domingo, 11 de dezembro de 2016

Ariella: capítulo 24

3 semanas depois...
            Enfim Diego estava em casa, sem enfermeiros, remédios, nem equipamentos médicos por perto. Mas com seguranças por perto. Quando a equipe hospitalar enfim sinalizou que era possível retornar ao lar, ele deu-se conta que já não sabia exatamente onde morava. O Brasil não era o seu lugar no mundo, a sede de sua empresa não estava ali, nem o apartamento em que viveu nos últimos anos. Por outro lado, não mais se imaginava dormindo naquele lugar noite após noite. Porque aquele apartamento havia se transformado no sinônimo da solidão. E agora ele tinha uma família para cuidar.
            - Como assim não sabe para onde vamos? – Ariella olhou-o como se desconfiasse de sua sanidade no momento em que ele externou a preocupação. – Para minha casa, é claro. A tranquilidade de acordar com o barulho da rebentação é tudo o que precisamos.



            Ela tinha razão. Não apenas óbvio, o destino lhe agradava muito. Porém, a palavra tranquilidade não era a primeira a lhe vir à mente quando pensava naquela casa. Saiu de lá desacordado, sangrando após levar tiros e pessoas que desejavam roubar ou sequestrar sua esposa. Assim que saiu do coma e convenceu Ariella de que poderia ser informado dos detalhes o que ocorria. Afinal, ao abrir os olhos viu o homem que mais odiava ameaçar Ariella à frente de seu leito. Não era mais possível ignorar o que se passava. Ela concordo e lhe relatou o que sabia da investigação policial e das desconfianças pessoais. Para ela, o assalto era um problema e a briga com o pai outro.
            - Mas são dois fatos muito bem amarrados. – Ele tinha certeza. Faltava a polícia provar e ele encontrar um meio pra proteger Ariella de mais esse sofrimento.
            Seu objetivo, no entanto, não era fazer nada de forma afobada. Ao contrário do passado de ações impensadas, agora ele tinha responsabilidades. Ariella já havia sofrido muito por erros dele. Agora ela lhe perdoara e, a despeito do momento difícil, ambos viviam as alegrias de esperar um filho. Conversaria com o delegado e acompanharia o caso de perto, mas servindo de escudo para que Ariella não mais fosse machucada.
            Murilo, ao saber que eles pretendiam voltar para a casa de Ariella e lá seguir pelos próximos meses, entendeu que sobre seus ombros pesariam muitas responsabilidades. Agora não mais de forma emergencial e à revelia do fundador da empresa. Ele e Diego conversaram seriamente e definiram que enquanto um voltaria para Espanha e gerenciaria as atividades europeias, o outro, do Brasil, responderia pelas latinas.

            - Você será financeiramente recompensado, Murilo. E espero que isso não lhe cause problemas com Dulce. Sei o quanto ela reclama da sua carga de trabalho. – Diego ponderou com o amigo.
            - Sim ela reclama. E diz que só aceitará engravidar quando eu viajar menos. – O executivo, que não escondia o desejo de ser pai, reconheceu. – Mas ela também adora me acompanhar nas viagens. E eu gosto muito do que faço. Por isso, fique tranquilo. Apenas...desculpe a intromissão...
            - Fale, Murilo. Sem rodeios, por favor.
            - Acho que você devia reforçar a segurança da casa, se pretende realmente viver aqui. Se Ariella já era um alvo, você certamente é um ainda mais chamativo.

            Diego acatou o pedido do amigo. E agora, além da espuma das ondas, a vista de sua janela contava com alguns carros padronizados de sua equipe de segurança. Isso servia para tranquilizar os amigos que, depois de tanto tempo dedicados a eles, iriam seguir suas vidas normalmente. Na primeira noite em casa ocorreu uma pequena comemoração. Taças com bebidas que os anfitriões não podiam beber passearam pela casa.

            - Seja feliz, minha amiga. – Dulce afirmou abraçando Ariella. – Ainda acho que o seu conde tem um lado sapo muito forte, mas se é ele que faz disparar seu coração, aproveite.
            - Eu o amo demais para permitir que qualquer outro se aproxime.
            - Sim. – Ela viu isso no passar dos anos. Mas avise-o que estarei de olho...só por garantia.
           
            Quando a recepção terminou, os dois permaneceram na beira do bar, agradecendo pelo que parecia ser o final de um pesadelo.



            - Não me lembro de ter sido tão feliz em nenhum outro momento de minha vida. Nem parece certo...
            - Ser feliz? Achei que era para isso que nascíamos. – Diego respondeu.
           
            Ela riu antes de responder.

            - É estranho me sentir culpada...eu sei. É que, nós estamos aqui curtindo tudo isso enquanto papai...não sei o que ocorreu com ele. Às vezes me sinto uma péssima filha, apesar de tudo.
            - Ele foi um péssimo pai, Ariella. Usou-a e, sei que você prefere não acreditar, mas eu sei que ele estava envolvido nesse atentado.
            - Não é questão de querer Diego, sei da possibilidade. Apenas me sentiria melhor caso a polícia descubra que foi apenas um assalta. Coloque-se no meu lugar.

            Ele entendia, apenas não podia se permitir tratar do assunto com sentimentalismo. Fora Afonso. E ele pagaria por isso, mesmo sendo algo triste para Ariella.

            - Vamos entrar? Acho que podemos terminar a festa lá no quarto. – Ele sugeriu.
            - Acho que você está muito saidinho para quem acaba de sair do hospital. Comporte-se!



Eles não ficavam sozinhos em momento nenhum do dia, sempre sob os olhos atentos de seguranças e funcionários da total confiança. O que não os impedia de fingir esquecer-se dos problemas e viver uma falsa lua de mel. Diego passava o tempo todo cuidando de Ariella, física e emocionalmente, dando carinho e conferindo se ela estava bem o bastante.
            Esse desejo de protegê-la, por vezes gerou problemas. Ela estava há tempo demais resolvendo sua via sozinha e, ter um parceiro lhe cobrando e verificando a todo o momento não era fácil. E o contrário também era verdadeiro.

            - Preciso lembrá-lo qual e nós dois estava hospitalizado? – Ela o lembrava sempre que Diego demonstrava alguma preocupação.

            Isso não o convencia quase nunca. Mesmo quando sua fraqueza momentânea ficava clara, como quando sentiu-se tonto e precisou apoiar-se em uma mesa para não cair. O tempo longo preso à cama hospitalar poderia causar isso, a médica tinha alertado. Sentir essa dependência, na prática, era mais complicado que o aviso teórico. E ele sentiu-se ofendido quando Ariella passou o braço por sua cintura e tentou suportar seu peso.

            - Nem pensa! – Ele, apesar de sentir as pernas fracas, desvencilhou-se ela.
            - Você tem de se deitar um pouco e não pode chegar no quarto sozinho. – Ela argumentou.
            - Chame um dos seguranças. Você não pode me levar.

            Não se tratava de machismo, como Ariella pareceu encarar sua ordem. Nem poderia, afinal, ela se mostrara a pessoa mais forte que ele já conhecera. Mas era sua responsabilidade zelar por ela e pelo bebê deles e enquanto ele era cuidado por todos no hospital, ela corria de um lado para o outro. E se nem mesmo preso ao leito deixava de perceber quando, após um sumiço longo, ela retornava ao quarto pálida feito um papel e sempre segurando uma garrafa d’água ele deixa de perceber suas crises de enjoo, agora elas eram ainda mais óbvias. Assim como o resultado delas no seu estado geral de saúde. Ariella carregava olheiras sob os olhos, no final do dia estava mais cansada do que o normal e era impossível deixar de perceber o quando vinha mancando mais do que o normal. Um antigo funcionário da casa, lhe confidenciou a razão.

            - Com tudo o que aconteceu, a patroa abandonou as sessões de fisioterapia. – Explicou o rapaz que parecia ter muito respeito pela empregadora.

            Desde que soube de tudo, Diego tomou uma decisão. A relação deles de forma alguma poderia prejudicar Ariella e tirar o que ela conquistou no decorrer dos anos, sobretudo no que se referia a saúde ou a recuperação do acidente sofrido na Espanha. Já lhe era muito duro aceitar que, independente de quando dinheiro investisse nos melhores tratamentos, ela jamais voltaria a andar como antes porque ficara com uma perna centímetros menor. A ideia dela ter a qualidade de vida sacrificada por cuidar dele era inaceitável.



            - Eu não quero falar de problemas médicos, Diego. Passei anos consultando ortopedistas. Aceitei minha situação. Faça isso você também. – Ela foi direta. Aquele assunto ainda doía. – Assunto encerrado.
            - Não...venha cá Ariella. Esse assunto não pode ficar entre nós.
            - Não está entre nós! – Ela ergueu a voz. – É que você ficou longe muito tempo e não se acostumou a ver as cicatrizes. Elas te incomodam. Mas eu as vejo há 10 anos.

            O que ele sentia nada tinha a ver com os riscos que cobriam a pele dela. Era a dor que eles comprovavam a lhe ferir. Quando ela mostrava dificuldade em dar alguns passos, era sinal de que sofria e esse era o se maior incômodo.

            - Você vai retomar a fisioterapia e nós conversaremos com a sua obstetra. Quero me assegurar que o peso que você ganhará durante a gestação não lhe cause mais dificuldades. Sou o pai esse bebê. Tenho direito de conversar com a médica e acompanhar o seu estado de perto.

            Ariella não tinha dúvidas desse direito nem pensava em questionar. Apenas preferia que Diego conseguisse deixar o passado enterrado. Mas a que parecia, ele tendia a sempre esperar que alguma sombra viesse da década passada para engolir sua felicidade. Ao menos a consulta com a obstetra serviu para acalmar o coração do pai de seu bebê. E eles ouviram atentamente todas as orientações da médica, ditas após ela analisar uma série de exames feitos recentemente, mas que ainda não haviam sido levados até o consultório antes.



            - Eu ainda não estou convencida, doutora. Afinal, esse cansaço que vejo em Ariella não é normal. Eu a conheço há muitos anos...
            - Mas nunca conviveu com ela grávida, suponho. É natural que algumas características mudem, sobretudo no começo, quando os enjoos são frequentes e o corpo ainda se adapta as questões hormonais.

            Diego não saiu do consultório totalmente satisfeito. Porém, havia conquistado o apoio da médica em coisas importantes como Ariella repousas durante uma hora durante a tarde. Já da alimentação, a obstetra foi mais severa e destacou que exageros alimentares só prejudicariam o bebê e Ariella.

            - Não gosto de médicos que insistem em dietas desnecessárias. Por que uma grávida faria uma dieta restritiva se por séculos elas foram orientadas a “comer por dois” e a técnica funcionava? – Diego argumentou, no carro.
            - Porque se eu comer muito virarei uma baleia e sofrerei mais para recuperar meu corpo depois. – A parte de que o peso extra prejudicaria sua dificuldade de locomoção ela deixou de fora pelas reações exageradas de Diego nesse assunto.
            - Alguns quilinhos a mais não lhe fariam mal. – Mas ele preferiu trocar de assunto.
           
            Policiais chegaram a ir a casa de Ariella para interrogar Diego. Mas Ariella não os permitiu entrar. Avisou que Diego ainda não estava completamente restabelecido e precisava de repouso. Não era bem verdade. No fundo, ela desejava atrasar o quanto pudesse aquele depoimento e seguir fingindo ser uma mulher apaixonada e vivendo feliz com o amante enquanto esperam um filho.

            - Quem era? – Diego perguntou.
            - A polícia...queriam o seu depoimento. E eu os mandei embora.
            - Ariella...
            - Eu sei, não podemos fugir eternamente. Mas eu prefiro ser feliz enquanto posso. E sinto que mexer nisso só trará mais dor.
            - Não sei. – Diego seguia preocupado. – Amanhã eu vou à polícia depor. Quanto antes eles descobrirem o que aconteceu é melhor. Quem tentou sequestrar você, pode não ter desistido. – E isso ele não permitiria.

...

Na Argentina...

            Afonso andava de um lado para o outro, atendendo ligações e dando explicações a credores. O cerco se fechava cada vez mais porque, contando com o dinheiro da filha, ofereceu promessas e promissórias de que pagaria as dívidas. Agora seus agiotas estavam agitados e exigindo o dinheiro.

            - Meu plano não deu certo...ainda. Só precisam ter paciência. Não adiante pressionarem. Enquanto eu não tiver o dinheiro, não poderei pagar a vocês.

            A resposta do outro lado da linha não o agradou.

            - Não adianta me ameaçarem. Eu já paguei tantas vezes. Não é verdade? E se me matarem só conseguirão não receber jamais. Qual o lucro disso?

            Apesar do argumento ser válido, resolveria por muito tempo. E Afonso sabia que precisaria de bem mais para acalmar seus cobradores.

            - Talvez unir forças fosse mais proveitoso. Eu sei da onde tirar o dinheiro...apenas não está fácil atingir ao alvo. Vocês entram nesse jogo, ganham a sua bolada e eu saio bem. O que acham?



Nenhum comentário:

Postar um comentário