domingo, 6 de abril de 2014

Dupla Perseguição - Capítulo 38





Neal observava Rachel com apreensão. Que ela não estava agindo de forma normal já sabia, mas não esperava que ela fizesse o que fez. Passou dias sem ir vê-lo. Mozz e Peter lhe davam desculpas inacreditáveis. Aí foi informado que sua companheira havia solicitado uma visita íntima. Ficou feliz...achou que poderia tê-la novamente em seus braços e resolver qualquer problema que estivessem vivendo, mesmo que esse tenha surgido sem que ele entendesse o motivo.

Recebeu-a de braços abertos, fingindo não ver o olhar preocupado. Rachel não estava agindo normalmente. Mesmo assim, a grande preocupação veio quando ela o afastou e disse que desejava conversar tendo privacidade. Já tinha visto esse filme e o final não tinha agradado.

- Fala Rachel...o que é tão grave para você me afastar assim?
- Afastar??? Eu não me afastei de você. – Não era dessa forma que ela tinha planejado a conversa.
- Como não? Rachel! Você sumiu! E agora, eu fui te dar um beijo e você me afastou.

Se antes já era difícil falar, agora, vendo o quanto ele estava irritado, pior ainda. Rachel repensou sua decisão e resolveu contar novidade em outra oportunidade.

- Eu...eu estou nervosa, Neal. Essa situação toda mexeu comigo. É só isso. – Percebendo que ele não acreditava, achou melhor mudar de assunto. – Eu queria falar com você sobre o nosso plano. Está tudo armado...a Alex já...

Neal se aproximou repentinamente, cortando qualquer coisa que ela fosse dizer. Beijou-a longamente, extravasando a ansiedade que sentia.

- Isso tudo eu posso conversar com o Mozzie...então...se era por isso que você precisava de ‘privacidade’, acho que consigo pensar em outras atividades pra nós gastarmos esse tempinho que temos aqui.
 
Rachel aceitou seu beijo, abraçou-o, passou a mão em seu peito, mas, depois, afastou-o mais uma vez.

- Não...não consigo Neal...não sabendo que do outro lado da porta tem um guarda...me desculpe.

Observando-a sem dizer nenhuma palavra, Neal aceitou que não haveria sexo naquela tarde, infelizmente. Isso, porém, não significava que Rachel iria embora sem dizer exatamente o que veio fazer ali. Ia pressioná-la para saber do que se tratava. Talvez fosse apenas algum problema com o FBI.

Porém, Rachel caminhou rapidamente até a pia que havia junto a uma das paredes do quarto e, abrindo o registro d’água, umedeceu as mãos e levou-as a nuca. Ela fechou os olhos e respirou profundamente.

- Droga! – Disse ao abrir os olhos e vê-lo ao seu lado, observando-a. Estava atento a ela. – Eu não me sinto bem, Neal...acho melhor eu voltar amanhã...e...

- Enjoada novamente? Eu lembro de uma vez em que você enjoou muito e teve desmaios. Eu não estava com você. – Será que poderia ser o que ele estava pensando? Não, claro que não. George era tão jovem...mas era uma possibilidade. E seria uma explicação para ela estar tão estranha. – Rachel...por que você está enjoando tanto?
- O que? Não sei eu...estresse. Só isso. – Mas a expressão dela dizia que havia algo mais. Agora sabia ver uma mentira nos olhos dela. – Melhor eu ir pra casa.
- Não...ainda não. Vamos esperar você se sentir melhor. Vem aqui. – Ele pegou-a pela mão e levou até a cama. Não iam usar para transar, mas podiam ficar juntos por algum tempo. Ele deitou e a puxou para seus braços. Esperou alguns minutos e levou uma das mãos à barriga dela. – Realmente não tem mais nada para me contar?

Rachel olhou-o. Lá estavam, em uma cela disfarçada de quarto, deitados nos braços um do outro, prestes a ter uma das conversas mais importantes de suas vidas. Não queria falar ali, não queria contar que estava esperando um bebê, não dentro de um presídio. Mas algo lhe dizia que Neal não precisava de uma notícia e sim de uma confirmação. Ele sabia. Estava apenas buscando uma confirmação.

Tentou ser o mais doce possível. Poética, talvez. Algo de normal aquela situação deveria ter. Perguntou-se como qualquer mulher responderia ao pai do seu bebê. Optou pelo mais óbvio. Cobriu-lhe a mão com a sua, sobre o ventre e, mesmo não necessitando de nenhuma explicação maior, disse:
- Parabéns, papai! – O tom era um misto de felicidade e sarcasmo.

Rachel não estava preparada para a reação de Neal. Esperava choque, surpresa, pânico, uma raiva contida ou uma felicidade discreta. O brilho de seus olhos fez tudo desmoronar. 

Ele demonstrou uma felicidade tão sincera, completa e capaz de desprezar qualquer outro problema, que, sem perceber, ela passou a sorrir também.

- Você...gostou. – Ela expressou a surpresa que sentia. – Gostou mesmo. Diz alguma coisa, Neal.
- Precisa? Amor...eu...eu estou mais que feliz, eu estou aliviado. Você tem noção de todas as coisas ruins que eu pensei? A última vez que eu estive preso e minha namorada disse que precisávamos conversar, ela me avisou que não queria mais nada comigo. Foi embora. E eu fiquei apenas com uma garrafa de vinho vazia como recordação. Eu pensei que você estava me deixando, Rachel, que eu ia ficar sozinho novamente. E você me diz que a família vai aumentar. Não é uma notícia ruim. É uma notícia maravilhosa.

‘Maravilhosa’ não exatamente a opinião dela. Mas era impossível não se tocar olhando o largo sorriso que Neal trazia no rosto. Ele ficava ainda mais bonito assim. Ela voltou dois anos na memória. Nessas lembranças também estavam ela e Neal. Também havia um presídio. E também havia uma gravidez inesperada. Só que na lembrança Neal não lhe sorria assim. É, ele estava certo. Aquela não era uma notícia ruim. Eles já tinham vivido coisas muito piores e conseguiram superar.

- Nós somos férteis demais! O George é apenas um bebê! – Era um misto de reclamação com brincadeira.
- O que esperar de uma Afrodite, a Deusa do amor e da fertilidade, e de Neal Caffrey?
- Você está se exibindo! Está achando lindo ter me engravidado novamente! – Agora a raiva já estava voltando. – Sim, claro! Típico comportamento de um homem!
- E você queria que eu me comportasse como? Mulher?– Ele achava engraçado o nervosismo dela.
- Claro que você está felizinho assim, bancando o garanhão fértil! Não é você quem vai engordar uns 15 quilos, não é você quem vai ter estrias, não é você quem vomita todas as manhãs, não é você quem sentirá dor nas costas! Não é você quem sentirá as dores do parto!

A voz dela foi aumentando de volume e Neal percebeu que ela estava a ponto de surtar, Nervosa demais. Por algo que ele não considerava tão importante.

- Para tudo isso, eu estarei do seu lado. – Neal a fez se sentar e olhou em seus olhos. -  Não vai ser como com o George. Nós estamos juntos. 

Mas isso não aliviou o desespero dela. A tranquilidade dele a deixava mais nervosa. Sem conseguir expressar a razão de sua preocupação, Rachel começou a chorar. Malditos hormônios!

–E, principalmente, não é você quem vai quem vai voltar pra cadeia assim que seu supervisor descobrir que está grávida e não serve mais para o FBI!!!!

Ela chorava, gritava e falava ao mesmo tempo. Essa explosão era muito mais típica de Rachel do que o silêncio contido com que ela entrou no quarto. Essa era Rachel Turner. Porém, sentiu um arrepio percorrer-lhe a espinha ao entender o motivo de todo aquele nervosismo. Rachel estava com medo de voltar para a cadeia, de ser obrigada a dar a luz estando presa.

- Você não entende! – Ela continuou. – Eu não podia estar grávida novamente. Foi irresponsabilidade minha! Esse bebê vai me devolver para prisão! E eu vou ficar longe do George novamente. É como se eu estivesse escolhendo entre os dois. Pra ter meu bebê, meu outro filho ficará longe de mim. E eu vou colocar outra criança no mundo para sofrer isso tam...
- Chega, Rachel! – Abraçou-a o mais apertado que conseguiu. Calou-a pela surpresa. – Espera. Não se desespera assim. Eu entendi o que está te deixando assim, mas não precisa ser desse jeito. A gente têm alternativas.
- Quais?
- Nada nos garante que o FBI te devolverá para o presídio. – O olhar de Rachel deixou claro que esse não era um bom argumento. – Ok, eu sei que o Peter não te deixaria na equipe e que eles não veriam sentido em te deixar em serviço administrativo. Mas nós podemos fugir.
- Você e o George não precisam se tornar fugitivos porque eu compliquei tudo. – Ela continuava em prantos.
- Preciso te explicar que eu e George também somos da família desse bebê aí? Nós somos uma família, Rachel. Se precisarmos fugir, fugiremos. – Ele beijou-a. – Agora fica tranquila, por favor, Rachel. Vamos lidar com um problema de cada vez. Sim? 

Ela o observou e não respondeu nada. Apenas enxugou as lágrimas com as costas da mão. Neal tornou a se aproximar, fez com que ficasse bem acomodada na cama e ergueu sua blusa, expondo o ventre plano.

- Sua mãe está muito nervosa, mas você, meu pequeno que está aí dentro, é muito bem vindo. E dessa vez eu vou estar presente em toda sua vida, o tempo que ficará na barriga da mamãe e, depois, quando vier para os nossos braços. Não vou deixar nada de ruim acontecer com você! – Ele encarava essa segunda gravidez como a sua chance de ser presente nessa hora tão importante. De dar a Rachel toda a atenção que lhe faltou quando esperava George. – Agora mais do que nunca eu  preciso sair daqui. Depois a gente vê o que faz. Mais alguém sabe?

- Só a Ell...ela desconfiou. Mas me prometeu não contar nada para o Peter.
- Ótimo! – Ele confiava em Elizabeth. – Então sossegue. Meu filho não merece uma mãe tão nervosa e estressada. – Mais um beijo rápido. – Tudo bem? -  E outro beijo. – Tudo? – Mais alguns beijos. – Acho que eu posso ficar te beijando o dia todo.

Neal tanto fez que conseguiu ver um sorriso em seu rosto.

- Não sei o que faço com você, agente Caffrey!
- Eu sei que você não está se sentindo bem e que não se sente a vontade sabendo que estão nos observando então não vou pressionar, mas quando sair daqui, aí você não irá escapar, minha Afrodite!

Eles passaram ainda algum tempo abraçados até que o horário de visita acabou, devolvendo-os a rotina e aos detalhes finais da fuga.

            Dois dias depois, tudo estava relativamente organizado. Mas faltava um detalhe pra lá de importante. Neal falsificaria um quadro, mas precisariam do original. O Les Noces de Pierrette estava em posse da Sterling-Bosch Seguradora. A questão era como convencer Alex de que Mozz havia roubado o Picasso de um depósito no FBI sem ter o quadro.

- Precisamos dele. – Mozzie disse. Era importante que o Engravatado trouxesse o quadro original. – Fale com Sara, Engravatado, ela tem acesso ao quadro.
          - Eu já tentei! Ela disse que não pode colocar o quadro nas mãos de Neal e Alex. – Peter respondeu. – É compreensível.
            - Compreensível nada! – Rachel estava estressada demais para aguentar os ataques de frescura de Sara Elis. – Eu vou falar com Sara. Ela sabe muito bem que o FBI estará monitorando. 

            Sara ficou muito surpresa ao ser avisada que Rachel Turner a aguardava na recepção. Tudo o que pode fazer foi pedir que entrasse. Até porque, segundo todos costumavam falar, Rachel era uma mulher persistente e ela imaginava que fosse procurá-la. A questão era que já havia ajudado como podia. Impediu o quadro de ser exposto no museu como Peter e Mozz pediram. Ajudou porque eles lhe garantiram que isso ia auxiliar a provarem a inocência de Neal. E tudo o que ela mais desejava era que Neal fosse inocente e logo estivesse livre. Mas não podia tirar um Picasso do cofre da seguradora escondido e simplesmente ajudar o FBI a fingir uma fuga de prisão! Detalhe: para que o famoso falsificador Neal Caffrey ‘multiplicasse’ a arte com sua antiga parceira! Isso era loucura!

            Quando Rachel entrou na sala, Sara estava arrumada e penteada, pronta para ouvi-la e dizer não sem nem mesmo pensar. Se pensasse, tinha chance de dizer sim. A possibilidade de ajudar Neal sempre a perturbava. Queria o bem dele e já tinha se arriscado por isso. Mas dessa vez estava convencida a não fazer.
            - Bom dia, Rachel. – Disse quando ela entrou. – Eu não sei o que você veio me falar, mas eu já posso te dizer quem nenhuma briga me fará arriscar minha carreira dessa forma. Não posso roubar um quadro pra ajudar o Neal.
- Eu não vim brigar, Sara. – Isso fez Sara se calar. – Eu vim te pedir. Em nome...do amor que você diz ter sentido pelo Neal. Sara, você sabe que ele não roubou. E se você não entregar esse quadro para o Mozz, todo o plano se esvai. Provar a inocência do Neal está nas suas mãos!
- Eu...eu...que droga! Você sabe como é sério o que vocês me pedem? É roubar um Picasso!
- Manter o Neal preso injustamente é muito mais sério! Sara! Pense! Você sabe que o Peter estará liderando a operação. Não haverá erro! O Neal jamais deixaria você se ferrar nisso. ELE é leal aos amigos. Por favor!

Sara pensou. No fundo sabia que não podia negar isso.

Na noite seguinte, o quadro estava com Mozz e o alerta foi dado. Neal e Alex deixariam a prisão. Ele usou uma tática similar a usada anos atrás. Saiu vestido de policial, pela porta da frente. Só que dessa vez foi muito mais fácil. 


Não precisou render nenhum guarda ou roubar um uniforme. Teve acesso fácil ao que precisou. Afinal, sua fuga estava sendo autorizada pelo FBI. Ele tinha apenas que enganar a carceragem e sair. Fácil. Complicado foi ser caçado por Peter Burke. Dessa vez, Peter estava do seu lado.


            Já na rua, pegou um carro deixado por Mozz e seguiu para o esconderijo combinado. Ter a chave na ignição foi um tanto frustrante. Esse era um bom momento para exercitar ligação direta.Seria tão fácil! Ligou o carro e saiu sorridente. No porta-luvas encontrou um celular. Discou o número de seu parceiro para fugas, falsas e reais.

            - Tudo certo. Estou a caminho do ateliê. – Disse sucintamente.
            - Ótimo. – Mozz respondeu no primeiro toque. - Jones está monitorando você. O lugar tem escutas e câmeras. Peter solicitou um novo interrogatório no FBI para Alex. Eu lhe disse que essa seria a oportunidade perfeita. Lembra de como você fugiu da sala de um juiz? Ela fará algo similar.
            - Fugirá do Peter? Nem eu consegui isso! – Alex não era tão prepotente para cair em um golpe assim. A fuga tinha que aparentar alguma dificuldade.
            - Não exatamente. Ela usará o truque do carro com piso falso. Confie em mim, Neal. Chegarei no ateliê em duas horas, com Alex.
            - E o quadro?
            - Já está lá no seu aguardo. Espero que esteja inspirado para falsificar um Picasso.
            - Sempre estou, Mozz. Sempre estou. – Essa não foi a sua fuga mais desafiadora, porém seria uma grata oportunidade. – E a Rachel? Ela está bem?
            - Está...ótima. Tem alguma razão para ela não estar bem?
            - Nenhuma...era só pra confirmar. – Não podia contar ainda para Mozz que ia ser pai novamente. – Onde ela vai estar?
          - Com Peter monitorando. O engravatado achou que a combinação de você, eu, Rachel e um Picasso original poderia ser tentadora demais. Então manterá Rachel bem perto e o menino George ficará com Ell.
            - Ótimo. Assim os dois estão seguros. – Tinha descoberto que ter uma família significava uma constante preocupação com a segurança dos outros. – Nos veremos em duas horas.

            Ao lado da sala de interrogatório, por uma parede de vidro, Rachel viu Peter interrogar Alex. Eram perguntas reais, ele era bom nisso. Ela sabia o quanto Peter Burke poderia ser duro num interrogatório. Esteve ali, sob o crivo de suas perguntas e com Neal exatamente onde ela estava agora. Observando à espreita. Nos últimos anos seu mundo deu tantas voltas quem nem sabia mais onde estava.

            Como combinado, ao fim do interrogatório, Peter foi chamado por haver uma emergência. Seria necessário evacuar o andar as pressas.

            - Algo errado, agente Burke? – Alex perguntou certa de que aquilo fazia parte da ‘cortina de fumaça’ criada por Mozz.
            - Nada com o que precise se preocupar. – Ele fingia uma preocupação contida. Na medida certa. – Os guardas apenas terão que escoltá-la para fora do prédio uma ou duas perguntas antes do que eu planejava. Mas imagino que você não tenha mais nada para me contar.
            - Nada. – Foi tudo o que falou antes de sair.

            Orientada por Mozzie, Alex abriu as algemas dos pulsos quando estava no elevador. Eram dois elevadores lado a lado. De muito longe Mozzie controlava o movimento de ambos por controle remoto.

Era ele quem comandava o abrir e fechar das portas, além das paradas nos andares. Ao alcançar o 13º andar, Alex precisaria conseguir escapar deles e ficar sozinha em um dos elevadores. Era um plano ousado. Do tipo que ela gostava.

        Quando chegou ao 13º andar o elevador onde Alex e os dois guardas estavam travou estranhamente e abriu as portas. Um dos guardas saiu para dar uma olhada. Alex achou que precisaria forçar o segundo.

            - Veja! O outro também parou aqui. Será que é falta de luz?
            - Não. O prédio está iluminado. Deve ser nesse elevador o problema, vamos pegar o outro. – Ele disse e deu três passos para fora.

            Assim que Mozz viu pela câmera de segurança que apenas Alex estava lá dentro, fechou as portas do elevador. Alex sabia o que fazer depois. Os guardas não iriam conseguir usar o outro elevador. E desceriam até o térreo pelas escadas para tentar recapturá-la no saguão de entrada. Como se ela fosse tentar sair pela porta da frente usando um uniforme de prisão! Ela deveria descer no terceiro andar e seguir três portas para a esquerda. Só quando entrou e olhou pela janela, entendeu o porque da indicação tão precisa de Mozz. Exatamente sob aquela janela, havia um toldo que amorteceria sua queda.

            - Mozzie você é realmente o melhor! – Comemorou ao saltar.
           
            A adrenalina de pular do terceiro andar de um prédio era maravilhosa. Sentiu o vento na pele e adorou a sensação de liberdade. Tinha sentido falta de ter aquele baixinho como parceiro. Quando tocou os pés no chão, correu o mais rápido que pode até o furgão preto.

            Ficou dentro dele exatos 9 segundos. O tempo necessário para deixar registrado nas câmeras de segurança da rua que entrou ali. Abriu o fundo falso do piso e desceu para o subsolo da rua por um bueiro. Enquanto o carro partiria e levaria a polícia para um lado da cidade, ela voltaria a rua apenas 3 quadras a frente, onde encontraria Mozz.

            Quando Alex e Mozzie chegaram ao antigo ateliê de costura que agora lhe serviria de esconderijo, encontraram Neal já trabalhando na falsificação.


            Ele estava concentrado na tela. Sequer os olhou. Na verdade ainda estava muito chateado com Alex e não queria se envolver muito. Desejava apenas que ela se arrependesse e o inocentasse por vontade própria. Teve poucos amigos na vida e estava prestes a perder uma.

            - Neal! Vejo que já começou a produzir nosso passo rumo a liberdade definitiva. – Ela olhou em volta. – Onde está sua família feliz? Se pensa que Mozz me enganou, realmente não sabe de nada.

            Neal manteve a expressão fria. Por dentro o alerta havia sido dado. Neal Caffrey estava em pânico. Algo raro Ela estava desconfiada!

            - Do que está falando, Alex? Mozzie não mentiu. Seguiu o acordo que fez com você.
            - Seguiu...mas não me disse tudo. Pensa que acredito que desistiu de sua bela assassina e do filho de vocês? Não, Neal! Você não os deixaria para trás! Fala!
            - Ok. Você me pegou. – Ela sabia que havia algo errado. Mas estava há quilômetros da verdade. – Eu não vou reeditar nossa parceria, Alex. Não confio mais em você. Vou fazer nosso acordo e usar minha parte da grana pra fugir com a minha família. A essa hora, Rachel já está num lugar seguro. Vou encontrá-los na hora certa. Ela também já estava enjoada do FBI.
            - Claro, claro...eu imaginei que ela ia ajudar.

            Na van, Diana, Peter e Rachel trocaram olhares aliviados. A operação estava segura. Agora era apenas Neal fazer sua magia e conseguir dois Les Noces de Pierrette tão perfeitos que ninguém fosse capaz de distinguir qual o falso.

            - Ótimo então. Deixemos nosso artista trabalhar. – Mozzie cortou o papo e estendeu uma mochila com roupas. Nelas havia um rastreador. – Vá se trocar Alex. Aqui tem roupas para você se livrar desse uniforme.
            - Ótimo! – Ela caiu perfeitamente.

            Durante todo aquele fim de tarde, noite e madrugada Neal pintou sem parar. No tempo em que ficou observando-o, Alex não disse nada. Nem  mesmo uma palavra que confirmasse o que fez. Ao amanhecer todos estavam exaustos, incluindo o pessoal do FBI que ficou monitorando. E Sara que havia se juntado a eles.
            - Vocês pediram minha ajuda! Agora não reclamem! Ficarei aqui! – Disse.
            - Para ver o quadro ou ver o Caffrey? – Diana perguntou.
            - Os dois! – Foi a resposta.

Faltava apenas Mozzie cuidar do processo de envelhecimento da peça. Estava perfeita.

            - Não sei como não tive essa ideia antes, Neal. Podíamos ter faturado em dobro ou em triplo em tantas peças! – Alex disse, encantada.
            - Copiar peças só para enganar colecionadores. É, podíamos...e você ia me enganar em todas elas ou nessas você iria me dizer que estavam escondidas na minha casa? – Ele tentava forçá-la a falar sobre o assunto.
            - Deixe isso no passado, Neal. Encare como uma oportunidade de deixar tudo que te prendia a NY e ao FBI.
            - Uma oportunidade forçada, Alex. Nós fomos parceiros e você me traiu.
            - E você vem traindo os nossos há algum tempo! Você mudou muito desde que se aliou ao FBI. E quando a ruiva entrou na sua vida ficou ainda pior.
            - Porque não me disse que o quadro estava lá, Alex?
            - Eu ia dizer, deixei uma pista. Se você não entendesse, o que era improvável, eu iria te falar. Mas a sua queridinha resolveu dar aquele show na frente dos federais e...eu quis ferrar com vocês dois. Achei sarcástico você ser pego ao encontrarem o quadro atrás do que fez dela. Porque foi ela que te levou para a prisão.
            - Ela? Não você? Foi você quem roubou e escondeu o quadro de mim, Alex. Não a Rachel.
            - Não! Eu roubei o quadro, mas foi você a esconder...o casa era sua, Neal! Eu lhe disse que você participaria. Apenas contei a forma de uma maneira muito discreta. – Ela falava de uma forma confusão. Não era uma confissão categórica.
          - Eu vou ligar para os caras e marcar a troca para amanhã. Sorria, Neal! Amanhã você será um homem riquíssimo para fugir com a sua família, se é o que deseja.

            A troca foi marcada com apenas horas de diferença entre os compradores. Carl Petterson e Lian Jefferson viriam pegar seus quadros. Um sairia com a peça original. O outro com a cópia. Alex nem queria saber qual era a cópia e qual era o original. Confiava que nenhum dos dois perceberia. Eram compradores de arte, admiravam, mas estavam longe da perícia e conhecimento de Caffrey.

Ainda era dia claro quando um ousado e ansioso Lian Jefferson apareceu por lá carregando uma pesada maleta de dinheiro. Muito dinheiro. Embevecido, olhou para o quadro e toda a raiva que sentia por Alex se esvaiu. Desejava apenas apreciar sua obra de arte sem precisar dividi-la com ninguém.

- Ótimo, Alex. – Entregou-lhe o dinheiro. – Apesar dos pesares, você cumpriu o combinado.
- Talvez possamos fazer outros negócios ainda....tenho certeza que logo mais você vai querer outra peça para sua coleção.
- Talvez! Mas vi sua foto nos jornais. Imagino que vai querer sumir por um tempo.
- Sim. Mas por um bom incentivo, sou capaz de reaparecer. Eu e meu parceiro, não é Neal?
- Fale por você, Alex. Só por você. – Estava irritado. Por mais que a pressionasse, Alex não estava saindo de seu plano.

Quando Jefferson estava há quatro quadras do local e acreditando ter comprado uma fabulosa obra de arte, sem que a polícia tivesse como rastreá-lo, o FBI o interceptou e prendeu. Ao recuperar a peça, ela foi para o depósito. Teriam que confirmar com Neal qual era a real e qual era a falsificada. 

- Você está preso, Lian Jefferson. Pode reclamar o dinheiro que pagou por esse quadro, mas duvido que o receberá de volta. É o que ocorre quando se compra peças roubadas.
- Mas eu não roubei nada! E a ladra ficará livre? – Ele estava indignado.
- Podemos fazer um acordo para você depor contra ela e aliviar os seus problemas. Que acha? – Esse acordo era do interesse de Peter.

Carl Petterson foi ao local após anoitecer. Estava irritado. Não acreditava em Alex e se surpreendeu ao encontrar Neal Caffrey lá.

- Não sabia que ele estava envolvido. – Disse ao vê-lo.
- Se serve de consolo, eu também não soube do meu envolvimento desde o começo. – Neal retrucou.

Estava o tempo todo tentando encontrar um meio de fazê-la falar. Não estava adiantando. Viu Alex pegar o dinheiro e entregar a peça. Sabia que aquela era a original. Picasso deixou uma discreta marca na parte de trás. Isso ele não reproduziu. Nem tinha porque. Ninguém sabia.

- Foi bom fazer negócio com você, Alex. Até! – Ele disse saindo e deixando o dinheiro. O plano do FBI era também prendê-lo longe dali para dar a Neal mais uma oportunidade de fazer Alex confessar ter agido só. Se não conseguisse, teria que ir a julgamento e convencer o juiz de que era ela a mentir.

- Apenas por curiosidade, Sr. Petterson...havia mesmo outra ladra disposta a roubar ou era apenas para me apressar? – Alex perguntou.
- Sim, havia e ela parecia bem durona. Achei mesmo que ia conseguir antes de você. Aqueles belos olhos azuis quase me convenceram. – Ele respondeu e Neal voltou a ficar nervoso.
- Ninguém conseguiria... a peça esteve guardada em local seguro por um tempo e depois ficou com o FBI.
- Ela tem acesso ao FBI. – O pânico de Neal cresceu. – Eu procurei informações sobre ela.
- Uma ladra com acesso ao FBI? Não conheço muitas. – Mas Alex desconfiou de quem eles estavam falando. - Ela é bonita com eu?
- São belezas diferentes. Há algo de encantador naqueles olhos azuis destacados pela pele pálida e cabelos negros. – Ao sair do Ateliê ele não sabia do problema que havia causado, nem que seria preso em instantes.

Alex encarava Neal seriamente. Ele estava armando alguma. Ficou nervosa. Sentiu que devia fugir com o dinheiro o mais breve que puder. Só não percebeu que enquanto ela conversava com os compradores, com a ajuda de Mozz, Neal havia trocado as malas.

- Por que, Neal? Porque Rachel procurou meus clientes? Isso não foi a toa.
- Talvez ela quisesse te ferrar também...assim como você fez com a gente.
- Eu não ferrei com ela, dei uma lição em você! – Ela pegou a primeira mala do chão e levou para o centro da mesa. – Eu podia ter dito ao Peter que ela também sabia. Devia ter feito isso! Ela teria perdido o acordo com o FBI e não tentaria acabar com meu negócio.
- E mandar o marido dela pra cadeia injustamente não foi ferrá-la, também?
- Não! Porque o marido dela sairia de lá quando desejasse! Eu sempre soube.
- Que atencioso da sua parte, Alex. – Neal resolveu arriscar. – Eu se fosse você abriria a mala antes de sair.

Ela o fez, desconfiada. Mozzie, que havia saído com o dinheiro, já retornava. A alta quantia estava segura com o FBI.

- Onde está o meu dinheiro? Mozz! Fale! Tudo isso para nada! Falem! – Ela gritou. Só havia papel na mala.
- Você não o terá, Alex. Essa é a minha, vingança. Eu vou fugir com 100% do dinheiro. Afinal eu escondi o quadro na minha casa, conforme você afirmou. E além disso, eu o falsifiquei. Se vou levar a culpa, também vou levar a grana! A não ser que...
- Que eu o inocente! É isso? – Ele estava furiosa.
            - Exatamente! – Neal respondeu sabendo que ela sairia da frieza habitual.


            - Nunca, Caffrey! Se depender de mim, você passará a vida na lista de procurados do FBI. Eu devia ter ferrado você muito mais! Muito mais! Devia ter enchido a sua casa de ‘lembrancinhas’ minhas. Você e aquela mulherzinha ainda vão me pagar!
            - Eu é que poderia te ameaçar em vingança, Alex. Não o contrário.
            - Eu só queria que você me ajudasse! Só isso! Não queria te prejudicar! Nunca! E queria que você largasse ela pra me ajudar, por isso escondi lá! Só isso! Eu achei que você ia encontrar, Caffrey! Nunca planejei te esconder! Mas aconteceu e eu quis me vingar de você preferir a ela! – O desabafo foi de Alex, mas foi Rachel que se sentiu mais leve ao ouvir da van. Neal seria absolvido.

            Ela não teve autorização para sair dali. Então ficou assistindo Peter entrar, encerrar a farsa e lhe dar voz de prisão. O mais humilhante foi quando ela entendeu que, na realidade, não deixou de estar presa por nenhum segundo.

            - Menosprezou meu departamento, Alex, quando acreditou que fugiria de dentro do FBI. – Ele a algemou. – Você continua presa, exatamente como estava há dois dias.
            - Tudo... – Ela entrou em choque.
           - Não passou de um auxílio para você nos contar a verdade. Agora, com sua mais perfeita confissão, somada aos depoimentos de Lian Jefferson e Carl Petterson, você realmente não sairá da cadeia.

            O procedimento para liberar oficialmente Neal foi rápido. Todos estavam cansados. Foi apenas uma questão de mandar Alex de volta e devolver o quadro certo a Sara para ela o colocar no cofre novamente.

            - Qual é o real, Neal? – Peter perguntou. Já tinha pensado num meio de garantir que Neal não trocaria as peças. Com Neal era bom nunca se arriscar. – Eu vou destruir o outro. Apenas para você não ter ideias que me façam ter de te prender novamente.
            - Eu sei que destruirá. – Realmente não estava interessado em roubar aquele Picasso depois de tudo. – O original tem uma marca na parte de trás da tela. O que fiz ontem é liso atrás. Pode queimar porque não é um Picasso.
            - Ótimo! – Ele abraçou Neal. – Agora pegue sua mulher e vá para casa. Assim a minha, pode entregar o filho de vocês e vir ficar comigo.
            - Obrigado, Peter. Eu preciso falar com você sobre.... -  Ele tinha um pedido a fazer.
            - Nem precisa. Eu já sei do que se trata. E já resolvi. – Peter respondeu.
            - Já? – Como assim? Será que ele sabia mesmo.
            - Sim. Você quer a Rachel no seu apartamento hoje. Eu falei com o Stone. Rachel está autorizada a morar com você definitivamente. Porém, tenha em mente que você está se responsabilizando por ela. É bom Rachel não aprontar nada. Ok?
            - Ok, Peter. – Saber que a teria para si era maravilhoso. – Eu farei isso.

            Claro que fez. Após um longo abraço ainda no local, Rachel e Neal foram para casa. Queriam a privacidade do lar para comemorarem. Só entranharam que Mozz quis acompanhá-los. Afinal já era madrugada.
            - Eu quero falar com você, Neal. – Explicou ele.
            - Ok. A Rachel vai descansar quando chegar e a gente conversa.
           - Eu não estou cansada. – Ela não gostava de ser excluída. – Tenho outros planos para a madrugada.
            - Mas deve sim descansar. Além dos seus planos. – Ele brincou.
            - Ok...eu descanso enquanto vocês conversam então e depois...
            - Eu estou aqui. – Mozzie os lembrou.

            Quando chegaram a casa, agradeceram a Ell por olhar George antes dela se despedir e ir pra casa e, depois, Rachel realmente deixou-os a sós para conversar. Não queria interrompê-los.

            - O que há, Mozz?
            - Você sabe que eu sou adepto a aproveitar as oportunidades da vida, Neal. – Ele começou assim, indo pegar uma bebida.
            - Claro.
         - Hoje você pintou lindamente a cópia de um Picasso. Poderia fazer muitas outras cópias. – Ele continuou.
            - Sim. Na verdade eu tenho outro Les Noces de Pierrette. Já tinha reproduzido aquele quadro outra vez. Está guardado em algum lugar...
            - Não! Agora está no cofre da Sterling-Bosch Seguradora! E nós temos o original. Eu tenho, pelo menos.
            - O que? – Essa surpreendeu, Neal. Ele não tinha conferido a autenticidade da peça que teve em mãos. – As duas peças que Alex entregou aos compradores eram reproduções minhas?
            - Sim. Fui eu quem fiz a marca na parte de trás da tela, não Picasso. Eu troquei assim que tive a original em mãos! – Era o plano perfeito. – A essa altura, Sara já devolveu a peça para o cofre e amanhã ela estará exposta no museu. Eles nunca saberão que o quadro deixou o cofre da segurada. E por isso nunca mandarão para uma análise. Eles têm uma quadro perfeito e autenticado e vão expor por um século antes de que alguém desconfie! E nós temos um Picasso!


            - Um brinde a nós! – A alegria dele era contagiante.

            Neal estava pasmo com a inteligência de Mozz. Mesmo ele sempre sendo assim, ainda o surpreendia.

            - Você é um gênio, Mozz. Um gênio.
            - Sim, eu sei. Ora Neal, você sabe que eu não trabalho de graça. Depois dessa trabalheira toda, alguma vantagem nós tiraríamos. Um Picasso me pareceu bem adequado!

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