sábado, 5 de setembro de 2015

Alguém Para Amar - Cap 22

            Lorenzo olhava para o relógio e conforme os minutos iam passando seu sorriso foi perdendo força. Jéssica estava atrasada, algo muito estranho. Àquela hora o restaurante já estava vazio e ela não deveria ter dificuldade para sair. Mais alguns minutos se passaram e ele resolveu ir até lá. A sempre independente Jéssica não gostaria muito dessa atitude, mas não conseguia deixar de preocupar-se com ela.

            - Márcio...onde Jéssica está? Ela se atrasou hoje. – Disso no rol da entrada.
            - Não, ela saiu pelos fundos. Eu mesma a vi. – Foi Emily quem respondeu e viu o olhar de Lorenzo ganhar o peso da preocupação. – Venha comigo. Vamos olhar a saída de serviço.

            Os três seguiram com olhos ansiosos e assustados. Emily e Márcio um pouco mais porque tinham certeza de que Jéssica tinha saído já há alguns minutos. Nervosa, Emily foi na frente, mostrando o caminho. Não precisaram esperar muito para descobrir o que acontecia. Logo que chegaram no corredor lateral que levava da saída de serviço para a porta principal Emily viu Jéssica no chão lutando com um homem. Ele a pressionava contra o concreto segurando-lhe os braços e, por vezes, golpeando-a. Ela revidava como podia, tentando desvencilhar-se enquanto gritava por socorro. Jéssica estava longe de aceitar a derrota e por mais dolorido que seu corpo estivesse, seguia lutando contra Bruno.

            - Socoroooo! – Jéssica gritou pouco antes de sentir as mãos de Bruno em seu pescoço.

             Sem conhecer Bruno, Emily podia ter pensado se tratar de um assalto. Não teve tempo de imaginar nada porque Lorenzo ultrapassou a ela e Márcio, atirando-se sobre o agressor, obrigando-o a soltar Jéssica.

            - Solta ela agora! – Lorenzo gritou prensando Bruno contra a parede.



            Por dentro ele estava dividido. Queria esmurrar Bruno até ver o sangue escorrer pelo rosto dele, vê-lo gritar por perdão e fazê-lo se arrepender de machucar a mulher dos outros. Por outro lado, fazer isso significava perder alguns minutos nos quais deveria estar cuidando de Jéssica.

            - Liguem para a polícia e chamem um médico para Jéssica! – Gritou para Emily e Márcio que assustados com a situação observavam a cena e, ajoelhados junto de Jéssica, tentavam erguê-la.

            Emily então correu de volta ao restaurante para pegar seu celular e chamar uma ambulância. Enquanto Lorenzo seguia pressionando Bruno contra a parede, Márcio acalentava Jéssica, confusa e com dores demais no corpo para tentar interferir na briga daqueles dois homens. Mas ela tentava, principalmente quando Bruno tentava revidar e acertar Lorenzo. Ele conseguiu acertar apenas um golpe antes de Lorenzo imobilizá-lo novamente, mas esse assustou Jéssica.

            - Parem! Parem! Lorenzo! – Jéssica gritou como se seus chamados fossem cessar com a briga.
           
            Lorenzo ouviu, mas não conseguiu dar atenção à namorada naquele momento. Estava concentrado em não deixar Bruno escapar. Quando ele tentou empurrá-lo para sair correndo, deu-lhe uma rasteira e voltou a segurá-lo.
           
            - Porque a pressa em ir embora? Vamos esperar a polícia. Pra você aprender a não bater em nenhuma mulher! E não encostar na minha mulher nunca mais! – Lorenzo gritou.
            - Sua? Não! Muito mais minha do que de um velho feito você! – Foi a única frase dita por Bruno. Antes dele pensar em algo mais, viu um punho fechado atingir seu rosto antes de apagar no chão frio.

            Bruno não viu, mas logo depois Lorenzo não mais se lembrava das suas provocações ou xingamentos. Ser mais velho que Jéssica não mais lhe incomodava. Não quando olhava para aquele jovem inconsequente e irresponsável que, tendo a chance de tê-la, desperdiçou ao não valorizá-la nem assumir a filha. Preferia ser mais velho e ainda assim amá-la e respeitá-la. Ainda mais quando sabia que Jéssica retribuía com os mais puros e sinceros sentimentos.

            - Calma. Está tudo bem. Acabou. Ele será preso. – Disse acariciando seus cabelos.
            - Casa...me leva...



            Lorenzo sentou-se ao lado de Jéssica e mesmo quando ao longe já podiam ouvir as sirenes da polícia, não conseguiu se afastar. Ela estava confusa, com o olhar perdido e em choque. Não sem motivo, seu rosto estava machucado e quando tentava se mexer ela gemia. Lorenzo ainda não entendia o que levou o ex dela a tamanha agressão. Mesmo que fosse o não pagamento da chantagem, ele nada ganhava espancando Jéssica. Devia estar sob o efeito de drogas ou muito desesperado.

            - Nós vamos para casa, amor. Logo. Primeiro vamos passar no hospital.

            Demorou muito mais do que ambos esperavam. Ela teve de passar pelo atendimento em primeiros socorros. Nada de muito grave, segundo o médico, mas uma radiografia do ombro esquerdo seria necessária. Nesse momento já era noite.

            - Você precisa de analgésicos ou não irá dormir. O médico fez apenas os primeiros socorros, teremos de passar na emergência.
            - Não quero. Chega. Não quero mais ninguém me tocando. Chega. Só quero deitar na nossa cama e dormir.
            - Eu sei...e vai dormir. No meu abraço...mas antes vamos passar no hospital. E depor contra Bruno. Ele não pode sair livre depois de tudo. Será rápido,eu prometo.
            - Eu nem tenho mais plano de saúde Lorenzo. E o do restaurante ainda está na carência. Vamos passar horas esperando atendimento.
            - Não vamos não. – Pela primeira vez Lorenzo pensava e recriminava-se por não ter colocado Jéssica e Clara em seu plano de saúde antes. Deveria ter imaginado que num momento de necessidade ele faria falta.

            O jeito foi ir até um hospital particular, pedir por um atendimento breve e fazer o exame do ombro. Tirando a tala que permaneceria ao lado de Jéssica por alguns dias, ela estava bem, foram escoriações leves. Os pensamentos de Jéssica estavam em Clara. Nunca chegavam em casa tão tarde.



            - Não se preocupe. – Lorenzo lhe pediu. – Ela está com Jonas e Emily. Está bem e logo estará conosco.

            Antes porém, faltavam ainda dois procedimentos. Um deles, Lorenzo desconfiava, terrivelmente desagradável. Jéssica não queria, mas antes de ir para casa foi necessário passar na delegacia, relatar o ocorrido ao delegado e fazer o exame de ‘corpo delito’. Ficar a sós com a perita que documentou a agressão para fazer fotos de seu corpo era mais uma humilhação. E mesmo estando apenas ela e a médica na sala, mostrar o corpo nú e machucado foi tão desagradável quanto estar nas mãos de Bruno.

            - Por favor, descreva como foi agredida. – A médica preenchia um formulário e fazia Jéssica se sentir ainda pior. Era apenas mais um caso.
            - Ele me jogou no chão. Eu bati o rosto contra o piso, fiquei confusa e tentei afastá-lo. Ele chutou meu ombro e minha barriga. Veio sobre mim e começou a apertar minha garganta. Achei que ia me sufocar. Até que Lorenzo o forçou a se afastar.
            - Afaste os cabelos do pescoço. – A profissional disse e novos flashes fizeram Jéssica fechar os olhos  - Pronto, senhorita. Pode se vestir. Eu pedirei ao seu namorado que entre para ajudá-la.

            Quando entrou na sala que muito se parecia com um consultório médico Lorenzo sentia-se ainda assustado. Agora que a queixa policial fora dada e o registro feito, ela finalmente iria descansar. Quis lhe dizer muitas coisas, que estava segura, que jamais permitiria uma nova aproximação de Bruno, que a amava e faria qualquer coisa por ela. Desejava lhe dizer que estava ali para ser seu anjo da guarda, alguém que pensaria mais nela do que em si mesmo. Desejava lhe dar todo o carinho que precisasse para esquecer Bruno e a infelicidade trazida por ele. Disse tudo isso sem pronunciar nenhuma palavra, apenas tocando-lhe os lábios docemente. Depois foram para casa, ele colocou-a na cama e esperou os analgésicos fazerem efeito.

            - Durma bem. Amanhã cedo Clara estará com você e, daqui para frente, nada de Bruno ou sofrimento.

            Jéssica não passou mais do que alguns minutos acordada. O relógio marcava 1h45min e depois de tudo aquilo ela tinha muitas razões para aliviar o corpo das dores e o pensamento das lembranças. Lorenzo, porém, tinha ainda mais uma coisa para resolver. Por mensagens de texto conversou com seu advogado, que já havia sido acionado e tinha a missão de garantir a prisão de Bruno. Agora precisava de mais uma ajuda.


[Consiga que eu possa vê-lo amanhã cedo. Hoje, melhor dizendo. Ainda pela manhã]

[Não é tão simples]

[Não me importa. Consiga. Ontem ele estava chapado demais. Quero que ouça claramente o que tenho a lhe dizer]

[Ele terá de querer vê-lo. Não posso obrigá-lo]

[Vai querer. Acha que vou lhe dar dinheiro para sumir]


            Na manhã seguinte todos imaginaram que o casal dormiria até tarde. Não foi assim. Enquanto Jéssica dormia, Emily, Jonas e Clara tomavam café no apartamento junto com Lorenzo. Não sem razão, Lorenzo comeu apressado e saiu. Na expressão do rosto cansado e na barba por fazer estava a confirmação de que ele ainda vivia a noite anterior. Jonas agradeceu mentalmente que toda a família estivesse no RS. Nenhum deles veria Lorenzo daquela forma, era outro, tinha ódio nos olhos. Não foi com o apoio do irmão que Lorenzo foi na central de polícia onde Bruno passou a noite. Quando chegou o responsável pelo local já sabia do motivo de estar ali.

            - Se as coisas fossem ágeis como deveriam, o rapaz já teria um defensor público e a sua entrada seria negada. Mas elas são lentas, ele não tem um representante legal e ele aceitou vê-lo. Tem 10 minutos com ele.

            Lorenzo não precisava de mais mesmo. Desejava apenas lhe dar um último aviso. Essa conversa já deveria ter ocorrido e, caso assim fosse, Jéssica nunca teria se machucado. Ainda assim, precisava fazê-lo. Bruno entenderia que não precisava lhe dar dinheiro nem pegar em armas para mantê-lo longe de Jéssica.


      - Veio me contar com está a nossa mulher? – Bruno provocou-o assim que ficaram frente a frente.
            - Cale a boca! – A resposta de Lorenzo foi direta. – Eu passei uma noite infernal por sua culpa e não estou com muita paciência. Posso esquecer do que vim fazer aqui e realizar o meu maior desejo. Esmurrar a sua cara até não sobrar nenhum dente na boca.
            - É fácil se livrar de mim. Eu sei que você tem grana sobrando...não te fará falta nenhuma. Eu sumo no mundo e não te atrapalho mais. Deixo a minha mulher pra você.
            - Ela não é sua. E eu não vou cair na sua provocação. – Lorenzo via o desespero de Bruno. Ele deveria estar precisando muito de dinheiro. Pelo nervoso que se encontrava, também sentia falta da droga. Fora burro o suficiente para se viciar no produto que vendia. – Tem razão. Eu tenho grana. Muita. Mais do que você um dia sonhará. E foi porque eu trabalhei a vida toda. Você nunca tocará em um centavo. Você não passa de um vagabundo.
            - Eu posso sair daqui e ir procurar minha mulher. – Bruno ameaçou. – Jéssica foi esperta. Achou um velho carente e apaixonado para sustentá-la. Mas ela sempre curtiu o vagabundo aqui. Largou a casa do papai pra ficar comigo. Ela gostava...
            - Cala a boca!
            -  O que? Não quer ouvir? Gostava sim....quando eu atirava ela na cama e fazia gostoso. Fazia Jéssica gritar. Até quando ela vai se satisfazer com um velho que nem você? Tá na cara que você não dá conta do fogo daquela mulher toda gostosinha. Eu comia ela quando queria! Fiz um filho dentro dela.
            - Fez, fez mesmo. E não assumiu.
            - Mas tenho meus direito de pai. – Bruno viu que ali havia um ponto fraco. Nunca pensava naquela criança, não sabia como se chamava ou se era menino ou menina. Mas agora lhe seria útil. – Não vai me dar o dinheiro? Eu vou querer o moleque! Vou levar pra passear...talvez eu traga de volta.
            - Você nem mesmo fez o registro. – Lorenzo acusou.
            - É fácil de provar. Sei que é meu. Ela não abria as pernas pra outro. Se não me tirar dessa cadeia e me der grana eu serei o papaizinho do meu filho. É o meu direito de pai.

            Por mais irritado que Lorenzo estivesse, lembrou-se do que foi fazer ali. Também tinha suas armas para revidar. E já esperava que Bruno fosse usar Clara na tentativa de lhe tirar dinheiro.

            - Te tirar da cadeia? Dar dinheiro? Nunca! E se quiser, entre na justiça e assuma seu filho. – Se ele não sabia se tratar de uma menina Lorenzo preferia deixar assim. – Direi para Jéssica exigir os três anos e meio de pensão alimentícia atrasados. Vai sair caro. E você sabe que pensão dá cadeia nesse país. Pensão e bater em mulher. A lei Maria da Penha existe, Bruno. Você está enrascado. Que ironia! Um traficantezinho de bairro, pau mandado de peixe grande, procurado da justiça por roubo de carros e investigado por participar de um sequestro. E ser pego justo por bater na ex namorada.
            - Não sei do que você tá falando... – Sua voz estava trêmula.
            - Sabe sim. Pensa que só você me investigou? Não Bruno. Eu tirei a sua ficha assim que ameaçou a minha mulher. – Lorenzo  ergueu-se da cadeira e se aproximou. – Você foi acusado inclusive de participar da morte de um agente penitenciário. E, garanto, que isso não ajudará em nada a sua vida no presídio. Meu advogado fez o favor de apresentar um dossiê completo sobre você ao delegado. Eu garanto que você não sai fácil da cadeia dessa vez. E, caso saia, lembre-se de ficar longe da minha mulher e do meu filho. Eu tenho dinheiro sim, mas ele não é pro bico de vagabundo. E posso usá-lo para acabar com a sua vida.

            Bruno não respondeu, nem precisava. O recado estava dado e o ódio que ardia nos olhos de Lorenzo deixava claro que ele não brincava nem ameaçava em vão. Passado o susto, Lorenzo foi para casa e encontrou a família reunida. Ficariam juntos aquela tarde no apartamento. Jonas insistiu que após um almoço em família, Jéssica e Lorenzo poderiam descansar enquanto eles olhavam Clara. A menina estranhou ver a mãe deitada até tarde, mas logo estava animada por ter Vida na casa. Clara tratava o bebê como a sua boneca e adora embalar seu carrinho.

            - Quando eu tiver um irmão vou poder fazer isso né papai?
            - Vai sim Clara, vai sim. – Hoje olhar para Clara feliz e segura tinha ainda mais sentido para Lorenzo.

            Quando Lorenzo e Jéssica foram descansar, Emily e Jonas levaram as crianças para a praça do condomínio. À sombra das árvores viram Clara correr contente e imaginaram Vida e o bebê que ainda não sabiam ser menino ou menina tão felizes quanto. Estavam agradecendo a Deus todas as bênçãos que vinham recebendo dos céus.



            - Eu vou no balanço, tio Jonas! – Clara avisou.
            - Vá. Mas cuide para não se machucar.

            No momento família Jonas observava Emily em silêncio. Era estranho como, aparentemente, ela ainda era a mesma. Ninguém que a visse agora diria que ali estava uma gestante, não observavam nenhuma diferença em seu corpo. Os outros. Porque ele conhecia aquela mulher bem demais para desconhecer qualquer mudança, mesmo as mais sutis. Com dois meses completos de gestação seus seios já estavam um pouco mais inchados e sensíveis. A barriga não havia crescido, apesar dele conferir a cada manhã, quando beijava-a e dizia ao filho o quanto era amado e esperado. Ou filha, conforme Emily sempre o lembrava. Mas a cintura, essa sim já estava um pouco mais larga. Algo que ele não ousava mais comentar.

            - Está dizendo que meu corpo está feio? – Emily reclamou na única vez que ousou comentar os centímetros a mais.
            - Não. Está bela, maravilhosa e fantástica com meu filho aí dentro. E ele precisa de espaço para crescer então sim, sua cintura está mais larga. E assim deve ser.
            - Se você me acha bela então está tudo ótimo. – A divergência acabou ali, com ele tentando descobrir mais mudanças naquele corpo.

            Emocionalmente Emily também mudou naquelas semanas. Sempre tão dura com sigo mesma, agora ela aparentava mais fragilidades. Os sentimentos fluíam. E em dois dias viu-a chorar sem motivo aparente. Desesperou-se. Só para, logo depois, rir da rápida mudança de espírito. Eram os hormônios, chorava de alegria, chorava de felicidade, chorava por uma tristeza profunda e chorava por nada antes de enxugar as lágrimas e seguir com a vida sem nem saber porque elas caíram.

            - Sente-se bem? – Jonas perguntou abraçando-a enquanto com o pé balançava o carrinho de Vida. – Ontem foi um dia estressante, você correu atrás de um bandido e presenciou sua amiga ser agredida. Espero que não tenha ficado nervosa demais.
            - Fiquei, mas agora já estou bem. Nós estamos ótimos.
            - E os enjôos?
            - Foi leve e só ao acordar. Leonor disse que é normal. Ela quer que eu vá consultar ainda essa semana. Disse que precisamos de consultas mais frequentes que o normal para acompanhar o crescimento dos cistos.
            - Você marcou para quando? – Jonas não gostava de esperar quando se tratava da saúde de Emily.
            - Ainda não marquei. – O olhar de Jonas exigiu complementação da resposta. – Quero fazer exames para acompanhar o crescimento de nosso filho, não da doença. Estou bem, minhas dores melhoraram. Nosso bebê só me fez bem.
            - Isso é ótimo, Emily. Mas não é desculpa para você descuidar da sua saúde. Marque a consulta e me avise do horário. Você irá, fará todos os exames e manterá o repouso que Leonor indicar. E, quando for a hora, você fará o tratamento.
            - Tratamento? – Esse assunto ainda lhe era doloroso. – Diga o nome correto, Jonas. Mutilação. É isso o que farão. Vão arrancar meu útero.
            - Emily, por favor...
            - Por favor o que? É a verdade! Se for mesmo necessário, eu farei. Mas não será menos doloroso. Mesmo que nós jamais desejássemos ter mais bebês, ainda assim, isso se chama mutilação. Vão tirar um pedaço de mim. Um pedaço doente, que me faz mal, mas um pedaço do meu corpo.

            Jonas acalentou-a por mais alguns minutos. Emily não chorou, aquele assunto a revoltava e a fazia se manter firme. Emily estava disposta a se manter saudável pelos filhos e iria se cuidar, disso estava certo. Ainda assim, tinha medo dos próximos meses. Para aliviar o assunto, passaram a cogitar possíveis nomes para o bebê.
            Certos da segurança de Clara, Lorenzo e Jéssica descansaram até o meio da tarde. Jéssica acordou antes e ficou observando o sono de Lorenzo, estava mais sossegado, ressonando tranquilamente, mas mantinha o braço sobre ela o tempo todo. Ainda a protegia mesmo no sono. Jéssica observou-o relembrando da razão de amá-lo mais a cada dia. Ainda assim, o medo a fazia sentir um arrepio na espinha. Para se aquecer, abraçou-se a Lorenzo, passando as mãos por seu peito.

            - Jéssica...tudo bem? – Lorenzo acordou e sentiu o perfume da pele dela, de seus cabelos. – Você está bem?
            - Sim, desculpe te acordar.
            - Se for para me abraçar assim, pode acordar sempre.

            Ali ficaram, juntos, mais algum tempo. Estavam ainda assustados pelo que poderia ter ocorrido. Mesmo Lorenzo, confiante em ter se livrado de Bruno, não conseguia esquecer a cena dele agredindo sua garota. Ainda podia ver o machucado em seu rosto, o inchaço do ombro e um grande hematoma na barriga. Não diria para Jéssica, mas pensava no que teria ocorrido caso aquele engano de uma gravidez tivesse sido realidade. Bruno a teria ferido muito mais. Ele lhe acariciou a barriga, agora pensando que, um dia, talvez, ela pudesse gerar o seu filho.

            - O médico disse que você está bem. Mas se sentir algo de errado, não hesite em falar.
            - Sim, não se preocupe. Eu ficarei bem. Só quero esquecer daquela tarde e daquele homem. Só isso.


            Esquecer também era o desejo de Lorenzo, deixar o passado para trás e seguir na direção do futuro, sem pedras, apenas com felicidade. Algumas ideias para devolver o sorriso doce de Jéssica ao lugar de onde nunca deveria ter sumido começavam a surgir. Assim que pudesse a levaria para viajar. Ela esqueceria o trauma e voltaria a ser feliz, em seus braços, lugar de onde jamais sairia. 

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