domingo, 21 de setembro de 2014

Diaba Ruiva: Passado Revelado - Cap 2




Cinco dias depois...

Era fim de tarde e Neal foi fazer uma corrida pela orla da praia enquanto Rachel buscava George da tarde de brincadeiras com os pequenos amigos. A vida infantil era agitada em Marselha. O garotinho costumava voltar tão cansado que dificilmente fazia muito mais do que tomar banho, jantar e dormir.



Não era apenas a rotina de George a ser cansativa. A deles também. Em especial por manterem algumas investigações paralelas. Uma visava apenas encontrar o diamante para montar uma estratégia de roubo e, finalmente, ter a pedra em mãos. Era apenas dinheiro. As outras investigações eram mais pessoais. Eles queriam descobrir os próprios passados. Queriam dar a George a verdade sobre seus avós.
A todos que perguntavam, Neal sempre dizia que a mãe estava morta. E de certa forma ela realmente estava. Não se viam desde que ela sumiu após a prisão de seu pai. Ela sofreu muito na época e não aguentou a pressão de ver o marido, policial, ser preso por corrupção. Os dois foram levados para um abrigo do governo e tentaram sobreviver com a ajuda da então parceira polícia do pai: Helen. Quando a mãe parou de lhe dar atenção, foi Helen quem ajudou a criá-lo.
Nunca mais teve notícias da mãe. Poderia estar viva ou morta. Já do pai era ele a não desejar um reencontro. Aproveitando-se da boa vontade de Helen, enganada já próxima da morte, ele aproximou-se do filho e apenas o usou para conseguir algo que precisava. Sumiu no mundo e ainda cometeu um assassinado deixando Peter como suspeito. Para livrar o amigo, ele fraudou uma gravação. Não queria nunca mais ver o pai. Mas tinha esperança de rever a mãe e dar outra avó para George e para a pequena Helen.
Quanto ao passado de Rachel, havia mais fios para puxar. Ela só não buscou pela própria história antes porque não tinha certeza se desejava mexer nesse assunto. Tinha a convicção de que seus pais adotivos ao resgatá-la de um acidente de trânsito onde os demais ocupantes do carro morreram, investigaram e descobriram que era uma criança traficada. Ela foi tomada dos verdadeiros genitores e vendida para aqueles que morreram no acidente. Se John, seu pai, havia realmente, ao menos iniciado uma investigação, Nicolle, sua mãe teria alguma pista. Mas ela estava em NY e qualquer contato poderia ser rastreado pelo FBI.
Mozzie vinha ajudando-os nas três investigações. A pista do diamante levava até New York, da mãe de Neal a última notícia vinha de antes do sumiço, há 15 anos, no abrigo de testemunhas. A menos que o pai lhe tivesse mentido. E as pistas sobre a família de Rachel estavam nas pesquisas de John e na memória de Nicolle. Ou seja? Tudo nos EUA. De Marselha pouco poderiam fazer. E ir até os EUA representava o risco de ficarem presos.

Continuando a corrida, ao longe pode ver a esposa caminhando pela areia a passos lentos. Ficou esperando-a chegar calmamente até ele, vestindo uma saia longa e estampada e apenas a parte de cima de uma biquíni. A barriga à mostra, como ela gostava. Helen era exibida pela praia diariamente, assim como os cabelos ruivos.



- Será que posso acompanhá-lo nessa caminhada? – Ela perguntou, sorridente.
- É claro. Como minha filha está?
- Agitada, por isso vim caminhar um pouco. Ver se no balanço ela se acalma. – Ela guiou a mão de Neal até a lateral da barriga. – Aqui está o pezinho. Sente.

Eles ainda caminharam de mãos dadas um pouco antes de voltar a falar. Com o sol já se pondo e a temperatura amena, a praia era um convite aos namorados. E eles ainda se sentiam assim.

- Estava pensando em como descobrir o nosso passado sem arriscar o futuro. – Foi Neal a puxar o assunto. – Eu quero continuar as investigações sem nos expor.
- Eu também. Mas queremos o impossível. Tudo parece nos levar de volta a NY. Justo NY. – Ela ficou triste. Queria poder voltar e esclarecer tudo. Nessas horas um ódio profundo por Josef Harabo a dominava. Por culta dele voltou a ser uma procurada pela justiça. – E se recorrêssemos a Peter?
- A chance dele fazer algo ilegal é zero. Isso inclui nos ajudar, a menos que resolvamos nos entregar. Isso significaria nós dois presos e distantes de Helen e George.
- Não...não consigo nem pensar. – Ela abraçou-o. – Mas você não é procurado por nenhum crime grave. Apenas por facilitar a minha fuga. Tenho certeza que para um crime assim, mesmo com seu histórico, Peter consegue um acordo. O FBI sabe como você é útil. Você pode voltar a NY.
- Voltar a usar tornozeleira? – O rastreador lhe fez companhia por anos e não trazia saudade. – Acho que não, amor. E qualquer acordo incluiria entregar a sua localização. Isso eu não farei. Não vou privar meus filhos do convívio com a mãe. Entre meu passado e meu futuro, eu fico com o futuro aqui, com você.



Ao voltarem para casa, encontraram Mozzie e George assistindo a um DVD infantil. Na verdade apenas Mozz assistia, ria e imitava as falas dos animaizinhos que dançavam animadamente. George já havia dormido no colo do amigo.

- Eu lhe dei um sanduíche e ele apagou.
- Obrigada, Mozz. Eu vou colocá-lo na cama. – Neal pegou o pequeno e levou para o quarto.
- Como vai a ‘baby-Helena’? – Claro que ele já havia apelidado a nova integrante da família.
- Muito bem, Mozz. Estávamos caminhando na praia e ela se acalmou. Deve estar tirando um cochilo. – De repente Rachel ficou séria. – Nós falamos sobre a necessidade de investigar em NY. Não podemos arriscar, Mozz.
- Nem precisam! Eu sou o ‘invisible man’. Vou e volto com as informações sem cair no radar dos engravatados.
- Nem no radar de Peter? – Neal perguntou ao voltar para sala.
- Eu reconheço que Peter é um engravatado melhor...nós lhe ensinamos muito. Mas ele não conhece todos meus truques. Eu consigo.
- Vamos amadurecer melhor essa ideia, Mozz. – Rachel finalizou a conversa. Iriam mais uma vez deixar essa decisão para o dia seguinte.

A noite foi de um amor terno e calmo, como se pressentissem o fim de sua calmaria. Já era tarde e deveriam estar deitados, mas ela abraçou o marido sem deixar-lhe dúvidas do que queria. Neal sentiu as mãos da esposa serpenteando por seu peito, descendo com destino certo. Rachel não era a mais delicada das mulheres para deixar claro que desejava sexo. Era direta e não tinha pudores em ser feliz na cama.



- Eu tenho um marido sexy demais para não usá-lo. Apreciar esse corpinho é o mínimo que eu posso fazer para agradecer a todos os exercícios que você faz, meu amor. E eu faço questão de agradecer diariamente.

Se ele mantinha exatamente o mesmo corpo de quando se conheceram, o dela estava bem diferente. Arredondado devido ao crescimento de Helen, o corpo dela estava farto e sensível a qualquer toque. Ela, já normalmente movida pelas emoções, grávida ficava ainda mais receptiva. Todos os sentimentos eram exacerbadas, inclusive a euforia do prazer. Por enquanto, a barriga não lhe atrapalhava nenhum pouco.

- É tarde...você deveria estar dormindo já. – Ele disse apenas para provocá-la. Não queria parar.
- Eu quero você. – Ela sequer deu atenção a provocação. Sabia que ele não lhe negaria o prazer. – Eu tenho a vida toda pra dormir e depois nós vamos ter o resguardo...preciso aproveitar agora.
- Então vamos aproveitar...vem pra cama vem.



Ao amanhecer Neal tinha planos claros. Levaria a família para um piquenique. Queria ficar na praia e curtir aquele momento. George andava perguntando por que a mãe não podia pegá-lo mais no colo e, apesar de não ter muito ciúme, estranhava a nova situação. Em breve ele não seria mais o bebê da família. O tempo só com eles iria lhe fazer bem.



- Bom dia, marido meu. – Rachel entrou no banheiro quando ele se preparava para fazer a barba. - Deixa assim. Eu gosto. Fico arrepiada.

Agradá-la era fácil e ele resolveu manter a barba por mais um ou dois dias. Nunca gostou de usá-la, mas combinava com o ambiente descontraído de Marselha. Utilizada por muitos turistas, era comum ver homens que a deixavam crescer durante a estadia ali.
Juntos, passaram a manhã brincando com George e animando-o para a chegada de Helen.

- Ela vai jogar bola com você quando crescer. – Neal lembrou ao filho.
- É...e vídeogame. – George concordou. Ele tinham uma coleção de joguinhos no tablet da mãe.
- E você vai cuidar dela? – Rachel perguntou.
- Vo sim...ela é muitooo pequena e eu sou grande.
- É! – Rachel riu. Parecia um adulto apesar de ainda nem ter completado três anos. – É o meu meninão lindo.
- Então vamos dar um beijo da Helen, George? Vamos? – Neal provocou-o antes de erguê-lo até a barriga da mãe.



Enquanto isso, os Burks desembarcavam em Marselha. O FBI tinha não fazia ideia de nada. A princípio, Peter estava em férias por uma semana. As únicas pessoas que sabiam da verdade eram Diana, Henrique e Sara. Eles esperavam que no retorno, Neal, Rachel, Mozz e George os acompanhassem. Mas primeiro, precisavam encontrá-los.

- Eu vou à praia papai? – Sofia perguntou.
- Sim, vai, querida. Depois. Primeiro vamos procurar o tio Mozz.

Mas não seria fácil. Foram a agência bancária onde Ana Assunção realizava os saques e nenhum atendente conhecia um morador com esse nome. Como tratavam-se de registros frequentes, era claro se tratar de uma moradora da praia que só utiliza os automáticos. Era um indício de que Sara estava na pista correta. Mas lhe dificultava a busca. Não faziam ideia de onde estavam ou quais nomes usavam.
Normalmente, Peter exigiria as gravações de segurança e buscaria imagens dos dias em que a conta teve movimentação, mas ele estava fora de seu país, em férias e, o mais importante, isso alertaria a polícia local. E não deseja criar problemas para Neal. Prometeu isso a Ell, Sara e Henrique. Ele voltaria aos EUA por vontade própria. Apenas isso. Se dissessem não, iriam embora sem denunciá-los. A saída era então uma só: perguntar para a população utilizando fotos.
As primeiras duas horas renderam abssolutamente nada. E preocupado com o esforço físico de Ell, pararam num bar para se refrescar. Ela sequer deveria ter vindo naquela viagem no sexto mês de gravidez, mas discordar dela naqueles meses era quase impossível. Ela ficava furiosa e gritava ou deprimida e chorava. Peter não sabia lidar com nenhuma das alternativas. Então fazia todas as suas vontades.

- Eu quero morangos. – Ela lhe disse olhando a banca de frutas do outro lado da rua. – Frescos. Aqueles morangos frescos ali!
- Morangos frescos? Porque não...já te trago.
A barraquinha simples de frutas era de um simpático vendedor. Ele lhe garantiu que os morangos eram sim frescos e ainda lhe sugeriu pontos turisticos da praia, lhe desejando boas férias. Peter não quis perder a oportunidade.

- Na verdade...nós estamos procurando um casal de amigos. Você os conhece? – Ao mostrar a foto, Peter teve o cuidado de não dizer nomes.
- Sim....claro. Os pais do menino George!
- Isso! Os pais do menino George! – Peter não se aguentava de felicidade. – Pode me levar até sua casa?
- Não posso deixar a banca...mas lhe indico como chegar. Srª Helena e Sr. Bernard gostam de tranquilidade. Moram numa parte mais afastada. Preferem criar George longe da agitação dos turistas. Aquele menino é tão inteligente...se puxar aos pais...
- Nem me fale. Eu tenho até medo. – Ele torcia para George ter gostos menos arriscados que Neal e Rachel. – Mas me diga como chego lá?
- Vai ter de alugar um carro. Pegue a estrada a beira mar e siga até uma placa que indica a aproximação da Praia do Prado. Ao fim dessa estrada encontrará uma única e bela casa. Fica numa elevada, de frente para o mar.
- Muito obrigada pela ajuda!



Sem saber a revolução que estava prestes a ocorrer, Neal trabalhava em uma escultura na parte de trás da casa quando ouviu a campainha tocar. Rachel e George tinham ido brincar na areia da praia e ela jamais esquecia as chaves. Era raro eles receberem visitas. Aquela casa foi escolhida por manter a privacidade deles e, caso fosse necessário, possibilitar uma fuga rápida, por terra ou por água. Manter seus segredos bem guardados também era o motivo para não manterem empregados. Apenas uma empresa de limpeza vinha uma vez por semana. Assim não criavam vínculos. Tinha de ser assim.
Um tanto desconfiado, vestiu uma camisa e foi atender a porta. Nada o tinha preparado para ver Peter ali, sorrindo e com a expressão tranquila. Não parecia o perseguidor das outras vezes...aliás, não parecia um agente do FBI. Discretamente, olhou em volta a procura dos policiais de apoio. Sairia daqui algemado? Rachel e Mozz conseguiriam escapar?

- Não vai me convidar para entrar, Neal? Ou devo dizer Bernard? – Peter via a confusão em seus olhos. Era natural. Precisavam conversar. Por isso Ell e Sofia tinham ficado para trás. Eles precisavam conversar antes.
- Não vai me prender?
- Não, Neal. Nem posso. Estou fora da minha jurisdição e de férias. Além disso, a França não...
- Faz acordos de extradição. É! O Mozz pesquisou isso.
- Eu não esperava menos dele, Neal. E já que eu vim sem algemas...será que posso te dar um abraço?

Peter não esperou pela resposta e abraçou-o. Era como se reencontrasse mais que um amigo. Neal era como um filho. Daqueles que é tão amado quanto problemático.




- Senti sua falta garoto!
- Eu também!



Depois do longo abraço e de efetivamente entrar na casa de Bernard, Peter anunciou o que era obvio. Por mais carinho que houvesse entre eles, tinham assuntos sérios a falar.

- Rachel e George estão?
- Não...eles saíram. – Neal não confiou o bastante para dizer que estavam chegando. Para Peter, fora ela a matar Harabo. E ele nunca teve muita simpatia por Rachel. Peter podia ter vontade de protegê-lo, mas nunca manifestou a mesma intenção por Rachel. Melhor deixar isso e a gravidez para falar depois. Peter não era muito chegado em bebês mesmo. – Ell e Sofia vieram com você...nas férias?
- Sim...Ell achou melhor a gente conversar à sós primeiro. – Não lhes disse que elas foram na praia ali perto e nem que Elizabeth esperava um bebê. O amigo e Rachel haviam perdido uma filha. Não sabia como haviam superado o assunto.

Assim, ainda cheios de segredos e desconfianças, eles se encaravam. Era um recomeço. Mas parecia bastante com o que viveram por anos em NY.

- Nós precisamos ter uma conversa muito importante, Neal.

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