sexta-feira, 25 de julho de 2014

Vidas Ocultas - Capítulo 4


Elizabeth acordou algumas horas depois. O peito queimava e o braço estava firmemente amarrado por uma atadura. Sobreviveu a mais uma. Ao lado da cama viu um lindo e imenso buquê de flores. Certamente não foi trazido pelos colegas da polícia nem por Beatriz. Algo tão espalhafatoso também não fazia o estilo de Matt.

- Voltou para nós. Ainda bem. Você não sabe o susto que levei ao saber que você tinha levado um tiro. Não sei se um dia irei me acostumar com esse seu trabalho, Liza. – Havia emoção na voz de Beatriz.

Olhando lentamente para o quarto, ainda um tanto confusa, Elizabeth percebeu Beatriz sentada na cadeira ao lado direito do leito. Estava sorridente, o que não evitava transparecer o cansaço de quem foi chamada as pressas para o hospital por mais uma emergência com a irmã. A jornalista já estava acostumada a receber chamados às pressas. A vida de Elizabeth parecia sempre estar em risco.

- Desculpe, Bia. Devo ter estragado do seu dia.
- É, mas eu dei um jeito lá no jornal. Não ia te deixar aqui assim, sozinha, aqui. Como se sente?
- Dolorida. Mas bem. Quando estarei liberada?
- Logo. – Ela apontou para o arranjo de flores. – Dessa vez você achou um suspeito bem galanteador, querida irmã.

Elizabeth parou de sorrir. Era justamente isso o que temia. Já tinha desconfiado ao abrir os olhos. Beatriz lhe entregou o cartão que respeitosamente, mas com uma pitada de charme, desejava melhoras. Miguel tinha saído livre e ainda lhe mandara flores.

Olá, querida Liz;

Esperarei ansiosamente por nosso próximo encontro. Ainda que prefira algo mais íntimo, sem seus ajudantes e fora do meu local de trabalho.
Desejo-lhe as mais sinceras melhoras.

Miguel de La Vega Benitez


- Onde está Rebecca? Porque ela não o prendeu?
- Talvez porque ela estava preocupada com você. – Beatriz pegou o cartão para ler. – Ele te chama de Liz?
-Mesmo assim ela deveria tê-lo prendido, não precisava deixá-lo livre só porque eu levei um tiro! – A respiração acelerada seu peito arder mais devido a força da bala contra o colete. O acessório evita o machucado fatal, mas não a dor do impacto. - Ele é um abusado que força essa intimidade comigo!
- Acontece quando você está fechando as algemas em alguém e leva um tiro. – A irmã brincou. – Daria um lindo case para a matéria do dia dos namorados no jornal. Que manchete! Amantes do crime: o bandido que ganhou o coração da policial.
- Chega Bia! Ele está sendo investigado e não há nada entre nós. Não pode e não vai existir nada entre eu e o Sr. Benitez. Ele é muito intrometido! Dá pra acreditar que ele perguntou o tipo da minha diabetes no dia em que o interroguei? Ele é arrogante e metido, isso sim!
- Pode ser...mas não pode negar que ele é bonito. Eu já estou sentindo cheiro de romance no ar. – Rindo, ela beijou a testa da irmã. – Eu tenho que voltar pra redação, Liza. O Matt vai ficar aqui com você.
- Bia, quer parar com essa história de romance? Ele é só mais um cara que vou colocar atrás das grades, como sempre, aliás. E vai logo para seu trabalho. Se cuida.
- Eu é que devia dizer isso. – Ela acenou da porta, mas ainda falou algo antes de sair. – Liza...antes de prender o Miguel, você deve agradecê-lo. Segundo a Rebecca, foi ele quem cuidou de você antes dos paramédicos chegarem.
- Não o idolatre, Bia, ele é um criminoso!
- Como não? Ele salvou a minha irmã. – E saiu sorrindo pelo corredor. Podia até estar se deixando levar pela beleza daquele homem, mas Miguel não aparentava ser um criminoso cruel. Talvez Liza pudesse lhe dar uma chance.


Para Miguel as flores tiveram dois significados. Queria conseguir se aproximar de Elizabeth, ganhar sua confiança e fazê-la parar ao menos para ouvi-lo. Também desejava provocar. Queria muito ter visto sua reação ao receber as flores. Aceitou? Mandou jogar fora? Atirou pela janela? Com aquele temperamento forte, não duvidava de nada. E precisava continuar provocando-a até descobrir o que realmente se passava. Aquela cicatriz não podia ser apenas uma coincidência. É ela! Elizabeth é a prostituta que encontrou numa calçada qualquer e com quem transou, bêbado e sem saber seu nome. Uma policial federal, formada em direito com altíssimas notas, mas que, quando perguntou seu nome, disse para chamá-la de vadia.
Por um momento, chegou a cogitar que aquela noite tivesse algo a ver com a investigação. Afinal, ela parecia realmente acreditar que ele traficava pessoas e lavava dinheiro de prostituição na empresa. Mas não. Já fazia mais de um ano. Seria improvável. E não acreditava que iria tão longe por uma investigação policial. Eles não levavam o trabalho de campo tão a sério assim. Não, não estava de serviço naquela noite. Transou com ele porque quis. Será que fazia isso toda noite? Com qualquer um?

- Será que ela ‘caça’ homens todas as noites? – Não devia, mas continuava pensando nela.


Forçou-se a deixar Elizabeth um pouco de lado e tentou se concentrar no trabalho. Mas antes tinha algo para conferir. Louis era um dos seus alvos naquela manhã. Achava muito estranho Elizabeth ter sido baleada na calçada da BTez. E Louis saber que ela estava chegando disparou uma dúvida na cabeça de Miguel. Chamou-o em seu escritório e agora o aguardava. No decorrer daquele ano havia modernizado o lugar e deixado a presidência da empresa com seu estilo. Conhecia aquela sala e sentia-se dono daquele espaço. Será que realmente conhecia o restante da empresa?




Odiava esperar. Andando pela ampla sala localizada no 7º andar do prédio, preparava-se para pressionar o advogado. A amizade que tinham o permitia ser muito direto. Não poupou Louis da dúvida que passava por sua cabeça.

- Está me acusando, Miguel?! – Respondeu o advogado depois de ouvir calado.
- Não, só estou perguntando se você teve algo com isso! Responda!
- É claro que não! E me admira você perguntar! Eu só queria que você fugisse, se escondesse. Só isso. Avisei a você e a Javier que a investigadora estava fechando o cerco. Deviam se preservar. Só isso! Esse é o meu papel. Não saio contratando assassinos, e para sua informação, eu conseguir anular o pedido de prisão que aquela policial tinha.
-Muito obrigada Louis. E você não fez mais que a sua obrigação, não quero ficar sabendo de mais nenhum atentado contra a Policial Elizabeth enquanto ela estiver averiguando meu caso. Está me escutando? Se ela sofre um novo atentado saberei que foi você e meu tio, está entendido?
- Sim Sr. Benitez.
- Então é isso, pode sair. - Não gostava de ser grosseiro assim, mas se Louis não era leal o bastante para contar tudo, ele também iria se comportar apenas como patrão.

Miguel acreditou em Louis. Com o trabalho de Elizabeth, não deviam lhe faltar inimigos. Ela podia ter sofrido aquele atentado por qualquer pessoa. E agora certamente acrescentava mais uma desconfiança sobre ele.
    Ele passou o dia atarefado, em especial, porque Javier não estava. Era esperado de volta dos EUA apenas amanhã no fim da tarde. Até lá, tudo estava sob sua responsabilidade. Após uma videoconferência onde garantiu para os diretores da regional asiática que não haveria demissões em massa, desde que as vendas não tornassem a cair, seu plano era concluir uma análise para a reunião do dia seguinte e assinar alguns contratos antes de ir embora. Talvez conseguisse passar na academia para nadar um pouco. Agora eram 18h40min. Poucas pessoas ainda estavam na empresa. O telefone começou a tocar anunciando que seus planos iriam mudar.

- Senhor, desculpe. Sei que não queria ser interrompido mas... - Clarisse, a secretária, interrompeu seu único momento de calmaria na tarde toda.
- Já é fim do expediente, Clarisse. Eu só tenho de assinar uns papéis e vou embora. O que é? Algum incêndio?
- Não, Sr. Benitez...mas tem uma visita....Ei, pare! – Ela gritava para a visitante. - Não pode entrar ainda...só um instante...

   Não adiantou nada Clarisse tentar avisar ao chefe. A mulher vestida de forma simples e elegante, com sapatos rasteiros e carregando um buquê de flores entrou no escritório sem nem mesmo bater na porta. Quando Miguel a viu, preparou-se para a tempestade. E sorriu, surpreso, mas contente com aquela visita inesperada.



- Tudo bem, Clarisse. A senhorita Santos pode entrar. – Ele se levantou de sua cadeira e foi recebê-la. – Pode ir embora. Até amanhã.

   Elizabeth passou as horas ainda no hospital muito irritada. Não adiantava Rebecca lhe dizer que prendê-lo não era a prioridade após ela sofrer um atentado. Pior que jogar fora a operação de prisão, era ter de aguentar a provocação do acusado. Enviar-lhe flores foi demais. E ela resolveu não tolerar nem ignorar aquilo. Assinou o documento assumindo a responsabilidade por deixar o hospital sem alta médica e saiu carregando o arranjo. Já era fim da tarde e nem mesmo foi para casa. Entrou na BTez pronta para enfrentar o ‘todo poderoso’. Agora encontrava-se diante dele e se esforçada para não se impactar com sua beleza.

- Vejo que está recuperada, Liz. Que bom. – Ele sorria de forma tranquila, até mesmo sedutora. – Mas não deveria estar carregando nada, nem mesmo flores, com o braço ferido.
- Vim devolvê-las. – Elizabeth disse antes de largar sobre a mesa dele o arranjo. – E não me chame de Liz. Não lhe dei o direito e nem temos intimidade para isso.
- Eu gosto de Liz...combina com você.
- Eu deveria te prender agora mesmo. Uma noite na cadeia ia te fazer entender que não estou interessada em flores nem em apelidos carinhosos vindo de você.
- Bom, até onde eu sei, o mandado de prisão que você tinha foi caçado. Meu advogado entrou com habeas corpus antes de você fechar as algemas. – Ele vinha se aproximando dela. – Então porque veio aqui, Elizabeth?  Não foi para me prender, nem para trazer essas flores. Qual foi o motivo então?

  No fundo, Elizabeth também se fazia a mesma pergunta. Não deveria ter vindo ali novamente. Agora que já estava ali, no entanto, então melhor atacar.

- Vim te avisar que aquele tiro será muito bem investigado. Mande seu advogado curtir o momento, porque o próximo mandado de prisão, ele não vai impedir a tempo.
- Entrar na minha empresa e fazer esse tipo de acusação sem nenhuma prova ou autorização não se enquadra em abuso de poder, Liz?
- Pergunte para um juiz! Adeus Sr. Benitez! – Respondeu e saiu andando em direção a porta.
- Espere! Eu sei o que veio buscar aqui...e posso te dar.
- Uma confissão completa? – Foi a resposta ousada.
- Não, não mesmo. Porque não foi por isso que veio aqui.  – Ele sorriu e Elizabeth viu os dentes perfeitos e o maxilar cerrado. Ele estava tão perto que podia sentir seu perfume. – Agora eu me lembro tão bem de você...tão bem...

Elizabeth não entendeu o que Miguel quis dizer com isso. Mas ele estava perto demais. Cada vez mais perto. Chegava a se arrepiar a cada passo dado em sua direção. Foi andando para trás, acuada mesmo sem ter medo dele e sentiu as costas tocarem na porta da saída. Era só abrir e ir embora. Mas ficou ali. Não tinha forças nem vontade para abri-la.

- Você não lembra, Liz? Não se lembra de mim? – Estavam com os rostos tão próximos que Elizabeth podia sentir na sua pele a respiração de Miguel.
- Não sei do que você está falando. – Ele continuava olhando-a nos olhos. E era como se estivesse presa naquela sala. – Eu...eu...vou embora.
- Ainda não! Vamos ver se assim você lembra! – E sem lhe dar chance de escapar, segurou-a pela cintura e beijou-a fortemente. Da forma como lembrava dela gostar.

A primeira reação de Elizabeth foi de empurrá-lo, afastá-lo. Mas não o fez. Deixou que Miguel a beijasse e, mesmo jamais reconhecesse em voz alta, gostou daquele beijo. Era duro, exigia mais do que dava. Era como se ele quisesse devorá-la ali mesmo, contra a parede de seu escritório. Deveria afastá-lo e lhe dar voz de prisão. As razões? Assédio a uma policial federal! Mas declinou da ideia quando lembrou que teria de explicar a razão de estar ali, sem um mandado válido de prisão, sem distintivo e fora do horário de trabalho. Então apenas o afastou.

- Me solte e nunca mais faça isso Senhor Benitez!

Ela lhe deu as costas e saiu correndo desajeitadamente pelo corredor, agradecendo o fato da secretária já ter ido embora. Ao menos não haveria testemunha daquela cena humilhante. Apertou o botão do elevador e o aguardou sabendo que Miguel a observava. Só quando as portas se abriram é que ouviu sua voz.

- Eu não sou um criminoso Elizabeth. Pode se sentir tranquila em gostar dos meus beijos. Não está beijando um traficante de pessoas. Tenha uma boa noite, Liz.



domingo, 20 de julho de 2014

Vidas Ocultas - Capítulo 3






Informação era uma arma poderosa. O problema era quando não se sabia para onde mirá-la. A fala do tio estava bem clara na mente de Miguel. Ele negava traficar pessoas ou que a empresa servisse para lavar dinheiro sujo. Porém, reconhecia um ‘telhado de vidro’, frágil e exposto às pedradas da investigadora Elizabeth Santos. Telhado esse do qual jamais desconfiou. “Escolha seu lado, Miguel.” Claro que o lado seria o da família. Não jogaria fora o império construído por seu pai. Mas não se orgulhava do que teria de fazer. Correta ou não, teria de encontrar um meio para frear Elizabeth.

Ter descoberto o estranho passado da investigadora fez daquela intrigante e insuportável mulher um ser ainda mais irresistível. Miguel passou o domingo tentando descobrir mais coisas ao respeito da bela e audaciosa investigadora, mas não conseguiu mais nada. Segundo Louis, havia algo mais, algo maior, nem tudo na história dela se encaixava, mas ele ainda não tinha a peça capaz de clarear tudo. Elizabeth ainda era um mistério.

Isso segundo seu advogado. Para Javier, ela era a inimiga. E o tio não escondeu seu desejo de usar a força da empresa para derrubar a policial. Nem que desejassem, no entanto. Ela tinha uma conduta ilibada. A menos que descobrissem algo fulminante o bastante para expô-la a ponto de fazê-la deixar o caso, não via como ‘derrubar’ Elizabeth. Ia ter de calar aquela língua afiada de outra forma.

- Posso pensar em alguns meios. – Disse em voz alta, sozinho em seu quarto.

Ela tinha algo que o atraía. Quanto mais Elizabeth tentava se mostrar superior e agia como se sua fortuna e posição social não a atingissem em nada, mais ele tinha vontade de fazê-la obedecê-lo. Ela, estranhamente, despertava nele um lado mais selvagem.

Passava das 13hs de segunda-feira quando Elizabeth se preparou para iniciar a operação de prisão contra Miguel, no escritório da BTez. Arma posicionada no coldre, algemas preparadas. Fred com ajuda de mais dois policiais lhe daria apoio. Iniciou sua missão.

- Fred está posicionado e o Benitez não saiu para o almoço, está na sede da BTez. Saímos na hora em que você decidir. – Rebecca avisou.
- Já vou.

Os problemas se acumularam e impediram Miguel de ir almoçar. Só pedia para conseguir algumas horas no fim da tarde para malhar e nadar. Precisava gastar de alguma forma toda a energia acumulada. Seria difícil. Javier viajou para tentar acalmar a situação nas outras unidades e ele permaneceu ali. Os acionistas não paravam de questionar sua liderança e os problemas que vinham acontecendo só piora a situação. Não desistiria. Aquele era o seu império.

Ouviu quando o celular tocou. Era Louis.

- Acho que a nossa amiga investigadora está armando alguma coisa. Saia daí. Agora!
- O que? Sair daqui? Por quê? Do que você esta falando Luis?
- Você será preso. Saia da empresa agora! – Era uma ordem.

E Miguel não estava muito acostumado a receber ordens. Nem ia começar a mudar esse hábito.

- Louis, você, meu advogado, está me mandando fugir? Por quê? E o que a investigadora conseguiu para vir me prender? Como soube disso? Fala! Diga logo o que vocês estão me escondendo!
- Já tem um cara observando a entrada da empresa. A investigadora estará aí logo. Não pergunte minha fonte, e nem por quês agora, Miguel! Saia rápido daí!
- Quer mesmo que eu fuja? Não pode conseguir me livrar?
- Oficialmente eu não sei de nada ainda. Não vai ficar muito tempo, a menos que ela tenha algo muito bom. Vou te tirar rápido. Mas essa noite você passará por lá. É fuga ou cadeia. A menos que tenha uma ideia menor.
- Vou ter que conseguir uma. – Não fugiria como um rato.

Elizabeth estava pronta para agir.

- Rebecca, pegue dois homens e leve com você para fechar a saída do estacionamento. Fred venha comigo. Carla e os outros ficam aqui. – Sua equipe sabia que a tranquila investigadora agora ficaria mais dura e compenetrada. Seus olhos ganhavam um brilho mais denso e até a postura ganhava ares menos delicados.

Ela iria à frente e eles a acompanhariam. Para a equipe era um sinal de respeito. Elizabeth era a autoridade superior, era a voz de comando a quem deviam respeito. Já ela tomava o fronte por crer ser de sua responsabilidade. Fazia questão de dar a voz de prisão e fechar as algemas.

- O escritório do Benitez fica no sétimo andar. Quero três homens esperando no rol. Fiquem de olho nas escadas.
- Está realmente achando que ele vai fugir, Elizabeth? Que ele sabe que estamos aqui e vai fugir? – Rebecca perguntou.
- Não acho nada. – Ela foi dura, mas depois se explicou melhor. – Chame de desconfiança ou intuição, não sei o que é. Só que algo me diz que não vai ser simplesmente chegar e prender. – Ela olhou para cada um e deu início a operação.

Elizabeth não era supersticiosa, não acreditava em destino, muito menos em sorte. Mas havia dias em que um arrepio, um sopro distinto, algo lhe dizia: cuidado. Hoje era um desses dias. No portão de entrada da Benitez, antes mesmo de ingressar no pátio do prédio teve uma prévia de como poderia ser uma tarde desagradável. Odiava quando algo não saía como planejado e, para sua surpresa, não fora ela quem foi até Miguel Benitez, ele veio ao seu encontro. Parecendo o rei do universo, saindo calmamente pelo pátio enquanto falava ao celular.



E mais tranquilo ainda, o viu desligar o aparelho como quem vê um amigo e resolve dar atenção.

- Ora, mas que coincidência. A que devo a visita, bela investigadora? Devo dizer que é um prazer?
- Sr. Benitez, não é uma visita de cortesia. Eu vim aqui para prendê-lo – Tirou as algemas do bolso e começou a lhe dar voz de prisão. – Miguel de La Vega Benitez você está...

Ninguém ouviu nada, nem soube de onde veio. A primeira bala estourou no centro do peito de Elizabeth, jogando-a contra um pilar da construção. Quem atirou teve tempo e mira o bastante para acertar em cheio. Houve ainda mais três disparos. Dois acertaram as paredes, o último o braço esquerdo dela.

- Elizabeth! – Rebecca e Miguel gritaram ao mesmo tempo.

Ela estava desacordada e a mancha de sangue crescia na camisa branca. A primeira coisa que Miguel fez foi tirá-la do chão e levá-la para o rol de entrada da empresa. Com ela deitada sobre um macio tapete começou a tirar-lhe a camisa. Ficou satisfeito ao confirmar que Elizabeth estava com um colete a prova de balas.

-Ei! Você estava preso! Tire as mãos dela! – O jovem policial disse.
- Não, Fred. Ele é médico. Pode ajudar Liza. – Rebecca interferiu.
- Obrigada pela confiança, Policial Rebecca. – Lhe deu seu mais doce sorriso. – Além do mais, a investigadora não me deu voz de prisão...ainda. – Tirou a camisa dela e começou a abrir a proteção balística. Elizabeth não usava nada por baixo. – Esse troço salvou a vida dela. Já chamaram a ambulância? Ela vai acordar com uma tremenda dor no peito.
- Sem o colete ela não acordaria. – Rebecca lembrou.
- Isso é verdade. Mas agora vamos tirar isso dela e cuidar da nossa ‘simpática investigadora’. O braço é que me preocupa, não tem porque deixá-la com esse colete. – Ele ia descobrindo-a e Rebecca reclamou sabendo que a chefe não ia gostar da liberdade que o suspeito teve. – Sou médico. Estou sendo profissional.
- Foi só de raspão, não?
- Sim. – Ao deixá-la com o dorso nu, Miguel viu, na parte de baixo do seio, a cicatriz que acreditava jamais tornar a ver em toda vida. Impossível haver duas iguais. – Só de raspão.

 Ali estava a mulher com quem ele transou achando se tratar de uma prostituta. Não era. Era uma policial. Investigadora da polícia federal. Aquela mulher fatal de quem se lembrava e essa nada tinham em comum. E mesmo assim eram uma só. O barulho da ambulância o fez deixar isso de lado. Manteve a pressão sobre o machucado no braço e tentou manter a mente clara e objetiva.

– Ótimo! Chegaram. Venham! Por aqui. Cuidado com ela. É diabética. – Orientou aos paramédicos.

Tudo foi acompanhado de perto pelo Doutor Miguel. Apesar do momento estranho, ele estava confortável no papel de médico. Foi com ela para o hospital, acompanhou o que se passava e certificou-se de que Elizabeth receberia o atendimento adequado. Viu quando um rapaz chegou carregando um bebê. Nervoso, ele perguntou pela paciente Elizabeth Santos e afirmou ser da família.
Miguel tentou relembrar tudo que estava no relatório da investigação. Não lembrava de nenhum namorado, muito menos filho. E Elizabeth não tinha outro familiar além da irmã. Primeiro cogitou ser um namorado. Depois pensou na possibilidade de alguém estar tentando terminar o trabalho frustrado pelo colete no pátio da BTez. Por segurança aproximou-se e ficou observando o rapaz. Era jovem, com cabelo castanho claro cortado muito curto. Vestia um terno acinzentado com elegante gravata e carregava a criança, uma menina vestida toda em tons de rosa, com grande intimidade. Resolveu se aproximar.

- Boa tarde. Você perguntou pela Elizabeth?
- Sim. – O rapaz o olhou de cima a baixo. – Quem é você?
- Um amigo. Miguel de La Vega Benitez. Fui eu quem trouxe Elizabeth. – Estendeu a mão. – E você? Quem é?
- Apesar de não dever explicações a um dos investigados de Elizabeth, sim eu sei que o senhor não é um amigo, e sim o suspeito de um crime, eu responderei. – Ainda assim apertaram as mãos. – Sou Matheus. Um amigo de Elizabeth e Beatriz.

Foram interrompidos por uma linda loura que entrou correndo na recepção. Estava com a face corada e a respiração acelerada.

- Matt! Que bom que pode vir. Eu fiquei tão nervosa!
- Claro que eu viria. Somos um trio! – Ele passou a bebê para a jovem. – Pegue Eva. Ela está nervosa sem a mamãe e a tia.
- Vem bebê. – Mais calma Beatriz encarou Miguel. – E você, quem é?

Era chato, mas ele preferiu, por hora, ser sincero.

- Sua irmã está me investigando e foi até a minha empresa...para me prender... provavelmente. Sou medico e prestei os primeiros socorros antes de a ambulância chegar. Então vim acompanhando-a, para não vir sozinha. – Estendeu novamente a mão. – É um prazer te conhecer, Beatriz.
- Se você ajudou minha irmã, digo o mesmo. – Ela sorriu. – Mas saiba que, com ou sem tiro, se ela foi lá para te prender, fechará as algemas logo.
- Bom, eu espero conseguir provar minha inocência e não seja necessário ela voltar lá para me prender. Agora, se me permitem, vou voltar pra casa. Foi um dia cheio de emoções. Por favor, Beatriz, diga para Elizabeth que desejo vê-la bem em breve, se por acaso e ela ainda quiser me prender ou em outra situação. – Com um charmoso sorriso ele se despediu.