sábado, 24 de maio de 2014

Dupla Perseguição - Capítulo: 43



            Neal voltou para casa revoltado. Em momentos assim ele realmente cogitava desaparecer no mundo com sua família e Mozz. A vida deles não representava nada ao FBI, muito menos à MI5. Queriam apenas usar Rachel nos casos mais perigosos, mais arriscados. E, se ela morresse, não ligariam. Ninguém se importava com o que ele sentiria, nem com o fato de George precisar da mãe. Isso lhe confirmava que se falassem da gravidez iriam apenas trancafiá-la novamente. Nada do que ela fez nesses meses seria bom o bastante para fazê-los reconhecer que Rachel merecia ser livre. A única pessoa que o segurava ali era Peter. Ele não era só um agente, o melhor de todos, era um agente que o via como amigo. Mas essa amizade não podia fazê-lo esquecer que sua família vinha em primeiro lugar.

            - Talvez esteja chegando a hora de a gente dar adeus a NY. – Ele disse pegando as mãos de Rachel já no apartamento. – É se arriscar demais.
            - Eu sei que você ama esse lugar, Neal.
            - É...mas eu amo mais vocês. Já está na hora de ir embora.
            - Calma. Conheço o Harabo. Ficarei atenta, mas não há tanto a temer. Sou melhor que ele, Neal.
            - Eu sei. – Com um beijo ele encerrou o assunto. – Cuide-se, por favor. Não se arrisque. Não posso perder vocês. – Ele ainda se lembrava com clareza do momento em que aquele avião explodiu com Kate dentro e levou o sonho de uma família embora com ela. Agora que tinha essa família, não iria arriscá-la.

            Os dois ainda ficaram juntos naquele domingo a tarde até que Mozz chegou. Para não cair na tentação daquele vinho aberto sobre a mesa Rachel resolveu ir dar banho em George. Ele reclamou quando saiu do colo do Tio Mozz.

            - Calma companheiro! Logo você volta! – Ele brincou com o pequeno que já tinha mais de 10 meses.

            A intimidade que Mozz tinha com Neal lhe permitia saber de certas coisas sem nem mesmo perguntar. E havia algo errado. Não era só o tal Harabo. Criminosos querendo vingança era algo comum pra eles. Era algo mais pessoal. E lhe parecia que aquele estranho pedido de casamento tinha a ver com isso.

- "Sofremos muito com o pouco que nos falta e gozamos pouco o muito que temos”. – Disse ao amigo enquanto bebericava do vinho.
-  Citando Shakespeare?
- Ele é ‘o pai das tragédias’, Neal. E há uma aura trágica sobre você. Vamos lá?!? Diga logo! Não é assim que deve estar o homem que acaba de pedir a mulher amada em casamento. Já comprou o anel de noivado? – Perguntou encarando Neal.

O olhar de Neal fez Mozz entender que tinha acertado em cheio...por mais que ele disfarça-se.

- Além dos casos do FBI, de George para cuidar e um suposto assassino vingativo atrás de Rachel, agora tenho de ver mais isso. A Elizabeth deveria ter me avisado que inventou isso para o Peter. Eu teria encontrado uma desculpa.
- Por ‘mais isso’ você se refere ao imenso e desagradável trabalho de escolher o anel de noivado de sua futura esposa? Neal, você não me parece muito animado com as bodas. Quem sabe você diz para Rachel a verdade? Se é que você sabe qual é a verdade. Qual o problema?

Não foi apenas Mozz quem percebeu que Neal estava diferente. Rachel também notou seu estresse exagerado. Ela não saiu da sala apenas para banhar George. Ela deixou-os à sós para, assim, Neal se abrir com o amigo. E ela poder ouvir tudo escondida. No closet de Neal, havia uma espécie de janela secreta, herança do antigo cassino que funcionou ali. Neal mesmo já utilizou para ajudar Peter em um caso. Ele só não sabia que agora ela se encontrava ali, quietinha, ouvindo seu desabafo e recebendo a dolorosa notícia de que Neal não desejava se casar.
- O problema? Eu...Mozz...eu não sei se eu estou pronto pra casar. Eu a amo. Muito. Mas casar, tornar oficial, me comprometer para o resto da vida. É muito. Não sei se é a hora.
- Você se sentia pronto para casar com Kate. Fez planos, guardou um anel para ela, lembra?
- Foi diferente. É...sei lá. Eu levei um susto quando o Peter disse aquilo na frente de todos. E eu fiz o pedido no susto.
- Então tudo não passou de um mal entendido que você não pode desmentir na frente de todos. Uau! Você não quer casar com Rachel?
- Fala baixo! Vem pra sacada! Traz o vinho! – Neal respondeu com receio de que ela ouvisse a conversa. - Não é isso. Eu só...eu não sei se eu quero. Nós estamos bem como namorados. Para que mudar?
            - Se me permite utilizar novamente os conhecimentos de nosso nobre amigo Shakespeare:         "Chorar sobre as desgraças passadas é a maneira mais segura de atrair outras."
            - Você acha que eu não quero casar por causa da Kate? Não, Mozz! Ela está morta há muito tempo para eu guardar alguma esperança. É passado.

            Ambos se assustaram quando ouviram uma porta bater. Estranharam. Não havia vento. Mas, a discussão estava acirrada e logo esqueceram.

- Tem de reconhecer que é estranha essa sua dificuldade de oficializar o casamento que você, na prática, já tem. A Rachel domina a sua vida, Neal. Até os seus pensamentos. Sem falar que é a mãe dos seus filhos.
- Eu a amo. Isso não mudou nem vai mudar. Só não esperava casar agora. – Será que era assim tão incompreensível?
- Ok...bom, com o faro para mentiras que ela tem, é bom você contar logo a verdade.
- Eu sei e... – O choro de George tomou o ambiente. – Rachel está com ele.

Mas o menino não parou de chorar. Então Neal foi vê-lo e o encontrou sozinho no berço. Rachel não estava ali. Tinha saído. Quando voltou para a sala, já com o filho sem chorar em seu colo, Neal tinha expressão preocupada. Sabia bem o que tinha acontecido. Rachel não sairia sem motivo. Ela tinha ouvido ao menos parte da conversa e não tinha gostado.

- Droga! – Passou George para Mozz. – Ela está com a tornozeleira. Não vai poder se afastar muito. Eu vou procurá-la! Fica com ele?
- Claro. – O que mais poderia fazer?

Rachel tinha ouvido até a parte em que conversavam sobre Kate. E teve a confirmação de que nunca seria a mulher mais importante da vida de Neal. Sempre viria depois de Kate. A bela morena de cabelos longos e olhos azuis que fez Neal arriscar um grande golpe. A inocente que ele levou para o crime e viu morrer em uma explosão de avião provocada por um grande inimigo. Alguém que, na verdade, desejava apenas a morte de Neal. Se Kate estivesse viva, estariam juntos, por aí, dando algum golpe.
Deixou George calmo e quase adormecido no berço e saiu do apartamento. Foi caminhar, esfriar a cabeça e decidir o que fazer. A jaqueta fechada escondia bem a gravidez de mais de quatro meses e ela não tinha pressa para voltar ao apartamento. Na verdade, pensava que se Neal não tinha vontade de oficializar a união, era porque não a queria morando lá de verdade. Então, talvez, o melhor fosse voltar a viver na sala de conferências do FBI e manter Neal mais afastado. Um namorado mesmo. A vida familiar era uma brincadeira para ele. Brincadeira da qual Neal já estava enjoando.
Ela entrou em um Café que costumava ir. Queria apenas sentar e pensar na vida. Decidir como ir embora da casa de Neal, se afastar um pouco, sem ser traumático para George. Ele estava muito habituado a ter o pai e a mãe juntos. Foi tirada de seus devaneios por uma voz muito familiar. Henry estava ao seu lado, encarando-a. E ela se seu conta do quanto ele lhe fazia falta. Não o via há quase dois meses, desde a semana em que Neal foi preso e ela descobriu a gravidez.

- Foi preciso uma coincidência para fazer a mulher que se dizia minha melhor amiga encontrar comigo novamente. Porque ela não atende nem retorna as minhas ligações! – Ele tinha a expressão fechada.
            - Henry! – Esteve tão imersa em problemas que nem pensou em procurá-lo. – Eu não esperava ver você.
            - É claro que não! Ou nem teria vindo aqui! E sabe porque, Rachel? Você ao menos lembra porque nós brigamos? Foi pela sua imaturidade de não poder aceitar que eu preciso dar atenção à minha esposa e não posso ficar ao seu dispor 24hs por dia. E então, por saber que eu ficaria preocupado, você sumiu e não entrou mais em contato! Eu que sempre te ajudei!
            - Agora você tem a Molly e o seu bebê! Não precisa mais se preocupar comigo e com George! – Ele sequer havia notado que estava grávida. Como Henry, seu amigo da vida toda, podia não ver claramente as mudanças em seu corpo. – Você não se importa mais comigo!
            - Isso é bobagem sua! Rachel! Meu filho nascerá em menos de um mês. A Molly está grávida, está vulnerável. Ela precisa mais de mim agora. Será que você não consegue entender isso?
            - Não, não consigo! – Ela não se importava em ser sensata. Só queria o seu amigo de sempre. – Eu também estive vulnerável esse tempo e também precisei de você e não tive. Quer saber?!?!? Não quero te ver mais! Adeus!

            Quando se afastou da mesa do Café deixando Henry pasmo e sem palavras, viu Neal entrando. Parece que ele tinha decorado os lugares que ela gostava e, bom...tendo apenas alguns quilômetros liberados pelo FBI, não foi difícil ele encontrá-la. Não ia lhe facilitar as coisas. Passou reto por ele sem nem mesmo cumprimentá-lo.

            - Volte aqui! – Ele tinha visto Henry e, por um momento, pensou que talvez ela não tivesse ouvido nada da conversa com Mozz e a saída do apartamento fosse apenas para se encontrar com Henry Roussel. – Não fuja, Rachel! Eu a peguei no flagra com seu amiguinho! Não adianta vir com silêncio agora! Eu sair com Sara é um pecado, mas você ir ver o Henry não?!

            Ela deu a volta e parou na calçada bem enfrente a ele. Se Neal Caffrey queria fazer um escândalo nas ruas de NY, ele teria um de primeira qualidade.

            - Eu não sou covarde, Caffrey! Não vou fugir de você! Não tenho nada com Henry e esse ‘encontro’ nada agradável não passou de uma coincidência!
            - Quer que eu acredite nisso?! Você veio encontrar ele! Deixou nosso filho sozinho para vir encontrar o Henry! – Ele a acusou.
            - Não tente virar as coisas a seu favor, Caffrey! – Ela começou a chorar. - Eu já sei de tudo! Não precisa mais fingir noivar comigo. Eu vou voltar para o FBI e a gente vai retornar ao acordo original. A gente ficar junto nunca fez parte disso. Eu vou trabalhar no FBI e a gente será colega. Só isso.

            Neal observou-a caminhar pela rua e seguiu-a de longe. Ela estava indo para sua casa. Não disse nada. Os dois precisavam se acalmar. Inferno! Não gostou de vê-la com Henry. Não tinha engolido aquela coincidência. E não queria que ela voltasse a viver no FBI. Quando subiram ao apartamento, Mozz foi embora só parando para avisar que George já dormia.

            - Ele...está acostumado a viver aqui. Acho melhor que ele fique. Você o leva para me ver como fazia antes. – Ela foi no quarto e pegou uma mochila. Estava falando sério. – A gente apressou as coisas, Neal. Não deveríamos ter começado a morar juntos tão rápido. Você não está pronto pra brincar de casinha. A verdade é essa!
            - E na primeira oportunidade você correu para os braços do Henry!
            - Eu não vou nem discutir essa idiotice.
            - Claro! Mas quando foi a Sara, você me esbofeteou. Mas o seu amiguinho é diferente.
            - Eu já  disse que não tenho nada com o Henry. Eu não o quero e ele não me quer. Diferentemente da sua situação com Sara. Henry está muito feliz com sua mulher e filho. – Ela disse com raiva.
            - E você se ressente de não ter mais o seu cachorrinho de todas as horas! – Neal devolveu.

            Ela pegou algumas roupas e jogou na mochila.

            - Pense o que quiser, Caffrey. – Estava cansada. Corpo e mente queriam repouso. A vida com Neal era agitada demais.

            Neal observou-a arrumar a mala e pensou que vê-la sair pela porta seria doloroso demais.

            - E como vai esconder a gravidez ficando o tempo todo no FBI? Vai usar cinta o tempo todo na barriga? Até quando? Você não pode ir para lá.
            - Não preciso ficar lá! Tinha a opção de hotel, lembra?
            - Um lugar deplorável que você não aguentaria um dia. – Ele mesmo não havia aguentado.
            - Eu me viro. – Ela colocou a mochila nas costas e foi dar tchau para George. – Sai da frente, Neal.
            - Parei de ser o ‘Caffrey’? Já se acalmou então?
            - Eu não quero brigar com você, Neal. Me deixe passar, por favor. – Ela o encarou firmemente. – Você não quer casar. Ok, é um direito seu. Só não precisava ter me enganado na frente de todos. A gente supera isso. Podemos conviver educadamente pelo George.
            - Não vou deixar minha filha ir para um hotel daqueles! Não quero você lá! Nem no FBI. Seu lugar é aqui.
            Ela o encarou por um tempo.

            - Você não sabe se quer conviver comigo o resto da vida. Melhor termos um tempo afastados. – Essa era a atitude mais sensata que podia ter.

            Será? Neal até reconhecia alguma lógica nisso. O afastamento poderia mostrar a ambos o que sentiam. Mas não era certo ela se arriscar em qualquer espelunca ou viver no FBI.
            - Eu fico no apartamento de Mozz! Você continua aqui, com George. E ninguém no FBI fica sabendo. Ok?

            O gesto era nobre, Rachel reconhecia. Mas não podia tirar Neal da própria casa. Não era justo. E nem sabia onde Mozzie morava. Ele passava mais tempo ali do que em qualquer outro lugar.

            - Não, Neal. Aqui é a sua casa. A June gosta de tê-lo aqui. Eu sou a hóspede. Não é o meu lar. – Era doloroso se despedir assim e abandonar a familiar que vinham construindo. – O George ficará bem aqui com você. Eu venho visitar. Conversarei com Peter.
            - Não! Eu quero ter certeza que você está aqui. A June não se importará. Eu falo com ela. Não quero desfazer o acordo que temos com o FBI. Não quero que eles saibam que... nós terminamos. Será melhor acharem que somos um casal quando a gravidez vier a tona. Você fica. Está decidido. – Ele não sabia o que queria. – Se Peter ou Ell aparecerem você dá uma desculpa e me manda um mensagem que eu apareço.
            - Está bem. – Ela não queria se despedir.
            - Qualquer emergência você me liga. – Após reunir algumas coisas em uma mala ele deixou o apartamento. Não havia clima para beijos. Era o fim. Mesmo assim lhe deu um abraço e fez um carinho na barriga. – Cuide-se. E...me liga a qualquer hora, se precisar.

            Terminar um relacionamento não era fácil. Com filhos, era impossível. E quando um bebê estava na barriga da mãe, a ligação era ainda maior. Nenhum dos dois dormiu naquela noite. Neal se preocupava com ela sozinha. Tinha conversado com June e pedido para ela não liberar ninguém estranho para subir. Lhe mostrou a foto de Harabo e disse para ficar atenta. Era um homem muito perigoso que podia estar rondando.
            - Está bem. Conte comigo. – A senhora lhe beijou o rosto. – Mas não fique afastado. Vocês se amam. Que bobagem é essa de separação?
            - Eu não sei, June. Talvez seja o melhor. A gente vinha brigando muito.

            Quando chegou ao apartamento de Mozz, Neal sabia que seria bem recebido. Eram como irmãos. O problema era que esse irmão também era intrometido e se sentia no direito de opinar sobre as melhores atitudes a tomar. Em especial sobre George e o bebê a caminho.

            - Menino George não pode passar por essas coisas. Ele está em fase de desenvolvimento. Precisa de segurança familiar. Peça perdão à sua Diaba Ruiva e resolvam suas diferenças na cama. Não é o que sempre fazem?
            - Dessa vez não é tão simples. E eu não tenho que pedir perdão! Ela se decepcionou comigo porque eu não queria casar e foi correndo para os braços do Henry. Ela saiu para se encontrar com outro. Sente falta do Henry. Talvez a gente nunca dê certo junto. Agora a gente só vai conviver pelos nossos filhos, eu só vou pensar neles. Não nela. Eu vou esquecer a Rachel. Quando eu a procurei era pelo George, não por ela. Posso ficar sem ela.

            A certeza de Neal, no entanto, durou só até a manhã seguinte quando a viu entrar no FBI abatida. Tinha certeza que ela passou uma noite tão infernal quanto a dele. Peter encarou a ambos com olheiras no rosto e presumiu que era algo com George.

            - Vocês também, é? – Brincou ao vê-los.
            - Nós o quê – Neal respondeu.
            - Tiveram problemas nessa madrugada. Sophia teve febre e manteve eu e Ell acordados.
            - Bem vindo aos problemas de ter filhos, chefe. – Diana brincou.
            - Sim, George esteve agitado e nós quase não dormimos. – Rachel resolveu aproveitar a desculpa.

            O dia de trabalho foi agitado deixando Rachel e Neal seguiram atuando em casos diferentes. Ele já tinha concluído sua parte do caso de tráfico infantil, indicando quem estava falsificando os documentos. Naquela tarde, Peter iria fazer os interrogatórios. Agora estava estudando um caso sobre contrabando de pedras preciosas com Diana enquanto Peter, Rachel e Jones investigam e cercavam a quadrilha de tráfico. Edbert Shepherd e Henrique passaram a manhã no FBI. A MI5 acompanhava de perto o andamento do caso e, agora, cuidavam de Joseph Harabo. Ele não tinha sido pego em nenhuma fronteira, mas Shepherd dizia não ter dúvidas de que ele viria aos EUA.
            Na volta do horário de almoço Neal tentou uma aproximação com Rachel. Ela e Diana tinham saído juntas e, ao retornar, Rachel encontrou sobre sua mesa uma única Flor de Lis e um bilhete dobrado: ‘Me desculpa? Eu gosto do que temos’.
            Ela procurou-o e viu que estava sozinho, próximo a cafeteira. Foi conversar com ele. Não queria ficar em guerra com Neal. Só precisava de algum afastamento.

            - Te desculpar pelo que, Neal? – Sussurrou em seu ouvido. – Por não desejar casar comigo? Ora...você não é obrigado. Você diz que gosta do que temos, mas tem medo de oficializar. É sinal que você ainda tem dúvidas. Eu não quero te pressionar, Neal. A gente se precipitou. – Ela resolveu dizer toda a verdade. – É que pra mim é difícil competir com a Kate. Você sempre a terá sua perfeição. A mulher que te amou e que morreu.
            - Isso é bobagem! – Ele não sabia que Rachel pensava assim.
            - Não, não é bobagem. – Rachel olhou em volta e viu que a maioria das pessoas não tinha voltado do almoço. – Você não quer casar comigo porque sempre quis casar com ela. Eu posso colocar a Alex pra correr a tapas, eu posso escorraçar a Sara pra longe...mas eu não posso lutar contra um defunto perfeito, que você endeusa.
            - Não é assim, Rachel. Kate é passado. Você é o meu presente. – Ele se aproximou e cheirou seus cabelos. – Eu gosto do que nós temos. Eu quero você. Eu quer ca...

            Neal ia dizer que queria casar com ela, mas Rachel colou-o colocando um dedo a frente de seus lábios.
            - Não! Não fale sem pensar. Você já fez isso na casa de Peter. Não seja impulsivo, Neal. Não brinque com o que a gente tem. Um afastamento nos fará bem. Pra gente ver o que quer da vida, de verdade. Não quero que você se arrependa de ter ficado comigo.

            Então eles seguiram separados e mantendo apenas as aparências ao FBI. Todas as manhãs Mozzie ia ficar com George e, a tarde, ele passava na mesma escolinha de Teddy. E eles trabalhavam lado a lado no FBI para, no fim da tarde, Neal acompanhá-la até em casa e se despedir com um leve beijo no rosto e um carinho no ventre. Em cada um dos dias da semana, uma nova Flor de Lis apareceu sobre a mesa de Rachel. Era como um símbolo do que tinham e Neal não queria perder.
            Em uma saída de campo acompanhado de Diana, Neal estava desconcentrado e preocupado. Com todos os problemas que tinham, seria melhor ao menos estarem juntos e unidos para resolver. Brigados era ainda pior.


            - O que você aprontou, Caffrey? – Diana perguntou.
            - Nada. Porque?
            - Você está cabisbaixo e a Rachel já tem uma floricultura na mesa dela! – Diana debochou. – Vai! Conta! Você está dormindo no sofá?
            - Vamos trabalhar, Diana? – Quem dera estivesse no sofá...estava fora de casa.
            - É sério o problema. – Ela ainda brincou antes de continuar o trabalho. 

            A quadrilha de tráfico de crianças estava sendo monitorada e já havia provas para prendê-lo. A ação poderia ocorrer a qualquer momento. Joseph Harabo não foi visto. Era como se tivesse desaparecido completamente. O que não acalmou as agências. Todos o investigavam. Além deles, Mozzie também fez sua busca particular. Durante a noite, ele e Neal faziam uma investigação própria.

            - Edbert Shepherd tem razão, Neal. É difícil para eu assumir, mas ele está certo. Harabo não fugiu por nada. – Mozz decretou tendo a sua frente um arquivo do bandido.
            - Que elementos conseguiu reunir? – Neal perguntou.
            - Rachel parece ter sido uma engravata das difíceis de encarar no seu tempo de MI5. Ela o investigou pra valer. Mas a grande ligação é com o pai dela. John Turner teve um conduta ilibada por quase três décadas de serviço à MI5. Se não fosse a Rachel nos dar a informação de que ele buscava ilegalmente aquele diamante, jamais saberíamos. Ele soube disfarçar, Neal. Seu currículo é perfeito.
            - Mas... – Tinha algo que Mozz não disse.
            - Existem dois momentos nebulosos na fixa dele. O primeiro data de 1988...
            - O ano em que Rachel nasceu e ele a encontrou após um incêndio de carro. – Neal relembrou o grande segredo que fez Rachel fugir sozinha na noite que deu à luz.
            - Isso é a versão de Nicolle. – Mozz falou.
            - Você acha que não é verdade?
            - Não há nada que diga que é mentira...mas é sempre bom desconfiar. – Mozzie desconfia de tudo sempre. – O que importa é que temos uma interrogação aqui. Porque o normal para um homem com a ética de John seria procurar as autoridades e adotar Rachel. Não foi o que ele fez. Ele forjou tudo e, estranhamente, não usou seus contatos para descobrir a origem da filha que jurava amar. Em vez disso, mentiu para todos e passou a treiná-la para encontrar o diamante. Não era o mesmo John Turner.

- Ok. Mas nada disso explica Harabo ter motivos para matar John. E é isso que nós procuramos. Vamos deixar o passado da Rachel quieto, Mozz. Ela não vai gostar nada se souber que a gente andou investigando.
- Levando em consideração que ela fez arquivos de todos nós, acho que eu posso investigar. – Ele encheu a taça de vinho. – Mas seguiremos ao segundo ponto nebuloso. Quando Rachel tinha oito anos, John teve seu primeiro embate com Harabo. Investigou um sequestro. Harabo recebeu o resgate e matou a refém da mesma forma. Sumiu com o dinheiro deixando a MI5 bem raivosa. John passou a caçá-lo. Mas algo me diz que tratava-se de problema pessoal, Neal. Porque oficialmente John só voltou a ter um caso envolvendo Harabo quatro anos depois. Dessa vez uma investigação de tráfico de drogas. Há 8 anos, quando Rachel era ainda uma novata na MI5, John morreu durante uma emboscada. Na época trabalhava em outro caso, sem ligação alguma com Harabo, mas, Rachel sabia que seu pai o investigava de forma particular e o acusou da morte.
- Mas porque o investigar escondido? – Era um mistério.
- Se tem alguém que pode explicar isso, é a Rachel.
- Não estamos em um bom momento para conversas difíceis como essa. Ela nunca gostou de falar de passado. Agora é ainda pior.


- Quer um conselho? – Mozzie nem esperou a resposta. – Se acerte com sua mulher! Quando é que vocês vão resolver essa bobagem?

A pergunta ficou sem resposta. Neal não tinha a resposta até aquele momento. Queria aquela mulher. Queria acordar com ela ao seu lado e ir dormir sentindo o cheiro de seus cabelos, queria até mesmo os problemas que ela trouxe à sua vida. Mas era difícil para ele imaginar-se casado.
Quando a sexta-feira chegou, Neal e Rachel sentiam a falta um do outro cada dia mais forte. June levou logo cedo para Rachel um café da manhã especial. Na verdade, queria conversar com ela e lhe dar alguma atenção.

- Não é o café da manhã que o Neal prepara, mas servirá para colocar um sorriso no seu belo rosto e alimentar essa pequenina que vem aí. George está bem?
- Obrigada, June. Está bem sim...sentindo a falta de Neal, claro. Mas está bem.
- E você também sente a falta. – June os tradava como seus filhos. – Vocês precisam resolver isso.
- Eu queria que esse casamento nunca tivesse sido cogitado, June. Eu não sonhava com isso. Eu sempre soube que o Neal sonhou casar com outra, que eu não sou o sonho de noiva para homem nenhum. Mas saber claramente que ele não cogita casar me magoou. É sinal que aquele amor que ele dizia ter não era tão grande assim.

Ambas ouviram uma batida na porta. Era o horário que Mozz chegava para pegar George. Mas não foi Mozz a entrar, foi Neal. Ele carregava outro boque de Flor de Liz.

- Bom dia, Neal. – June o cumprimentou. E se afastou de Rachel para lhe falar. - Vejo que tomou juízo. Menino teimoso! Não jogue fora o que tem de mais valioso. Essa moça entrou na sua vida para roubar um diamante, mas ela vale muito mais do que qualquer joia. Ela é a sua parceira para uma vida.
- Acredite! – Ele sussurrou. – Eu sei disso. Em nem uma semana longe dela, eu vi que não posso ficar sem. Você leva George ao descer? O Mozz está chegando e eu queria um minuto à sós com Rachel.
- Claro! – A senhora saiu sorridente.
Quando Neal viu a porta se fechar, aproximou-se de Rachel e lhe estendeu as flores. Ela caminhou até ele e, em silêncio, pegou o delicado presente.
- São lindas. Obrigada, Neal. – Ela o pegou pela mão e levou até o quarto onde, sobre a cama, estavam algumas roupinhas de bebê. – Olha. Dizem que quando a gente está triste, fazer comprar é bom. Eu fiz várias essa semana. Estava mal.

Esse foi o jeito que Rachel encontrou para dizer que sentiu a falta dele em cada um daqueles dias. Neal sabia que ela era orgulhosa demais para falar com todas as letras. Mas ela sofreu exatamente como ele. E estava tocada, fragilizada. Neal abraçou-a na cama.

- Não fica assim. Não quero você triste. Eu errei, nós erramos. Desde que te conheci você mudou a minha vida, virou meu mundo de cabeça pra baixo, um mentindo para o outro fingindo ser quem não era. Você foi a mulher que fez com que eu esquecesse meu primeiro grande amor. – Rachel iria interferir para lembrá-lo que nunca esqueceu Kate, mas ele a cortou. – Shiiiii não me interrompa. Você é única, é eterna, a mais amada no mundo todo. Você me proporciona tudo o que eu poderia desejar encontrarem numa mulher: carinho, conforto, atenção e tranquilidade, surpresa, desejo, paixão e, o mais importante de tudo, me deu dois filhos.
- Não quero que fique comigo por eles. – Ela disse corajosamente.
- E não é o caso. – Ele se ergueu da cama. – Rachel! É verdade que a Kate foi importante. Eu a amei muito. Sonhei casar com ela. Sonhei ter uma família com ela. Sonhei ter filhos com ela e levá-los para brincar no parque. Mas não passaram de sonhos. Quem me deu essa família foi você. E eu tenho orgulho da nossa familial. Você me alegra a cada vez que sorri para mim, me dá prazer sempre que toca minha pele ou que me beija, você mexe comigo apenas com o olhar. Esses nossos meses juntos, foram a época mais feliz da minha vida. Eu vejo o mundo diferente hoje e, eu não sei como eu pude temer me casar quando a vida perderia toda a graça sem você. – Ele tirou o anel comprado ontem a noite do bolso e  se preparou para fazer o pedido. Dessa vez sincero. – Eu quero passar com você toda a minha vida. Nos momentos bons e ruins. Dividir com você as coisas boas e todos os problemas que aparecerem. Por tudo isso, minha Deusa Afrodite, é que eu preciso fazer uma pergunta, repetir, na verdade, porque na primeira vez eu agi no susto e estraguei tudo, mas eu vou concertar agora e você me dará uma imensa alegria ao repetir o ‘sim’... ou eu terei que pedir novamente até você me aceitar de volta. Você quer se casar comigo?

Qualquer dúvida se dissipou com aquele pedido. Neal Caffrey podia ser um salafrário cheio de ex namoradas oferecidas. Mas ele a amava e era o homem da sua vida.

- Sim, eu quero ser sua mulher, Caffrey. – Ela o abraçou o mais apertado que pode. – Eu sempre quis...desde o início.

Depois de algum tempo ali, eles perceberam que estavam atrasados para o trabalho. Era sexta-feira e o dia no FBI prometia ser de muito trabalho. Antes, porém, Rachel queria lhe mostrar uma coisa.


- Olha. Eu vi e não resisti. – ela mostrou a cama cheia de roupinhas e sapatinhos cor de rosa, com babadinhos e fru-frus. – É tudo tão lindo! Eu queria comprar as lojas inteirinhas! Nossa bebê vai ser muito amada!
- Ela já é, amor. Já é muito amada. – Disse ele pegando um sapatinho minúsculo. – Só falta a gente escolher o nome dela.
- Eu tenho uma sugestão. – Na verdade foi Neal quem lhe deu a ideia depois de presenteá-la tantas vezes com a Flor de Lis. Agora o nome parecia quase óbvio. A bebê era, assim como a flor, o símbolo de como uma amor tão improvável poderia surgir e criar raízes tão profundas quanto duradouras. – Lis. É simples, bonito e, para nós, inesquecível.
- Lis? – Neal repetiu o nome baixinho algumas vezes. – Lis! Gostei. A minha Lis! A nossa florzinha. É. Será Lis então!

Mais alguns beijos e com a certeza de que chegariam atrasados, Neal e Rachel finalmente desceram as escadas de mãos dadas.

- Sem mais cenas de ciúme? – Neal provocou. – Nem por Sara, nem por Henry ou quem seja. Não há razão para isso.
- Você está certo. Sem mais cenas de ciúme. – Ela concordou.- Vamos fazer um piquenique no parque? Eu, você, Lis e George.
- Vamos. – Por um instante Neal imaginou os muitos piqueniques que faria com a família. Tinham um futuro lindo se aproximando. - Algum cardápio especial para  a minha grávida?
- Não...apenas Neal Caffrey ao ponto. – Ela riu e o mordeu.

Foi um dia de muito trabalho, mas feliz. Mesmo que com bastante serviço, a todo o momento se procuravam e, numa carícia discreta, prometiam que a noite iriam matar a saudade um do outro.

- Neal! Suba na minha sala. – Gritou Peter do segundo andar da divisão. Quando Neal fechou a porta ele voltou a falar. – A pista sobre o falsificador de documentos que você me passou, é quente mesmo?
- Sim, claro. Olha Peter...foi o Mozz que conseguiu e é pra valer. – Neal conhecia pouco do cara que havia apontado como o falsificador. – Falsificador dessa qualidade não tem em cada esquina e nem todos topariam entrar num esquema desses, que tira crianças dos pais. Também existe ética no crime, Peter. Se Mozz diz que é ele, pode apostar que é.
- Tomara que você esteja certo, Neal. Porque eu requisitei um mandado pra invadir o lugar onde esse cara vive e vou tentar um acordo para ele nos levar até o chefão da quadrilha. A próxima documentação que ele fará, terá dados escolhidos por nós e, quando for usada teremos a prova definitiva.
- Ótimo. – E era mesmo. Mexer com crianças era demais. – Isso ficou bem pessoal para você.
- Como não ficaria se uma vítima desse golpe agora vive lá em casa e me chama de papai? – Peter sentou-se. – Ela acabou ao menos com pais que a amavam, Neal. Mas quantas dessas crianças podem ter sido maltratadas, abandonadas, usadas para exploração sexual ou trabalho escravo. Eu vou por fim nisso!

E Neal sabia que iria. Quando Peter queria descobrir algo, ele conseguia. Sentiu na pele como aquele federal podia ser insistente.
Ele e Rachel almoçaram juntos, com a companhia de George. Namoraram feito dois adolescentes. Parecia que precisaram recuperar a semana perdida. Quando viram, já era hora de voltar ao FBI e não tinham comido. O jeito foi comprar sanduíches. Neal avisou que a noite iriam comer algo mais saudável.

- Você anda pior que médico, Neal. Só me dá recomendações. – Rachel brincou.
- Isso é mentira. Também te dou beijos. – E deu, muitos.

Ali, deitados na grama, ficaram até a hora de voltar ao FBI. Quando passavam pela porta de vidro, Peter os observou. Percebeu que fosse qual fosse o problema que tiveram, estava resolvido. Neal e Rachel tinham passado a semana estranhos, ainda mais estranhos do que vinham agindo nos últimos tempos, mas agora já voltavam ao normal. Se é que havia algo de normal entre eles.
Estranho foi ficar observando-os e ver como Rachel estava diferente. Suas roupas haviam mudado e ela andava muito discreta. Fazia o seu trabalho, mas parecia querer passar despercebida. Isso sem contar na forma como Neal ficava o tempo todo cercando-a. Agora mesmo, mantinha a mão em suas costas.
- Rachel! – Chamou-a. – Suba com aqueles processos. Quero olhá-los com você.

Ela subiu...mas Neal veio junto trazendo a caixa de papeladas referentes ao caso em que Rachel atuava.
- O que você faz aqui, Neal? – Peter perguntou.
- Nada. Só vim ajudar trazendo os processos. – Na verdade a caixa estava pesada e subir a escada com aquilo parecia demais para uma grávida. - Ajudar.
- Sim...ok. Eu vou avisar a equipe que nós temos um novo carregador de processos! – Neal andava estranho demais. – Obrigada. Agora deixe eu e Rachel trabalhar.

Naquela noite Peter chegou em casa desconfiado. Tinha a sensação de que estava perdendo algo. Havia alguma coisa sendo escondida dele e, tendo Neal por perto, ele era naturalmente o primeiro alvo de sua desconfiança. Não que pudesse estar envolvido em algum crime. Não! Neal estava muito familiar para isso. Ao menos por um tempo poderia confiar nele. Mas havia algo. E, se tinha Neal, tinha Rachel. Tentou relembrar os últimos meses e unir cada uma das atitudes estranhas que presenciou. Não eram poucas. Fingia que não percebia. Fechava os olhos. Mas estavam lá. Como uma cortina de fumaça, as mentiras tentavam confundi-lo. Mas ele descobriria.

- Tudo bem, Peter? – Elizabeth perguntou enquanto ambos arrumavam a louca do jantar.
- Tudo...é só que sinto que estou sendo enganado.
- Enganado? Porque? Por quem?
- Eu não sei exatamente. É como se uma mentira pairasse no ar. Mas eu vou descobrir, Ell.

No sábado a tarde, Rachel e Neal chegaram em casa pra lá de cansados. Desde o meio da manhã estavam passeando com George pela cidade. Ele não queria saber de ficar no carrinho mais. Era no chão engatinhando para todos os lados ou no colo de um dos pais. Normalmente com Neal.

- Não pode ficar carregando ele, Rachel. George está pesado. – Neal reclamou.
- George, diz pro seu pai que ele está ficando um velho resmungão e que a mamãe não vai parar de dar colo pro bebê dela. – Foi a resposta bem humorada de Rachel.
- Espera chegar em casa pra eu te mostrar quem está velho, espera!

A noite anterior já havia sido bem gostosa, o que também explicava o cansaço deles. Tirar o atraso de uma semana afastados exigia energia. Neal tinha lhe feito uma deliciosa massagem. Ela agradeceu fazendo-o gritar ao chupá-lo até o limite quando, contra a parede da sala, penetrou-a. Não tiveram paciência para chegar em casa. O amor calmo e paciente foi adiado para o dia seguinte. Iam dar banho em George e assim que o menininho dormisse, continuariam exatamente de onde pararam.
            O plano foi seguido à risca, até a parte em que George adormeceu. Quando Rachel abria os botões da blusa para tomar um banho e ia provocar para que Neal a acompanhassem, ouviram batidas na porta.

            - Seja quem for, vou despachar. – Avisou-a antes de abrir a porta. – Essa noite é nossa!
           
            Quando abriu a porta, Neal encontrou Peter, Elizabeth e Sophia. A menina animada com o passeio, Ell constrangida e Peter com aquele ar de policial ‘em serviço’. Quase perguntou se ele trouxe as algemas de tão sério e desconfiado que parecia. Mas aí viu que seu amigo carregava um engradado de cervejas. Rachel puxou a blusa para baixo o quanto pode e manteve as mãos em frente do ventre. Não esperava encontrar Peter e, como a cinta apertada era desconfortável, ficou sem.
           
            - Oi Príncipe! Oi tia Rachel! Cadê o George? – Sophia gritou.
            - Ele está dormindo já. Chegou cansado do Parque. – Rachel respondeu beijando a garotinha. – A gente não esperava vocês.
            - Eu avisei ao Peter, Rachel. – Ell explicou e olhou para o marido. – Melhor nós irmos. Eles estão ocupados.
            - Nãooo. Tenho certeza de que o Neal vai querer assistir o jogo!
            - Eeee Peter...nós passamos o dia fora. Chegamos há pouco e...
            - Ei sei!
            - Sabe? – Neal não entendeu.
            - Sim! Eu olhei a localização da tornozeleira da Rachel! Muito útil! Melhor que celular!

            Sem muita alternativa já com Elizabeth e Sofia se instalando as sacada e Peter recostado no Sofá, Neal foi abrir um vinho enquanto Rachel resolveu procurar na cozinha ingredientes para preparar um lanche rápido. Estava com fome, cansada e com convidados na casa. Tinha que ser prática.
           
            - Não, não, não. – Neal disse vindo até ela. – Você estava indo tomar banho. Vá. Eu preparo algo...ou peço pizza. Melhor.
            - Não! Eu preparo algo rápido.
            - Não, Rachel. Já disse que não. Você vai tomar banho e descansar. Aproveita enquanto o George está dormindo pra descansar um pouco. – Ele abraçou-a na cozinha e acariciou as costas enquanto sussurrava. – Já exagerou hoje. Se acomoda um pouco. A Lis precisa de repouso.
            - Tá...eu vou tomar um banho e colocar a cinta. Volto logo.

            Peter observava-os  e percebeu que cochichavam algo. Mais uma vez, o cuidado excessivo de Neal com Rachel o surpreendeu. Seu consultor sempre foi um homem atencioso com suas namoradas. Mas nos últimos tempos, parecia que Neal colocava Rachel em uma redoma de proteção. Coisa que, aliás, ela seria a última mulher a necessitar.
            Sua desconfiança só piorou quando, de relance, viu Neal passar a mão na barriga dela. A blusa parecia esticada sobre o ventre arredondado. O corpo de Rachel estava diferente, muito diferente. Ela estava...

            - Papai! Papai! Eu quero ver a rua lá embaixo! Me leva lá na sacada e pega no colo. -  Mas a recente desconfiança de Peter o deixou mudo. Rachel, Neal e Ell olharam para ele. - Agora papai!
            - Sim, sim. Claro Sophia. Papai te pega.

            Rachel saiu discretamente deixando Neal cuidar de tudo e distrair as visitas. Tomou um banho rápido e se permitiu alguns minutos relaxando enquanto passava cremes na pele e escovava os cabelos. Calmamente passou óleo sobre a pele da barriga e carinhosamente massageou-a.
           
            - A mamãe vai ter que te apertar novamente, Lis. Mas será rápido. – Disse antes de colocar a cinta bem apertada.

            Quando voltou para sala Rachel teve a sensação de que Peter a analisava. Por um instante, teve certeza de que ele olhava seu ventre. Encolheu a barriga o quanto pode e manteve uma postura impecável. Neal avisou que a pizza devia chegar em meia hora e que estava tudo organizado, então deveria ir se sentar e conversar com Ell.
           
            - Não vai servir uma taça de vinho para sua mulher, Neal? – Peter indagou.
            - Ela está evitando o álcool, Peter. Para não engordar. Rachel acha que ganhou alguns quilinhos desde que veio para o FBI. – Ele beijou-a. – Uma bobagem, sem dúvida. Mas...se ela não quer álcool, eu respeito. E já preparei um suco.
            - Obrigada, amor. Você é o melhor noivo do mundo! – Rachel ainda olhou para Peter para responder. – Além disso, um de nós tem que estar sóbrio para quando o George chora.

            Quando Rachel bebia o primeiro gole de seu suco, novas batidas na porta soaram. Certamente não era a pizza pois nem que o entregador viesse de avião seria capaz de chegar tão rápido.

            - E as visitas não param. – Disse Neal já desistindo da noite romântica que pretendia.

            Ao abrirem a porta, Neal e Peter concordavam que não se tratava de uma visita. Era Mozz quem batia e Neal só estranhou ele não ter entrado direto.





- Para que não digam que eu sou intrometido. O que seria mentira terrível! Olá Sophia, o tio Mozz chegou para alegria de todo. – Ele parou no meio da sala. – Neal, não vai servir meu vinho?

A ‘festa improvisada’ continuou. Elizabeth percebeu claramente que Peter mudou drasticamente. Se antes ele observava Neal com todo o cuidado e tentava farejar mentiras, agora Rachel era o alvo. E do alto de seus 12 anos de casamento, podia dizer com certeza que Peter estava muito próximo de descobrir o segredo deles.

- Rachel! Porque você não me mostra aquele sapato que comprou? Eu fiquei curiosa! – Disse para tirar o alvo de Peter da sala.
- O que foi, Ell? – Rachel sabia que havia algo errado.
- Não sei exatamente. Mas cuidado. Peter está bem desconfiado. Vocês terão que contar logo, Rachel!
- Eu sei, eu sei. Logo! Agora olha isso. Olha a roupinha que eu comprei. – Rachel mostrou um macacão verde, muito delicado. – Nossa princesa já tem nome: Lis.
- Que lindo! Lis Turner Caffrey. – Elas se abraçaram. - Muito bonito. Parabéns.

Na próxima vez que ouviram uma batida à porta, todos pensaram que se tratava do jantar que havia chegado. Rachel e Ell voltaram do quarto e, vendo Neal pegar mais bebidas, Rachel gritou que abriria a porta. Encontrou June. A senhora disse que apenas trazia uma caixa deixada na entrada endereçada à ela.

- Está bem. Eu vou abrir. – Mas ela estranhou aquilo e pressentiu algo ruim. – Não quer ficar e jantar conosco?
- Não...você está bem, querida? – June notou Rachel pegar a caixa um tanto trêmula. – Se acha que é algo ruim, não abra. Neal! Venha aqui.

Não só Neal, mas todos se aproximaram. Mas foi Rachel quem fez questão de abrir a caixa misteriosa. Se era endereçada a ela, abriria. Não seria covarde. Tirou a fita colante que lacrava a embalagem e lá encontrou dois envelopes. Abriu o primeiro, continha apenas uma mensagem:

“Quem diria que um dia nos reencontraríamos, Rachel. E que você teria uma família. Gente como você não deveria se reproduzir”.


Suas mãos tremiam e ela só sentia  a presença de Neal ao seu lado. Não viu todos os demais trocarem olhares assustados. Rachel abriu o segundo envelope. Ela imaginou coisas terríveis. Só não pensava que doeria tanto e lhe deixaria tão atormentada. Dentro, encontrou fotos de George, Neal e ela no passeio do dia anterior no parque. Rachel sentiu que tudo em sua volta escurecia e não viu mais nada.