sábado, 28 de fevereiro de 2015

Vidas Ocultas - Capítulo 18


            A ideia de Elizabeth deixar o escritório sem gritos nem discussões só era menos improvável de ele lhe revelar a verdade. Miguel podia até reconhecer intimamente seu erro em mentir para Liz, mas contar a verdade agora não traria benefício algum. Então foi ao bar e serviu uma generosa dose da bebida mais forte que avistou. Elizabeth acompanhou cada um de seus passos com olhar ansioso e irritado.

            - Eu não me intrometo nas suas investigações, Liz. Fique fora dos meus problemas de trabalho.
            - Não! Ouviu bem? Não fico fora porra nenhuma! Ouvi claramente quando disse ‘exigindo mais dinheiro’. Isso é chantagem!
            - Vai recitar o código penal e o tempo de detenção, investigadora?
            - Pela última vez, Miguel: o que está acontecendo?

            Miguel só tinha uma alternativa para por fim naquela conversa. Magoar Liz e fazê-la, com raiva, esquecer o assunto.

            - Não é da sua conta! Eu não me casei para ter a sombra de uma policial na minha cola. Vai pro quarto, pra piscina, vai tomar um banho...qualquer coisa, mas sai do meu escritório. Agora. E me deixa resolver os meus problemas. – Ele disse aos gritos enquanto servia mais uma dose de whisky.

            A vontade de Elizabeth era arrancar aquele copo das mãos do marido e esfregar aquela aliança em sua face até lembrá-lo de que eram marido e mulher. E esse tipo de parceria incluía mais coisas do que apenas transar e velejar em águas límpidas. Podia gritar no mesmo tom dele até fazê-lo por pra fora o que escondia. A sogra impediu qualquer coisa.

            - Quero lembrá-los que isso é um lar. Vocês acabam de voltar da lua de mel, por favor! Se não respeitam ao casamento, ao menos ofereçam paz para essa velha repousar! Gritos nesse lar, não!
            -Desculpe, madre. Elizabeth vai descansar da viagem enquanto eu resolvo uns assuntos. – Os dois travaram uma batalha quando seus olhares se cruzaram. – Vai Liz, por favor. Eu não quero brigar.

            Ela também não. O que não a faria esquecer o assunto. Sem dizer nem uma palavra para a sogra nem ao marido, Elizabeth deixou o escritório e retornou ao seu quarto. Só quando trancou a porta às suas costas seu coração começou a diminuir de ritmo. Era duro constatar a mentira de Miguel. Era algo grave e nada tinha a ver com trabalho. Era pessoal. Se fosse na BTez ele já teria dividido com ela.
            Deitar-se ou aproveitar a piscina? Miguel deveria estar mesmo muito perturbado para acreditar naquelas possibilidades. Já que a rotina tratou de por fim ao clima de recém casados, iria mostrar ao marido o tipo de esposa independente que seria. Trocou de roupa rapidamente e procurou pelas chaves do seu carro, estacionado ali desde antes do casamento.


            Quando Miguel deixou o escritório o relógio marcava 19h55min. Sua mãe e Juliana já deveriam estar colocando a mesa do jantar então resolveu procurar por Liz. Ela deveria, e tinha motivo, para estar magoada com ele. Não era assim que pretendia começar sua vida de casados.

            - Se vai atrás de sua esposa, nem perca seu tempo. Ela saiu. E sequer manifestou interesse em se integrar à rotina da casa, saber qual seria o jantar, nada! – Rúbia gritou quando o viu subindo a escadaria. – Devo colocar o prato dela na mesa?

            Miguel sentiu a raiva lhe consumir os pensamentos. Raiva de Elizabeth, Rúbia e dele mesmo. A mãe por fazer de tudo para piorar o que já estava ruim. Da teimosia de sua esposa e de si mesmo por ter se enredado em tantas mentiras que agora não conseguia sair sem magoar alguém. E, o pior de tudo, ela estava sozinha por aí, arriscando-se a um perigo que desconhecia porque seu marido preferiu não informá-la de que estava sendo chantageado.

            - Infierno! No te metas, madre! – Gritou para Rúbia antes de pegar o celular e ligar para Liz. Tranquilizou-se quando ela atendeu. - Dónde está?
            - Não é da sua conta! – Elizabeth lhe repetiu a frase dita por ele horas antes. – Não se intrometa nos meus assuntos. Comigo é assim, Miguel. Na mesma moeda, sempre. Acostume-se! E fale português comigo! Não tem razão nenhuma para ficar estressadinho.
            - Virá dormir em casa, não é? – Por um instante, temeu que Elizabeth tivesse ido extravasar sua raiva procurando algum outro homem, na rua, como tantas vezes fez.
            - Até onde sei, é aí a minha cama! Eu volto logo.
            - Tenha cuidado...por favor. Eu esperarei para jantar com você.
            - Não precisa. Já comi. Até depois, Miguel.
            - Até...Liz...
            - O que é? – Ela ainda estava com raiva.
            - Eu te amo. Muito. Cada dia mais.
            - Eu também Miguel. – Era difícil resistir ao charme dele. - Mesmo você sendo insuportável às vezes. Até logo.

            Elizabeth estava sentada na sala de estar de Rebecca, já tinham jantado, conversado e relaxado como só velhas colegas de farda poderiam fazer. As duas tinham anos de parceria no Polícia Federal e de amizade pessoal. Rebecca não sabia dos detalhes mais sórdidos da vida de Elizabeth, mas a conhecia bem o bastante para sentir a disputa emocional vivida pela amiga naquele momento.



            - Amor e raiva estão brigando dentro desse coração, Liza. Sossega! Esse homem te ama. O resto são problemas naturais da vida em dupla. – Casada há 8 anos, Rebecca tinha experiência no assunto. – Todo o casamento tem dificuldades.
            - Eu sei...imaginava na verdade. Só não esperava já brigar com Miguel no nosso primeiro dia em casa. E descobrir que ele está mentindo. – Liza já havia contado para a sua amiga o que aconteceu. – Não aceito isso, Becca.
            - Ok então. O que você sabe? Miguel e esse advogado chamado Louis estavam tendo uma conversa suspeita. Alguém está chantageando seu marido. E ele mandou esse ‘braço direito’ resolver o problema.
            - Eu não gosto desse homem! Louis e Miguel são amigos...ele cuida de assuntos pessoais, familiares e sigilosos.
            - Isso significa que é de total confiança dos Benitez. – Para Rebecca, isso deveria contar ao favor do advogado. Talvez Liz só não quisesse assumir o que realmente a afligia. – Liza, se esse Louis faz algo de errado, o mais provável é que seja com o conhecimento e aprovação de Miguel. Você tem medo dele estar envolvido com algo ilegal, gente barra pesada ou...
            - Não! – Liz a cortou. – Eu tenho certeza da honestidade de meu marido. Se tivesse alguma dúvida, mesmo que pequena, jamais teria me casado com Miguel.
            - Então qual o problema?
           
            Depois de tantas voltas, finalmente chegara a hora de Elizabeth dizer à Rebecca o que a trouxe à casa da amiga numa tarde de domingo, véspera de se reencontrarem no trabalho. Não veio ali à toa ou apenas para desabafar.

            - Eu sei o quanto tem sujeira no meio empresarial. É só olhar os jornais. Empresas e governo envolvidos em esquemas de corrupção são tradição nesse país há décadas. E eu não tenho a ingenuidade e pensar que a BTez está isenta disso. Mas Miguel veem tentando conduzir sua empresa longe de falcatruas, tenho certeza. – Ela parou por um momento para tomar ar antes de continuar. - Conscientemente, Miguel é um homem íntegro e cumpridor de seus deveres. Porém, ele também é dono de uma personalidade explosiva e perigosa. Miguel faz coisas sem pensar, age por impulso e por isso estou preocupada. Ele pode estar se enredando em problemas que eu sequer imagino e usando dos serviços de Louis, bem intencionado ou não, para livrar-se de quem o está chantageando.
            - E como te ajudo a resolver isso? – Rebecca riu ao encarar o olhar da amiga. – Nós duas sabemos que você não veio aqui só para alugar meus ouvidos. Diz logo Liz.
            - Amanhã eu finalmente recebo meu distintivo de volta e reassumo meu posto e meus casos. Mas o Tom está pressionado a manter olhos bem atentos no meu trabalho. Eu não posso deixar nenhum erro para trás com meu histórico recente. Por isso quero te pedir ajuda. Quero que investigue discretamente Louis, os processos em que atua e as pessoas com quem anda metido. Quero uma pista do que meu marido anda lhe pedindo para fazer.
            - Vai investigar seu próprio marido, Liz?
            - Ele não me deixou escolha.
            - Está bem, farei isso.



            Já de pijama e com o computador em seu colo, Beatriz aproveitava o momento livre para estudar sua próxima pauta. Era uma grande oportunidade como jornalista. Estava de folga naquele domingo, passou o dia com Will e a filha, mas por vezes seu pensamento voltou-se ao trabalho. Culpa de seu editor que, na véspera, lhe propôs uma matéria grande.

            - Quer a sua matéria de capa? – Perguntou ele, sorrindo enquanto mexia em seus arquivos de computador. – Pois a sua chance é agora. Dessa vez não estou te dando nenhum assalto de esquina nem crime passional pra cobrir. É uma grande reportagem investigativa. Topa?
            - Claro! – Teria de ser louca para dizer não. – Mas o que é?
            - Era com essa animação que eu contava. Mas vá com calma, sim? É tema para ir comendo pela beiradas, com cuidado. Prostituição infantil e tráfico sexual de menores. É barra pesada, Bia.
            - Ual....mas espera...a minha irmã investigou isso faz um tempo. Você não acha que eu...É só por causa disso que me passou a matéria?
            - Não. Também é porque você é boa jornalista, dedicada ao jornal e teimosa o bastante para cavar nessa história até encontrar coisas bem legais. Mas o fato de ter contatos na polícia federal ajudou bastante. Mas se quiser que eu passe pra outro repórter...
            - Não! Nem pensar! Essa pauta é minha e ninguém tasca!
            - Ótimo. Então aproveite sua folga de amanhã e estude o tema.

            Era o que Beatriz fazia há horas. E cada vez mais se sentia enojada do que via na tela de seu computador. Eram muitos casos e a maioria sequer chegava ao conhecimento da polícia. Mulheres, homens e crianças levadas para a exploração sexual. Sem querer, seus pensamentos se voltaram à Patrícia. Se era horripilante apenas ler a respeito, sequer conseguia imaginar vivenciar aquele inferno de abusos físicos e psicológicos.

            - Matheus tem razão em valorizar e cuidar dela. Paty é uma garota de fibra para ter sobrevivido a tudo isso.

            Aquele seria um trabalho longo. Teria de encontrar famílias que tiveram seus filhos levados, algum sobrevivente e precisaria tentar infiltrar-se numa das quadrilhas. Só assim poderia ver de perto como eles escolhiam as vítimas e planejavam os lugares para onde levá-las. Mas como chegar nessas quadrilhas? Poderia descobrir outros meios, mas Elizabeth era o meio mais fácil e rápido.


  
            - Oi Liz, pode falar? – Ela não resistiu e ligou para irmã naquele momento mesmo.
            - Pode. Estou estacionando meu carro em casa.
            - Nossa! Você e Miguel mal chegaram e já estão na rua?
            - É...quase isso. – Não tinha razão para preocupar Bia com seus problemas conjugais. - Mas fale porque ligou, Bia.
            - Queria alguns contatos seus de quadrilhas que traficam pessoas para exploração sexual. Me passa?

            Elizabeth não esperava por mais isso.

            - Claro! Eu devo ter um ou outro membro da quadrilha nos meus contatos do Facebook. – Não resistiu a ironia. – Por quê?
            - Pauta do jornal. Não complica, Liz. Eu sei que você tem como me dar uma pista. Eu investigo o resto.
            - Eu não quero você metida nisso. É perigoso.
            - Ótimo! Sinta o que eu passo quando você está investigando isso. E me dê os contatos.
            - Eu sou policial! – Elizabeth gritou.
            - E eu jornalista! E essa é a minha chance de uma reportagem de capa! Se você não puder, vou conseguir por outros meios.
            - Está bem. Amanhã eu volto pra centra de polícia e vejo o que posso conseguir. Infelizmente, seguidamente recebemos denúncia de ação desse tipo de quadrilha. Eu vejo e te passo, mais nada. O andamento das investigações não posso.
            - Isso basta, Liza. Obrigada!

            Beatriz agora investigar criminosos era apenas mais uma preocupação na cabeça de Elizabeth. Ao abrir a porta de casa rezando para não avistar Rúbia, Liz concentrou seus pensamentos em seu casamento e deixou todo o mais para o dia seguinte. Foi direto para o quarto. Estava precisando de um banho. Ela não se surpreendeu em encontrar Miguel sentado na poltrona no quarto, esperando-a.

            - Oi. – Ela disse simplesmente. – Eu vou tomar um banho e depois a gente conversa.
            - Não. A gente conversa e depois toma o banho juntos Eu te peço desculpas. Não queria ter gritado com você mais cedo, no escritório.
            - Já eu não me arrependo de ter gritado ao telefone. Você mereceu, Miguel.
            - É, mereci. Mas eu te amo mais do que qualquer outro homem um dia poderá amar alguém.
            - Ótimo. Também te amo. Mas isso não resolve os nossos problemas.
            - Eu estou tentando Liz.
            - Vai me contar quem está te chantageando?
            - Você entendeu errado...não tem chantagista algum. Foi apen...
            - Não! Chega de mentir, Miguel. Eu aceito que não queira dividir isso comigo. – Iria descobrir por seus meios. – Só não minta. Eu posso lidar com tudo, menos com suas mentiras.
            - Está bem. Deixe isso pra lá.



            Com um beijo Miguel deixou a discussão no passado e superou o assunto. Sabia que Elizabeth não deixaria aquilo terminar assim. Mas estava satisfeito em sentir o seu sabor, sem gritos ou brigas. Ainda com os lábios colados, começou a despi-la. Depois de tantos dias usando apenas biquíni, Liz lhe parecia vestida demais.
            - Vamos pra banheira. Quero ensaboar você todinha.

            Liz sentiu-se feliz em poder deixar os problemas guardados no fundo de um baú até o dia seguinte e deixou-se ser amada e cuidada por mais aquela noite. Seu marido tinha segredos e isso era difícil de suportar, mas ele também era gostoso, delicado, apaixonado e sabia tocá-la como ninguém mais.
            Enquanto a banheira enchia, Miguel tirou-lhe peça por peça das roupas. Com mãos experientes abriu os botões da saia e soltou-lhe o fecho do sutiã. Analisou aquele corpo como se procurasse alguma mudança desde a última vez em que a viu nua, naquela manhã. Mas aquelas poucas 12horas foram longas demais. E eles precisam do corpo um do outro para se refazer, superar os desafios e provar ao parceiro que continuavam ali, disponíveis para amar apesar dos problemas.
            E como amam. Amavam além do que julgavam ser possível. Ainda mais sendo tão diferentes. Com ela nos braços, Miguel desejava alongar os minutos e fazer daquele momento infinito em prazer e felicidade. Colocou a esposa sentada sobre o balcão da pia e, ajoelhado entre suas pernas, provou-a na intimidade, fazendo-a contorcer-se de prazer enquanto ele acarinhava-a com os lábios e a língua.

            - Migueeeelll....aaa.....aaa.....eu acho que vou desistir da banheira.
            - No tan rápido, mi amor.
            - Nessas horas eu gosto quando você fala espanhol.
            - Sí?
            - Sim. É sexy.



            Logo estavam imersos na água perfumada e Liz sentia a espuma suave tocar-lhe a pele. Não só a espuma. Tinha também as mãos de Miguel. E ela perguntava-se como algum dia conseguiria resistir ao toque daquele homem. Seu homem. E de ninguém mais. Até mesmo ela assustava-se com esse tipo de pensamento. Nunca fora uma mulher possessiva, ciumenta. Agora era. Talvez fosse porque pela primeira vez tinha alguém para chamar de seu. E não estava disposta a perder.
            Ficou feliz em tomar a iniciativa e deixá-lo de costas na banheira, abraçando-o com as coxas e acariciando o peito esculpido pelos músculos bem torneados e a barriga lindamente torneada. Sabia o quanto Miguel estaca excitado e sentia seu pau duro submerso na água. Acariciava toda sua extensão numa doce tortura enquanto beijava-o nos lábios. Até que encaixou-se nele e permitiu-se senti-lo até o fim dentro dela. Era só assim que se sentia completa. Miguel ali, todo dela, todo dentro dela. Com força, sem delicadeza ou sensibilidade, o fez entrar avançar em seu corpo sem dó até que os dois libertaram-se de qualquer sentimento que não fosse o êxtase sexual. Quando alcançaram o orgasmo estava cansados, à um passo da exaustão. Miguel ainda teve de conseguir forças para levar Elizabeth até a cama antes de abraçá-la sob o lençol e finalmente encontrar o mundo dos sonhos.



            Na manhã seguinte a vida tomou seu rumo natural. Depois de um constrangedor café da manhã em família e um beijo de bom dia na esposa, Miguel seguiu para a BTez. Ficou constrangido ao receber cumprimentos por seu retorno. Alguns diretores mais íntimos fizeram piadas comentando sua aparência feliz, outros disseram que agora era a hora do casamento começar pra valer. Mesmo com o tom de brincadeira, era também necessário retomar a rotina de obrigações, reuniões, balanços financeiros, assinaturas e ordens desagradáveis.
            Começou o dia com uma vídeo conferência com diretores comerciais e administrativos globais. Problemas com embargos na argentina, com sindicatos na Europa e de vendas na Ásia o preocuparam.

            - Castro, se não for resolvido em 48hs, inicie o processo de redução da produção. – Disse ele ao Diretor de Buenos Aires.
            - Isso implicaria demitir funcionários.
            - Eu sei. Mas não podemos produzir carros que não poderão ser vendidos. E a mão de obra é nosso maior poder de barganha com os governantes. Se os fizermos crer que vamos demitir, vão nos oferecer vantagens. É a nossa melhor chance. Apenas 48hs, nenhum minuto a mais. Me envie relatórios.

            Passou todo o dia resolvendo problemas que se acumularam na sua ausência. Porém, olhava com um sorriso para os gráficos e percebia que o pior da crise havia passado. Os lucros começaram a se estabilizar e isso acalmava os acionistas. Eles percebiam que a BTez era uma empresa confiável.

            - Por mais forte que seja a tempestade, vem a bonança depois, meu amigo. – Louis veio lhe ver durante a tarde. – Então, a bela policial não lhe assassinou ontem? O olhar dela brava é poderoso, hem?
            - Não fique prestando a atenção ao olhar da minha mulher, Louis. Posso sentir ciúme. Ela ouviu demais, temos de ter cuidado. Eu tenho de me lembrar que casei com uma mulher inteligente e sagaz. Ouviu apenas uma frase e entendeu boa parte do que se passa. E você? Alguma novidade?
            - Não a que você espera. Ainda não sei quem é o nosso homem. A operadora me garantiu que aquele chip não existe mais. Ele pode ter se desfeito porque desconfia da nossa investigação ou já estava no plano dele. A verdade é que a nossa melhor chance é esperá-lo aparecer novamente.
            - Merda! E a segurança de Liz?
            - Tudo certo. Falei com eles há pouco. São uma equipe de primeira, disfarçados, trocam de veículo para ela não perceber. Só não podem entrar no prédio da polícia. Quando ela sair, serão sua sombra.
            - Ótimo. Tenho medo desse maníaco achar que agora, casados, aquelas fotos já não servem para nos chantagear e tentar sequestrá-la para pedir resgate.
            - Não vai acontecer. Pode ficar tranquilo salvando os milhões dos seus acionistas. A Senhora Benitez está segura e o nosso homem misterioso será pego quando reaparecer.



            O dia de Liz foi um pouco mais complicado. A começar porque agora precisava preocupar-se mais com o que vestir. Não era mais apenas a investigadora Elizabeth Santos. Agora carregava o sobrenome Benitez e isso representava ser fotografada por aí. E isso era extremamente desagradável porque fazia com que alguns colegas de trabalho parassem de tratá-la como uma igual. Ela virou uma estranha.
            A melhor parte era poder retomar suas investigações. Na primeira tarde já pode participar de uma apreensão de drogas trazidas da fronteira com a Bolívia. Sim, era dessa parte de seu trabalho que mais gostava. Ter resultados. Merecer o salário que o governo lhe pagava. Tom chamou-a em sua sala re recitou todas as recomendações possíveis. Ela deveria se manter na linha e não deixar rastros para ninguém até sua sala reclamar.

            - Não quero ninguém pedindo a cabeça da minha mais competente investigadora. Entendeu?
            - Sim, Senhor.
            - Então vá prender alguns bandidos por aí. É bom tê-la de volta Liza.
            - Obrigada. Vamos marcar uma noite dessas...Miguel quer que vá jantar conosco.
            - Eu não perderia por nada. – Ele lembrou-se de mais uma coisa. – Elizabeth, aquele caso das prostitutas...você levou o inquérito para analisar. E aí? Lembre-se que é arriscado porque envolve...
            - ...a empresa de meu marido. Eu sei. Estou analisando vírgula por vírgula. Quando conseguir amarrar as pontas que deixei passar antes, eu te aviso e nós seguiremos juntos, Tom. Prometo. Mas já te adianto, é na Rússia que esse nó irá fazer sentido.
            - Como assim?
            - Deixa eu conseguir provar isso, Tom. Mas confia no que estou te dizendo.
            - Eu confio. Muito. - Depois de anos de convivência era impossível não confiar. – Perguntei por que na semana passada fui chamado num presídio no interior do Estado. Um preso desejava fazer um acordo para redução de pena e disse ter para barganhar informações sobre tráfico de pessoas.
            - E aí? Você foi?
            - Sim. E demorei a acreditar. Pedi que ele comprovasse ter ligação com a quadrilha e ele provou. Deu-me o endereço de onde ocorrem ‘testes’ com garotas para ir ao exterior. Eu estive lá e vi. Todos os elementos, para quem quisesse conferir. Bairro nobre, homens escondendo armas pesadas e jovens, quase crianças, de ambos os sexos, chegando vestindo roupas humildes. Se não for tráfico para o exterior, certamente é prostituição com abuso de menores.
            - E você invadiu?
            - Não. Achei que seria melhor não nos precipitar. Esperei você voltar e quero que analise qual a melhor possibilidade. Esse foi só o teste para o nosso amigo. Vou fechar o acordo e talvez ele nos leve aos líderes da quadrilha.
            - Está bem...não vamos invadir o lugar então para não alertá-los. Mas vamos deixar...assim sem fazer nada? E essas crianças? – Liz estava tendo uma ideia. – Isso podia ser descoberto por algum repórter enxerido e...
            - Beatriz?
            - Porque não? Estouramos o lugar sem eles desconfiarem que temos um informante da quadrilha. Uma bala, dois alvos.
            - Ótimo. Faça isso. Senti sua falta por aqui, Elizabeth. 
           
 NOTA: O grupo Delírios Devaneios e Algo + no Facebook reúne quem gosta dessa história e outras nossas. Tá a fim de participar? Manda o convite pra gente te add. Bjss


domingo, 22 de fevereiro de 2015

Diaba Ruiva - Passado Revelado: Cap 11


            Peter deixou a esposa e as filhas em casa para conversar com Neal. Obviamente, havia um motivo. Nohan era o assunto. Quando procurou a embaixada inglesa para pedir auxílio na caçada a um suposto terrorista, esperava poder contar com sua ajuda. Nohan foi muito além. Ele não ajudava, comandava ao seu jeito. E parecia ter ao seu lado pessoas importantes. Quando da definição da sentença, Peter ficou temeroso de como colocar na prática o dito pela juíza. No parecer estava escrito que Rachel deveria trabalhar no FBI a contar do dia seguinte, fazendo uso de rastreador eletrônico e sob rigorosa vigia policial. Fácil de cumprir não fosse ela precisar de tempo para se recuperar do parto e Helen necessitar dos cuidados da mãe.

            - Bom...não é o ideal, mas diante dos nossos problemas acho que não ter uma ‘licença maternidade’ será irrelevante para Rachel. Ela está precisando do convívio no trabalho. E vamos nos esforçar para dar conta de Helen nisso tudo. – Neal respondeu oferecendo uma cerveja ao amigo.
            - Foi o que eu pensei. Mas Nohan resolveu interferir novamente. E isso já está me irritando.

            Enquanto bebiam, Peter contou da estranha ligação de Stone minutos após ele chegar em casa do hospital. O inglês argumentou que no despacho da juíza não constava Rachel cumprir horário na sede do FBI. E que, por tanto, ela poderia trabalhar em casa, considerando sua condição.

            - Amanhã cedo teremos uma reunião no FBI e depois Rachel terá o que Nohan chamou de ‘jornada flexível’, pelos próximos quatro meses.
            - E você não gostou disso?
            - Neal, não me entenda mal. Também tenho um bebê em casa. Sei o tanto de atenção eles exigem. É a interferência de Nohan que me incomoda.
            - A nós também.
            - E enquanto Nohan se exibe para Rachel, Thomas Carter está solto em algum lugar dos EUA, armando seu próximo atentado. Ele não vai esperar Helen se tornar mais independente para atacar.
            - Com isso não se preocupe, Peter. Aqui ou no FBI, Rachel irá se dedicar ao caso. Thomas Carter que se cuide. Logo estaremos em seu encalço.

            Alguns goles de cerveja depois, a conversa tomou rumos mais amenos. Peter estava feliz por eles. E ainda mais por George. Aquele garotinho vinha sentindo a falta da mãe. Já Helen agora teria uma infância normal...ou quase. A atenção do chefe de divisão no FBI foi atraída para a parede da sala. Lembrava-se daquele quadro e, principalmente, da confusão causada por ele. Era uma replica impressionante.

            - Bela cópia do Les Noces de Pierrette. Você tem talento, Neal. Aos meus olhos, parece idêntico ao de Picasso. – Disse ao amigo sem imaginar que estava de frente para o verdadeiro quadro.
            - Obrigada, Peter.



            Enquanto isso, no quarto de George, Rachel matava a saudade de ter o filho em seus braços. Há tempos ele já não era um bebê. Mas continuaria sempre sendo o seu garotinho sapeca e esperto. Comprado por Mozzie, o quarto era pensado para divertir e instigar uma criança. Muitas cores e itens que despertavam a curiosidade. A cama ficava no alto, tendo escada e escorregador para subir e descer. Qual criança não gostaria de viver num lugar assim? Ao lado, uma pequena mesa, à altura do morador, com muitos livrinhos e DVDs infantis. E, por fim, uma parede toda branca, revestida com material de fácil limpeza. Era um imenso quadro branco esperando por todos os desenhos que a criatividade de George pudesse criar.

            - A Helen pode escorregar comigo, mamãe?
            - Só quando ela crescer. Por enquanto Helen só come e dorme pra ficar forte.
            - Então vem desenhar comigo. – Ele pediu abrindo um imenso estojo de canetinhas coloridas.
            - Vamos desenhar! – Rachel respondeu. – Qual desenho faremos primeiro?
            - A Helen! Depois o papai!

            Com as pernas cruzadas na frente da parede e fazendo desenhos Rachel e George passaram algum tempo. Mãe e filho voltando a conviver. Podiam passar horas juntos...não fosse a necessidade urgente de Helen mamar. Mozz a trouxe e ficou com George enquanto isso.

            Filhos cuidados, Peter despachado de volta à sua casa, banho tomado. Era hora de cuidar dos próprios assuntos.

            - Tive de estrear nosso banheiro sem você. Infelizmente.
            - Uma pena. – Neal respondeu brincando. – Mas levando em consideração o seu resguardo, foi melhor. Amanhã cedo temos uma reunião no FBI. Acho que teremos de levar Helen.
            - Ou eu tiro leite e deixo aqui. Não poderemos levá-la todos os dias, Neal. Helen terá de se acostumar.
            - Não será preciso. O seu protetor inglês veio mais uma vez em sua defesa e garantiu que não vá seguidamente ao FBI. Poderá ficar em casa e trabalhar daqui por enquanto. Foi por isso que Peter veio.
            - Está com ciúmes, Neal?
            - Tem um homem cobiçando o que é meu. O que você acha?

  


     

       - Sabe que não tem porque sentir ciúme. Sou sua. Totalmente sua.
      - Eu sei sim. Mesmo assim...não gosto dele. Vou pedir para Mozz agilizar suas ‘pesquisas’. Esse Nohan não é o que aparenta.
            - Concordo. Mas não sofra por ciúme. Essa ruiva aqui é toda sua.


            A reunião no FBI começou divertida. A sala estava cheia e Rachel conhecia quase todos. Poucas coisas haviam mudado por lá. Depois dos abraços de reencontro, foi hora de fixar os pensamentos em desvendar a mente perturbada de Thomas Carter. Na sala de conferências, Peter apresentou tudo o que tinham até o momento. Ou seja, quase nada. Carter era inglês e já tinha operado ataques na Itália, Alemanha e Áustria. Segundo a Interpol, havia conseguido entrar nos EUA e a qualquer momento poderiam ser informados de que algum ponto turístico no país foi atacado, matando pessoas ou, na melhor hipótese, destruindo patrimônio artístico e cultural do país.

            - Pedi a cada um aqui presente que pesquisasse uma região para mapearmos quais os pontos mais prováveis de vir a ser alvo. Gostaria de ouvir um relatório de cada um. – Peter disse e viu olhares apavorados em resposta. – Ninguém concluiu concluir a tarefa?
            - Desculpe, Peter...mas é praticamente impossível. – Henrique externou o que todos pensavam.

            Peter queria reclamar, usar sua autoridade de chefe para exigir o cumprimento de suas ordens. A lembrança de seus tempos como agente, antes de assumir a chefia, lhe impediram. A tarefa era sim impossível de ser cumprida. Mesmo assim, não pode falar nada porque alguém já conhecido e inconveniente chegou. Dessa vez, acompanhado de uma bela mulher.

            - Bom dia a todos. – Nohan entrou assumindo uma cadeira à mesa. – É bom ver essa equipe completa. Sentindo-se em casa, Rachel?
            - Sim, Nohan. É ótimo estar de volta ao FBI.
            - Claramente, foi ingenuidade minha pensar que você iria se manter no consulado, Nohan. – Peter afirmou. – Veio nos visitar?
            - Vim auxiliar, conforme me comprometi. Vim apresentar a todos nossa assessora jurídica, Srt. Melissa Marshall. Ela acompanhará todo o caso e podem recorrer a ela caso necessitem de qualquer auxílio da embaixada inglesa.

            Todos na mesa observaram a bela loira vestida de forma elegante. Seria, ela olhava nos olhos de Peter e lhe estendeu a mão de forma elegante.

            - Será um prazer ajudá-los, Sr. Burke.



            - Seja bem vinha, Melissa. – Peter respondeu antes de questionar Nohan. – Porque só agora coloca sua equipe à nossa disposição.
            - Por que só agora a sua equipe está completa. – Ele voltou-se a Rachel. – Agora que assumiu o comando desse caso, como pretende agir?

            Peter fuzilou ao embaixador. Ele não precisava agir como se Rachel tivesse carta branca. Ela não tinha essa liberdade toda. Ao contrário, quem comandava aquela operação era ele. Controlou a ansiedade e observou Stone também chegar e acomodar-se discretamente.

            - Na verdade eu ainda não sei. Peter estava nos apresentando aos dados dos possíveis alvos de Thomas Carter. Uma tentativa de anteciparmos seu próximo ataque. – No fundo existia certo desacordo em sua voz.
            - E o que você acha dessa estratégia? – Nohan percebeu sua incredulidade.
            - Eu? Bom...eu acho que será inútil. – Rachel olhou para Peter. – Desculpe.
            - Prossiga. – Peter respondeu. Não era vaidoso a ponto de não poder ter um erro apontado pela equipe. Se ela tinha uma ideia melhor, que a colocasse na mesa. – Diga. É para isso que você está aqui.
            - Bom...é impossível tentar antecipar o local. Nossa única alternativa é encontrá-lo. Talvez atraí-lo...fazer com que se interesse por um alvo em especial, já monitorado por nós.

            Todos ali conheciam Rachel bem demais para se surpreender com seu raciocínio rápido e facilidade para armar planos e resolver conflitos. Nohan pela intensa pesquisa feita ao seu respeito, os demais por já tê-la visto em ação. Ninguém ali duvidava dela já estar esquematizando uma ação.

            - Estou ansioso pelo restante, Rachel. – Stone afirmou. Prossiga.

            Sob o olhar atento de todos, ela exemplificou suas ideias e apresentou duas linhas de raciocínio. Na primeira Carter era alguém com problemas mentais e praticava os atentados buscando pela atenção, talvez até mesmo pelas tragédias. Nesse caso, precisariam do apoio de um psicólogo forense. E manipulá-lo seria um caminho. Mas, naquele momento, outra possibilidade lhe vinha em mente.
           
            - Carter será mesmo um perturbado? Ou alguém inteligente o bastante para nos ludibriar e levar a pensar em nele como um doente? E se essa destruição toda for apenas uma cortina de fumaça para esconder o verdadeiro golpe?
            - Pode fazer sentido. – Peter entendeu onde ela desejava chegar. – Vamos investigar se houve denúncia de algum crime coincidindo com dia e local dos atentados.

            Rachel tinha de ir embora para casa para amamentar Helen, porém, antes de sair, resolveu atacar Nohan. Fugir da raia nunca foi a sua estratégia favorita.

            - Nohan...você e Melissa poderiam jantar na nossa casa essa noite. Um agradecimento por tudo o que vem fazendo por mim.

            Rachel deixou o FBI sem Neal vir se despedir. Ele não gostou daquele convite. Natural, estava com ciúme. Ela lembrava-se bem daquele gosto amargo. Mas ele teria de superar, assim como ela teve de conviver com Sara e tantas outras cobiçando-o.



            Chegou em casa, deu o peito para Helen e almoçou junto com George. Só depois de relaxar um pouco enquanto as crianças tiravam a soneca da tarde é que conseguiu dar início aos seus planos. Buscou em seus antigos livros referências da pedra preciosa que a trouxe a Nova York anos atrás. Agora na rua, esse era um de seus objetivos. Encontrar o diamante. Ele estava ali, escondido por alguém, há décadas, segundo seu pai. Mas onde? Enquanto ela ainda se debatia entre livros e documentos antigos, Neal chegou.

            - Oi. Chegou cedo.



            - É. Peter me liberou. Percebeu que minha cabeça estava aqui. – Beijou-a de leve nos lábios antes de voltar a falar. – Não gostei da forma como nos despedimos. Agora que finalmente te tenho aqui comigo, não desejo ficar brigado.
            - Não estamos brigados...apenas deixei você ‘digerir’ a ideia de ter Nohan aqui em casa.
            - Eu não gosto desse homem, Rachel. Não o quero perto dos meus filhos.
            - Eu sei. Ter os inimigos na linha dos olhos é uma estratégia de guerra, Neal. Quero estar próximo para entender Nohan, antecipar a próxima jogada.
            - Imaginei algo assim...concordo. Só não gosto. Já falei com Mozz...ele ainda não encontrou nada.
            - Coloque Melissa na lista. Quero a fixa dela. – Ela sorriu antes de beijá-lo com paixão. – Seus filhos passaram a tarde tranqüilos e eu recomecei minhas pesquisas. Nosso diamante dará trabalho.
            - Isso. É bom. Roubos fáceis demais sempre me deixaram insatisfeito. Alguma ideia?
            - Quando vim procurá-lo há anos atrás tinha três alvos possíveis. Consegui verificar apenas um antes de você e Peter me descobrirem. Agora terei de investir nos outros dois. Há um antigo prédio no centro financeiro onde trabalhava um homem que teve acesso a pedra na década de 30. O problema é que durante todo esse tempo muitas reformas ocorreram e a pedra pode ter ficado por lá ou ter sido retirada. O homem morreu num acidente de avião.
            - E a terceira possibilidade?
            - A estação de metro Lexington Avenue – 63rd Street. Só que essa possibilidade não me convence.
            - Por quê?
            - Eu pesquisei essa estação. Ao contrário da maior parte das plataformas que compõem a malha ferroviária de NY, ela não é centenária. Lexington Avenue – 63rd Street foi aberta em 1989. E antes não havia nada lá. Segundo meu pai esse diamante está escondido desde a década de trinta, quando foi roubado de seus bisavós. Não pode ser lá.
            - E não pode ser outra estação?
            - Se é, John levou o segredo com ele...e são 468 estações.




            - Calma. Nós vamos descobrir. – Neal preferia ser positivo. A tarefa era difícil, porém não impossível.

            Um choro forte interrompeu o momento do casal. Helen só podia desejar atenção. Estava alimentada e há pouco Rachel havia lhe trocado as fraldas.

            - Ela parece sentir sua presença. – Brincou com Neal. – Passou a tarde sem chorar.
            - Vou pegá-la. Deve ter cansado do berço.


            Eram 20hs quando a campanhinha da casa tocou. Rachel e Neal já estavam prontos, assim como o jantar e as garrafas de vinho. Nohan e Melissa chegaram, agradáveis e simpáticos, propuseram não falar de trabalho. Fácil com George e Helen na sala. Melissa encantou-se com as crianças e logo tinha a bebê em seus braços. Sempre disposta a receber afagos, Helen, ao contrário de George naquela fase, não rechaçava braços desconhecidos.
            O menino não gostou muito de Nohan. Talvez por ser bem mais desconfiado, George ficava observando-o à distância. Já Melissa ganhou sua simpatia.

            - Você é bonita. Quase tanto quanto a minha mãe. Mas a mamãe é mais bonita que você!
            - George! Não fale assim. Vai deixar Melissa encabulada. – Neal corrigiu o filho.
            - Não tem problema. Seus filhos são maravilhosos.

            Depois das crianças adormecerem, a Inglaterra foi o tema escolhido.

            - Londres tem uma elegância que me agrada muito. – Rachel disse. – Já meu marido tem maior fascinação por Paris.
            - Paris é linda, mas o excesso de turistas me incomoda. – Completou Melissa.
            - Eu gostaria de conhecê-los um pouco melhor. – Neal foi ao ataque. – Como se tornou embaixador, Nohan?
            - Basicamente: muito estudo, vontade de conhecer outros lugares e alguns contatos influentes. – Ele respondeu enigmático.
            - É, você parece mesmo ter pessoas influentes ao seu lado. E você, Melissa?
            - Eu...bom...sou apenas uma advogada que presta serviço à embaixada de meu país aqui nos EUA. Nada mais.
            - Não se menospreze, Melissa. Quem olha para você percebe se tratar de alguém com requinte. – Rachel enfatizou. Aquela garota não a enganava.

            Certa de que sua única chance de arrancar algo de Nohan seria a sós, Rachel aproveitou-se do momento em que Melissa foi ao banheiro para pedir a Neal mais vinho. No olhar dele pode ver o desagrado. Neal era um homem inteligente e entenderia seu plano. Quando sozinhos, foi ao ataque. Aproximou-se do inglês e encruzou as pernas antes de falar.



            - Devo minha liberdade a você. Não entendo a razão e não gosto de ficar no escuro, Nohan. – Estavam lado a lado e ela pegou-lhe a mão.
            - Seu marido não se sentirá a vontade se nos ver tão próximos. Ele já não me aceita muito bem.
            - Deixe Neal fora disso, Nohan. Ele foi abrir um vinho. A não ser que tenha medo de Melissa nos ver.
            - Não, Rachel. Melissa é apenas uma amiga e colega de trabalho.
            - Então me diga. Porque me ajudou tanto? O que eu tenho de especial?
            - Você me fascina. Por enquanto é isso o que posso te dizer.


            A noite acabou sem que conseguissem descobrir muita coisa. Cada vez mais dependeriam das investigações de Mozzie. E assim também foi nas semanas seguintes. Dividindo-se entre trabalhar em casa e na sede do FBI, Rachel e a equipe apresentaram o caso para uma psicóloga, mas ela não apresentou um diagnóstico final.

            - Obviamente esse homem tem um quadro de psicopatia. Mas com apenas esses dados que vocês têm, é impossível dizer se ele tem controle de suas ações ou se a loucura o comanda. – Disse a médica experiente.
            - Como assim? Se é um psicopata... – Peter odiava a enrolação médica para lidar com termos técnicos.
            - Eu não disse se tratar de um psicopata, Sr. Burke. Ele tem um quadro de psicopatia, mas não sei dizer até que ponto é doença. Na verdade, há casos em que nunca saberemos. Onde termina a doença e começa o mau-caratismo? É uma linha muito tênue, agente Burke. Há estudiosos da mente humana que afirmam haver em cada um de nós um grau de loucura e que é ele a nos manter saudáveis e capazes de ver a vida de forma única. A diferença está no fato de em alguns a loucura tomar conta enquanto a maior parte da população consegue dominá-la.
            - Em resumo, não conseguimos nos aproximar dele porque não o entendemos psicologicamente e não podemos traçar seu perfil sem nos aproximar. É o cachorro correndo atrás do próprio rabo. – Disse Neal.

            O tempo passou e conseguiram descobrir algo interessante. Não ouve nenhum roubo no mesmo dia das explosões nas proximidades dos atentados. Mas nos três lugares, nos destroços, não foi possível recuperar vestígios de todas as obras.

            - Você acha que Thomas Carter rouba algo e explode o lugar, podendo gerar vítimas fatais, apenas para encobrir o furto? – Diana não acreditava em tanta frieza. – E se a obra reaparecer? Tudo não se perde?
            - Vende apenas no mercado negro. Quem compra não deseja se exibir. Quer esconder a peça apenas aos seus olhos. – Neal estava convencido. – O problema agora será identificar o tipo de roubo. Se conseguirmos, será fácil atraí-lo para um alvo.

            Nas semanas seguintes, Mozz ajudou Neal a entrar em contato com receptores de roubo no mercado negro. Queriam saber de peças que apareceram recentemente, itens oficialmente perdidos. Descobriu esculturas em bronze e ouro velho que estavam expostas na Áustria e algumas peças da Alemanha nazista.

            - Nada de origem italiana? – Peter questionou.
            - Não, nada que tenha surgido após o atentado lá. Mas Carter pode estar com o roubo ainda.

            Sem descuidar das próprias preocupações, eles tentavam viver a vida sem estressar aos filhos com os problemas dos adultos. Os finais de semana eram sagrados. Passeios e piqueniques para reunir adultos e crianças no parque. Naquela tarde de sol estava deitados na grama, rindo e brincando. Diana trouxe Teddy, Ell e Peter vieram para Sophia poder correr enquanto Valentina ressonava tranquila em seu carrinho junto de Helen. Henry trouxe Daniel para brincar com George.

            - Podemos dizer que temos uma grande família. – Neal disse no ouvido da esposa enquanto lhe dava um morango na boca.
            - Sim. E linda. – Ela sorriu e beijou-o. – George, mamãe está carente. Quer um beijinho.
            - Mas o papai não para de te beijar! – Respondeu o menino.
            - Mas eu quero o beijo do meu filhão.

            Estavam todos tranquilos e confortáveis quando George se levantou da grama gritando e apontando para uma moça que corria na pista que circundava o parque.

            - É a moça bonita! Mãe! É a moça bonita!

            Realmente era Melissa. E ela avistou o menino e veio lhes cumprimentar. Peter apresentou a esposa e os filhos. Diana instigou Teddy a dizer oi para Melissa e Rachel a apresentou para Henry e Daniel.

            - Vocês são amigos fora do escritório. Legal isso.
            - Somos um time, Melissa. Uma família. Diana explicou.

            Depois os pais foram incumbidos da tarefa de cuidar das crianças enquanto elas iriam correr com Melissa. Eles não reclamaram. Henry em especial. Ele estava acostumado a cuidar sozinho de Daniel desde seu divórcio com Molly. Não passou despercebido de Rachel o desejo de ver seu amigo feliz novamente.      

            Helen já completava três meses e a apreensão por um atentado aumentava. Peter solicitou alerta máximo. Qualquer tentativa de roubo ou invasão a espaços que abrigassem peças de arte deveriam ser informados ao FBI mesmo que frustrados.
            Outro caso também estava bem demorado e Rachel pressionou Mozz por respostas. Há meses ele vinha investigando Nohan e nunca lhes disse o que descobriu.

            - Nada. – Sua expressão mostrava irritação. – Ou ele é um santo ou sabe esconder muito bem suas falcatruas! Minha experiência faz crer na segunda hipótese!
            - Como assim nada? – Ela também não acreditava.



            - Nada diferente do que ele contou. Filho de família de renome, estudou nas melhores escolas, conhece o mundo e tem ótimas recomendações. Assumiu primeiro a embaixada inglesa na Croácia e há menos de um ano foi transferido para New York. Teve algumas namoradas, uma noiva, mas nunca casou. Nada demais na fixa dele e olha que eu puxei tudo o que pude! Nem multas de trânsito ele tem. Chega a ser chato!
            - Inacreditável. – Rachel contava com a pesquisa de Mozz para desvendar aquele nó.
            - Mas o mesmo não pode ser dito da Srt. Engravatada.
            - O que tem a Melissa?
            - Ela está longe de ser ‘apenas uma advogada’. Srt. Melissa Marshall é filha do Primeiro Ministro Inglês. Digamos que ela não precisa trabalhar para viver.
            - Não mesmo. – O que para Rachel não impedia a advogada de trabalhar honestamente e desejar ter uma vida distante da política. – Vou ficar de olho nela.

            Na manhã seguinte, Neal foi trabalhar logo cedo enquanto Rachel iria deixar George na escolinha junto com Teddy e levar Helen para tomar um pouco de sol no parque. Somente um pouco porque sua pele clara e cabelos ruivos se irritavam facilmente.



            - Venha, bonequinha da mamãe, vamos passear.
           
Depois de almoçar com Ell, ambas as mamães foram amamentar suas filhas. Valentina também não gostava de ficar muito tempo sem mamar. As duas garotinhas gostavam de ficar juntas. Balbuciavam e brincavam como se uma bebê entendesse da outra. As mães também conviviam muito bem e entendiam as dúvidas da outra, em especial no que dizia respeito aos problemas do pós parto.

- Graças a deus os três meses estão acabando, Ell. Ter Neal por perto, lindo daquele jeito e não poder transar é um castigo.
- Eu entendo, Rachel. Quando acabou o meu resguardo eu praticamente tranquei o Peter no quarto por uma semana! – Ell respondeu e as duas riram. – Claro que eu ainda estava com um pouco de vergonha do corpo, mas ele não reclamou de nada!
- É claro que não! Você está linda. E nos acabamos na academia nesses meses. Se o Neal reclamar depois de tudo o que eu corri naquela esteira, juro que afogo ele na banheira!

O clima ameno só foi embora quando os celulares das duas tocaram quase que no mesmo momento. Sinal de turbulência no FBI. Estavam certas. Thomas Carter tinha escolhido seu próximo alvo. E dessa vez não tinha sido nenhum museu, monumento ou parque de visitação. A explosão foi na sede do FBI.

- Meu Deus! – Ell gritou em choque. – Estão todos bem?
- Foi no térreo, na portaria. Dois guardas e uma recepcionista perderam a vida.

Rachel correu para lá, deixando Helen com Elizabeth. Apesar de Neal não ter lhe atendido no celular, algo raro, Henrique lhe tranquilizou avisando de que o andar da Colarinho Branco não tinha sido atingido.
Quando chegou, Rachel percebeu o estrago feito por Carter. O primeiro andar do prédio foi destruído. E o IML já retirava os corpos. Mostrando sua identificação, conseguiu entrar e chegar ao trabalho. Todos estavam na sala de conferência em uma reunião de emergência. Todos, menos Neal.

- Eu já mandei chamá-lo. Logo deve estar aqui. – Peter afirmou.

Diana estava concentrada tentando descobrir imagens da pessoa a deixar a bomba na recepção. O lugar esteve movimentado durante todo o dia. Não seria fácil. Uma equipe fazia a varredura do local e tentariam descobrir se Thomas Carter levou algo do FBI.

- Não temos nenhuma obra de arte valiosa. E, se tivesse, seria arriscar demais. – Peter estava preocupado. Carter tinha agido fora do esperado. – Ele não tem medo de matar.
- Podemos tentar levantar qualquer item de valor...Neal saberia dizer de cor. – Diana comentou.
- Onde ele está? Chamem Neal! Onde ele estava na hora da explosão?
- Aqui, Peter. Ele ia ao arquivo pegar uns documentos. – Henrique falou.
- Então ele está no prédio! Por que não atende ao celular? – Um temor tomou conta de Peter. – Diana, peça o vídeo de segurança da sala do arquivo. Vamos ver se Neal esteve lá e a hora em que deixou a sala.

Rachel manteve-se calada. No fundo, já desconfiava do que veria. Quando a imagem em preto e branco apareceu no monitor, não se surpreendeu. Carter esteve no FBI e levou Neal com ele. Com uma arma de choque, o homem derrubou-o e saiu arrastando o corpo desacordado. Deve ter deixado o local com a ajuda de algum comparsa enquanto todos voltavam às atenções para a explosão na entrada principal.

- Ele nem mesmo escondeu o rosto. – Diana afirmou.
- Sabe que já o conhecemos. - Peter respondeu. - Ele nos enganou direitinho.
- Não veio buscar nenhuma obra de arte. Veio sequestrar Neal e usou a explosão para nos fazer perder tempo enquanto fugia. Já deve estar longe. – Rachel ergueu-se e caminhou até a janela olhando NY. Só pensava em onde estavam e porque Thomas Carter levou Neal. Depois voltou-se aos colegas. – Porque estão parados? Movam-se! Há um agente dessa divisão desaparecido. E nós vamos encontrá-lo.

Peter observou orgulhoso. Aquela frase podia ter saído da sua boca. Em alguns aspectos eles eram realmente parecidos.

- Chamem a psicóloga! Acho que agora ela tem mais elementos para trabalhar.

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