Jonas preparou o chá e colocou nele algumas gotinhas de
um calmante. Caso soubesse, Emily não gostaria nada. Mas não conseguia vê-la
naquele desespero. Em todos esses anos de relacionamento sempre viu Emily como
uma mulher controlada, segura de seus desejos e das escolhas que fez na vida.
Ela é uma mulher firme. E agora havia desabado. Ele não sabia como lidar com aquilo.
Tinha, no entanto, uma certeza. O seu próprio sofrimento
precisava ser suportado e escondido. Naquele raro momento de fraqueza Emily
necessitava de alguém forte ao seu lado. Alguém capaz de lhe dar a estrutura
necessária para manter-se de pé. Não era uma tarefa fácil. Não quando ele tinha
passado as últimas noites abraçado à cintura de Emily, imaginando a criança
que, sonhava, já estar ali.
- Está aqui seu chá Emily. – Disse ao entrar no quarto e
vê-la encolhida na cama, ainda chorando. – Como estão suas cólicas? Quer
colocar a bolsa de água quente?
- Não. Está suportável ainda. – Na frente dele ela
tentava se recompor.
- Ótimo. – Jonas puxou-a para seus braços. – Sabe que
esse não é o fim da história, não sabe? É apenas uma parte triste. Nós vamos
tentar de novo. Quantas vezes forem necessárias. Não importa quanto isso custe,
financeira nem emocionalmente, no final teremos nosso filho. E isso fará valer
todo o sofrimento.
- Eu sei. Não vou desistir. Mas dói.
- Acredite, também está doendo aqui. Mas nós vamos
superar.
- Porque a vida é tão injusta? Tá cheio de mulher grávida
por acidente. Meninas que não sabem o que desejam da vida. Não têm nem como
alimentar os filhos. Enquanto nós tentamos e não conseguimos. Por quê?
- Eu não sei, Emily. Mas nós seremos teimosos o
suficiente para lutar contra isso. Até conseguirmos.
O calmante fez efeito e Emily acabou adormecendo nos
braços dele. Após a longa noite de descanso, acordou mais tranquila. As cólicas
voltaram a incomodar, mas ela negou-se a se entregar à dor. Tomou seus remédios
e se preparou para o dia de trabalho. Para desespero de Jonas, arrumou-se e
maquiou-se elegantemente, fincando pronta para trabalhar logo cedo.
- É com trabalho que a gente supera os problemas. Sinto
que sou produtiva, faço algo de bom.
- Você também faz coisas muito boas aqui comigo. – Jonas
respondeu. Mas, no fundo, ficava feliz em vê-la forte e decidida novamente.
Aquela era a sua Emily. – Está bem. Não tentarei te impedir.
- Ótimo. Até porque eu vi sua agenda e ela está cheia de
reuniões. Nós dois não nascemos para ficarmos parados, Jonas. Eu vou para o
restaurante, você vender seus vinhos. Mas deixe as garrafas mais maravilhosas
para mim, ok?
- O melhor de mim está sempre reservado pra você, Emily.
– Jonas surpreendeu-a com a declaração que ia muito além dos vinhos.
- Nossa! Gostei disso. Eu te amo.
- Ótimo. Então cuide-se. Ficará até muito tarde hoje por
lá?
- Não. Sairei cedo. Mas porque tenho um compromisso ao
qual você não pode me acompanhar.
- Posso saber qual? – Jonas não gostou nada daquilo.
- Vou na costureira escolher meu vestido de noiva. E dá
azar o noivo ver. – Ela sorria falando.
- Então eu ficarei longe dele.
Jonas foi para o escritório sorrindo. Passou por Juliana
que o encarou como se ele fosse um estranho invadindo o escritório. Talvez
fosse mesmo. Estava mudando a cada dia. E isso era ótimo. Porque jamais se
sentiu tão feliz. Claro que estava triste por saber que Emily ainda não havia concebido.
Mas vê-la sorrindo e falando no casamento fez seu estado de espírito melhorar
muito. Se Emily já conseguia sorrir, ele também estava bem. Foi apenas um
adiamento. Nada mais.
Seu dia passou rápido. Ele visitou três compradores dos
vinhos Vicentin, fechou dois contratos e abriu caminho para outros. Eram
pequenos clientes, mas prósperos. A
tarde foi mais dura. O mercado da construção civil já viu dias melhores. E duas
obras com as quais a empresa contava foram adiadas. Sabendo que isso era uma
fase da qual o setor iria se recuperar, assinou a indicação para a JRJ
participar de um nova licitação. E deu o dia por encerrado. Ao andar por um
corredor, viu Jéssica passar de cabeça baixa carregando sua bandeja. Chamou-a na
sua sala.
- Algum problema, Senhor? – Ela perguntou ainda olhando
para o chão.
- Não, Jéssica. Sente-se, por favor. E me olhe nos olhos.
– Só quando ela fez o que lhe foi pedido seguiu falando. – Serei direto. Meu
irmão e você se aproximaram muito. E eu não consigo entender a razão. Mas eu
sei que isso foi um desejo dele.
- Sim, o Senhor Lorenzo me...ajudou bastante nos últimos
dias. Mas eu não pedi nada.
- Eu sei, não a estou culpando. Sei o quanto meu irmão é
persistente quando deseja algo. Só quero que você tenha atenção ao se envolver
com ele. Pode ser muito tentador ficar com um homem que pode lhe dar uma vida
tranquila e...
- Eu não sou assim. – Jéssica respondeu. – Não quero ser
sustentada pelo seu irmão.
- Fico feliz em ouvir isso, Jéssica. – Ficou mesmo. A
força com que ela se defendeu lhe pareceu sincera. Foi a primeira vez que ouviu
a voz de Jéssica se elevar a além de um sussurro. Ela estava falando a verdade.
– Pode voltar ao trabalho Jéssica. Juliana está analisando as possibilidades de
melhorar as condições dos funcionários terceirizados.
- Obrigada, Sr. Jonas. Com sua licença. – Ela saiu com a
mesma postura envergonhada de sempre.
Jonas deixou a empresa com os ombros mais leves após
falar com Jéssica. Talvez aquela menina fosse realmente quem seu irmão
precisava para ser feliz. Começava a concordar com ele. Jéssica era especial.
Feliz com essa conclusão chegou a pensar em ir ao restaurante fazer uma
surpresa à noiva, mas lembrou-se que ela, àquela hora, provava o vestido de
noiva. Resolveu então cuidar dela de outro modo. Ligou para Leonor.
- Algum problema, Jonas? – A médica e amiga de Emily
estranhou a ligação.
- Sim. Emily não lhe telefonou hoje?
- Não. O que houve?
- O procedimento não deu certo. Ela se sentiu mal quando
a menstruação desceu. Eu gostaria de ir conversar com você.
- Estou consultório. Venha sempre que precisar.
Ele foi. Não era apenas a decepção pela não gravidez. Ele
se preocupava com o reflexo disso no tratamento de Emily. E logo que explicou a
situação, Leonor não apenas concordou com seus temores como se disse indignada
por Emily não ter lhe telefonado.
- Sua noiva é muito teimosa, Jonas. Às vezes ela não se
ajuda. – A médica, naquele momento, falava mais como amiga. – Ela está
sofrendo. E, se a conheço bem, está esperando a dor diminuir para então ‘juntar
os cacos’ e vir aqui, começar tudo do zero. E nós podemos seguir com o
tratamento. É o que faremos a menos que vocês decidam desistir.
- Isso não vai acontecer.
- Fico feliz em ouvir isso, Jonas.
- A menos, é claro, que a gravidez se transforme em risco
para Emily. É somente isso que me faria impedi-la de engravidar. Há algum
indicativo disso? – Essa foi a dúvida que o trouxe ali.
- Digamos que a parte masculina num processo de concepção
é bem mais simples que a feminina. Nós temos os seus espermatozóides
congelados, eles se manterão inalterados para serem utilizados quando
desejarmos. Daqui a alguns anos, se esse for o seu desejo. Não é o caso do
corpo de Emily. Ela tem óvulos saudáveis, porém, o útero e as trompas estão
deteriorados pela endometriose. O passar do tempo é um complicador para Emily.
Podem surgir complicações.
- Nós temos um prazo então?
- Não é algo exato, Jonas. Nada no corpo humano é. Mas o
fato é que o tempo é um problema. Emily fez uma raspagem para melhorar suas
chances, com o tempo o efeito dela se extinguirá. E devido aos hormônios do
próprio tratamento, isso pode se acelerar. Vamos acompanhar a evolução do caso,
observar como o corpo de Emily responde ao tratamento. E só faremos novas
tentativas de inseminação enquanto tivermos certeza de que a gestação não será arriscada para ela.
- É, isso mesmo. Eu quero um filho, mas não à custa da
saúde de Emily. Se for necessário fazer aquele procedimento... – Ele não
gostava nem de dizer o nome.
- A histerectomia. Sim, será a nossa última alternativa.
- É, última.
Emily nunca ficou sabendo daquela conversa de sua médica
com Jonas. E foi melhor assim. Nunca concordaria em voltar a ter a
histerectomia como alternativa. Mesmo que última. Ia tentar até o final. Mesmo
que voltasse a sentir fortes cólicas, como aconteceu naquele mês. Ela percebeu
que ele ignorou compromissos profissionais, deixando de ir à construtora, para
ficar junto dela. Sua dedicação encantou-a ainda mais. E agora já não conseguia
disfarçar para Jonas quando não sentia prazer em seus braços.
Quatro dias depois, quando sua menstruação já havia
cessado, mas ainda sentia desconforto, ele a tinha brindado com uma noite
romântica. Ela passou aquela semana sem beber nenhum gole de vinho devido aos
fortes analgésicos e ele abriu a garrafa de seu favorito, como que para deixar
os dias sofridos para trás.
- Eu te amo cada dia mais. – Ela sussurrou em seu ouvido.
- Ótimo. Esse é o meu objetivo mesmo.
Mas quando transaram, a ardência que tomava conta do seu
colo do útero impediu-a de se concentrar naquele homem. Ela tentou fingir que
estava perfeitamente bem. Não conseguiu enganá-lo. A penetração foi muito
dolorosa. E quando Jonas percebeu e parou, saindo de dentro dela, perceberam as
marcas de um pequeno sangramento nos lençóis.
- Porque não me disse que não estava bem, Emily? Não pode
me esconder esse tipo de coisa.
- Me desculpe, Jonas...eu não achei que...que não
conseguiria.
- Que não conseguiria o que? Enganar-me? – Ele estava
realmente magoado.
- Que não conseguiria fazer amor com meu noivo. É um
pouco constrangedor, não acha? Nós vamos nos casar em algumas semanas e eu não
consigo satisfazer você! Já não consigo te dar um filho! Agora também não pude
aceitar que me toque! É insuportável isso!
- Nós não vamos mudar um milímetro dos nossos planos por
isso, Emily. Eu fui apressado. Não devia ter feito nada tão cedo. Essa semana
você ainda sentia fortes cólicas.
- Você não devia ter esse tipo de preocupação! Muitas
mulheres têm relações enquanto estão menstruadas.
- Mas a minha mulher é especial. Então não se preocupe
com isso.
- Especial não. Defeituosa! É isso que você quis dizer.
- Não, não é mesmo. Disse exatamente o que quis dizer. E
pare de se menosprezar. Você não é assim, Emily! Vou lhe dar um analgésico,
você vai relaxar e melhorar. E, quando estiver realmente bem, eu vou te mostrar
que você me satisfaz, completamente. Como nenhuma outra seria capaz. Nunca
duvide disso, Emily. Nunca.
Emily realmente repousou. E só quando isso aconteceu
Jonas entrou no banheiro e ligou o chuveiro. Tinha os músculos do corpo
enrijecidos. Por mais que fosse firme diante de Emily, era uma situação
difícil. Amava Emily e desejava-a. Ficar junto dela e não poder tocá-la era
realmente difícil. Após o banho ele voltou para o quarto e puxou-a para seus
braços. Se não podia amá-la fisicamente, ao menos a manteria junto dele,
absorvendo aquele calor e perfume que só dela conseguia absorver.
O afastamento realmente doía em um homem apaixonado. Não
só o físico. Ficar sem ouvir a voz da mulher que ama estava sendo difícil para
Lorenzo. Ele estava decidido a não pressionar Jéssica e por isso se afastou
garantindo a ela que se precisasse de qualquer coisa ele estaria ali para
ajudá-la. Mas não recebeu nenhum contato e estava com o coração doendo de
saudade. Em tão pouco tempo, Jéssica e Clara já faziam parte de sua vida. E,
sem elas, tudo parecia vazio demais.
Ele deixou o orgulho de lado e voltou até a casa delas.
Bateu palmas, chamou e ela não atendeu. Insistiu ao ver uma janela aberta.
Porque ela o estava evitando? Estava decidido a não desistir e seguiu
chamando-a. Foi Clara a aparecer na janela.
- Tioooo! Mamãe o tio Lorenzo tá ali no portão. Espera
tio! Não vai embora. – Gritou ela pouco antes de sair correndo.
- Eu não vou embora, Chiara. Pode apostar que eu não vou!
– Essa certeza ele tinha.
Jéssica não pareceu tão animada ao vê-lo. Tinha nos olhos
muita tristeza, até alguma mágoa. Ela realmente não parecia feliz e vê-lo e
isso o deixou decepcionado. Tudo o que desejava era ficar junto dela. E
ajudá-la a ter uma vida melhor, mais tranquila junto de Chiara e dele.
- Jéssica...senti sua falta. Queria te ver como você
está. - Ela não lhe dizia nada. – Tudo bem, Jéssica?
- Não, Lorenzo. Não está bem. E eu prefiro que você se
afaste de nós.
- Mas...porque? – Tinha de ter um razão ela estar tão
fria. – Eu só quero te fazer bem.
- Querer não é o bastante. Eu fui demitida, Lorenzo.
Primeiro seu irmão veio falar comigo e disse que estava preocupado. Depois fui
chamada no escritório da empresa que me contratou e me despediriam. Não falaram
a razão, mas eu sei que foi por me envolver com você!
- Não! Isso não é verdade!
- É sim. E eles estão certos. Não é certo uma servente
sair com o irmão do patrão. E agora eu estou sem emprego.
Ela realmente estava magoada. E Lorenzo entendia por que.
Até mesmo ele, caso ficasse sem uma ocupação estaria chateado. Imagine ela, que
dependia do emprego para cuidar da filha. Ele pensou em lhe garantir que lhe
daria tudo, que não precisava se preocupar. Mas desistiu quando prestou atenção
em seu olhar. Ela não queria ser sustentada. Precisava trabalhar. E não merecia
ser dispensada. Não fez nada de errado.
- Fique tranquila, Jéssica. Eu vou resolver isso. –
Garantiu-lhe.
- Não tem solução, Lorenzo. Eu vou começar a procurar
emprego. É a única saída.
Ao menos ela já lhe olhava nos olhos e parecia mais
decidida do que desanimada. Talvez conseguisse convencê-la de que poderiam
ficar juntos. Emprego seria um problema para resolver, mas nada que não
pudessem superar.
- Eu não tive culpa disso. – Ele se aproximou e pegou seu
rosto com ambas as mãos. – Só quero seu bem. Nunca faria nada para te
prejudicar. Jamais.
- Eu sei. É só que não adianta brigar com a realidade. Eu
não sirvo pra você, somos muito diferentes.
- Não, não somos. Eu vou resolver o problema. Só quero
saber se você gosta da minha companhia, se gosta de ficar perto de mim. –
Estavam muito próximos, os rostos colados – Junto de mim.
- É impossível não gostar. – Ela fugia do seu olhar. – Eu
senti sua falta. Queria que estivesse aqui.
- Ótimo. Eu tenho de ir agora, mas eu volto. – Ele se
afastou.
- Tio! Não vai embora! – Clara gritou. Parecia ter visto
o beijo, mas não ligou muito. – Brinca comigo.
- Não posso pequena. Mas não fique triste Chiara. Na
próxima vez que vier vou levá-la para passear num parque. Você escolhe.
Qualquer um.
Não podia ficar. Por mais que desejasse, não podia ficar.
Lorenzo acelerou seu carro até a JRJ Construtora. Ficou feliz ao saber que
Jonas estava em sua sala. Poderia esclarecer aquele assunto com ele. Não
aceitaria que seu irmão se intrometesse em sua vida e prejudicasse Jéssica.
- Por quê? Sem enrolação, Jonas! Por quê? - Disse assim
que entrou no escritório.
- Bom dia para você também, Lorenzo. – Jonas estava mal
humorado depois da noite difícil junto de Emily. Seu irmão ali, com cara de
poucos amigos, não melhorou em nada seu humor. – O que foi, Lorenzo?
- Não se faça de desentendido!
- Para isso eu tenho de entender. O que aconteceu?
- Aconteceu que você chamou Jéssica para lhe cobrar
explicações e, não satisfeito, ainda ordenou a demissão dela. Não acha que eu
já sou crescido o bastante para se envolver nos meus relacionamentos?
- Eu não sei de demissão alguma! Jéssica é funcionária de
uma terceirizada! Eu não decido a demissão deles. E se conversei com Jéssica
foi por me preocupar com você. – Ele explicou. – E gostei dela, se quer saber.
- É muita coincidência demitirem ela agora. Jonas, é uma
menina que precisa trabalhar. E o fato de estarmos juntos não atrapalhava em nada
em seu trabalho. Porque demiti-la?
- Eu não sei nada de demissão! Droga! Parece que não me
conhece! Mas é meio obvio que, se realmente quiser ficar com ela, não pode concordar
que ela siga servindo café.
- Não é você quem decide isso! – Lorenzo disse e saiu do
escritório do irmão.
Jonas não foi atrás dele. Conhecia Lorenzo o bastante
para saber que nenhuma explicação resolveria o problema. Precisava descobrir o
que tinha acontecido. E resolver o problema antes de qualquer nova conversa com
Lorenzo.
- Valquíria, por favor, peça que Juliana venha na minha
sala imediatamente. – Pediu à secretária e ficou esperando pela sócia.
Quando Juliana chegou, Jonas sabia que não tinha o
direito de cobrá-la de nada. Ela era proprietária junto com ele e Rafael. Mesmo
assim, ele merecia saber como as coisas andavam. Ainda mais em um assunto que
ele lhe tinha confiado.
- Juliana, eu lhe pedi para rever o contrato com a
terceirizada. E agora descubro que a funcionária que originou isso foi
demitida. Pode me explicar qual a ligação desses dois fatos?
- Bom, Jonas, eu fiz o que você pediu. Marquei uma
reunião com o diretor da empresa e verifiquei alguns itens do contrato. Nos
próximos meses entrarão em vigor alguns benefícios trabalhistas para eles.
Aumento de salário não, mas o vale refeição será ampliado e o horário de
trabalho flexibilizado.
- E porque Jéssica foi demitida?
- Eu não podia esconder a razão da reunião do diretor,
Jonas. Comuniquei-o do fato que originou o problema. E ele achou por bem
afastá-la. Logo estará em outra empresa. Não se preocupe. – Juliana respondeu.
- Problema? Eu não sabia que era um problema, Juliana.
Até onde sei, sempre primamos pelas boas condições de trabalho. E oferecer vale
refeição não é tão difícil assim.
- Representa custo num momento em que estamos em queda
nos negócios. Não foi fácil negociar esse acordo com eles.
- Pois devia ter me informado! Ela é importante para meu
irmão.
- Sinto muito, Jonas. Eu vou ver o que posso fazer.
Talvez ela possa se adequar em algum cargo do nosso RH. Se tiver o mínimo de
estudo, podemos colocá-la na recepção ou algo assim. – Ela não queria se
indispor com Jonas.
- Faça isso. – Jonas a dispensou logo depois. Deixando
claro que sua atitude o desagradou.
Emily ficou sabendo da briga e do que deu origem a ela
durante o almoço. Jonas veio ficar com ela e depois de alguma insistência,
ficou sabendo que ele e Lorenzo estavam brigados por conta da demissão de
Jéssica.
- Nunca gostei dessa Juliana mesmo. Tipo de ‘filhinha do
papai’ que faz o que deseja sem pensar nas consequências. – Disse ao noivo.
- É, foi um erro grave. Mas será resolvido. Ela será
recontratada.
- Acho que eu tenho uma ideia melhor. – Emily disse,
sorrindo, como uma criança que descobre um brinquedo novo. – Deixe comigo!
O plano foi simples. Ela telefonou para Lorenzo e pediu
que ele viesse ao restaurante no fim da tarde, antes do movimento de jantar se
acentuasse. E trouxesse Jéssica. No início ele recusou. Mas ela lhe garantiu
que sua intenção era a melhor.
Imaginou que não foi fácil para Lorenzo convencer Jéssica
a lhe acompanhar. Quando a hora marcada chegou, ela entrou no restaurante,
estava de mãos datas com a pequena clara, olhando a tudo, encantada.
Provavelmente nunca havia entrado num lugar tão bem decorado. Emily viu boas
chances de acerto com Jéssica. Talvez ela só precisasse mesmo de uma
oportunidade.
- Sejam bem vindos. É um prazer conhecê-la Jéssica. E
você também Clara. – Ela apenas sorriu em resposta. – Lorenzo, fico feliz por
ter aceito meu convite.
- Confesso que achei que encontraria Jonas aqui. – Ele
afirmou.
- Ele vem, mais tarde. E espero que todos possamos jantar
unidos, como uma família. Mas antes temos que resolver um assunto. Você poderia
me dar licença para conversar com Jéssica? – Emily o orientou a se sentar em
outra mesa com Clara. Eles seriam bem atendidos enquanto elas conversavam. –
Quero saber se você, Jéssica, gostou daqui. O que achou?
- É lindo. Fantástico.
- Ótimo. Porque eu tenho uma oferta para lhe fazer. –
Anunciou. – Jonas me disse que, erroneamente, você foi demitida do seu emprego.
- Sim, mas não foi culpa dele. Eu entendo suas razões. –
Jéssica respondeu. – Você não precisa se preocupar com isso.
- É verdade. E Jonas não me pediu nada. Mas ele vive
insistindo para que eu trabalhe menos. E estou pensando em seguir seu conselho.
Para isso, terei de fazer mudanças no quadro de funcionários. O restaurante tem
dois chefes de cozinha, eu e Bruno. Em rodízio, eu e ele coordenamos a cozinha.
Eu vou promover uma das cozinheiras ao cardo de chefe e, consequentemente, uma
das auxiliares à cozinheira. Assim poderei ficar mais tempo com Jonas. Isso me
abre uma vaga de auxiliar de cozinha. Fiquei sabendo que você cozinha um ótimo
feijão. Se quiser, a vaga é sua.
- Quero, é claro que eu quero. – Mas havia um problema. –
Não posso deixar Clara sozinha à noite.
- Não há problema com isso. Ela fica numa creche durante
o dia, certo? Você trabalhará durante o dia, com a equipe do almoço. – Emily
ofereceu.
- Eu quero ser sua auxiliar de cozinha então. Não tenho
palavras para te agradecer, Emily.
- Não agradeça, apenas aproveite a oportunidade. Não
estou fazendo nenhuma caridade, Jéssica. Estou contratando uma funcionária.
Você vai aprender um trabalho e exigirei que se dedique. Se fizer isso, terá
chance de ser valorizada e promovida. –
Emily viu Jonas entrar no restaurante e acenou para que ele se junta-se ao
irmão. – Agora, porque não deixamos os homens conversar enquanto eu lhe mostro
seu futuro local de trabalho?
Jonas e Lorenzo apertaram às mãos e selaram a paz. Jonas
nem mesmo sabia os detalhes do que Emily tinha feito. Só percebeu que ela tinha
contratado Jéssica quando ouviu-a chamar a garota para uma visita à empresa.
Ele sentiu o peito cheio de orgulho. Enquanto elas saíram conversando,
tranquilas, quase como velhas conhecidas, ele e o irmão puderam se falar.
- Desculpe se eu te ofendi, Jonas. Não tinha o direito de
te cobrar nada. Me excedi. E não tenho palavras para agradecer pelo que Emily
fez. – Lorenzo disse ao irmão.
- Não ofendeu. Lutou pelo que acredita. E a construtora
cometeu um erro grave. Nós iríamos contratá-la novamente, caso Emily não
tivesse feito primeiro.
Os dois seguiram conversando, beliscando e bebendo. Não
conseguiam ficar brigados ou afastados. Lorenzo, pela diferença de idade, foi
quase um segundo pai para Jonas. Aconselhou, ensinou e lhe mostrou como agir.
Mais tranquilos, falaram da vida na fazenda, da atual safra da uva, dos números
da vinícola e da família que deixaram em Bento Gonçalves e
lhe fazia tanta falta. Poderiam ter seguido ali por muito tempo. Não fosse o
celular de Jonas tocar. Era o engenheiro chefe deu uma importante obra e ele
precisou atender. Lorenzo assistiu o irmão ficar pálido no decorrer da
conversa. Por mais que não desejasse se intrometer, precisou perguntar qual o
problema.
- Sempre é feita uma vistoria no terreno ao final do dia.
– Jonas explicou. – Para verificar se os peões não deixaram nenhum material
descoberto ou maquinário no canteiro.
- E? – O que de tão grave poderiam ter encontrado.
- E durante a vistoria encontraram uma criança. Alguém
abandonou um bebê por lá. Eu preciso ir lá, chamar a polícia e o conselho
tutelar. Avise Emily, Lorenzo, por favor. Eu tenho de ir lá.
Ele saiu e deixou Lorenzo sentado ali, pensando em como
era possível alguém abandonar um bebê daquela forma. Não podiam ser chamados de
pais. Não quando, não fosse a atenção do chefe da obra, a criança passaria a
noite toda ao relento, abandonada.
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