Emily
internou-se na clínica mal passava das 7hs da manhã. Estava feliz, sorridente.
Aquele era o primeiro passo, apenas. Mas ao final da extenuante caminhada seus
dias de dor e solidão estariam concluídos. Havia, conforme Leonor tinha
esclarecido, a possibilidade de voltar a sofrer com os sintomas da endometriose
após o nascimento de seu filho. Mas ela não estava preocupada com isso.
- Se acontecer, se não houver
alternativa, nós podemos optar por uma histerectomia, total ou parcial. Nós
vamos avaliar os riscos, procedimentos e cuidados. E como você já terá um bebê,
não será algo tão traumático. – Disse a médica.
- Eu não quero pensar nisso por
enquanto, Leonor.
E assim Emily iniciou os
procedimentos. Com a paciente completamente anestesiada, Leonor realizou a
raspagem nos órgãos reprodutores de Emily, garantindo a saúde do útero e a
desobstrução das trompas. O procedimento durou menos de meia hora e logo Emily estava
na sala de recuperação. Ás 14hs foi levada para um quarto da clínica apenas
para um período de observação e no fim da tarde, por volta das 17hs, após ser
examinada pela doutora, seguiu para casa com a receita de seus já conhecidos
analgésicos, além de algumas recomendações.
- Manterá repouso por dois dias e
depois apenas caminhadas curtas por uma semana. Se houver sangramento, ligue e
chame uma ambulância. Eu não gosto da ideia de você sozinha. Se não há ninguém
para ajudá-la no pós operatório deveria ficar aqui essa noite.
- Bobagem. Ficarei ótima.
- Daqui cinco dias retorne e vamos
fazer ultrassom. Se tudo correr bem, em algumas semanas iniciamos o estímulo
hormonal para você conceber.
Jonas passou o dia cumprindo uma
extensa agenda de compromissos. Valquíria era muito organizada e apenas por
isso conseguia equilibrar todos os afazeres de um executivo que se dava ao luxo
de ‘sumir’ por quase um mês.
- Ninguém com juízo tem duas
empresas, tão diferentes e distantes, para liderar Jonas.
-É. Não tenho juízo mesmo,
Valquíria. Mas tenho você. – Ele respondeu, simpático. – E isso é ótimo porque
preciso que transfira o jantar com cliente de hoje para qualquer outro dia.
Marquei algo pessoal para às 20hs.
- Mas todos os dias das próximas
duas semanas estão tomados!
- Eu não pediria isso se não fosse
necessário. Por favor.
Aquele dia pareceu se arrastar. Ele
sentia-se apreensivo e não entendia o motivo. Chegou a pegar o telefone duas
vezes com o objetivo de ligar para Emily. Mas percebeu que ela deveria ter
feito escala e, caso já estivesse na França, estaria muito cansada e sentindo
os efeitos do fuso horário. Decidiu dar-lhe espaço e esperar que ela ligasse
quando sentisse vontade.
Quando a campainha de seu
apartamento tocou ele esperava se sentir mais relaxado. Afinal, teria as
respostas para as questões que tanto o incomodavam. Mas a apreensão pareceu
ainda maior. Bruno cumprimentou-o, aceitou uma dose de bebida e quando
finalmente lhe estendeu o relatório, tinha nos olhos um desafio. Ele parecia
curioso pela sua reação.
- Fale, Bruno. Prefiro ouvir a ler.
O que Emily faz na tal clínica? A quem ela visita?
- A Dr. Leonor Silveira,
ginecologista e especialista em reprodução humana. Emily é paciente dela há
mais de uma década.
A princípio, pareceu-lhe uma
situação normal. Toda mulher visitava seu ginecologista. Lembrava-se de ouvir a
mãe e a irmã comentarem sobre a marcação de consultas com certa regularidade.
Não havia nada de errado nisso. Então porque Bruno o analisava daquela forma.
Deveria haver algo de grave.
- Não são exatamente consultas de
rotina, Jonas. Talvez você deva ler o relatório com calma e atenção.
- Não. Se quisesse apenas ler um
relatório teria pedido para enviar um e-mail e não bagunçado a minha agenda
para estar aqui. Diga qual a razão dessas consultas. – O nervosismo tomava
conta de Jonas. Emily está doente. – É grave? Câncer?
- Não, Jonas. Não é nada disso. – O
detetive realmente preferia que Jonas lesse o relatório. Era muito íntimo. –
Sua...companheira...Emily está fazendo um tratamento de fertilidade. Emily quer
engravidar, Jonas.
Era tudo o que Jonas não previa
ouvir. Se tivessem lhe contado que Emily estava doente seria triste, procuraria
por ela e lhe ofereceria apoio. Mas não sentiria aquela sensação de traição.
Qual seria o plano de Emily? Engravidar escondido e garantir 18 anos de pensão
alimentícia? Não, isso não combinava com Emily. Há anos não usavam
preservativos e ela lhe garantia tomar anticoncepcionais porque ter filhos não
estava nos planos. E ele acreditava cegamente nela. Ele estava confuso. E não
gostava daquela sensação. Queria extravasar, gritar. Mas não na frente de
Bruno. Então tentou livrar-se do investigador sem saber que mais uma surpresa
ainda o aguardava.
- Preciso resolver isso sozinho,
Bruno. Pode ir. Quando Emily voltar de Paris eu a confrontarei e tudo será
esclarecido. – Aparentemente estava calmo. Disfarçava bem os sentimentos.
- Paris? Não...Jonas deve haver um
engano. Emily está em seu apartamento. Ela passou várias horas na clínica e
dep...
Jonas passou a ver tudo sob uma
névoa de raiva. A péssima sensação de ser enganado fazia com que o ódio tomasse
conta de tudo. Emily passou o final de semana todo lhe mentindo que iria para
Paris na segunda feira. Ao que parecia, Emily passou os últimos seis anos
contando mentiras. E ele, feito um idiota, sendo enganado. Decepção era pouco
para explicar o que ele sentia.
- Saia, Bruno. Quero ficar sozinho.
– Foi tudo o que conseguiu dizer.
- Vá com calma com essas
informações, Jonas. Eu paguei um enfermeiro para tirar cópias do histórico
médico de Emily. Está tudo no relatório, cada visita, exame, procedimento
médico. Estamos falando de informações sigilosas, Jonas. Emily pode nos
processar seriamente se isso vazar. Tenha cuidado com o que faz dessas
informações. Entendeu?!
- Suma da minha casa, Bruno! Agora!
– Cuidado era a última coisa com a qual contava.
Quando viu-se sozinho no
apartamento, Jonas olhou em
volta. Não queria fazer nada tomado pela raiva. Olhou em volta. Viu garrafas de
bebida sobre o balcão, o relatório de Bruno sobre a mesa e as chaves do carro
ao lado da porta. Era uma decisão difícil. Esquecer tudo no álcool, ler e
provavelmente descobrir novas mentiras de Emily ou ir confrontá-la e dizer em
seus olhos o quanto ela o decepcionou.
Deu as costas para o relatório e
decidiu ir vê-la. Exigiria de Emily a verdade. Ouviria aquelas mentiras na voz
dela. Dirigindo pelos bairros nobres de São Paulo em alta velocidade ele sentia
as mãos ferverem em ódio. Raiva de si mesmo por ter acreditado tão fielmente em Emily. Quando chegou
ao prédio, o porteiro olhou-o de forma estranha. O conhecia há muitos anos, mas
titubeava em deixá-lo passar.
- Sim, eu sei que a ordem de Emily é
não deixar ninguém passar. Avisar que ela está fora. Não é isso?
- Sim, senhor Jonas. – André
respondeu.
- Mas isso não me inclui. Fique
tranquilo. Vim fazer uma visita surpresa. Ela vai adorar.
Emily chegou da clínica, banhou-se e
foi se deitar após tomar os remédios. O procedimento não era doloroso, ao menos
não se comparado com as cólicas a que estava habituada. Mas após a anestesia
passar por completo, passou a sentir um desconforto. Normal, segundo Leonor,
por terem lhe aplicado medicamentos para dilatar o colo do útero. Pretendia
descansar e relaxar por dois dias. Seu freezer estava cheio de comidas pré
prontas e ela evitaria preocupações. Tudo para passar o melhor possível pela
curetagem e em oito semanas iniciar o tratamento para engravidar.
Apesar das dores e desconfortos,
estava feliz. Sentia ter tomado uma decisão difícil, porém acertada. Seu filho
seria gerado e ela não estaria mais sozinha no mundo. Sorrindo, cobriu sua cama
com toalhas brancas, a mesma cor da simples lingeries de algodão que vestia. Se
tivesse algum sangramento, mesmo leve, como era natural, logo perceberia e sua
cama estaria protegida. Deitou-se esperando descansar no sono até a manhã
seguinte.
- Emily!!! Eu sei que você está
aí!!! Abra essa porta antes que eu a arrombe! – A voz de Jonas, aos berros,
despertou-a passava um pouco das 21hs.
Emily se levantou torcendo para não
passar de um pesadelo. Vestiu um roupão felpudo e caminhou pelo apartamento.
Era real. Jonas estava esmurrando a porta de seu apartamento. De alguma forma
ele havia descoberto sua falsa viagem e veio tomar satisfação. Ela tinha duas
alternativas. Podia fingir-se de morta e esperar algum vizinho reclamar para
ele ser retirado pelos guardas ou enfrentá-lo. A covardia não lhe agradava.
- Oi Jonas. Pode entrar. E só para
avisar, a campainha funciona bem. É desnecessário tentar demolir minha porta. – Disse assim que abriu a porta e deixou-o passar.
Emily estava diferente. Enrolada em
um roupão, sem maquiagem e com os cabelos bagunçados, ela tinha um aspecto
frágil. Jonas percebeu jamais ter olhado para ela assim. Em seis anos juntos
ele nunca tinha visto Emily desarrumada. Mas isso não o distraiu do intento
ali.
- O clima está maravilhoso em Paris
hoje, Emily. – Disse simplesmente. Procurava algum sinal de arrependimento em
seus olhos e não viu nada. – Por quê?
- Eu precisei de uns dias de
descanso, sozinha aqui. Não desejava ver nem falar com ninguém. Então inventei
a viagem. Não é nada demais Jonas. Não precisa fazer esse estardalhaço todo por
uma mentirinha que não muda nada na vida de ninguém.
-É, tem razão. Melhor discutirmos as
suas outras mentiras. Como talvez planejar engravidar sem me falar! Isso também
não vai mudar a minha vida em nada, Emily?!?!? Diga!
Emily não fazia ideia de como Jonas
descobriu. Mas ele parecia saber de tudo. Ou de muito, pelo menos. Seus planos
foram por água abaixo. Agora teria de lhe contar toda a verdade e dar adeus ao
seu plano. Poderia seguir com o tratamento, é claro. Mas teria de aceitar
implantar espermatozoides de um desconhecido. Não de Jonas. Seu bebê não
herdaria aquela pele perfeita, nem os olhos azuis de um tom muito especial.
Isso lhe entristeceu mais do que deveria.
- Não! Não vai mudar a sua vida
porque EU decidi engravidar do MEU filho. Você não tem nada com isso. Agora
saia da minha casa! Já! – Gritar a fez sentir uma fisgada no baixo ventre e
quase por reflexo levar a mão até a barriga e curvar um pouco a coluna.
- Como não? Vai me dizer que teve
outro homem durante todo esse tempo? Que fui traído, é isso? E esse homem é o pai
do bebê?
Ao que parecia Jonas não estava tão
bem informado assim. Ele estava misturando informações com invenções de sua
cabeça e confundindo tudo.
- Não há outro homem Jonas. – Se era
para falar a verdade, que fosse direto e sem rodeios. Tentando se manter mais
ereta apesar da dor ela começou a falar. – Eu estou fazendo um tratamento
porque não tenho um útero saudável e decidi engravidar.
- E eu seria o pai sem saber! –
Jonas estava quase tão pálido quanto ela.
- Não! Não seria pai coisa nenhuma!
Seria um doador de esperma! Nada mais do que isso. Não iria participar de nada.
O filho seria só meu.
- E quando você iria me contar isso?
Deixe-me adivinhar! Quando o bebê já fosse uma realidade a qual eu não pudesse
evitar. Então eu receberia uma intimação judicial pedindo pensão alimentícia.
Isso é muito baixo, Emily! Como pude me enganar tanto com você!
- Deixe de ser prepotente, Jonas!
Cresça!
- Crescer?!??! EU?!?! Você mente
dessa forma e eu tenho de crescer?
- Olhe em volta, Jonas! Veja onde eu
vivo e me responda se eu preciso do seu dinheiro para criar um filho. – Ela
mesma passou os olhos pelo ambiente fino e bem decorado. – Não, Jonas. Seu
dinheiro é bem dispensável. Não preciso dele. Nem da sua presença. Precisava
apenas do seu esperma.
- Algo que certamente você não terá.
– O golpe foi certeiro e Jonas assistiu Emily ser atingida em cheio. A decepção parecia
fazer a dor no corpo ficar mais forte e ela sem perceber encurvou mais a coluna
para suportar. Ele percebeu haver algo de errado. – Por que está se encolhendo
assim? O que você tem?
- O que eu tenho? – Muito séria e
cansada de mentir, ela foi brutalmente sincera. – Eu fiz uma curetagem essa
tarde Jonas. Para amenizar os sintomas de uma doença com a qual eu luto por
mais de 15 anos.
- Que doença é essa? O que é uma
curetagem? – Só o nome já parecia assustador.
- Vá perguntar ao Google, se deseja
mesmo saber. Você não é nada meu e não te devo satisfação da minha vida. Agora
vá embora. Eu preciso descansar. Então rua! Agora, por favor. E não me incomode
mais. Nós não temos mais nada para conversar.
Antes de sair, porém, Jonas fez a
pergunta que vinha lhe incomodando desde que Bruno esteve em seu apartamento.
- Existe alguma chance de você estar
grávida de um filho meu?
- Não. Nenhuma chance de eu estar
grávida nesse momento. – E ele não fazia ideia do quão doloroso era saber
disso.
- Ótimo. Adeus, Emily.
Quando a porta se fechou Emily
seguiu até seu quarto, deitou-se na cama de deu vazão a todo sofrimento em
forma de lágrimas. Doía muito. E não era apenas o útero. Ela sofria ao colocar
fim daquela forma num relacionamento tão bonito, o mais longo de toda a sua
vida. E sofria em desistir daquele sonho tão recente, mas que já criara raízes
em seu coração. Sem perceber, ter um filho deles havia tornado-se algo
importante. Jonas, no entanto, achou ‘ótimo’ não haver chance dela estar
grávida. E como poderia estar se há poucas horas seu útero estava sendo
raspado? Agora, se realmente desejasse ser mãe, teria de aguardar oito semanas
e escolher a amostra de um doador anônimo. Nunca saberia quem era o pai de seu
filho. E ela odiava essa ideia.
O choro foi se tornando cada vez
mais intenso e ela enrolando-se na cama cada vez mais. Era um sofrimento que
parecia não ter fim. Estava habituada a sofrer com as cólicas. A dor física lhe
era comum. Mas não a sentimental. Nunca criou muitos laços amorosos. Nunca teve
muito o que perder. Talvez tenha sido uma forma de se proteger. Mas agora ali
estava. Entregue àquela avalanche de sentimentos que ameaçava derrubá-la.
Perdida em tantos tipos de dores, Emily demorou a perceber as toalhas e roupas
de cama brancas começaram a ficar pintadas pelo vermelho do sangue.
Negando-se a se entregar
completamente aos instintos Jonas não parou num bar para beber e esquecer da
briga com Emily. Esse não era ele. Não era a sua forma de resolver os
problemas. Estacionou o carro na garagem de seu prédio tentando convencer a si
mesmo que não havia problema. Era o fim de um relacionamento como qualquer
outro. Foi direto para o chuveiro na esperança do jato forte e quente lhe
apagar algumas lembranças. A voz, o toque, o cheiro dela.
- Acabou. Não existe mais Emily na
minha vida. – Repetia enquanto esfregava a toalha nos cabelos sem a costumeira
calma.
Sobre o sofá de sua sala permanecia
o relatório de Bruno. E logo o desafio de Emily se fez presente. ‘Vá perguntar
ao Google, se deseja mesmo saber’, ela lhe disse. Automaticamente, uma
lembrança de sua mãe lhe veio a cabeça.
- Virar a página é bom...mas só
depois que a gente a lê por completo. - Dizia ela.
Ele pretendia virar aquela página
chamada Emily, mas antes descobriria tudo sobre ela, cada mentira contada nos
últimos anos. Com o arquivo em punho e o notebook à frente, Jonas foi
desvendando o significado de palavras como endometriose, curetagem e
histerectomia. E a cada página lida, mais assustado ficava. Emily estava muito
doente. Cólicas menstruais intensas, sangramento e dor
durante as relações sexuais. Além disso, aproximadamente a metade das mulheres
com endometriose têm dificuldade para engravidar.
A lista de consultas médicas era imensa, além de muitos
exames. E a tal curetagem que ela disse ter feito naquela tarde também já
ocorrera anos atrás. Eles já estavam juntos. Como era possível ela passar por
um procedimento tão sério e ele não ter percebido? O tempo foi passando e ele
seguiu ali, lendo e tentando entender. O relógio continuou correndo e quando
percebeu já era madrugada. E uma angústia continuava tomando conta de seu
peito.
- Eu só vou conseguir dormir depois de esclarecer tudo isso. Antes é
impossível
Decidido a encerrar aquele relacionamento com um mínimo
de respeito, Jonas chegou calmo ao prédio de Emily. Iria esclarecer as coisas,
cada mentira dela. Precisava entender onde ele estava quando aqueles exames e
consultas todos eram feitos. Precisava entender Emily.
- Seu Jonas...voltou. – O porteiro não esperava vê-lo
novamente. – São 2hs da manhã. Por favor, sem gritos ou os moradores vão
reclamar.
- Sem gritos, eu garanto. Só preciso falar com Emily.
Liga pra ela, por favor.
- Não posso acordar a dona Emily...ela vai reclamar.
- Interfone, por favor.
Ninguém atendeu no apartamento. Mesmo após uma longa
espera. E Emily sempre atendia, independente da hora. O porteiro sabia, tanto
quanto Jonas, que havia algo de errado. Mesmo temendo perder o emprego,
confidenciou a Jonas ter chave extra do apartamento. Era ele a molhar as
plantas quando Emily fazia viagens longas.
- Então vamos ver o que há de errado.
- Eu não quero perder o emprego, seu Jonas.
- E não irá.
Ao
contrário. Caso pudesse, Emily agradeceria a atitude dele. Mas ela não teve
chance porque estava desacordada. Quando Jonas e o porteiro entraram no apartamento
não viram nada de anormal na sala. Tudo escuro e organizado. O funcionário do
prédio esperou junto da porta, constrangido por entrar num ambiente particular,
sem a autorização da proprietária. Jonas conhecia muito bem o lugar e seguiu
direto para o quarto. Nunca se imaginou caminhando por ali sem Emily. E nada o
preparou para vê-la no centro da larga cama, com os lençóis brancos manchados
de vermelho. Emily estava pálida. E, por um momento, pensou vê-la morta. Foi
apenas um instante. E mesmo assim pareceu arrastar-se um longo tempo.
-
Emily! Emily! Abre os olhos! – Seu desespero diminuiu quando tocou-lhe o pulso.
Estava viva. – Droga, Emily! Não faz isso comigo!
Mas
o nervosismo não o paralisou. Emily precisava da sua ajuda e ele garantiria que
ela ficasse bem. Rapidamente olhou pelo quarto e, na falta de algo melhor,
pegou um cobertor enrolado aos pés da cama e cobriu seu corpo sujo de sangue
antes de pegá-la no colo e sair do quarto.
-
Seu Jonas... – O porteiro olhou-os, confuso, e abriu espaço. Pela palidez de
Emily, não foi difícil perceber o que ocorria.
-
Vou levá-la ao hospital. – Jonas disse simplesmente.
Quando
acomodou-a no banco traseiro do carro, Jonas agradeceu o fato de ter contratado
um detetive. Tinha o endereço da clínica e, também, os contatos da médica com
quem Emily consultava. Difícil seria explicar como justamente ele a encontrará.
Mas isso seria uma preocupação para depois de ver Emily saudável novamente.
Colocou o carro em movimento na rua deserta e silenciosa da madrugada e discou
o número de Leonor Silveira.
-
Emily está com hemorragia. Estou levando-a para a clínica. Encontre-nos lá em
alguns minutos. – Falou assim que ela atendeu.
-
Quem fala? – Ela nunca tinha ouvido àquela voz. – Emily Fruett? Ela está tendo
hemorragia?
-
Sim, Drª. É melhor correr. – E desligou logo depois. Não tinha tempo nem
disposição para dar explicações.
Quando
entregou Emily à equipe médica Jonas não conseguiu dar às costas e retornar
para sua casa. Em especial porque se ele saísse, ela estaria só de carinho, de
cuidado, de alguém conhecido. Não tinha ninguém para chamar. Até onde sabia,
Emily não tinha nenhum parente ou amigo íntimo. Havia dois funcionários do
restaurante mais chegados a ela, além de Melissa e Rafael. Mas o casal também
eram seus amigos e nunca ficaram sabendo do relacionamento deles. Se soubessem
agora, daquela forma, ficariam magoados.
-
Não posso te abandonar aqui, Emily. – Disse a si mesmo enquanto pegava um copo
de café e seguia na direção do balcão de atendimento. Tinha consciência de que,
na realidade, não desejava nem conseguiria ir embora sem saber do bem estar de
Emily. Precisava de notícias. E só resolveria aquele problema contando algumas
mentiras. – Boa noite. Eu trouxe uma paciente. Queria informações dela. Seu
nome é Emily Fruett.
-
O senhor é familiar dela? Nós só fornecemos informações para familiares. – Uma
simpática recepcionista falou.
-
Sou sim. – Jonas mentiu. – Sou noivo dela. Emily não tem família. Eu sou sua
família.
-
Ela está em atendimento ainda. Depois a médica poderá lhe dar as informações.
Demorou
muito. Apenas quando o sol já nascia Jonas ouviu seu nome ser chamado por
Leonor. Ela tinha uma expressão tranquila e isso de alguma forma o fez se
acalmar também. Antes de falar eles se encararam. Havia alguns segredos em
jogo.
-
Emily está melhor. O quadro foi estabilizado. – Ela informou lhe estendendo uma
cadeira. – Ela ficará bem.
-
Vai ter de ser um pouco mais clara do que isso, Drª. Eu encontrei Emily envolta
em sangue. Não
pode simplesmente me dizer ‘ela ficará bem’.
-
Eu serei bem clara com Emily quando ela acordar. Até onde sei, é sozinha e
ninguém se responsabiliza por ela, como o senhor informou no formulário da
clínica. Você mentiu. - Ela percebeu pegá-lo de surpresa. - Deixe-me dizer uma
coisa, além de médica, sou amiga de Emily. E sei que ela não é noiva de
ninguém.
-
Então eu também lhe direi uma coisa, Doutora: fazer inseminação artificial sem
autorização do doador é crime. O plano que Emily vinha armando, com o seu
auxílio, para engravidar de um filho meu, sem meu consentimento, foi
descoberto. E claramente esse tratamento não deu certo! Ou ela não estaria
internada aqui! Então é muito bom me contar tudo. Agora!
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