio de uma estrada. Nada sofreu, a não ser o trauma da violência. Estava completamente recuperada, ao contrário de Afonso, que jamais deixou de se preocupar com sua segurança.
            Quando o almoço terminou, Ariella voltou para casa com três pedidos atendidos e a consciência um tanto pesada. Em menos de duas horas juntos, seu pai concordou em lhe pagar um curso extracurricular de desenho criativo, financiar a troca de seu carro e emprestar a casa de campo para um final de semana entre amigos. E, mesmo assim, quando ele lhe perguntou se ela seguia sozinha ou se já estava novamente apaixonada, ela lhe mentiu com facilidade.

            - Solteira, papai. Nenhum príncipe a vista em meu horizonte. – Disse brincando para esconder a mentira.
            - Melhor assim. Porque tem mesmo de ser um príncipe para merecer você. Nunca se esqueça disso. – Afonso respondeu.

            Por pouco Ariella não brincou afirmando que na falta de um príncipe, estava saindo de um conde. Quando a piada com fundo de verdade estava na ponta da língua ela desistiu para não descumprir uma promessa por algo tão sem importância. Conforme Diego mesmo afirmou, o fato dele ser um conde em nada mudava sua vida. Ariella voltou para casa feliz e decidida a manter o relacionamento com Diego em segredo, exatamente como ele lhe pediu. Lhe enviou uma mensagem assim que ficou sozinha, confirmando um próximo encontro. Rapidamente havia se acostumado a ter Diego ao seu redor.
            Ela não fazia ideia, mas com isso permitia ao namorado seguir seu plano exatamente como imaginado por tantos anos. Logo após por fim ao contato telefônico de Ariella, certo de que seu segredo seguia em segurança, ele fazia planos de como prosseguir. No sonho era tudo muito mais simples que na realidade. Agora, ali em Buenos Aires, percebia o quanto de sacrifícios teria de fazer em sua vida particular e profissional para seguir com o plano. Os hotéis estavam precisando de atenção e tinha mensagens de amigos em Madri que simplesmente não podia responder. Tudo isso representava várias dores de cabeça;

            - Uma semana! Só uma semana e sua vida já está de cabeça para baixo. – Ítalo lembrou-o. – Quando tempo levará para a amarrá-la definitivamente? Muito!



            - Todo o tempo que for necessário. Tenho funcionários capacitados em casa e nos hotéis. Nada me impede de passar uma longa temporada na Argentina. – O que não o fazia desejar isso. Não gostava daquele país. Estava ali unicamente para enredar Ariella a tal ponto que ela não resistisse a cair na armadilha. – Mas sei que Olívia e Murilo desejam sua presença em Madri. Pode ir vê-los, Ítalo.

            Vontade não faltava a Ítalo. Mas deixar seu jovem patrão, quando esse estava perto de realizar o grande erro de sua vida era impossível. E sua família era capaz de entender isso. Especialmente porque Olívia os conhecia há muito mais tempo, trabalhou para Ramón e Silvana. Ajudou a criar Diego quando sua mãe morreu Ramón afundou-se cada dia mais. Agora a única família que sobrara ao garoto era Anita, a avó paterna que o ama, mas visita-o ocasionalmente e não faz ideia dos erros legais e morais que Diego está prestes a cometer.
            Por isso tudo, Olívia senti-se como uma guardiã daquele jovem e, apesar de sentir a falta do marido, jamais pediria que esse retorna-se à Espanha deixando-o na América do Sul, sem ninguém para orientá-lo e trazê-lo de volta à razão. Quem sofre mais com isso é Murilo. Apenas quatro anos mais jovem que Diego, o filho de Ítalo e Olívia cresceu frequentando as mesmas escolas e usufruindo da grande casa dos Bueno em Cádiz. E mesmo após crescerem e se mudarem para Madri, os dois mantinham a mesma amizade da infância.
            Se dependesse do patrimônio do pai, Diego seria hoje um homem pobre já que Ramón perdeu tudo após a morte de Silvana, usando seu tempo para beber e jogar e esquecendo dos negócios. O que salvou Diego da pobreza foi a herança deixada pela mãe, que recebeu da justiça ao completar 18 anos. Com ela ele iniciou seus negócios e apesar de muito jovem, fez o dinheiro se multiplicar. Quando chegou a hora de Murilo fazer faculdade e Diego já tinha uma pequena cadeia de hotéis estruturada, Murilo procurou o amigo e expôs seu plano de fazer hotelaria e, com isso, um dia receber uma oportunidade de trabalho na empresa de Diego. Respondeu uma resposta surpreendente.

            - A menos que você goste muito de hotelaria, Murilo, prefiro que você curse administração e venha trabalhar comigo desde já na empresa. Eu contrato hoteleiros em cada estabelecimento. O que preciso é de um administrador da minha confiança para administrar os negócios. Pretendo dobrar a quantidade de hotéis em poucos anos e isso exigirá trabalho. Se topar, garanto que não se arrependerá. Vou te recompensar.



            Desde então Murilo, além de um amigo, às vezes confidente, tornou-se funcionário de total confiança. Nesse momento, mesmo sem estar formado ainda, era ele quem estava responsável pelos negócios localmente quanto Diego cuidava de seus problemas pessoais. Caso algo grave ocorresse, ele ligava e conversava diretamente com o chefe, mas, quando as coisas caminhavam calmamente, ele conseguia resolver a tudo sem precisar de ajuda.
            Era com isso que Diego contava nas próximas semanas ou meses. O que fosse necessário para enganar Ariella. Tranquilidade nos negócios e em casa para  resolver sua vida particular. Enquanto não conseguisse vingar-se e acabar com Afonso Amaral, sua vida não estaria completa, mesmo que viesse a ser um dos maiores empresários de seu país.

            - O que fará quando ela aceitar casar-se e ir para Madri, Diego? O que pretende com tudo isso? Matar uma jovem de 18 anos que nada lhe fez?
            - Não sou um assassino e você sabe. Matar Ariella e até mesmo Afonso, jamais esteve em meus planos. Já tenho as operações da maior parte das empresas dele, que estavam falidas. Vou desmoralizá-lo publicamente. Todos na Argentina saberão que ele é um péssimo administrador que não tem mais nenhum centavo. E que ele também perdeu a filha ao mesmo homem.
            - Isso tudo você já disse. – Ítalo pressionou-o. – Mas e depois? A menina estará na Espanha, contrariada e, provavelmente temendo você. E o que fará? Como termina essa história criada por você.
            - Não termina. Ela será a minha mulher. Se quiser ficar e ser uma duquesa, continuar em sua vida de princesinha sustentada, ótimo.
            - E se não quiser?
            - Ela pode ir embora. – Diego respondeu friamente. – Depois que me der um filho, Ariella pode deixar a Espanha. Desde que abra mão dele. E saiba que não mais terá quem a sustente. Terá de aceitar pela primeira vez na vida que trabalho a mais do que um gosto, é necessidade. E, posso garantir, ela preferirá uma prisão de luxo do que uma liberdade na miséria.
            - E então? O que acontece? – Novamente Ítalo tentou fazê-lo ver a realidade.
            - Então o que? – Diego já estava irritado. – Então eu terei vencido. Simples!
            - Vencido? Isso é vencer? Terá uma mulher magoada e uma criança traumatizada em meio a tudo isso. E você estará feito um louco, como Ramón.
            - Não fale do meu pai!
            - Falo! Falo porque vi. Ele ficou infeliz e por isso enlouqueceu. A infelicidade e a solidão faz isso com um homem. E você foi criado em meio a essa infelicidade. Veja no que se transformou. Quer colocar outra criança no mundo para passar por isso?

            - Os Amaral tomaram a minha mãe. Eu tirarei um filho deles. É isso que fará Afonso Amaral saber o quanto sofremos. E se isso se chama loucura, que eu seja um louco. Agora me deixe sozinho.

domingo, 20 de março de 2016

Ariella - Capítulo 3


Diego surpreendeu Ariella ainda naquela tarde quando ao retornar para seu apartamento, encontrou na portaria um imenso boque de flores. Elas por si só já teriam grandes chances de agradar a jovem Amaral, mas, para garantir o sucesso daquele segundo passo da conquista, ele ainda adicionou uma doce declaração. Nela, Diego afirmava ter lutado para lhe dar espaço e tempo para pensar antes de dar uma chance aquele desconhecido. Mas a lembrança de seus cabelos e de seu perfume não permitiram. Por fim, dizia-lhe que passaria ali às 21hs para levá-la para jantar e que se não estivesse interessada, ele compreenderia e voltaria para Madri sem jamais incomodá-la novamente.

- Com isso você a impede de fazer o charme típico das mulheres que desprezam a primeira tentativa de encontro. – Ítalo lhe disse quando viu Diego preparar o cartão.
- Infalível, não?
- Certamente. A questão é: conquistar a garota e destruir Afonso, trará sua mãe de volta e apagará todo o ódio que você tem?
- Não. Mas quitará uma dívida antiga. E pare de falar como se ela fosse um anjo caminhando na terra e eu um demônio que a levarei ao mau caminho. Ariella não é nenhuma santa. Ela teve a vida de uma rainha por cada um de seus 18 anos, sem fazer por merecer nenhum de seus mimos. Um choque de realidade lhe fará bem.

O resultado foi eficiente. E poucas horas depois Ariella encarava-se no espelho, tentando estar pronta para encanar Diego com sua beleza. As flores no fim da tarde, quando ela já estava triste por ele não ter feito nenhum contato durante todo o dia lhe fizeram sorrir, mas o convite para jantar a deixou ansiosa. Talvez naquela noite ele desejasse tê-la para si por toda a madrugada e só essa possibilidade a fazia tremer. Então abriu seu guarda roupa e tentou escolher algo que fosse elegante e sexy ao mesmo tempo. Preferiu ser ousada e escolheu um modelo vermelho, com uma fenda que valorizava suas pernas. A mensagem era clara: estava interessada nele.



Já na roupa íntima, que realmente esperava que ele visse, não encontrou nada sexy o bastante entre suas opções e que combinasse com o vestido. Então optou por um lingerie de estilo jovem, mas, ainda assim, capaz de colocar fogo em um homem. Desejava Diego. E se ele realmente tinha de voltar logo para Madri, queria tê-lo para si antes disso.

- É impressionante como você consegue ficar ainda mais bela. Não parece real, Ariella. – Diego disse cumprimentando-a logo após chegar para pegá-la.

Se fosse sincero, diria que não gostou do vestido nem da postura dela com ele. Ariella estava se oferecendo e, talvez em qualquer outra situação ele gostasse a te se sentisse lisonjeado. Ali, pensava que ela mostrava sua índole e vulgaridade. Não tinha nenhum recato nem se valorizava. E Diego, que não pretendia levá-la para a cama ainda, começou a repensar a decisão. Ela podia até estar vulgar, mas despertava sua libido. Antes, porém, seguiria com sua sedução e armadilhas. Só uma noite com ela em nada o ajudaria a destruir Afonso Amaral, por mais que fosse convidativa. Precisava que Ariella estivesse a ponto de largar tudo e vir com ele quando lhe propusesse casamento. Desconfiava que uma informação ajudaria muito. E não tardou a lhe oferecer.

- Sério?!?!? Mas então você é um legítimo conde espanhol? – Ariella surpreendeu-s quando ele, casualmente, lhe confidenciou isso. Ela quase se engasgou com o prato, uma insossa salada ao molho de ervas.
- Sim, sou. Herdei de papai o título. Mas não é nada demais. Não serve para nada. – Diego lhe respondeu. Era verdade, uma das poucas frases verdades que disse à garota até agora. E só lhe disse porque sabia não ser capaz de desfazer o fascínio que via em seus olhos. Ela estava encantada por ter um conde lhe cortejando. Típico de uma menina sem princípio, que valorizava apenas a aparência. – Tem certeza que vai comer só isso?
- Sim. Não como carboidrato a noite.
- Entendo. – No fundo, colocava aquela afirmação na lista de frescuras dela. – Mas preciso que tenha energia hoje a noite.
- Terei, não se preocupe.



Ainda no restaurante, Diogo beijou-a e acariciou-a como se já estivessem em lugar privado. Passava a sensação de ansiar por ela. Era assim que se sentia, mesmo que por vezes  dissesse a si mesmo que era tudo uma farsa, tudo parte de um objetivo. Poderia até fazer parte do plano tantas vezes imaginado para vingar-se e acabar com Afonso Amaral, mas teria um grande prazer naquela etapa.

- Quero você, Ariella. Não deveria lhe pedir isso já, assim, sem cortejá-la adequadamente. Mas preciso. Não aguento. Venha para o meu quarto de hotel. – Disse mordiscando-lhe a orelha, garantindo que ela não tivesse forças para negar.
- Não prefere meu apartamento? – Ela ofereceu.
- Não. – Disse bruscamente e depois teve de explicar. – O hotel é mais perto e cada minuto é tempo demais. - A verdade é que preferia não usar uma cama que foi paga por Afonso. E também não duvidava que ele tivesse acesso a câmeras de segurança do prédio. Então devia ter cuidado.
Com os dois desejando exatamente a mesma coisa, não demoraram a estar na suíte de hotel. Com diferentes objetivos, nenhum deles mostrou como realmente era. Diego escondia sua fúria por trás de um sorriso doce e voz suave. Ariella mostrava-se serena e natural enquanto lutava para ele não perceber sua ansiedade e timidez.

- Você é um conde, um empresário, um homem maravilhoso. O quer comigo? Uma estudante de arte, no primeiro semestre? – Ariella teve coragem o bastante para externar sua preocupação.
- Quero muito mais do que você pode imaginar. – E pela primeira vez ele lhe disse uma frase totalmente verdadeira.



- Nossa! Isso foi meio assustador. – A forma como ele disse a frase tão pouco tempo depois de conhecê-la deixou-a preocupada.
- Não! Por quê? – Diego percebeu que precisava disfarçar melhor o seu comportamento. Tinha pressa em enredá-la, mas ela parecia não estar pronta ao um relacionamento tão rápido. – Eu fui afobado. Desculpe-me.
- Tudo bem.
- Mas, Ariella, não fique preocupada por eu ter alguns anos mais, um título de nobreza que não serve para nada ou uma empresa que me trás preocupações. Nada disso importa. Eu só tenho 23 anos. Você faça como se fosse um velho solitário que nada no dinheiro.
- Não...é só que é estranho um rapaz de 23 anos ser dono de uma rede de hotéis. E você disse que não a herdou do seu pai então...
- Eu a fundei com um dinheiro que recebi de minha mãe. Uma herança. Dei sorte em alguns investimentos e fiz apostas corretas. E trabalho bastante. Só isso. Agora prefiro falar de você.
- Não tem muito o que falar. Vivo em um apartamento bancado por papai e faço faculdade de artes plásticas. Eu amo pintar e desenhar. O plano é um dia viver disso. Sem precisar de mesada.
- É um bom plano. Você e seus pais são próximos?
- Minha mãe morreu há vários anos. Mas sim, ela era maravilhosa. Apoiava-me em tudo. E era uma artista também. Papai é mais distante. Eu...estudei em colégios internos depois que mamãe morreu. Mas ele é bom pra mim. Nunca nega nada que peço...mesmo que eu tenha de pedir por e-mail ou ligar para sua secretária porque ele raramente tem tempo de me ver.

Perfeito, pensou Diego. Ela não correria para contar ao papai que vinha sendo cortejada por um espanhol que apareceu do nada. Ariella parecia uma vítima tão fácil, tão exposta, que, às vezes, ele sentia vergonha pelo que fazia. Isso passava sempre que ela fazia um comentário sobre alguma extravagância financeira de seu passado. Tudo pago com um dinheiro que Afonso Amaral jamais deveria ter conseguido. E, pelo que havia descoberto, o mesmo golpe ele repetiu com a mãe de Ariella. Talvez, quando tudo acabasse, ela até lhe agradeceria por acabar com seu pai. Ou não. Talvez seu caráter fosse idêntico ao do genitor. Era bem possível, já que ela não via problema em usufruir do dinheiro, mesmo reclamando da falta de tempo do genitor.
Algumas doses de bebida depois, os assuntos familiares ficaram no passado e tudo o que Ariella lhe contou de mais íntimo foi um dos relacionamentos amorosos passados. Ela até tentou saber mais da vida dele, mas Diego lhe disse preferir o futuro. E começou a despi-la. Teve a grata surpresa de ver que a menina tinha curvas de uma mulher.



- Linda. Perfeita. A ideia de outro apenas olhá-la começa a me incomodar. – Diego disse analisando as curvas cobertas por uma pele muito banca e macia.

Ariella poderia ser chamada de ‘falsa magra’. Ou assim ele acreditava. Porque após vê-la em inúmeras fotos do dossiê de investigação, não percebeu que era tão linda. Sempre observou os cabelos ruivos e chamativos, a pele delicada complementada por minúsculas sardas e o sorriso doce. Era como se ela gritasse uma falsa inocência. Agora, porém, via que ela estava mais para uma ninfeta sensual e perigosa. Precisava ficar atento a ela. Ou cairia em seus encantos.

- Você merece um amante paciente e delicado. Não sei se consigo. Não te olhando assim, tão sexy.
- Eu não sei se quero paciência ou delicadeza. – Ariella respondeu, fascinada por aquele homem.

Nos braços dele, Ariella viu a madrugada passar entre ápices de prazer, intercalados de sussurros safados. Ao contrário do que deu a entender, Diego não foi bruto nem apressado. Amou-a com firmeza, mas em nenhum momento mostrou-se menos afetuoso. Ariella estendeu-se sobre seu peito quando o cansaço tornou-se maior que o desejo e sorriu aconchegada contra o pescoço dele. Aquele riso tranquilo fez Diego sentir-se bem, era sinal que estava satisfeita e seguia enredada em suas mentiras.

- É hora de eu ir para o meu apartamento. Tenho aula...e antes preciso ligar para papai. – Ariella disse vestindo a calcinha.

Aquilo desagradou Diego. E se ela falasse algo e Afonso resolvesse investigar o homem que saía com sua filha? Qualquer desconfiança podia protegê-lo de cair no golpe final, mesmo que ele já estivesse atado a diversas armadilhas.

- Hermosa niña. Mi sol! – Diego disse enquanto os primeiros raios de sol atingiam os cabelos avermelhados. - Posso te pedir uma coisa, minha linda?
- Você me chamou de meu sol?
- Sim. Com esses cabelos avermelhados, você pode ser comparada ao sol. Então? Posso fazer um pedido?
- É claro.
- Não conte a ‘su padre’ sobre nós.
- Por quê?
- É tão lindo o que temos...prefiro manter em segredo por enquanto. Promete?
- Está bem. Eu não falaria mesmo. Tenho poucos minutos com papai. Preciso aproveitá-los com o essencial. Agora preciso ir. Verei você novamente, não é?
- Por muito tempo. Não duvide disso, mi sol.

Feliz, Ariella deixou o hotel e, satisfeito, Diego começou a trabalhar em seu computador antes de planejar seu próximo passo.



domingo, 13 de março de 2016

Vida Roubada - Capítulo 16


            Matt jantava junto de Paty num clima leve, mesmo que os pensamentos de ambos estivessem na Rússia, na esperança de Elizabeth trazer Bia de volta. Ainda assim, entre eles tudo estava bem. E enquanto isso continuasse assim se sentiriam seguros e capazes de ajudar os amigos. Aquela foi uma noite típica de casal. Macarrão preparado a dois, cerveja ao invés de vinho porque era isso o que desejavam para aquele momento e muito carinho. Estavam felizes.

            - Sabia que eu não consigo mais imaginar a minha vida sem você? – Patrícia disse ao namorado, quando já estavam atirados no sofá da sala, procurando um filme para assistir. – Você mudou a minha vida.
           


            - Você também mudou a minha, pequenina. Mais do que pode imaginar. Em outros tempos, numa noite como hoje, eu teria saído para beber e provavelmente voltaria sozinho para casa.
            - Acho difícil acreditar nisso. – Paty não conseguia entender porque aquele homem esteve sozinho por tanto tempo.
            - É a verdade. Eu nunca fui de relacionamentos rápidos ou passageiros. Só uma noite, por melhor que o sexo seja, não me satisfaz. Parece que falta algo. Não é o desejo que mantém um homem junto de uma mulher, apesar de vocês acreditarem que somos movidos por esses instintos.
            - Quer dizer que o sexo comigo pode ser ruim, desde que o resto compense? – Ela perguntou, achando graça daquele comportamento do namorado.

            Há alguns meses, falar sobre sexo era algo difícil. Matt levou algum tempo para aceitar que estava apaixonado por Paty, não apenas ajudando uma menina que vendia o corpo para sobreviver. E quando finalmente deu vazão aos próprios sentimentos e declarou estar enamorado pela então hóspede em seu apartamento, passou semanas lutando para não terem um relacionamento sexual. Temia que Patrícia visse nele um ‘cliente’ a quem precisava agradar na cama para manter o emprego e o teto onde mora. Adaptar-se ao atual relacionamento e superar o passado foi algo difícil para os dois.
            Hoje mantinham uma vida sexual como a de qualquer casal. Dias de intenso desejo e outros sem a mínima vontade de transar. E conviviam bem com isso. Paty aprendeu que Matheus desejava-a como nenhum outro homem já a quis, valorizando seu corpo e zelando por ele. Enquanto ela adaptava-se a isso, Matt entendeu já Patrícia tinha desejos e quando o procurava na cama não era para agradá-lo, mas sim para matar a própria fome sexual.

        - Se por ‘resto’ você estiver falando de companheirismo, planos em comum e amor, sim, eu acho que compensa. Mas, além disso, o sexo também é bom pra caramba. E essa conversa toda está me deixando com vontade tirar a sua roupa.
            - Achou que você deve obedecer essa vontade.
            - É, também acho. Mas antes...tenho uma coisa para te dizer. Uma coisa bem importante.
            - Diz logo. – Ela ficou ansiosa.
            - Que ansiedade é essa?
            - É pressa pra você tirar a minha roupa. – Sem nenhuma timidez ela reconheceu.
            - Ótimo! – Matt riu. – Porque é bom saber que a mulher com quem eu pretendo casar me deseja tanto assim. Patrícia, você aceita se casar comigo?
            - Sim! Sim! Mil vezes sim! – Sem nem um instante para pensar ela respondeu.



            Logo Matt cumpriu a promessa e tirou peça por peça das roupas que cobriam o corpo magro e proporcional da namorada. Sem nenhuma pressa, ele acariciou a pele macia e perfumada que agora estava arrepiada, antecipando as carícias que viriam. Quando lhe tirou a calcinha e surpreendeu-a pela ousadia movimentando dois dedos dentro dela, Patrícia cravou os dentes entre gemidos na curva entre seu ombro e pescoço.

            - Você diria que esse sexo é ruim, minha noiva? – Matt provocou, aprofundando a penetração e vendo-a não conseguir se concentrar para falar. – Vamos Paty, eu quero uma resposta. Está ruim?
            - Não. Está...está...é...é o paraíso.

            Satisfeito com essa resposta Matt tirou as próprias roupas e levou a namorada para o quarto. Estava feliz em conseguir passar aquela noite sem pensar nos problemas que ainda viriam. Matt não comentava com Patrícia, mas quando Liz desmembrasse aquela quadrilha, suas ramificações apareceriam e ele não tinham esperança alguma de que o passado de Paty ficaria escondido. Apesar de não sentir vergonha, ele preferia poder esquecer-se de tudo. Infelizmente não era algo possível. Então aproveitaria o agora, naquele breve cessar fogo da guerra que ainda continuaria.

            Elizabeth acordou em Moscou disposta a invadir a Noxotb.  Logo após ela alimentar-se com um farto e saudável café da manhã. Miguel chamou um táxi e eles circularam pela região das boates que há tanto tempo Liz investigava. O problema é que ela lá estava como uma civil, em férias com o marido. E seu distintivo nada valia. Sua única alternativa era conseguir um forte indício e enviar para Rebeca. A policial, do Brasil, convenceria Tom a aprovar uma solicitação de ajuda internacional. E numa ação conjunta, as polícias de Brasil e Rússia estourariam uma das grandes quadrilhas de sequestro de pessoas no mundo para fins de abuso sexual. Olhando da rua, porém, estava difícil conseguir esse indício.
            Elizabeth resolveu entrar. Mandou o táxi parar na frente da Noxotb, mas, quando abriu a porta, Miguel a segurou pelo braço. Os dois não discutiram dentro do veículo, apenas trocaram um olhar. Lá no fundo Liz sabia que entrar sozinha, desarmada e sem distintivo em uma boate ilegal seria arriscado e sem muitas chances ao sucesso da operação. Ela estava agindo com o coração e agradeceu a sensatez de Miguel. Em um russo que misturava algumas palavras de inglês ele falou com o motorista antes de retornar a atenção à esposa.

            - Ele disse que alguns homens frequentam aqui durante o dia. Poucos, mas acontece. Se eu entrar, não vou atrair a atenção. Você sim.



            - E o que você sugere fazer? Vai lá, contratará uma menina enquanto eu fico aqui?
            - Não. Eu vou lá, tentarei ver os chefes, gravar alguma coisa que valha você mandar para Rebecca. Depois que lhes dermos algo valioso...a polícia federal se sentirá feliz em ter uma investigadora, coincidentemente, por perto e pedira que você interfira. Aceita o meu plano?
            - Aceito. – Que alternativa tinha. – Mas você não é policial, não tem treinamento para isso. Nunca lidou com essas pessoas. Cuidado.
            - Já frequentei muitas dessas casas de prostituição, Liz. Não me orgulho disso. Mas sei como ligar com essas pessoas.
            - Vá logo então!
            - Ótimo. – Miguel voltou a falar em russo e ordenou ao motorista a levá-la de volta a segurança do hotel. – Até depois, meu amor.

            Miguel entrou na Noxotb muito seguro. Nunca esteve naquela casa, mas já conhecia em detalhes muitas outras as quais, hoje, não tinha dúvidas participarem do mesmo esquema ou de outros muito similares. Ao entrar, viu um local discreto, porém, bem iluminado e limpo. A parte mais ao fundo estava sendo limpa por duas mulheres. Nenhuma era Beatriz, mas, pelos trajes e beleza, não teve dúvidas de que elas não eram apenas serventes da casa. Antes de ter a chance de falar com alguma delas uma mulher alta, bela e negra se aproximou.

            - Posso ajudá-lo? – Perguntou num inglês que não era sua língua mãe.
            - Sim...eu...estou na cidade há negócios. Busco por...diversão.
            - Claro, senhor. E que tipo de diversão lhe interessa? Homem, mulher, alta, baixa, loira, negra?
            - Mulher. – Aquela conversa o estava inojando. – Gosta das...brasileiras.
            - Todos gostam. Temos uma festinha particular acontecendo. Acho que o senhor irá gostar. Como posso chamá-lo?
            - Sr. Alexander. Eu adoraria conhecer suas meninas.
            - Ótimo...terceira porta à esquerda. Deseja beber algo?
            - Whisky sem gelo, por favor.




            Ao entrar na sala indicada, Miguel encontrou alguns homens sentados em confortáveis lugares enquanto mulheres de biquíni dançavam sobre as mesas. Eram muito belas, com curvas fartas, longos cabelos soltos e maquiagem reluzente. Logo Miguel estava falando com alguns dos frequentadores e observando as mulheres. Todas pareciam profissionais. Não havia nenhuma muito jovem nem com expressão facial que lembrasse nada além de sexo e prazer. Eram bem treinadas para parecerem felizes com aquilo.

            - Oi bonitão. – Não demorou para uma sentar-se em seu colo e se oferecer para um atendimento particular. – Me leva para o quarto. Não vai se arrepender.
            - Posso apostar nisso. Qual seu nome.
            - Rubi. Sou boliviana.
            - Você é muito bela, Rubi. Mas eu procuro por uma brasileira para hoje.
            - Veio ao lugar errado, queridinho. Ontem foi feito um leilão...as brasileiras foram todas vendidas. Sabe como ela, se não dá lucro de um jeito, vai dar de outro.
            - É, eu sei. – Miguel ficou feliz em ter aquilo gravado. Duvidava que algo assim não fosse encarado como prova de que Liz estava no caminho certo. Ainda assim, para encontrarem Bia, era um banho de água fria. – Mas não sobrou nenhuma?
            - Não sei bonitão. Talvez. Mas...te garanto que faço você esquecer qualquer uma no remelexo dos meus quadris. Vem, vem...
            - Não! Não é você quem eu quero. Desista.

            Miguel deixou a boate e correu para o hotel. Precisava passar tudo aquilo para Elizabeth. Eles tinham muito a fazer em pouco tempo. Afinal, se Bia foi vendida junto das outras brasileiras, teriam de se apressar ou perderiam aquele rastro.
            Quando Tom recebeu de Rebeca aquela gravação, sentiu a raiva tomar conta de seu corpo. Aquelas férias improvisadas de Elizabeth não poderiam mesmo ser coisa boa. Lá estava ela, como civil, na Rússia, investigando por conta aquela quadrilha de importância mundial.

            - Você sabia disso? – Ele pressionou Rebeca?
            - Sim, Senhor.
            - Sabe dos riscos? Ela pode se ferir ou ser morta ao tentar resolver sozinha ao que batalhões inteiros tentam há anos e não conseguem. É um risco imenso!
            - Ela está com Miguel, senhor?
            - Sim, presumo que seja ele o “Sr. Alexander”! Outro que não tem a cabeça no lugar! Podiam os dois já estarem mortos por essa ansiedade em resolver as coisas. Elizabeth vai me ouvir quando retornar. A se vai!



            - Com todo o respeito, Sr., eu acho que agora temos de correr para que o risco que Liz sofreu não seja em vão. Precisamos de um mandato de execução do juiz e também temos de avisar a polícia Russa. É urgente. – Rebeca afirmou.
            - Está tentando me ensinar o meu trabalho, policial?
            - Não senhor.
            - Ótimo! Agora trate de entrar em contato com a polícia russa. Eu falarei pessoalmente com o juiz. Depois que isso tudo se resolver, eu mesmo me acerto a Elizabeth!
            - Sim, Senhor – Rebeca repetiu, satisfeita com a conduta do chefe. Agora era só colocar tudo em prática.


            Naquele momento, porém, Beatriz iniciava sua nova vida. Já não era mais uma prostituta escravizada. Porém, estava prestes a descobrir que ser propriedade de Sebastian não era tão melhor como imaginava. O homem atencioso parecia novamente ter dado lugar a um irritadiço e mal humorado homem.
            Aquela noite ela passou solitária, sem nem mesmo malas a arrumar. Primeiro porque não fazia questão alguma de levar nada dali. Segundo porque, após ser deixada sozinha no quarto por algum tempo, Gregory veio lhe falar e ofereceu alguns avisos e entregar um pacote. Somente a ideia de nunca mais vê-lo mantinha sua felicidade.

            - Seu dono quer que saia daqui vestindo isso, sem nada levar.
            - E meus documentos? Você ficou com a minha identidade na noite em que me sequestraram?
            - Não existem mais. Beatriz, aquela mulher não existe mais. Você não é mais uma mulher...é uma mercadoria pela qual Sebastian pagou e vai usar conforme seu desejo. Aconselho você a lhe obedecer cegamente. Você não sabe como ele pode ser brutal quando irritado.
            - Está com medo por mim?
            - Você pode até debochar, pequena Beatriz, mas eu sempre tive simpatia por você. Desconfio que muito em breve você verá que não fez uma grande troca. Sebastian apenas a comprou para ter uma cadelinha particular e não permitir que mais ninguém lhe toque ou a veja. Vai lhe enclausurar dentro de um quarto e aparecer quando tiver vontade de fazer uso da mercadoria. Simples assim.
            - Ao menos não terei mais de olhar na sua cara nojenta.
            - Nem na cara de mais ninguém, sua idiota. – Ele sentiu vontade de lhe espancar ou de tomá-la uma última vez. Mas irritar Sebastian não era boa ideia. E as ordens dele foram claras. “Ela não é mais sua. É minha agora. Eu paguei por Beatriz. Toque nela e eu mesmo cuido para que não toque em mais ninguém nessa vida”. Ainda assim, vontade não lhe faltava. - Você apenas mudou de carcereiro. Você pode pensar que estava no inferno, mas logo verá que há coisa ainda pior.

            Gregory deixou o quarto e entrou na porta ao lado. Nela, meninas recém chegadas esperavam assustadas. Pegou uma delas pelo braço e levou de lá até um dos quartos. Precisa extravasar a raiva que sentia em perder Beatriz.



            - Socorro! O que você quer? Nãoooo! – Ela tentava se defender e era contida pelas mãos e pernas de Gregory.
            - Calada! Aprenda que sua única função aqui é abrir as pernas. Quanto mais se negar, mais apanha. – Mais um tapa estourou na face dela. – Entendeu?

            Indiferente a tudo que ocorria, no Brasil e na Rússia com intuito de encontrá-la, Beatriz deixou a boate em um carro guiado por Francisco. Sem nada falar, ele entrou com o carro na garagem de um hotel, abriu a porta e acompanhou-a até o carro. O segurança que os seguia e postou-se ao lado da porta não lhe representava boas notícias. Jamais se sentiu não vigiada.

            - Onde está Sebastian? Achei que ele estaria aqui.



            - Ele virá mais tarde, depois vocês vão viajar juntos e ele te instalará num local seguro. Por enquanto ficará aqui. Sem ataques de coragem ou de burrice, Beatriz. Se souber lidar com o patrão, terá o melhor dele. Mas se der um passo em falta, perderá sua confiança e terá o seu pior. E não irá gostar. Há roupas para você no quarto. Naquelas sacolas têm produtos de higiene e comida. Não precisa se preocupar com nada, mas esteja pronta, bela e com um sorriso nos lábios quando Sebastian chegar.
            Nervosa, Beatriz banhou-se na banheira do quarto com toda a calma. Comeu vestindo apenas o roupão do hotel. E quando o relógio marcava que passava do meio dia, foi olhar as roupas de que dispunha. Não gostou de nada. Porque em cada uma delas havia escrito a palavra ‘vagabunda’, se combinadas, sentia vergonha em vesti-las e perguntava-se qual a mensagem que Sebastian queria lhe passar com tudo aquilo. Sugestivamente, não havia calcinha entre as roupas. Mais um humilhante recado. Pensou em ficar exatamente como estava, de roupão e cabelos bagunçados. Mas desistiu ao perceber que bater de frente com aquele homem seria pior.
           


            Quando Sebastian entrou no quarto, encontrou-a vestindo o vestido escolhido por ele. Era de uma grife inglesa conhecida e qualquer mulher deveria se sentir honrada em receber a cara peça de presente. Numa mulher longilínea ficaria discreto e harmônico. Provavelmente, muito elegantes. Nela, porém, tornou-se chamativo e vulgar. O tecido ficou muito justo em suas curvas. Na região do quadril marcou as nádegas livres de calcinha. E os seios fartos pareciam saltar pelo decote.
            Seu sentimento foi dúbio. Ao abrir a porta do quarto avistar o segurança e ter de destrancar a porta o fez se sentir um criminoso. E o plano de voo falso que trazia na pasta comprovavam que ele agia fora da lei. Iria fugir da Rússia em um avião particular levando com sigo uma mulher comprada. A vergonha lhe corroía por dentro. Já demônio dentro dele gostou de ver em oferta cada um dos atributos de Beatriz, sentada no sofá próximo da porta, esperando-o com uma expressão que beirava o temor. Gostou, principalmente, de saber que ela lhe pertencia. Saber que aqueles seios nunca mais seriam tocados por outras mãos. Saber que o cheiro daqueles cabelos era somente ao seu prazer.
            Passara aquela noite organizando seu futuro, agora com uma amante secreta. Preferia essa expressão a ‘escrava’, ela lhe fazia sentir-se um pouco melhor. Comprou um apartamento em área nobre, porém afastada da qual ele vivia com a mãe e a filha. Era em um condomínio de classe alta, com infra-estrutura que permitiria a Beatriz ter uma vida agradável sem deixar o local. Além disso, por lá era comum pessoas andarem com segurança por perto. Ninguém estranharia se a nova moradora tivesse uma sombra a percegui-la por todos os lados. Por se tratar da cobertura, ele poderia acessar ao apartamento por um elevador privativo e nenhum vizinho o veria. Telefone e internet foram cortados. Beatriz poderia se distrair pela televisão, livros ou revistas, mas sem poder pedir socorro a ninguém. Depois de instalá-la, lhe apresentaria as regras que deveria seguir e então poderia seguir com sua vida, trabalhar, viajar e, ao voltar, ter Beatriz segura e a sua espera. Era um bom plano, ele acreditava. Ainda assim, não apagava aquele gosto amargo da boca.
           
            - É bom vê-la aqui ao chegar. – Sebastian disse ao fechar a porta.
            - Como se você tivesse alguma dúvida do local onde eu estava. – Bia respondeu, sem esconder o mau humor de quem passou horas trancada naquele quarto, enfeitando-se como se fosse uma boneca que serviria de brinquedo para ele.
            - Vejo que está irritada. Não entendo por que. Esse ambiente me parece bem melhor do que aonde você viria.
            - E é, sem dúvida. Mas ainda assim, não passa de um cativeiro e você é tão feitor quanto Gregory.
            - Será que sou mesmo? Aposto que ele, por muito menos, já teria feito-a calar a boca a socos. Estou mentindo?



            O silêncio foi a resposta de Beatriz. Sebastian não a aceitou, foi até ela e segurou-a pelos braços, fazendo-a temer por como aquela noite terminaria.

            - Eu fiz uma pergunta. E exijo a resposta.
            - Não, é verdade. Mas o que me garante que você não fará exatamente o mesmo assim que enjoar de ter uma cadelinha de estimação?
            - Você não tem garantia Beatriz. Por isso é melhor me obedecer e não me causar problemas. Você não está em condição de ter chiliques desse tipo. Gastei uma pequena fortuna para tê-la como minha e tirá-la daquele buraco. Você ganhou na loteria! Poderia ter sido comprada por um velho babão que a colocaria de joelhos esfregando o chão, louco para chicotear esse seu belo traseiro.
            - E os seus planos, quais são?
            - Bem mais interessantes ao seu traseiro, pode apostar. Olhe para o vestido maravilhoso que você usa e perceba o quanto eu valorizo a minha mais nova aquisição.
            - Valoriza tanto que esqueceu-se de comprar a calcinha! – Beatriz sabia que estava indo longe demais, mas, não conseguia se segurar.
            - Então é isso o que te incomoda? A vendedora disse ser a última moda as mulheres não usarem calcinha com vestidos desse tecido. Fica marcado e incomoda, me disse ela. Mas na próxima, me lembrarei de lhe enviar essa peça. Na sua nova casa, Beatriz, você poderá usar calcinha sempre. Desde que eu não esteja lá, é claro. Nesses momentos você não precisará de roupa alguma.
            - Só servirei para sexo então? É só essa a minha serventia?
            - E qual mais seria, querida? Eu não lhe comprei para discutir a queda da bolsa de valores. – Prepotente, ele riu da pergunta. Agora tire a roupa. Eu já cansei de olhar a esse vestido.