segunda-feira, 21 de abril de 2014

A Mentira - Capítulo 38: Quando a morte é o menor dos castigos





            Quando Ana acordou estava dentro de uma ambulância. Exagero de Christian com sua segurança. Não havia nada de errado com ela. O desmaio era fruto do choque de ser sua prima ser atingida por um tiro bem à sua frente. Não era assim que espera terminar aquele dia.

            - Me tirem daqui! – Gritou. – Onde está meu marido?

            Christian havia sido chamado pela polícia. A administração do shopping havia tentado impedir, mas quando duas integrantes de uma importante família estavam envolvidos numa tentativa de assassinato, imprensa e polícia logo apareciam. Agora estavam servindo de manchete em todos os canais de televisão e sendo chamados para depor.

            - Seu marido já vem, Senhora Grey. Ele pediu que não lhe deixasse sair sozinha.
            - Onde ele foi? – Estava irritada sem entender o que se passou. – Minha..prima...o que fizeram com Alice?
            - A outra moça foi levada as pressas ao hospital. Ao contrário da senhora, que já está liberada, o caso dela é muito grave.

            Christian chegou logo depois e quis levar Ana para casa. Teimosamente ela não aceitou. Por pior que fosse a relação de Alice com a família, certamente José e seus tios teriam de ser informados do que se passou e seguiriam ao hospital. Ela tinham de estar com eles.

            - São a minha família, Grey! Não posso abandoná-los.

As horas que se seguiram passaram lentamente. O hospital estava cercado de repórteres e a polícia dizia ainda não ter conseguido pegar o atirador, mas que estavam seguindo uma pista importante. Alice passava por uma complicada cirurgia para retirada da bala, alojada próxima a terceira vértebra da coluna. As perspectivas não eram boas.
            O clima no hospital era terrível. Nenhum amigo veio saber do estado de saúde de Alice e, para a família, estar ali era pouco mais que uma obrigação. Depois de tudo, a sensação de todos era que Alice havia procurado aquela bala.
            Quando todos estavam reunidos, Grey  resolveu contar-lhes o que viu. Já havia passado a informação para a polícia, mas Ana e a família ainda não sabiam. Seria um choque. Mas ele teve de falar.

            - Anastásia era o alvo. – Ele foi direto. – Eu vi o atirador. A distância, mas vi. Ele atirou em Ana. Alice foi atingida por engano.

            Ele teve o cuidado de usar a palavra engano também com o investigador. Isso, porque não queria que, de forma alguma, Ana fosse envolvida no crime. Ela não imaginava que estava salvando a própria vida ao sacudir Alice a sua frente.

            - Como assim? Quem desejaria matar Ana? – José se apavorou frente a ideia que fosse Ana sendo operada naquele momento.

            Ana e Christian trocaram um olhar.

            - Só uma pessoa seria capaz, José. – Seus tios empalideceram sabendo a grave acusação que seria feita. – Alice. Só Alice.
            - Mas foi ela quem levou o tiro! – Ray gritou. – Ela não iria tão baixo!
            - Eu não sei com, Tio. Mas...ela tinha o motivo para isso.

            Sem saída, Ana contou aos tios o que vinha fazendo com Alice nas últimas semanas. Contou do amante que a prima tinha, das provas que conseguiu e da chantagem. Ray e Melissa não gostaram se saber que vinham sendo enganados, mas compreenderam a sobrinha.

            - Você queria que ela desse o divórcio a José? – Melissa concluiu.
            - Sim. Queria. – Ana agora entendia o risco que havia corrido. – Eu a ameacei. E disse que se não me obedecesse, eu liberaria as fotos, a humilharia e faria com que terminasse divorciada e sem um centavo do nosso dinheiro. Deixei-a acuada.
            - E ela armou um plano para te matar! – Grey tremia só de pensar. 

            Todos ali sabiam que não poderiam esconder nada da polícia. O atirador ainda estava a solta e podia tentar algo. Só não foram diretamente ao investigador porque a cirurgia de Alice teve fim. As notícias que o médico trouxe não eram animadoras.

            - Ela vai viver. Infelizmente, não posso lhe dizer que não restarão sequelas.
            - O que quer dizer com sequelas. – José perguntou.
            - Ainda não posso lhe confirmar nada. Mas a coluna foi atingida. É melhor aguardar. Ela será levada ao quarto para se recuperar. Aos poucos saberemos o quanto seus movimentos foram atingidos e esperaremos para dar qualquer notícia a ela. Nesses casos a paciente precisa ser tratada com muita delicadeza...não são coisas fáceis de se ouvir.

Semanas depois...

            A polícia havia chegado até Jasper. Alguém denunciou a placa do carro e, junto com a história que Ana contou ao investigados sobre o amante de Alice e as fotos, não foi difícil encontrá-lo. Ele ainda estava com a arma e completamente apavorado com as notícias que via na televisão.

            Não demorou muito para confessar a autoria do tiro que acertou sua amante. Agora, ele estava preso por tentativa de assassinato. Jasper e Alice ainda teriam que se encontrar para uma acareação. Só não o fizeram ainda porque ela tinha problemas maiores com o que lidar.

            Alice continuava internada no hospital. Não deu nem daria mais nenhum passo na vida. Os médicos haviam diagnosticado seu quadro como paraplegia total e irreversível. Alice não sentia nada abaixo da linha do pescoço. Não era capaz de se erguer da cama e dependia das enfermeiras para tudo. As poucas visitas que recebeu ela expulsou aos gritos.

            Uma psicóloga tentou atendê-la, mas ela deixou claro que não desejava falar com ninguém. A profissional orientou que não a informassem que o caso era irreversível. Alice achava que seus movimentos voltariam com o tempo. Ela não queria que ninguém a tocasse ou a visse naquela situação. Impossível. Todas as manhãs uma enfermeira vinha cuidar dela. A única que aturava seus gritos. Uma senhorinha que a olhava com pena. Não sabia tudo que já havia feito.

            - Sorria, você está viva. – Lhe disse a doce enfermeira.


            Alice ouviu a enfermeira e sorriu. Seguros em seus pensamentos estavam seus planos. Quando voltasse a andar poderia terminar o que planejou. Aquele tiro ainda encontraria Anastásia.

            Alice sorria sem saber que jamais poderia concluir seus planos porque jamais conseguiria andar novamente.

Dupla Perseguição - Capítulo 40



            - Elizabeth Burke! Pare agora mesmo! – Vendo que a esposa não iria obedecer, Peter foi obrigado a segui-la. Rachel e Neal fizeram o mesmo. Apenas Mozzie tentou respeitar a privacidade do casal que discutia. – Ell! Não corra! 

            Já no térreo, ela parou e olhou para ele, desafiando-o.

            - Como assim ‘encontrarei alguém mais interessado’? Eu sou seu marido!
            - Vai ser o pai do meu filho? – Ela esperou dois segundo para ver se obtinha uma resposta satisfatória. – Não? Então terei de procurar alternativas!

            Descer as escadas correndo fez Rachel ficar tonta mais uma vez. Definitivamente, bastavam os seus próprios problemas para deixá-la nervosa. Não podia ficar ali.

            - Eu não estou bem, Neal. – Sussurrou em seu ouvido. – Vou subir. Fiquei zonza.
            - Espera. Não vai subir escadas assim, sozinha. Eu vou me despedir deles. – Neal tentou, mas antes dele conseguir chamar a atenção de Ell e Peter, Rachel desabou desmaiada. Conseguiu apenas evitar que ela caísse no chão. – Rachel! EIEIEI Amor!

            O grito de Neal fez o casal que discutia perceber o que ocorria a sua volta. Ell correu para acudir a amiga. Ela e Neal trocaram um olhar revelador. Teriam de enrolar Peter. E estavam certos. Ele já estava desconfiado do estranho comportamento de Rachel nos últimos dias. Neal a carregou de volta ao apartamento.

            - Os desmaios da Rachel já estão se tornando rotina...eu vou solicitar que ela faça exames médicos. O Estado tem a tutela dela, enquanto detenta. Seria negligência minha se estiver doente e não receber tratamento. – Peter sempre pensava de acordo com a lei.

            Enquanto cuidava da namorada e fingia ignorar Peter, Neal pensava em como ia resolver isso. Sempre seria possível fazer com que Rachel fosse ao médico e fizesse exames, mas trocar os laudos por outros falsificados. Mas seria trabalhoso e Peter poderia descobrir. Melhor encontrar uma forma de tirar essa ideia da cabeça dele.

            Quando Rachel começou a abrir os olhos, estava tranquila. Não era mais uma ‘grávida de primeira viagem’ e lembrava de ter tido várias tontura e desmaios nos primeiros meses da gestação de George. Não havia nada de errado. O problema é que não podia dizer isso a Peter.

            - Relaxem! Não tenho nada. Só que estou sem comer há muitas horas...apenas isso.
            - É. Verdade, Rachel. Nós não tivemos tempo de almoçar. – Elizabeth confirmou a mentira.

            Não foi fácil enrolar Peter. Mas no final ele aceitou que não era necessário preencher uma pilha de formulários e enviar Rachel para fazer exames quando ela garantia que estava na mais perfeita saúde.

            A semana que se iniciaria prometia muito trabalho. Casos não faltavam e, agora, teriam que dar andamento a investigação de tráfico de pessoas. E uma notícia deixou Neal ainda mais chateado. Ao contrário do que esperava Henrique e o antigo supervisor de Rachel não tinham planos de coordenar a ação da Inglaterra. Eles ficariam ali. 

            - O mundo está de cabeça para baixo! – Mozzie bradou naquela tarde. Marcaram de se encontrar em uma praça pra esclarecer algumas coisas. – O Sr. Engravatado e Elizabeth em crise conjugal, engravatados europeus andando pela sua casa e nós na mais completa honestidade há mais de uma semana! É inaceitável!

            - É Mozzie...a vida não está fácil. E eu não faço ideia de como conto pra Peter que Rachel e eu seremos pais novamente.
            - Sua euforia pela gravidez começa a diminuir? É isso? – Mozzie conhecia Neal há muito tempo. Sabia que ele só agora percebia as complicações
            - É claro que não! Isso é ótimo! Só preciso encontrar apenas um meio do Peter também pensar assim.
            - É simples, Neal! É só não contar. Enrolem o Peter. Você e Rachel são mestres nisso!
            - Eu não acho que ele deixará de perceber a barriga da Rachel inchada, Mozz.

            Mozzie pensou por algum tempo. Seria complicado, mas podia dar certo.

            - Existem meios para disfarçar a barriga e, mesmo que ele descubra no final, se a Rachel estiver quase parindo quando descobrir, estamos no lucro...Neal...uma hora ele saberá. Vocês não precisam esconder eternamente, a Rachel não vai poder dar a luz e estar no FBI no dia seguinte. Alguma licença ela terá de tirar...nem que seja no presídio.

            - Ela surtará se voltar pra cadeia, Mozz. Eu não vou deixar ela passar por isso mais uma vez. Não.
            - Então vamos fugir. Quando não der mais para esconder de Peter, nós teremos de dar adeus a NY.

            Em meio a tantas dúvidas, a certeza com que Mozz afirmava que conseguiriam fugir era tranquilizadora. E ele deixava claro que iria junto. Mozz podia ficar em NY. Nada o impedia. E, mais uma vez, guiava seus planos, pelos caminhos dos amigos. Era maravilhoso isso.
            - Eu e você tudo bem. Já estamos acostumados. Mas com um bebê e uma grávida, provavelmente no final da gravidez, não será tão simples.
           


            - Sossegue Neal! Deixe comigo. – Ele sorria como quem tinha uma coleção de cartas na manga. – Curta a chegada do seu segundo filho. Quando chegar a hora de partir, terei os meios prontos, aguardando por nós. Por ar, por terra ou por mar, outra nação terá o prazer de hospedar-nos.

            Mais por necessidade do que por confiança, Neal conversou com Rachel e passou para ela os planos de Mozzie. Queria que ela se sentisse confiante, que aproveitasse aquela gestação. Queria que eles curtissem a chegada do segundo filho. Ela não teve nada disso antes e, se passasse os próximos meses nervosa com a perspectiva de voltar ao presídio, novamente não viveria as coisas boas de se gerar um filho. Não ia permitir isso.

            Estavam deitados na cama conversando.

            - Eu não queria fugir, Neal. Apesar de não gostar do FBI, eu me acostumei. Não queria ter de fugir, obrigar o George a viver escondido. – Ela lhe disse abraçando-o.
            - Vamos esperar pelo futuro. Talvez não seja necessário. – No fundo ele sabia que era muito difícil. – Se Peter descobrir quando você já estiver para dar a Luz, ele pode afastá-la apenas por alguns dias, uma licença...uma prisão domiciliar. Ele se acostumou a ter George por perto. Outro bebê não irá incomodá-lo.

            Ela sorriu. Estava mais doce e sonhadora.

            - É. Quem sabe. – O desejo começava a crescer nela. – Essa ‘Diaba Ruiva’ aqui está precisando de você.
            Neal riu da expressão.

            - O Mozzie te falou disso? – Ela apenas confirmou com um aceno. – Não ficou chateada?
            - Não...achei muito apropriado. – Rachel beijou-o com paixão. Pareceu querer sugar toda sua energia. – Desde que você continue aqui, comigo, a ‘Diaba’ estará mais que satisfeita.

            Neal sorriu e observou-a. Era uma mulher apaixonada por natureza. Estava, nesse momento, fervendo de desejo por ele. E não ia se negar a satisfazê-la. Foi abrindo sua blusa lentamente enquanto ela o agarrava com ânsia e agilidade. Até nisso ambos se completavam.

            - Diaba ruiva e gostosa pra caramba! – Sussurrou em seu ouvido. Definitivamente, o apelido criado por Mozzie tinha pegado entre o casal.

Essa noite pareceu ter um sabor diferente. Era um amor tranquilo, familiar e, ao mesmo tempo, com uma paixão incendiária.
           
            A investigação do caso de tráfico de pessoas começou pela família da menina a que Edbert Shepherd se referia. Tratava-se de um jovem casal de classe média alta. Sophia foi adotada ainda bebê e criada por eles desde então. Acabara de completar cinco anos e era uma menina esperta e bem educada. Nunca houve denúncias de maus tratos contra a menina que aparentava ser uma criança feliz.

            - Eu não concordo com cogitarem tirar essa menina dos pais quando sempre foi bem tratada. Sophia vai sofrer desnecessariamente. – Rachel se revoltou.
            - Se os pais forem criminosos, não devem ficar com ela. – Peter respondeu sem pensar. – Desculpem...Rachel, Neal eu...não quis...ofender.
            - Deixa pra lá Peter. – Neal respondeu. Ambos sabiam que Peter esquecia da relação estranha que eles mantinham. E uma coisa mantinha Neal tranquilo. Se algum dia a polícia cogitasse afastar George deles, sumiriam pelo mundo no instante seguinte. Não havia hipótese de ficarem longe do filho. – Mas acho que temos de pensar em preservar Sophia. Ela não tem culpa de nada.
            - Eu concordo. – Peter não gostava de crianças, mas faria algo para se certificar que não errariam naquela operação. – Nós iremos até lá, Neal. Vamos conversar com os pais de Sophia.
            - Com que pretexto entraremos lá?
            - Com o real! Vamos deixá-los com medo. Diremos que estamos investigando a adoção de Sophia e pediremos os documentos. Vamos conferir como é que a garota vive e descobrir até que ponto os pais estão envolvidos no esquema.

            Assim, Neal e Peter foram até a casa de Patrick e Mariah Walker. Casal bonito e simpático, os receberam bem e não manifestaram medo ao ver o distintivo do FBI. Antes de falarem do que se tratava a visita, Sophia apareceu e sentou-se ao lado de Peter. Era uma garotinha muito falante e curiosa.

            - Olá! Sou a Sophia! Quem é você?



            - Me chamo Peter.  É muito bonita a sua casa. – Ele queria que a menina falasse para ter certeza de que era uma criança saudável e bem criada. Aparentemente os relatórios estavam certos.
            - É bonita sim...mas a casa das minhas bonecas é mais bonita. Você quer conhecer?
            - Talvez mais tarde. – Já estava com vontade fugir da menina. Crianças não deveriam ser tímidas com estranhos?
            - Todos os dias às 5hs nós fazemos o chá das bonecas. Você pode participar. – A menininha o convidou.
            - Nos sentiremos honrados em participar. – A resposta foi de Neal. Ele viu que Peter não sabia como dizer não sem magoar a menina. – Mais tarde. Agora precisamos falar com seus pais.
            - Filha, vá brincar no seu quarto. Sim? – Mariah lhe disse e garotinha logo saiu. – Desculpem. Ela é sempre assim. Quer que todos participem de suas brincadeiras.
            - É...bom. – Peter resolveu ser direto. Queria ver a reação deles. – É sobre Sophia que viemos falar. Sabemos que ela foi adotada e recebemos denúncia de que ela fez parte de um esquema de tráfico de menores.

            A reação foi mais dura do que esperavam.

            - Saia da minha casa! Agora! – Patrick gritou. – Nossa filha foi adotada na mais perfeita legalidade. Não admitirei que venham cavar podridão na história dela. Rua! Agora!
            - Acho melhor se acalmar, Sr. Walker. É o melhor que faz. Se tudo foi realmente legal, poderá provar e...
            - Tem um mandado judicial para estar aqui? – Mariah questionou.
            - Não, não tenho. Vim apenas conversar.
            - Então nossa conversa terminou. Adeus, Senhores.
            - Eu diria que é um até logo. – Foi a resposta de Peter ao sair acompanhado de Neal.

            A ação esteve longe de ser um fracasso. Era verdade que não tinham um mandado de busca, mas tinham a autorização de um juiz para grampear os telefones da família. Por isso, no instante que deixaram a casa da família, o FBI passou a controlar o que Patrick e Mariah fizeram. Queriam ter certeza do que eles fariam ao saber que a adoção da filha estava sendo investigada.

            O normal seria contatarem um advogado e reunirem provas da adoção da menina. Mesmo que ela tivesse sido roubada na Europa, hoje, dificilmente seria retirada deles se comprovassem que não participaram do golpe. Isso seria o que qualquer advogado lhes diria. Mas não foi para um homem da lei que eles telefonaram.

            A gravação foi muito clara.

            - Você nos garantiu que nunca teríamos problemas! Nunca! Como agora o FBI está batendo na nossa porta. Sophia é nossa. – Mariah bradou ao telefone menos de uma hora depois.
            - Deixe de bobagem! Pode não ser nada. Vocês sabiam dos riscos quando ficaram com ela. A garota era para seguir o mesmo caminho das outras crianças, mas você e Patrick quiseram ficar com ela. Deixaram um rastro. Não venham reclamar! – O homem do outro lado da linha não tinha laço afetivo algum com Sophia.
            - Ela é minha filha! – Mariah estava desesperada. – Eu não vou perdê-la. Não vou! Eu entrego todos vocês. Ouviu bem! Eu acabo com vocês!
            - Não me ameace. Você não sabe do que sou capaz, Mariah! Antes de você conseguir me ferrar eu complico a vida de você e de Patrick tanto que nunca mais colocarão os olhos em Sophia. Pense muito bem antes de entregar o esquema pro FBI. A sua pequena filha é que pode sofrer. Quem sabe quando você estiver presa eu não a vendo para outros. Esse era para ter sido o destino dela desde o início mesmo. – O homem era frio e cruel.
            - David...por favor...eu não quero perdê-la. Claro que não quero estragar tudo, mas...- O homem desligou o telefone e o FBI ficou apenas com o primeiro nome do integrante da quadrilha e uma fraca indicação de que o casal participava. Era pouco.

            Era fim de tarde e Peter analisava a situação antes tomar uma decisão. Não tinha pressa de ir para casa mesmo Ninguém além do cachorro o aguardava. A situação era muito complicada. O FBI continuava monitorando, mas ele não sabia como agir. Poderia fazer uma denúncia contra os Walker. Eles perderiam temporariamente a guarda da filha, mas logo estariam na rua. As provas eram muito frágeis. Deixar correr era melhor. Só assim poderiam chegar ao tal David e o restante da quadrilha.
            - Peter! – Neal chamou da porta. – Eu e Rachel já vamos. Você vai ficar?
            - Sim. Vou. Acho que escreverei um relatório a MI5 sobre a evolução do caso. – Era apenas uma desculpa.
            - A Rachel resolveu fazer um risoto de frutos do mar. Quer saber se você deseja jantar conosco.
            - Não estou num bom dia, Neal. Melhor não. Boa noite e bom jantar pra vocês.

            Jantaram apenas os dois. Uma refeição calma e deliciosa enquanto observavam George brincar sobre o tapete da sala. A vida a três podia funcionar perfeitamente. Era raro uma noite assim, mas existia.

            - Feliz? – Neal perguntou lhe acariciando os cabelos.
            - Muito. – Ela olhou para a vista de NY que tinham da janela. – Não sei por quanto tempo mais teremos isso. Então resolvi aproveitar.
            - Não, não, não. Sem tristeza por hoje. Peter nem desconfia.
            - Sim. Mas está só começando. Não vou conseguir esconder quando a barriga começar a crescer. Eu fiquei redondamente enorme enquanto esperava George. A partir do 5 meses cresce muito Neal. Não é algo para se esconder. Sem falar que eu sentia muita fome. Como as pessoas à minha volta não perceberiam? E como me esquivarei de missões que forem arriscadas demais?
            - O bebê vai crescer o que tiver que crescer. Você, obviamente, vai ter de se alimentar. E claro que não vai se arriscar. Isso não está em discussão. Quando não tiver como esconder, nós fugiremos. Mas não quero que fique se preocupando. Deixe isso para eu e Mozz.
            - Acho que fui independente demais a vida inteira pra concordar com isso, Neal.
            - Não está mais sozinha. – Ele a beijou para intensificar o que iria falar. – Vamos resolver tudo. Confia em mim. Você seguirá no FBI enquanto for possível. Estamos indo bem. Ninguém além de Ell notou.

            Em menos de meia hora, no entanto, o argumento de Neal foi derrubado. Já passavam das 10hs da noite quando Nicolle apareceu. Ela olhou-os calmamente. Parecia esperar que eles falassem. Neal e Rachel apenas se olharam.

            - Mamãe...tudo bem? – Rachel questionou.
            - Claro. Muito bem. – Ela lhe estendeu uma sacola. – Vim lhe trazer um presente.

            Desconfiado, Neal observou sua namorada abrir o pacote e tirar de lá três babeiros infantis. Era lindo. Mas Rachel não sorriu olhando o presente. Provavelmente porque George já estava bem próximo de não usar mais babeiros. Não era o tipo de presente que faria Nicolle aparecer ali naquele horário.


            Rachel encarava a mãe calada. Preferia não dizer nenhuma palavra antes de ter certeza. Já Nicolle esperava que eles lhe dessem a notícia.

            - Estou esperando. – Ela avisou. – Falem logo! Digam que serei avó novamente!
            - Foi tão óbvio assim? – Rachel perguntou.
            - Não. Mas eu sou sua mãe. – Nicolle abraçou a filha e depois o ‘genro’. – Parabéns! Mas eu não gostei nada de saber depois da Elizabeth Burke! Sou a avó!
            - Ela descobriu, mãe. Eu não contei. – Rachel tinha os olhos cheios de lágrimas. – Veja! Começou! Eu já estou chorando por nada novamente!
            - Por nada NÃO! Vai ser mãe novamente! Isso não é nada! Mais um neto que felicidade! – Ela olhou seriamente para Neal. – E você! Cuide bem dela! E de meus netos!
            - Pode deixar. – Neal sorria satisfeito. Era bom ver alguém tão eufórico quanto ele. – Eu não vou desgrudar dela dessa vez.

            Nicolle os observava e via o quanto eram bonitos juntos. George já estava em seu berço dormindo, mas era o amor por ele que os uniu. Agora um segundo filho faria bem para eles. Viveriam aquilo juntos. Mas Nicolle não foi ali apenas para levar o presente. Tinha também de cuidar de questões práticas. Ela pegou um cartão de dentro da bolsa e entregou para Neal. Depois explicou.

            - Se Rachel está escondendo a gravidez, imagino que não vai a um hospital qualquer. Eu entendo. Mas liguem para Richard e marquem uma consulta. – Ela encarou Neal. – Estou entregando para você o número dele. Porque ela vai dizer que está bem e não precisa. Richard cuidou de Rachel na gravidez de George e cuidará novamente se ela pedir. E manterá segredo.

            - Mãe! Ele mora longe! Não precisamos incomodar o Dr. Richard.
            - Ela está certa, Rachel. Nem sabemos exatamente quantas semanas você tem. Alguém terá que te atender. Melhor que seja alguém de confiança. Vou ligar para ele e nós vamos encontrar um lugar discreto onde você faça o acompanhamento. E tem que ser próximo por causa do sinal da tornozeleira.

            Nicolle ficou satisfeita ao ouvir Neal falar. Ele lhe pareceu um homem responsável. A vida familiar fez bem àquele garoto. Quando ia saindo lembrou-se de perguntar uma coisa.

            - Falou com Henry recentemente? Ele me ligou esses dias pra perguntar de você.
            - Não. Nós estamos brigados. – Rachel surpreendeu a Neal também.
            - Ligue pra ele filha. Aquele é o amigo mais fiel que você poderá ter.

            O orgulho era mais forte. Ela não ia dar o braço a torce e correr atrás de Henry. Ele que errou. Ele que a procurasse.

            - Um dia mãe. Um dia. – Deu uma resposta vaga.

            Três dias se passaram e a Divisão de Colarinho Branco foi sacudida por uma notícia. A casa dos Walker havia sido invadida por três homens disfarçados de entregadores. O casal havia sido morto com um tiro na cabeça cada um.

            - E Sophia? – Esse foi o primeiro pensamento de Peter. Aquela criança tão doce havia ficado órfã pela segunda vez na vida.
            - Estava na escola. Será levada para um abrigo. – Jones disse.

            Perder vidas em um caso sempre aborrecia a equipe. Nesse caso ainda trouxe problemas com a MI5. Eles consideraram com o FBI se precipitou ao ir a casa dos suspeitos e, ao assustarem o casal, colaboraram para o desfecho trágico. Não foram feitas críticas abertamente, mas as agências tiveram sua relação estremecida. E isso era ruim para Peter, Rachel e o acordo que possuíam.

            Como já era de costume quando as coisas ficavam realmente complicadas, Stone lhe telefonou. Peter não gostou nada do rumo do assunto.

            - O quanto Rachel Turner é importante na sua equipe, Burke?
            - Muito. E você sabe! – Era difícil para ele assumir isso. Reconhecia que ela dava 100% de sua capacidade em cada caso. – Foi você, Stone, que a trouxe, lembra? No caso de Ruan Rodrigues! Eu não queria que se tornasse um acordo definitivo e você insistiu nisso. Hoje tenho de reconhecer que ela é parte fundamental na minha equipe!
            - Eu acompanho seus números, Peter. Sei que ela vem trabalhando bem e que ela segura o Caffrey conosco...mas...também sei que esse acordo me custa muito com a MI5.
            - Eu sei. O agente Edbert Shepherd esteve aqui e fez solicitações e ameaças. Só que preciso lhe afirmar: são questões pessoais que o motivam. Ele foi parceiro do pai dela!
            - Eu não ligo para as ‘questões pessoais’ do Edbert Shepherd. Ele é pouca coisa perto das encrencas da Turner. Tem muita gente grande na MI5 disposta a dar um braço pra ver ela presa por lá. Eu te liguei para falar que erros como o que houve na ‘operação Walker’ não podem ocorrer mais. Você errou, Peter! E errou justamente com a MI5! Coloque essa operação nos trilhos novamente ou Turner será entregue a eles.
            Peter decidiu não dizer nada para ninguém sobre sua conversa com Stone. Não ia adiantar. O melhor que tinha a fazer era trabalhar. Isso sim ia ajudar Rachel. Passou aquela madrugada analisando o caso e as possíveis ações que poderia ter, seus riscos e suas vantagens.
           
            O que Neal Caffrey tinha para fazer naquela manhã era uma das piores tarefas que já teve nas mãos. Era arriscado e exigiria 100% de sua habilidade de convencimento por oratória e charme. Também seria um gigantesco teste de confiança. Ele estava prevendo um dia terrível. Definitivamente corria riscos fatais.
            - Bom dia, amor. Tudo bem? – Rachel passou por ele na cozinha para pegar café e notou que ele não lhe tirou a xícara das mãos e lhe serviu chá como de costume. – O que há, Caffrey?
            - Nada.
            - Você está me escondendo algo, Neal Caffrey! E é bom falar.

            Neal avaliou. Seria melhor cumprir sua missão agora e ter Rachel mal humorada o dia todo ou enrolá-la e tê-la muito mal humorada a noite? Resolveu arriscar e cumprir sua difícil missão desde já. Quem sabe ele não estava sendo exagerado e sua namorada teria a grandeza de entender o que se passava e aceitar tranquilamente?

            - Sara me ligou. – Disse num fôlego só.
            - É...interessante. – Os olhos demonstraram mais raiva e ciúme do que tranquilidade.
            - Ela me convidou para jantar.

            Rachel largou a xícara sobre a pia e cruzou os braços a frente do namorado. Não disse nenhuma palavra. Apenas o encarou.

            - Eeee tudo bem? Não vai falar nada?
            - Depende! Depende MUITO. Qual foi a sua resposta, Caffrey?!?!
            - Rachel! Que ciúme bobo! Ela é apenas uma amiga e...eu não podia dizer não. Você consegue entender, por favor. Não precisamos brigar por isso!
            - Você não podia dizer não? Ou não quis dizer não? Sua amiguinha convida VOCÊ para sair e eu devo entender? Você acha que sou idiota, Neal? Se está com vontade reatar com aquele esqueleto ambulante, é só falar! Você não está amarrado a mim! Fique com ela!
            - A não...Rachel pare! Ela é minha amiga. Que palhaçada esse ciúme! – Ele não tinha argumentos para uma reclamação tão idiota. Não sentia nada pela Sara. 

            Mozzie entrou e sentiu o clima ruim. Pegou discretamente uma garrafa de vinho e saiu para a varanda. Seus amigos não tinham começado bem o dia. Ele ficou ouvindo para entender a discussão. Eles falavam do jantar que Sara queria ter com Neal...ele pagava o preço por anos agindo como pegador convicto.

            O celular de Rachel tocou fazendo com que parassem de discutir. Rachel falou rapidamente com alguém. Parecia marcar um compromisso. Seu tom de voz melhorou muito. Ficou até bem animadinha. Feliz. Quando ela se despediu até mesmo Mozzie estava curioso para saber com quem ela falara.

            - Ótimo, Caffrey! Marque seu jantar para hoje a noite com Sara! Façam bom proveito! – O tom era uma ameaça clara.
            - Porque mudou de ideia? – Neal não gostou nada disso.
            - Nada de especial...apenas percebi que um jantar entre amigos não representa nada de mau. – Ela sorriu de um jeito que assustou Mozzie. Rachel estava armando alguma. – A ligação também me fez ver como estava errando.
            - Com quem você falou? – Neal perguntou já desconfiado de que não gostaria da resposta.
            - Era Henrique! Ele estará de folga hoje a noite da MI5. E me convidou para jantar. Como pode ver, querido, nós dois teremos inocentes jantares com amigos. Lindo, não acha?

            Neal apertou tanto seu maxilar que pensou que fosse quebrar seus dentes. Teria que engolir aquilo calado se não quisesse passar por ridículo. Afinal, como negar a Rachel o jantar com Henrique se ele estaria jantando com Sara? Mas não queria aquele cara por perto. Não!

            - Isso é uma retaliação infantil, Rachel. – Não se importou em ser ridículo e reclamou assim mesmo com ela.
            - Não, não é retaliação. É um jantar. Só isso! – O sorriso inocente contrastava com o olhar raivoso.

            Vendo que aquilo não daria certo e pensando que George e o bebê que estava a caminho mereciam pais inteiros e unidos, Mozzie interferiu.

            - Façam um jantar coletivo e em família: Vocês, Henrique e Sara. E chamem os engravatados. Assim eles se acertam de uma vez! – Quem diria que Mozzie seria a pessoa mais sensata do apartamento?

            Eles seguiram o conselho de Mozzie. E o apartamento de Neal foi palco de um jantar entre casais e amigos. A verdade é que ninguém naquela mesa estava completamente feliz. Quando Henrique ligou e convidou Rachel para sair, imaginava apenas os dois em uma mesa de barzinho qualquer. Queria uma chance de conquistá-la. Aquela mulher mexia com ele há muito tempo. E agora estava na casa dela, mas Rachel, mesmo enquanto conversava com ele, não tirava os olhos do namorado que falava com outra moça muito bonita.

            Sara também estava muito mais que descontente com o programa. O convite era para Neal vir jantar em sua casa. Pensou que tinha sido clara o bastante! E ele marca um jantar a seis! Para completar, Rachel fazia seu joguinho de ciúme e Neal não tirava os olhos dela. Era capaz dele não se lembrar de uma palavra do que havia lhe dito.

            As duas não faziam nenhum esforço para que a paz fosse selada. Quando comiam a sobremesa, Sara tentou fazer um comentário agradável, mas não resistiu a uma pitada de veneno e Rachel não deixou barato. Logo estavam trocando farpas.

            - Você cozinha muito bem, Rachel. Estava tudo delicioso. – Disse a visitante. – Não me estranha que tenha engordado um pouquinho.
            - A vida é muito curta pra gente passá-la contando calorias, Sara. Eu prefiro contar orgasmos. – Ela lambeu a colher cheia de chocolate e finalizou com mais uma ferroada. – Dizem que ‘a gente é o que come’ e Neal costuma falar que eu sou muito gostosa. Apropriado, não acha?

            A próxima garfada do doce desceu como uma pedra no estômago de Sara. Neal olhava para a cena com um misto de orgulho e medo. 


Estava adorando ver as duas trocarem provocações por causa dele. Isso era prova de que Rachel não tinha interesse algum por aquele agente europeu que agora a cercava.  O medo era que garrafas passassem a voar contra as paredes em alguns minutos. Ell interferiu a seu favor:

- A Rachel cozinha muito bem. E eu tenho que te pedir essa receita de molho madeira, mas esse doce quem a ensinou a fazer fui eu. Se quiser a receita eu te passo, Sara. – Elizabeth disse.
- Claro, claro. – Esse realmente não era um interesse da executiva de seguros.

Para Ell e Peter o jantar também não estava sendo um sucesso. Elizabeth planejava encontrar uma forma de convencer o marido a voltar na decisão e lhe dar um bebê. Nada! No meio de tantos convidados, não conseguiu falar com ele. E sentia a falta do marido. Começava a pensar que ele jamais mudaria de ideia e que, além de ficar sem o filho, perderia Peter também.

Ele também estava infeliz e tudo o que desejava era terminar aquela noite levando a esposa de volta pra casa. Quando a mesa já estava sendo retirada, ele se aproximou de Ell e lhe disse que precisavam conversar.

- Sinto sua falta. – Sussurrou em seu ouvido.

Rachel observou a cena e achou que podia dar uma ajudinha para sua amiga. Colocou uma música lenta de fundo e foi até Neal. Pensava que, além de ajudar Ell e Peter ainda conseguiria mostrar a Sara que não devia convidar seu homem para jantares às sós.

- Peter, Ell...não sei vocês, mas eu pretendo dançar essa noite. – Enlaçou Neal pelo pescoço e dançou lentamente.

Neal se deixou levar pela música nos braços da namorada e adorou poder fechar os olhos e esquecer que não estavam sozinhos. Alguns momentos depois, no entanto, lembrou-se que eles eram os anfitriões e não podiam abandonar os convidados.

Uma olhada ao redor e percebeu que tudo correu bem enquanto eles se desligaram do mundo. Peter e Elizabeth dançavam coladinhos e pouco se mexiam. Estavam se acertando. Henrique tinha feito o que se esperava dele e chamado Sara para dançar. Eles estavam um pouco mais afastados, mas ficavam bem juntos. Talvez aquele jantar pudesse enfim terminar bem.

Quando a música acabou e o aparelho ia passar para outra faixa, os casais de afastaram. Todos pareceram voltar ao lugar onde se encontravam. Peter beijou Ell, Henrique se afastou de Sara e Neal foi buscar uma garrafa de vinho.

Quando voltou a varanda, Neal encontrou Henrique muito próximo de Rachel. O agente parecia mesmo disposto a achar confusão! Eles só conversavam. Nada demais. Mas Neal percebeu quando ele ia convidar Rachel para uma dança. De relance, viu Sara observar a cena também. Se sua namorada começasse a dançar com o amigo, a título de provocação ele poderia muito bem dançar com Sara. Era isso que sua amiga esperava que ele fizesse.

- Me concede a dança? – Henrique disse a Rachel.
- Se ela concede, eu não sei, mas EU não concedo a namorada. – Neal interferiu em voz bem baixa. Só eles ouviam. Resolveu que já estava velho e cansado demais para esse joguinho de ciúme. Não ia permitir que Henrique se aproximasse de Rachel nem ficar usando Sara. – Se quer um conselho, Henrique, há outra dama bela, interessante e inteligente nessa sala. E ela está disponível. A minha namorada não!

O recado estava dado com todas as letras. Era bom o rapaz entender. E Henrique colaborou o resto da noite.

Eles voltaram a sala para conversar e tomar alguns drinques e o clima já era bem mais agradável. Rachel e Ell beberam sucos enquanto os outros continuaram no vinho. Conseguiram os seis conversar sem provocações e todos prestando a atenção na conversa, sem cuidar o que o parceiro estava fazendo. Infelizmente, o assunto FBI acabava sobressaindo mesmo em um momento de folga. E o atual caso envolvendo MI5, tráfico de crianças e a doce Sophia virou assunto da conversa.

- Vejo que a menina preocupou a todos. – Henrique comentou. – Gostam de crianças, parece.

Todos se olharam. Criança era um tema que despertava simpatia em qualquer pessoa e, com George já dormindo calmamente em seu berço e sempre alguém indo espiar para ver se ele não havia acordado, era uma constatação fácil de ser feita. Sim, todos ali gostavam de crianças. Ou, como Peter, mesmo que não soubessem lidar com elas, desejavam seu bem.

- Acho que sou o único que não tem muita facilidade com elas. – Peter brincou.
- Único não, Peter. – Sara também disse. – Eu não faço ideia de como se cuida de uma criança. São barulhentas demais, agitadas demais e bagunceiras demais. Não saberia cuidar de uma criança.
- O dia que você as tiver, Sara, aprenderá. – Neal respondeu. – George nos ensinou como cuidar dele. Não é, Rachel?
- Sim. Eu acho que cada criança é diferente. – Para ela e Neal aquela conversa tinha um significado especial. – Cada bebê trás novos problemas e novas alegrias.
- E a gente os ama cada dia mais. – Ele completou.

Os outros dois casais a mesa não entenderam o que eles diziam, mas respeitaram o laço de amor que havia ali.

- Pena que em todo esse caso, quem sofrerá será Sophia. Os pais biológicos estão mortos há meses e os adotivos agora também foram assassinados. Ela ficará em um abrigo sei lá quanto tempo. – Henrique falou tristemente. – Isso me deixou mal. Às vezes tenho vontade ir ao abrigo e pegá-la. Mas levar par um hotel é ruim. E ela sofreria mais uma perda quando eu voltar para Inglaterra.

- O que ela precisa? – Sara perguntou.
- Uma família. Mesmo que provisória. Só enquanto a investigação não termina e ela entra definitivamente na lista de adoção.
- É...bom...isso é algo que eu não tenho a oferecer. – Sara sempre foi sozinha. Não tinha família.

Mesmo sem querer, todos olharam para Ell e Peter. Eles eram a família estável que Sophia precisava. E essa era a oportunidade que Elizabeth precisava para voltar para casa e provar a Peter que os Burke podiam criar uma criança.

- Eu fico com ela. – Decretou Elizabeth.
- Eu posso saber onde? Na casa da sua amiga? – Peter provocou.
- É claro que não. – Ell sorriu. Agora vinha a melhor parte. – Na nossa casa! Pelo que entendi Sophia precisa de uma família. E isso inclui pai e mãe. Quando disse que eu ficarei com ela, você estava incluído no plano, Peter Burke.

O que Peter podia dizer? Queria Ell em casa e, pelo que se lembrava de Sophia ela era uma menina agradável e esperta. Não seria um preço tão alto a pagar. Desde que ela entendesse que era temporário.

- Está bem. – Ele cedeu. – Eu vou requisitar a guarda temporária da menina, Ell. Mas é provisório. Você entende isso? Ela não é nossa filha! Ela é uma hóspede mirim na nossa casa.
- É claro que eu entendo, querido. – Ela respondeu. Mas algo dizia a Peter que não era assim.
- Bom...quem sabe nós vamos embora agora. Passamos na casa da sua amiga e você pega suas coisas então?
- Ok. Vamos! – Ela não podia terminar a noite mais feliz. Ao sair Elizabeth ainda fez um convite pra Rachel. – Irei as compras essa semana. Precisarei transformar o quarto de hóspedes em algo bacana para uma menina de 5 anos. Estou cheia de ideias. Me acompanha?
- É claro! – Rachel respondeu.

Henrique e Sara também foram embora e ao fechar a porta Neal e Rachel tinham duas certezas:

- Não será provisório. A Ell nunca vai conseguir dizer adeus a menina! – Rachel disse.
- Peter Burke pai de uma garotinha de 5 anos! Será legal de ver isso! – Neal sorria só de imaginar.