terça-feira, 2 de junho de 2015

Alguém Para Amar - Capítulo 8


            Era meio da tarde, o sol ainda brilhava, mas Jonas e Emily não estavam nada interessados em ir se bronzear em algum parque da cidade. Ali estava bem agradável. Sair para que quando tinham tudo o que necessitavam dentro do apartamento? E isso incluía muito carinho, mimos e carícias.
            Quando o porteiro avisou que o irmão de Jonas estava subindo, Emily ficou nervosa. Incluindo a família as coisas ficavam mais sérias. Ela pulou do sofá assim que entendeu o que ocorria e correu para o quarto. Não sabia bem se deveria ficar trancada lá enquanto os rapazes conversavam ou se trocava de roupa para estar mais elegante e receber Lorenzo ao lado de Jonas.

            - Você está perfeita Emily. Venha aqui. Sente-se nesse sofá e comporte-se normalmente. É apenas o meu irmão! – Jonas achou graça da reação dela.
            - Apenas?!?!? Jonas! Ele não sabe que eu estou aqui!
            - Eu tenho 40 anos, Emily. Não preciso dar satisfação da minha vida. Fica aqui quem eu desejo e ninguém se mete nisso.

            Além disso, Lorenzo já imaginava que apenas Emily seria capaz de manter Jonas em casa durante um dia útil inteiro. Mesmo assim, foi uma surpresa encontrar os dois num clima tão familiar. Ele não tinha nenhuma intenção de recriminar o irmão. Ainda se lembrava um pouco do sabor de estar apaixonado. Tudo na vida era mais adocicado. Quando entrou e viu a camisa de Jonas um tanto amarrotada e as faces de Emily coradas, pensou que, talvez, estivesse interrompendo algo mais íntimo.

            - Desculpem....eu não queria atrapalhar nada. – Disse, constrangido.
            - E não atrapalhou. – Jonas abraçou o irmão. – Que bom te ver aqui! Eu e Emily estamos morando juntos, Lorenzo. Então não estranhe a bagunça.
            - Oi, Emily. É bom revê-la. Acho que meu irmão lhe chamou de bagunceira.
            - É, muito engraçadinho ele.

            Foi fácil para Emily habituar-se com Lorenzo. Ele não parecia analisá-los nem julgá-los. E não passou despercebido para Jonas que sua casa, antes sempre vazia, agora recebia visitas. Não era nada comum Lorenzo sair da fazenda. E logo Jonas decidiu que precisava de uma explicação. Seu irmão obviamente não veio ali apenas para vê-lo com Emily.

            - Vai me contar o que o trouxe aqui? – Ele perguntou.



            - Vou. Preciso mudar de ares, Jonas. Só a administração da fazenda não está mais me satisfazendo. Então eu pretendo dividir melhor as minhas funções com Milena e me arriscar em outro negócio.
            - Outro negócio? Mas você sempre administrou a fazenda tão bem e conseguiu um bom retorno financeiro.
            - Eu sei. Acumulei um bom dinheiro. Com o qual quero me arriscar agora.
            - E a vinícola? Milena não é administradora.
            - Eu não me desligarei, apenas não viverei mais para o vinho. Você não mantém dois negócios?



            - E por isso, trabalho como um louco. Às vezes eu penso em largar a construtora e ficar mais no sul.
            - Eu não sei se a Emily gostaria disso. E, pelo que percebo, vocês se assumiram de vez. – Lorenzo aproveitou para brincar.
            - Eu...não...nunca iria me intrometer nas decisões profissionais do Jonas. – Emily adiantou-se.



            Ela estava sentada no sofá, tentando receber bem o irmão de Jonas, sem interferir. Na verdade, desejava passar despercebida, queria dar privacidade para eles e evitava participar da conversa. Mas Jonas não deixou-a se afastar. Ele se aproximou dela e acariciava seus cabelos enquanto falava.

            - Mas é claro que a sua opinião conta, Emily. Eu jamais resolveria voltar a viver em Bento Gonçalves sem que você concordasse. E, como o seu trabalho exige que fique aqui, vou me manter em São Paulo. – Ele olhou sério para o irmão. – Nós estamos namorando. E está muito bom. Mas conte em que deseja investir seu dinheiro.
            - Uma empresa de consultoria em administração de empresas. Você gosta de trabalhar na vinícola, mas gostaria de lidar com toda a papelada e organização do negócio?
            - Não, nem pensar! – Jonas respondeu.
            - Exatamente! A minha empresa cuidará de todo o resto do negócio, vários tipos de negócios.
            - Eu adoraria poder apenas cozinhar, sem me preocupar com papeladas, regras trabalhistas, organização financeira e todo o resto. Acho que é um grande negócio. Conte comigo como cliente! – Emily brincou.

            Parecia mesmo uma ótima ideia. Mas Jonas desconfia de que não era apenas isso a afastar o irmão das terras da família. Porém, não queria falar disso na frente de Emily. Ela lhe deu a oportunidade perfeita quando se levantou.

            - Vou preparar nosso jantar, rapazes. – Ela anunciou.
            - Você precisa de repouso, Emily. Vamos pedir algo.
            - Eu repousei o dia todo. Conversem, meninos. Eu garanto uma bela refeição. Só não me atrevo a escolher o vinho. Isso fica com vocês.

            Jonas, apesar de gostar daquele momento de privacidade com o irmão, ficou torcendo para Emily não inventar nenhum prato elaborado demais, que exigisse que ficasse horas na cozinha. Mesmo enquanto conversava com Lorenzo, não tirava os olhos dela.

            - Qual a verdadeira razão? – Foi direto.

            Lorenzo não se surpreendeu. Sempre teve uma relação muito aberta com seu irmão. É claro que ele saberia ver nas entrelinhas e perceber o quão delicada e importante era aquela decisão. Ela tinha outra razão, bem mais sofrida. Ele levou anos preparando-se para deixar Alice no passado. Agora, tantos e tantos anos depois, sentia que precisava deixar aquela história guardadas no coração e seguir com sua vida.

            - Alice está lá. Sempre vai estar. – Explicou ao irmão.
            - Eu já imaginava. Na verdade, logo que aconteceu, eu achei que você ia embora. Que as lembranças iam fazê-lo deixar a fazenda. Mas você seguiu. E eu pensei que isso fosse uma demonstração de força e superação.
            - Acho que foi mais apego e acomodação. Eu sentia a presença dela, quase podia sentir seu cheiro no nosso quarto, ouvir sua voz quando caminhava nos parreirais. No fundo, o que me manteve lá foi o medo de perder essas lembranças. Parecia que eu a estava abandonando.
            - E o que mudou?
            - Eu vi que preciso viver. Talvez eu tenha esperado tempo demais para ver isso. Mas agora eu sei. Eu preciso levar minha vida para outro rumo.
            - Eu vou gostar de ter você por perto. Aliás, Emily está na suíte comigo. Pode ficar no quarto de hóspedes.
            - Eu amanhã verei um apartamento e começarei a estruturar a minha empresa. Casa nova para uma vida nova!

            Quando ainda falavam animadamente e já abriam outra garrafa de vinho, Jonas percebeu um perfume inundar o apartamento. Não sabia qual a receita, mas o aroma daquele jantar estava maravilhoso.

            - Vejo que Emily o pegou pelo estômago. – Lorenzo disse.
            - Não foi isso. Mas certamente poderia. O que está saindo de bom aí, Emily?
            - Está pronto. Arroz de açafrão, carne assada e legumes no vapor. Simples e leve, mas delicioso.
            - E perfumado! – Jonas disse.



            Ficou muito tarde e Lorenzo dormiu no apartamento. Mas garantiu que seria a única noite. Depois, seguiria para um hotel para não tirar a privacidade do casal. Jonas e Emily não se deram ao trabalho de corrigi-lo.
            Depois do jantar Emily foi se deitar e Lorenzo teve a chance de perguntar ao irmão porque ele parecia cercar Emily de cuidados exagerados. Ele tratava a namorada com uma delicadeza da qual não se recordara quando ela esteve na fazenda.

            - Emily tem um problema de saúde. Talvez precise retirar o útero. Mas ela não quer nem ouvir falar dessa possibilidade.
            - Você me disse que ela deseja ser mãe e havia encontrado uma dificuldade. Mas eu não pensei que fosse tão grave.
            - Nem eu, inicialmente. – Jonas respondeu. – Nós estamos começando o tratamento para Emily engravidar. Depois, se não houver alternativa, ela terá de passar pela cirurgia. Mas a gente ainda tem esperança de conseguir sem chegar a isso.
            - E quando vão se casar? – Muito tradicional, para Lorenzo, quando um casal planejava um bebê, era com a benção de Deus.
            - Não está nos planos. Ainda, pelo menos.
            - Você sabe o quanto uma criança é aguardada pela nossa família, Jonas. Mas eles esperam que nasça em um lar.
            - Por isso não falei nada ainda para eles. A Emily já tem as próprias preocupações. Não quero que ela se sinta pressionada a engravidar. Se não acontecer, ela se sentirá muito mal. Vamos esperar. Quando o bebê vier, se vier, nos lidaremos com tudo. Com ou sem uma certidão de casamento, eu cuidarei deles.

            Quando amanheceu, Emily anunciou que estava melhor e ia trabalhar. Iria com Márcio até uma grande feira de culinária. Comprariam especiarias e alguns outros produtos raros e importantes para os pratos do restaurante. Ela prometeu não se atrasar, afinal, alguns peixes frescos eram vendidos somente na primeira hora da manhã e, depois, ainda desejava escolher algumas frutas para preparar sobremesas. Jonas tinha outros planos para ela. E teve de lembrar-se que Emily não estava habituada a ter alguém organizando sua agenda.

            - Eu amo o meu trabalho. Acostume-se com isso. – Ela disse enquanto tomavam café fingindo não perceber o sorriso bobo com que Lorenzo os observava.
            - E eu amo você. Acostume-se com isso. – Jonas devolveu. Saiu sem perceber. Eles não costumavam trocar declarações de amor.  – Ok, vá para sua feira. Eu e Lorenzo vamos para a construtora e depois eu cuidarei de uns negócios enquanto ele procura um apartamento. Nos vemos às 8hs da noite. Está bem?
            - Eu vou tentar.
            - E vai conseguir. É muito tempo trabalhando para quem esteve adoentada.
            - Está bem. – Ela sorriu e beijou-o. – Obrigada por cuidar de mim. Nunca pensei que fosse tão bom.



            Enquanto Emily já caminhava pelos estandes em busca de sabores e temperos, Jonas seguia entrava na construtora apresentando seu irmão para alguns colegas. Lorenzo ainda se admirava da agilidade com que Jonas habitou-se com a vida familiar. Ele podia não ter planos de casar, mas tratava Emily como só um marido muito atencioso faria.
            Depois de mostrar algumas áreas da empresa, Jonas pediu que o irmão ficasse em sua sala enquanto ele precisava resolver uma emergência. Ao sair, passou por Jéssica e pediu que levasse café para o seu irmão.

            - Claro, Senhor Jonas. – Ela respondeu, formal como sempre.

            Jéssica só não esperava, no momento que abriu a porta, que o irmão do patrão estivesse junto dela, observando o quadro na parede. Com o susto, sua mão tremeu, a bandeja caiu e o café foi parar na camisa do visitante.
            Lorenzo estava tão atento ao desenho abstrato que cobria a parede do escritório que não percebeu quando a porta se abriu. Notou sim quando aquela jovem gritou e o café atingiu em cheio sua camisa. Não achou engraçado, mas também não foi nenhuma tragédia. Por isso, não entendeu o desespero da garota. Ela tentou fazer tudo ao mesmo tempo. Primeiro tentou secar sua camisa com um pano não muito limpo. Depois percebeu que tudo ficaria manchado e desistiu para juntar as louças do chão. E, quando ergueu o rosto, estava vermelha de vergonha.

            - Me desculpe por isso. Eu fui muito desastrada!
            - Tudo bem. É Jéssica, não é?
            - É. Jéssica. Se o senhor tirar a camisa, eu posso lavar.



            - Não precisa, Jéssica. O Jonas deve ter uma camisa reserva aqui no banheiro. Eu vou ver. – Ele disse entrando no banheiro integrado ao escritório.

            Jéssica não queria ter problemas no trabalho por causa de sua desatenção. Não queria e não podia. Sua filha, Clara, só tinha quatro anos e dependia do seu trabalho para viver. Ela não recebia pensão do pai porque ele tinha sido um namorado sem importância e foi embora do estado fugindo da responsabilidade. E não pretendia se humilhar pedindo para ele registrar a filha. Não. Podia criar Clara sem a ajuda dele. Então, tinha de conseguir. Ficar desempregada por derramar café no irmão do dono da empresa era inaceitável.
            Correu atrás dele até o banheiro. Iria se oferecer mais uma vez para lavar a camisa. Deixaria perfeita! Tudo para não perder o emprego. Só que entrou, novamente, sem avisar. E o viu, abotoando uma camisa limpa, provavelmente do irmão. E percebeu que ele era muito bonito. Mais do que qualquer empregada como ela deveria se dar ao luxo de notar.



            - Desculpe, desculpe...eu...droga! Só faço besteira! Não devia ter entrado aqui! Eu...só me dê a camisa para lavar sim. Eu juro que não venho mais aqui. Nunca mais vai me ver.
            - Eu joguei fora a camisa, Jéssica. – Ele ria da reação daquela menina. Tão jovem. – E pare de se desculpar.
            - Sim, Senhor. Eu sou muito estabanada! Não posso perder o emprego.
            - E não vai perder. Não por isso, pelo menos. Volte ao trabalho, Jéssica. Isso tudo fica sendo um segredo nosso.

            Para Jonas, a história que Lorenzo contou foi quase igual a verdadeira. Ele mesmo havia virado o café. Não seria por sua culpa que aquela jovem, tão simpática e atenciosa, perderia o emprego. Depois, foi necessário que seguisse com seus planos. Ele foi procurar o apartamento, Jonas trabalhar verificando algumas plantas.

            - Nos vemos às 19hs lá em casa. Emily, você e eu jantaremos juntos. Só que hoje eu a farei ficar conosco conversando e pediremos algo.
            - Sim, tem de cuidar da mulherzinha. Você está se saindo um grande marido, Jonas! Quem diria!

            Ele tentava. Mesmo quando Emily dificultava de todas as formas. E quando não era sua teimosia, parecia ser o destino mesmo. Naquela noite Emily chegou em casa 20h25min. E antes mesmo de o relógio marcar 21hs, o telefone tocou chamando-a para voltar para o trabalho.

            - Não! Definitivamente, não! – Ele disse ao vê-la pegar as chaves do carro. – Você não vai. Está cansada!
            - Claro que eu vou! Meu chefe de cozinha substituto passou mal. Não posso abandonar o restaurante assim! É o meu negócio!
            - Você acabou de chegar, Emily.
            - Porque meu funcionário ia ficar lá cozinhando. Mas ele passou mal. Eu tenho de ir!
            - Emily, não!

            - Sim, Jonas. Entenda que você não manda em mim! – E saiu irritada. Não suportava que alguém, mesmo Jonas, tentasse lhe controlar.

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