sábado, 14 de junho de 2014

Dupla Perseguição - Capítulo: 46




            A equipe médica aceitou e agradeceu que o Dr. Richard cooperasse. Além de ser um ginecologista e obstetra capacitado e experiente, era o único que conhecia o estado de saúde de Rachel e tinha informações quanto a gravidez. Sua primeira tarefa foi tentar confortar Nicolle e Neal.
            - Richard...por Deus...eu preciso de minha filha e de minha neta. – Nicolle estava em desespero.
            - Eu não posso dar atenção a vocês agora. Preciso ir atendê-la. Só peço que tenham fé.
            - Elas têm alguma chance? – Neal perguntou saindo de seu silêncio profundo.

Ainda estava em choque pela imagem que viu ao encontrá-la. Foi como vê-la morta caída a sua frente.

            - O diagnóstico preliminar indica que teremos de fazer o parto. Não há como levar a gestação aos nove meses. Teremos duas equipes prontas. Uma para levar o bebê a uma incubadora enquanto a outra atende Rachel. Confie! Farei tudo o que puder para que ambas sobrevivam. – Era o que o médico podia lhe falar.

            Ele correu para a área restrita onde Rachel já estava sendo preparada na mesa cirúrgica.

            - Obrigada pelo oferecimento, Dr. – Uma médica chamada Melissa lhe disse.
            - Conte comigo, Drª. – Logo Richard assumiu seu posto como se nunca tivesse deixado de operar. – Enfermeira...tem bastante gente na sala de espera. Peça para todos fazerem testes sanguíneos. Ela precisará de doação de sangue.

            Enquanto todos se revezavam fazendo testes quanto ao tipo de sangue, na mesa cirúrgica a equipe estava apreensiva. Fazer um parto prematuro nessas condições era um desafio. O descolamento da placenta e a forte hemorragia não lhes deixava alternativa, mesmo que fosse de alto risco trazer ao mundo um bebê de pouco mais de 20 semanas. A hemorragia havia sido controlada, mas os exames demonstraram que ela tinha, no mínimo, uma fratura nas costelas e isso gerou lesões internas.
            Quando o anestesista deu aval Richard certificou-se de que ainda segurava o bisturi com mão firme e em pensamento resou para que tudo corresse bem. Não podia errar. A pele claríssima de sua paciente estava ainda mais pálida e logo o sangue manchou tudo de vermelho quando a primeira camada de pele foi riscada pela lâmina.

            - A pressão está caindo rapidamente. – Melissa afirmou.
            Richard sabia que não podia se deixar apavorar. Eles estavam controlando os sinais vitais e não poderia errar por um milímetro. Lis tinha poucas chances. Não iria desperdiçar nenhuma. Minutos se passaram e camada por camada ele fez as incisões necessárias.
            Quando chegou ao bebês e tirou do útero, sua fragilidade era assustadora. Não deveria pesar nem 800 gramas. Estava formado, mas cabia na palma da mão.

            - Incubadora, rápido! – Gritou mesmo sabendo que a equipe era capacitada e estava pronta para agir.

            Um pediatra assumiu e na troca de olhares entre os médicos a perspectiva era claramente ruim. Enquanto se voltava para retirar a placenta, verificar se não haviam lesões no útero e suturar a incisão, ouviu o pediatra nervoso ao fundo.

            - Ela precisa de um respirador mecânico. Já! Ou os pulmões não vão suportar. – Dizia ele já retirando o bebê daquele espaço. – Os pulmões estão parando.

Enquanto isso, na recepção, Neal andava de um lado para o outro querendo saber de notícias. As duas mulheres da sua vida se encontrava em uma sala de cirurgia e ele ali esperando sem poder fazer nada, nem mesmo doar seu próprio sangue. Peter era o único doador compatível com Rachel.
Quando uma enfermeira levou Peter para fazer a transfusão, Neal tentou ir junto na esperança de vê-la. Foi impedido pela enfermeira e apesar de retrucar, teve de aceitar e aguentar mais da infindável espera. Nem os médicos para dar alguma informação sobre o estado de Rachel e de Lis. Passa-se 1 hora até Peter voltar.

- Obrigada por ajudá-la. – Disse Ell ao lhe dar um beijo delicado nos lábios.

            Richard queria estar com Lis, mas não podia. Tinha que garantir a Rachel a melhor chance de sobrevivência. Foram várias notícias negativas e algumas positivas. A melhor era a descoberta de que a fratura de duas costelas machucou, mas não chegou a perfurar o útero ou qualquer outro órgão. A pior era que a cesárea intensificou a perda de sangue e com isso a pressão baixou ainda mais.
           
            - O coração está parando. – Melissa avisou solicitando o desfibrilador.
            - Sutura feita. Prepare a transfusão de sangue. – Richard com isso fazia tudo o que lhe cabia e deixava que outros profissionais assumissem.

            Nenhum deles se surpreendeu quando o sinal cardíaco que soava ao fundo deixou de ser suave e intercalado para passa a um som assustador e contínuo. Um som que todo médico vinculava a morte. Significava a parada cardíaca.
            Richard sabia que a melhor coisa que faria naquele momento era deixar a Drª Melissa trabalhar. Ela era a pessoa mais capacitada naquele momento. Ficou ai observando enquanto ela se preparava para reanimar a paciente com choques no peito.

- Carga leve. Vamos! Um, dois, três. – Eles aguardaram e bombearam ar. – Preparem! Mais uma vez. Um, dois, três! Vamos Rachel, você tem uma vida pela frente. Vamos! –

Richard saiu da sala cirúrgica indo direto UTI neonatal para saber do estado de Lis. Nesse momento ele já não tinha as mãos tão firmes. O conhecimento profissional o fazia temer por mais otimismo que desejasse impor a si mesmo.


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Ligar com a morte era a mais dolorosa das comuns atividades médicas. Morrer era obvio, era o comum, era necessário. Mas não daquela forma. E quando o Dr. Richard atravessou os corredores hospitalares para ter aquela conversa com Neal seu coração também sangrava.
Quando apareceu na porta da obstetrícia e chamou Neal para uma conversa em particular, todos os demais desabaram em suas cadeiras na recepção. A cena típica de filmes em que o médico sai e diz ‘a cirurgia ocorreu como esperado e a paciente vai se recuperar’ parecia fantasiosa demais. Neal seguiu sozinho e calado pelo corredor. Vendo-o, Peter se levantou. Nunca o tinha visto desanimado assim. Precisava dar apoio ao seu amigo.
            - Eu vou junto. Acompanhei todo o resgate e...ela estava sob minha responsabilidade no FBI. – Disse explicando sua presença na sala. Neal e Richard não pensaram em lhe pedir para sair. Qualquer apoio era bem vindo.
            - Eu serei direto, Neal. – Richard disse assim que fechou a porta do consultório que o hospital lhe cedeu para conversar com o noivo da paciente que acabara de operar. – Eu fiz o que prometi a você e a Rachel... fiz de tudo para salvar as duas. Neal...
            - Diga logo o que tem a dizer! – Pelos olhos embaçados de lágrimas ele via o médico. – Fale!
            - A Rachel deu entrada no hospital com uma grave hemorragia interna, ocasionada por fraturas nas costelas que lesionaram órgãos, entre eles o útero. Não tínhamos muitas chances de salvar a bebê. Os batimentos cardíacos do feto estavam fracos e esperar acabaria por arriscar ainda mais a vida da mãe. Eu sinto muito. Mas sua filha morreu logo depois do nascimento. – O médico disse.
            - Não! Não! – A intenção era gritar. Mas a voz saiu fraca pela garganta de Neal.
            A notícia já era imaginada. Mas eles mantinham alguma esperança. Uma fé sem explicação científica os fez acreditar que havia alguma chance de Lis nascer bem e sobreviver. Não foi assim. Neal olhava para o chão, calado, tentando entender e aceitar o que naquele momento parecia um pesadelo. Sentiu a mão de Peter em suas costas em sinal de apoio. Era bom tê-lo ali.
            - A causa da morte foi parada respiratória. Os pulmões não estava completamente formados ainda. – Informou.
            - Conte conosco, Neal. – Peter simplesmente não sabia o que falar. Ele queria poder ajudar mais.
- Como ela já tinha mais de cinco meses de gestação, o corpo estava formado, você o receberá para fazer o sepultamento. – Richard parou e esperou Neal assimilar as informações antes de continuar. – Eu sei que é difícil, mas...
            - A menos que o senhor tenha recebido essa notícia quanto a um filho seu, Dr., não, o senhor não sabe. – Ele não conseguia chorar. As lágrimas estavam ali embaçando seus olhos e não rolavam. Era como se o sofrimento não quisesse deixá-lo. – Não sabe o quanto dói. Saber que ela estava perfeita horas atrás e...que não nasceu saudável porque um imbecil lhe impediu.
            - Neal...acalme-se. – Peter disse abraçando-o. O ombro amigo era a melhor ajuda que podia oferecer. – Deixa que eu cuido dos detalhes para a retirada do corpo e do sepultamento.
            - A Rachel...ela não vai superar isso. A gente não vai. – Ele encarou o médico. – Ela está bem, não está? Está acordada? Posso vê-la? – O médico não respondia. E ele foi se assustando. - E a minha mulher? Ela...ela está bem? Não é?
            - Ela está viva, Neal. – Bem não era a palavra que o médico usaria. Achou que perderia aquela jovem na mesa cirúrgica. Além disso, perder um filho em uma gravidez tão adiantada era algo agressivo física e psicologicamente. – Ela teve uma parada cardíaca, mas foi reanimada. Também realizamos uma transfusão de sangue. Será uma longa recuperação. Sem dúvida a cesariana, agravada pelas fraturas nas costelas, é o pior. Mas, de forma geral, ela está bastante machucada. Por alguns dias, a equipe médica a manterá sedada. Ela precisa estar com o corpo mais forte para receber a notícia da perda da filha.
            - Quando acordar totalmente a criança já estará sepultada. – Peter deduziu.
            - Ela  não vai me perdoar por isso. Eu jurei que ia proteger meus filhos e...Lis está morta. – Neal parecia em outro mundo. – E não poder se despedir da filha...não irá me perdoar.
            - É o melhor, Neal. – Richard reafirmou. – Ela não teria condições físicas nem emocionais de acompanhar o enterro ou a cremação. Seria sofrer ainda mais.

            Quando saíram da sala para voltar à recepção, Peter tornou a abraçar Neal e a reafirmar que estaria ali para o que precisar. Depois lhe deu um conselho:
            - Por mais sofrido que seja, você terá que superar, Neal. Tem George. E terá que estar firme quando Rachel abrir os olhos. Não pode desmoronar, Neal. E nós estamos aqui para te apoiar. – Quando chegaram a recepção Peter fez sinal pedindo para evitar comentários. – Mozz, leve Neal pra casa. O George pode ficar hoje com a babá que está com Teddy.
            - Não! – Neal disse. Não queria perder George de vista. Agora mais do que nunca. – George vem comigo.
            - Ok. Ele vai com você. – Elizabeth concordou que ele precisava do filho. Eles não sabiam o que aconteceu, mas estava na cara que o final não foi feliz. – Nós ficaremos, Peter?
            - Sim. Eu vou cuidar da papelada do sepultamento de Liz. - E, se tiver alguma notícia do estado de Rachel eu ligo. Ela ficará sedada por bastante tempo. Fique comigo, Ell. Preciso de você. – Ele fez um sinal para Mozz ficar mais um pouco quando Neal já saia. Depois falou em tom baixo. – Fique de olho nele. Tenho medo que faça alguma bobagem.

            Todos estavam em choque. Calados começaram a deixar a emergência. Menos Nicolle. Ela permaneceu sentada ali. Shepherd pediu que Henrique o esperasse no térreo do prédio e foi falar com ela. Ofereceu-se para levá-la em casa, para conversar, para apenas ouvi-la, para emprestar o ombro e ouvir seu choro. Ela o ignorava.

            - Nicolle, por favor, fale comigo. Não quero te deixar sozinha aqui. Você ouviu o Peter...ela está medicada. Não irá acordar.
            - Vá embora! Eu vou ficar com minha filha e minha neta!
            - Não posso te deixar aqui.
            - Não devia nem ter vindo! – Nicolle estava agressiva. – Ela estava bem, estava feliz construindo a família dela. E você apareceu trazendo desgraças! Veio esfregar esse distintivo em nós, Shepherd, e ameaçar devolvê-la para uma cadeia na Europa. Minha neta podia estar viva!
            - Eu ter ficado na Inglaterra não iria barrar Harabo, Nicolle. Não tive culpa nisso.
            - Mas não a protegeu! Ao contrário, a amedrontou! Eu e John confiamos em você e tudo o que fez foi forçá-la a esconder minha neta de todos.

            Shepherd pensou antes de responder. Precisava reconhecer que por muito tempo se manteve dividido entre o carinho que sentia por ela e as decepções que lhe causou.

            - Nunca foi minha intenção. Eu posso ter errado, Nicolle. Mas também estou sentindo por como isso terminou. – Ele a abraçou sabendo que ela desprezava seus sentimentos. -Mesmo com raiva por tudo de ruim que ela já fez, eu quero o bem dela.
            - CHEGA! CHEGA! Parem de falar dos erros dela! Será que não basta tudo que ela já pagou? Ninguém merece sofrer a morte de um filho. Não é castigo o suficiente para vocês?
            - Existem leis Nicolle. Eu apenas as sigo. – O que ele ia falar era duro demais, mas era verdade. – As pessoas que Rachel matou também tinham mães que choraram suas mortes. Assim como ela irá querer que Harabo pague pelo que fez, aquelas famílias também desejavam justiça. Foi por isso que ela foi procurada pelas agências.
            - Que se danem as leis! Que se explodam as agências! Não puderam protegê-la. – Ela tentou se acalmar. – Shepherd, eu sei no que você acredita. John era assim. Mas não aceito isso como justiça. Ela tentou mudar, melhorar. Ela e aquele rapaz criaram uma família, não comum ou tradicional, mas uma família. Eles tinham que poder seguir em frente e deixar os erros no passado.
            - Nós vamos tentar ajudá-la a superar isso, Nicolle. – Ele tornou a abraçá-la. – Agora deixe eu te levar pra casa.
            - Não! Eu vou ficar com ela. Aqui. Sou mãe dela, vou ficar.

            Peter ainda ficou no hospital por 3 horas. Cuidou da liberação do corpo junto com Nicolle. Preparar para que um bebê fosse enterrado era uma das tarefas mais difíceis. Ninguém estava preparado para isso. Não fariam nenhum cerimonial, apenas o sepultamento. Precisavam terminar ou minimizar aquele sofrimento. O sepultamento foi marcado para as primeiras horas do dia seguinte.
            Já sobre o estado de Rachel, a equipe médica afirmou não ter notícias concretas, mas que isso era um sinal positivo. O quadro estava estabilizado e a manteriam sedada por no mínimo mais 24 horas.
            Peter também não esqueceu que haveria mais um enterro. Por celular, Diana lhe deu informações da caçada a Harabo que, até o momento, parecia invisível e também informou que o corpo de Jones foi liberado e que seus familiares resolveram sepultá-lo em sua cidade de origem.
            - Chefe...eu vou ao enterro. Vou pedir para Mozz ou June olharem o Theodore e vou me despedir dele. Volto nessa noite ainda.
            - Claro, Diana. Leve meus pêsames à família.

            Quando se reuniram na casa de Neal, Elizabeth tentou oferecer algum conforto a ele, mas estava perdido. Não queria acreditar na morte da filha. Nem mesmo George conseguia tirá-lo daquela inércia. Mozz lhe deu uma garrafa de vinho, mas ele preferiu beber algumas doses de vodka.

            - Eu não sabia que ele bebia coisas tão fortes. – Ell espantou-se.
            - Não bebe. Não em circunstâncias normais. – Mozzie respondeu. – Não dá para condená-lo.

            Naquela noite fizeram uma espécie de revezamento. As crianças dormiram em um dos quartos de June, cuidados por uma babá. Ell, Mozz, Peter e June cuidaram de Neal e o colocaram na cama quando ele apagou pelo excesso de álcool. No meio da madrugada, Henrique apareceu.

            - Não consegui dormir. – Disse ao se juntar a eles.

            Elizabeth ainda tentou telefonar para Henry. O amigo de infância de Rachel tinha o direito de saber o que aconteceu e, mesmo que estivessem brigados, duvidava de que ele não viria apoiar. Mas ela não conseguiu ligação.

            - Nós tentamos pela manhã, Ell. – Peter disse.


            Quando o sol nasceu, Peter e Mozz fizeram Neal entrar no box e acordar sob o jato da água. June colocou na sua frente uma xícara de café e esperaram que ele desse sinal de que podia receber as notícias da manhã.

            - Não foi tudo um pesadelo.  – Não houve bom dia.
            - Infelizmente não, Neal. – Peter lhe disse.
            - Rachel... – Ele sequer completava a pergunta.
            - Passou bem a noite e vai se recuperar. – Ell o tranquilizou.
            - E George está agora mesmo tomando a mamadeira. – June disse.

            As lágrimas voltaram aos olhos dele. Impossível pensar em George e não lembrar que deveria ter outro bebê com quem se preocupar. Todos perceberam o que Neal queria perguntar, mas não conseguia.

            - Você precisa se trocar, Neal. E participar do sepultamento. É em um hora. – Peter falou.

           
            Sem alternativa ele foi se despedir da filha. Teve um momento sozinho com ela. Só ele e Lis. O pequeno caixão branco era fechado então não pôde ver o rostinho de Lis. Era uma prática para não assustar ou fazer sofrer ainda mais os entes que perderam a criança afinal o bebê não estava pronto para nascer e não tinha uma aparência saudável.
            Tudo o que Neal fez foi olhar para o caixão e pedir perdão por não ter conseguido protegê-la. E agradecer por toda a felicidade que trouxe a eles naqueles cinco meses em que a esperaram.

            - Não vamos esquecê-la nunca, filha. – Disse.

            Logo Nicolle e os demais se juntaram a ele e Lis foi sepultada. Ell e June voltaram para casa com a intenção de sair com as crianças. Não podiam deixá-las presas em casa daquela forma e o clima terrivelmente pesado em casa. Nicolle abraçou Neal e disse que voltaria ao hospital.
            - Eu vou com com você...preciso vê-la.
            - Também quero e ontem não me deixaram ficar com ela. – Nicolle respondeu.

            Shepherd, Peter e Henrique planejam ir a sede do FBI para dar andamento as investigações. Diana já havia retornado do enterro de Jones e estava desde cedo trabalhando na busca de Harabo. Por mais que desejasse ver Rachel, Neal quis ir ao FBI e ao menos se inteirar da investigação.
            Enquanto todos reuniam suas pesquisas antes da reunião, Peter foi até sua sala assinar documentos referentes aos outros casos que ficaram parados pela falta dele no escritório e  tentou verificar com Henrique coisas que não queria falar na frente de Neal. Precisa se certificar legalmente de que todo o tempo de recuperação de Rachel seria autorizado pelo juiz como parte do acordo, mesmo que ela não estivesse trabalhando no FBI.

            - Precisa constar como prisão domiciliar. O tempo no hospital e também quando vier para casa. Eu e Shepherd assinamos a solicitação.

            Parou de falar ao observar Neal. Ele estava sentado à sua mesa na parte de baixo da Divisão de Colarinho Branco. Tentava escrever algo em um papel, mas sua mão tremia. Seja o que estivesse tentando escrever, ele mesmo desistiu e simplesmente ficou observando, olhando ao longe sem foco algum. Neal estava longe de se recuperar.


            Quanto a Harabo a reunião foi um fracasso. Por mais que todos estivessem reunindo esforços, não havia nenhuma pista. Tinham apenas a certeza de que ele não saíra dos EUA.

            - Estamos rastreando a moto e alguns contatos dele. Mas até agora nada. Ele desapareceu. – Diana afirmou.
            - Ele está nos EUA e ficará até saber o que aconteceu com Rachel. Está obcecado. Quer acabar com ela. – Shepherd disse.
            - Só que agora ele não é o único obcecado! – Neal respondeu pouco antes de sair da sala de reuniões.


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            Neal pode ficar pouco tempo com Rachel naquele dia. Ficou mais tranquilo ao perceber que Rachel já tinha uma cor saudável no rosto. Aparentava uma fragilidade que nunca tinha visto nela, porém já infinitamente melhor do que no dia anterior. Agora ela já não aparentava estar morta.

            - Ela vai voltar para nós. – Nicolle disse se aproximando do leito e ajeitando a roupa hospitalar que a filha usava. – O leite desceu. Um pecado. Terão de medicá-la para secar.
            - Eu não sei como falarei com ela, Nicolle.
            - Não há uma forma menos dolorosa. Fale e a ajude a superar a dor, a torná-la suportável.

            Todos se revezaram na emergência pelas horas que se seguiram. Apenas Nicolle e Neal tinham autorização para entrar no quarto enquanto Rachel estivesse sob efeito da medicação. A partir do início da noite a dosagem seria reduzida e na manhã seguinte ela deveria acordar aos poucos.
            Neal passou a madrugada no quarto com ela. Por volta das 3hs ela se mexeu e gemeu pela dor. Não chegou a acordar completamente, mas era claro que ela estava voltando à consciência.

            - Calma, amor. Eu estou aqui com você. – Ele lhe disse tocando-a na testa.

            Por volta das 7hs Neal acordou e viu que Rachel seguia dormindo. Saiu para pegar um café e ligar para casa, além de precisar esticar as pernas.
            Quando bebia o café no corredor da ala onde funcionava a maternidade ouviu vozes conhecidas. Olhou em volta e logo reconheceu Henry. Ele falava nervosamente ao celular enquanto  Molly era levada em uma cadeira de rodas. Molly estava em trabalho de parto. A maior parte dos casais vivia momentos felizes naquela ala do hospital. Henry acenou e veio lhe cumprimentar enquanto Molly era levada por uma enfermeira.

            - Neal...eu...não esperava te ver...
            - É...nem eu esperava estar aqui. A Rachel está internada.
            - Como assim? Porque? Aqui nessa...
            - É uma história gigantesca, Henry. E com final infeliz. Ela estava grávida e deu a luz prematuramente. Nossa  bebê viveu por poucos minutos. – Neal se deu conta de que não era um bom momento para dizer isso a Henry. – Desculpe. Seu filho está nascendo e eu lhe dizendo isso.
            - Não...eu só estou em choque. Por Deus, Neal! Como ela está?
            - Dopada. Ainda não acordou e não sabe de nada. Ainda não pode receber visitar fora da família, quando puder eu te aviso.
            - Eu quero vê-la! – Henry estava em choque e arrependido de não ter insistido em vê-la, mesmo que ela não desejasse.
            - Henry! Fica comigo! – A voz de Molly foi ouvida ao longe.
            - Acho que a Molly está precisando de você.
            - Eu vou vê-la...preciso acompanhar o parto...mas assim que eu puder vou vir aqui procurar vocês..

            Neal retornou ao quarto e ficou esperando Rachel acordar. O relógio marcava 7h22min. Algumas vezes ela tentava se mexer e parava ao perceber as dores na região abdominal. Até que em um momento ela realmente abriu os olhos e encontrou Neal ao seu lado.

            - Bem vinda de volta. – Ele beijou-lhe a testa. – Eu estou aqui. Estou com você.

Esperava-se certa confusão naqueles primeiros minutos. Ela deveria não saber onde estava, nem imaginar que tinha dado a luz. Realmente foi assim. Apenas encarou-o com olhos confusos por algum tempo. Até que levou uma das mãos ao ventre e sentiu que não carregava mais Lis.

            - Neal...cadê...cadê? – Ela queria ouvir o que seu coração já havia dito. – Onde ela está? Tiraram ela de mim...onde está? Lis...
            - Rachel, você precisa ser forte agora. – Ele percebi nela o nervosismo e discretamente apertou o botão para chamar a enfermeira.
            - Não... – Ela sabia o que ele ia falar. – Lis estava viva. Eu sentia ela.
            - Mas ela era muito novinha e não sobreviveu, amor.
            - Não! É mentira! Você está me enganando....não...eu a sentia!
            - Mas ela não sobreviveu ao parto. Ela era pequena demais para respirar aqui fora. – Era tudo tão doloroso. Não sabia mais o que lhe dizer.
            - Então porque a tiraram de mim?!?! Não deveriam tê-la tirado. – O pranto desesperado a fazia tremer e Neal imaginava o quando de dor isso deveria causar. - Eu ia proteger ela, eu ia.
            - Você estava com uma hemorragia. Se não tivessem feito o parto, eu teria perdido as duas.

            A enfermeira entrou com uma medicação.

            - O que é? Não quero dormir mais. Parem de me dopar! Me doparam para matar minha filha! Vocês mataram minha filha. – Ela estava descontrolada.

            - É apenas um calmante senhora. Não vai adormecer. – A enfermeira experiente disse e deixou o copo d’água e o remédio ao lado da cama. – Vou colocar aqui para a senhora tomar quando achar necessário.

            - Não quero! Assassinos! Assassinos! – Ela gritava e tentava sair da cama.

Quando ficaram sozinhos novamente, Neal apertou-a na cama e falou mais firmemente, olhando em seus olhos. – Eu preciso de você, Rachel. George precisa de você. Por mais que doa saber que a gente perdeu a Lis, você não vai desmoronar. Você vai fazer o que sempre fez quando caiu: vai levantar. Não vai me abandonar agora. Eu preciso da mulher forte que você é ao meu lado agora! – Um instante depois estendeu-lhe o remédio e a viu abrir a boca.

- George está bem? – Perguntou ela já mais calma.
- Sim. Está com June ou com Mozz. Está sentindo a sua falta.
- Também sinto a falta de meu menininho. Muita falta. – Ela se lembrou melhor da noite do sequestro. – E o Jones?
- Já foi sepultado. Não pensa mais nisso, Rachel. Não foi sua culpa.

Apesar de já haver liberação médica, Neal pediu que por enquanto as visitas não viessem. Nicolle viria passar a tarde com ela. Mas os outros ainda ficariam distantes. O calmante fez efeito, mas ela seguia muito frágil. Ficou acordada por uma hora e não falou mais nada. Apenas aceitou as carícias no cabelo e acenou com a cabeça dizendo que não queria nenhuma medicação para  a dor. Quando a médica veio ela tornou a se alterar e demorou para permitir-se ser examinada.

- Foi o Richard a fazer o parto, amor. Você sabe que ele jamais faria mal à nossa filha. – Era o ultimo argumento para trazê-la de volta a realidade.
- Richard?
- Sim...ele fez o que pôde. A tarde ele virá coversar com você e te examinar. – Ela estava visualmente cansada. – Dorme um pouco. Você vai acordar mais forte.


Entre o sono agitado e períodos de breve consciência, Rachel passou as próximas 4 horas. Tempo em que Neal não arriscou sair do hospital porque ela o chamava a todo o momento. Curiosamente, quando Richard chegou para examiná-la, expulsou-o o quarto. O médico fez sinal de que era melhor mesmo sair e não contrariá-la.

Ao sair até a recepção, Neal viu Henry perguntando por Rachel Turner e sendo informado que a família não estava autorizando visitas.

- Mas eu quero saber o estado dela. – Dizia.
- Eu te falo, Henry. Deixe eu pegar um café e a gente conversa. – Com passos lentos ele fez exatamente isso. – Ela está com Richard agora. Por isso saí. Tenho medo de deixá-la sozinha. Está nervosa e paranoica. Demorou a aceitar que o bebê não sobreviveu.
- Ela não me disse que estava grávida. Porque?
- Poucas pessoas sabiam. E ela andava chateada com você. Esperava que você tivesse notado a gravidez e, como não percebeu, resolveu não falar.
- Estive coberto de problemas com a Molly. Ela teve uma gravidez difícil e foi...foi a grávida mais fresca que você pode imaginar. Eu passei todos esses meses tentando agradá-la e cuidar da empresa. Mas nunca me negaria a ajudar a Rachel.
- Eu sei, Henry. E ela sabe também. Ela andava mais sensível e...ficou magoada por não receber sua atenção. Tenho certeza que vai receber bem sua visita. Pode entrar par vê-la assim que Richard deixar o quarto.
- Como ela perdeu o bebê? – Henry não sabia de nada do que ocorreu nos últimos meses.

Sem entrar em muitos detalhes porque estava com a cabeça explodindo Neal contou o que aconteceu. Desde sua prisão, a chegada da MI5 e as ameaças de Harabo. Até o sequestro e do horror que ela viveu nas mãos da antiga inimizade.

- Joseph Harabo. Eu achava que esse demônio estava morto. Desgraçado! Já o pegaram?
- Não. Nem tem pista de onde está.
- E estão com segurança aqui? Ele pode voltar.
- Ela não ficará sozinha por momento algum. – Havia policiais e amigos para se revezarem com ela. – E você? Nasceu o herdeiro?
- Sim. É um menino. – Henry sorriu e sacudiu as mãos. – Aliás...eu deveria estar comprando o leite dele. Molly não conseguiu amamentar. E ele provavelmente vai acordar com fome.

Mas Henry ainda demoraria para ir buscar o leite do filho. Quando estavam se despedindo, Richard saiu do quarto e chamou Neal. A preocupação com a amiga falou mais alto e ele também foi.

- Olá Henry. – O médico não se surpreendeu ao vê-lo ali. – Quem sabe, Henry, você fica com Rachel enquanto eu falo com Neal?

Henry abriu o quarto um tanto nervoso e inquieto. Esperava que Rachel o enxotasse dali aos gritos. E se ela o fizesse, sairia dali rapidamente para não deixá-la nervosa. Bateu na porta e espiou discretamente. Lá estava esta ela, escorada em travesseiros e com os olhos marejados. Não disse nada quando o viu e ele encarou isso como um convite para entrar. Passo por passo e ainda em silêncio, aproximou-se da cama e viu as lágrimas rolarem pelo rosto dela. Rachel apenas esticou os braços. A amizade deles sempre foi assim. Não precisavam dizer nada.
Sentado na lateral da cama, Henry segurou Rachel nos braços e abraçou enquanto ela chorava por longos minutos. Sentia as lágrimas dela molharem sua camisa enquanto apenas acariciava seus cabelos.

- Minha amiga, minha amiga...porque mesmo a gente ficou afastados? – Tinha um humor amargo na frase.
- Por alguma idiotice sem a mínima importância agora.- Rachel respondeu. – Me tiraram a minha filha, Henry. Minha Lis.
- Sim, eu conversei com o Neal. Ela nasceu morta.
- É...morreu. O Richard disse que os pulmões dela era frágeis demais. Mais alguns dias dentro de mim e ela ia ter sobrevivido. Mas o Harabo apareceu.
- Você tem que superar isso, Rachel. – Ele sabia o quanto era difícil o que ele lhe pedia. – Erguer-se e voltar a vida.
- Eu sei...e eu vou...vou viver pra acabar com ele.
- Não, não. Tire esse pensamentos ruins da cabeça.
- Harabo é um homem morto, Henry. Morrerá assim que eu sair daqui. Pode escrever. – Ela disse sendo completamente sincera.

Henry iria continuar tentando convencê-la a se acalmar. Mas Richard e Neal entraram e a viram exatamente como antes. Encostada no amigo. Neal não sentiu ciúme. Ficou feliz por ela ter encontrado o conforto que precisava.

- Eu e Neal conversamos, Rachel. Exatamente o que nós dois falamos também. Você está se recuperando. É só se comportar. Vejo que Henry lhe fez bem.
- Ele sempre faz. – Ela apertou a mão do amigo. – Mas...eu não sabia que Neal já tinha avisado a todos. Eu não podia receber visitas.

Neal e Henry trocaram um olhar. Não achavam que lhe dizer que Molly tinha dado a luz fosse positivo. Ver bebês poderia ser algo sofrido para ela.

- Aaaa eu não sou visita. Sou tipo um irmão. – Brincou.
- Não minta pra mim. E não troque segredos com Neal! – Ela tinha percebido o olhar. – O que foi? Eu conheço você, Henry. Mente mal pra caramba.
- Não estou mentindo. Vim ver você. – Ele insistiu. Melhor deixá-la se recuperar antes de falar do nascimento.

Mas Rachel viu no pulso do amigo a pulseira que dava acesso à maternidade do hospital. Henry não estava ali como visitante e sim acompanhante de alguém. Molly, é claro.

- Seu filho nasceu. – Não era uma pergunta. – Porque está me escondendo? Acha que eu não ficarei feliz por você. Acha que sou tão má assim?
-Não, não. Claro que não, Rachel. Eu só...não quis te fazer sofrer. Só isso. Bobagem minha. – Ele a fez se deitar na cama novamente. – Logo você vai conhecer Daniel.

Neal olhou para Richard surpreso. Não esperava aquela reação de Rachel. Por mais que ela amasse Henry, saber do bebê poderia magoá-la. Mas não. Ela estava verdadeiramente feliz.

- Eu quero conhecê-lo sim. Vai ser bom ter um bebê nos braços. – Ela voltou a se emocionar. – Ainda lembro de quando tiver George recém nascido mamando no meu peito. É uma sensação única.

- Rachel, lembre-se do que eu te falei. – O médico a lembrou. – Nada lhe impede de engravidar novamente no futuro.

O celular de Henry tocou interrompendo a conversa. Era a mãe de Molly dizendo que a filha estava nervosíssima porque Daniel acordou com fome e ele não retornou com o leite.

- Droga! Eu tenho que ir. – Ele queria se despedir de Rachel calmamente para ela não se sentir magoada. – Eu venho te ver. Só tenho que ir comprar leite para Daniel. Ele acordou nervoso e parece não poder esperar.
- Porque comprar leite? – Ela disse. – O do peito é melhor. Mais saudável. George mamava só no peito.
- Molly não tem leite. Ela queria dar de mamar, mas não conseguiu. – Ele beijou-a e se levantou. – Não posso deixá-lo com fome. Assim que eu acalmar a fome da ferinha eu volto.

Rachel olhou para a própria camisola marcada pelo leite que vazava de seus seios e não viu justiça naquela situação. Tinha algo muito errado no mundo. Mas ela podia concertar.

- Eu tenho leite. Traga Daniel e eu o amamento. – Ofereceu.

Os três homens se olharam sem saber o que fazer. Ela oferecia com uma naturalidade muito grande, mas eles temiam que isso a machucasse ainda mais.

- Rachel, eu acho que não lhe fará bem. – Richard falou.
- É, amor, melhor evitar isso. Você não precisa passar por isso. – Neal concordava.
- Passar pelo que? Segurar um bebê me fará mal? Não! Me fará muito bem isso sim! – Ela respondeu. – Vamos Henry! Vá buscar Daniel. Não vou deixar o menino com fome.
- Você tem certeza, Rachel? – Henry não achava aquilo nada natural, por mais que ela agisse daquela forma. – Não precisa.
- Henry, seja racional. – Nesse ponto Neal já sorria ao observá-la. Essa era a mulher forte que ele amava. – Você tem um filho e não tem leite. Eu tenho leite sobrando e não tenho um bebê para dar de mamar. Traga Daniel. A menos que Molly ache que irei envenená-lo.
- Está bem. Mas é só hoje. Depois ele beberá o leite em pó. – Concordou ele.

Henry buscou o menino e Molly realmente achou muito estranho a amiga de seu marido, inimizade dela, alimentar Daniel. Mas o pediatra garantiu que o leite materno poderia ser consumido por outro bebê. Não faria mal. E era melhor que qualquer outro alimento. Entre deixar o filho com fome e aceitar a oferta de Rachel, Molly fez a escolha que duvidava que faria algum dia.
Richard saiu pra lhes dar privacidade e Henry se manteve afastado para não causar ciúmes em Neal. O que importava era que Daniel mamou com vontade por vários minutos. Claro que era doloroso para Neal e Rachel. Era para Lis estar ali mamando saudável. Mas ela havia ido para o céu cedo demais. E Daniel estava ali. Então que aproveitasse o alimento.
            Quando acabou de mamar e Henry o pegou Rachel lembrou o amigo de fazê-lo arrotar antes de deitá-lo. Ela já estava com a camisola abotoada novamente quando ouviu a porta se abrir. Era Molly ainda na cadeira de rodas.

            - Henry já ia levá-lo. Eu não vou roubá-lo, Molly. – Rachel disse.
            - Eu sei. Vim te agradecer. – Não era fácil para Molly dizer isso. – Henry me disse o que lhe aconteceu e eu sinto muito. Jamais te desejaria nada assim.
            - Eu não quero falar disso com você...parabéns por Daniel. É um menino lindo.

            Henry entrou Daniel para a mãe e começou a empurrar a cadeira. Era melhor não prosseguir com aquela conversa.

            - Vamos Molly. Você e Rachel precisam descansar.
            - Sim, vamos. Obrigada, Rachel. Agradeço pelo que fez por meu filho.


           

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