Após apenas três semanas convivendo com aquela
sombra desagradável a quem Diego chamava de segurança, Ariella já se sentia
mais sufocada que se trancada no quarto. E não era por ter sempre alguém lhe
observando. Seu próprio pai já tinha lhe obrigado a andar com guarda-costas
após ser sequestrada. Eles agiam tornando-se quase invisíveis. Pablo conseguia
ser insuportável a cada minuto. Ele fazia questão que ela percebesse a sua
presença e não se sentisse à vontade em nenhum minuto do dia.
Quando Diego lhe permitiu um passeio a um dos
museus de Madri, Pablo manteve-se sempre às suas costas. E no melhor do
passeio, ele lhe disse ser hora de retornar à prisão que aquela casa se tornou.
Mesmo que a tentação de uma fuga fosse grande, ela nada fez para tentar
escapar. Primeiro porque temia por seu pai. Depois porque sentia medo pela
própria segurança. Não se surpreenderia caso aquele segurança sacasse a pistola
que trazia escondida sob o paletó e não ligasse nem um pouco em usar.
Mas o que irritava mesmo era sua insistência em
permanecer à sua volta mesmo quando utilizava as dependências da casa. Se ia na
biblioteca ler um livro, ele sentava-se na poltrona ao lado. Se estava
relaxando no jardim, sentia sua presença. E nem mesmo para nadar conseguiu um
pouco de privacidade. Ali, inclusive, teve certeza de que ele observava seu
corpo de forma nada respeitosa.
Sabendo disso, passou a testá-lo e mostrar-se para
ver sua reação. Não tinha planos para usar isso ao seu favor nem envolver-se
com ele seriamente, mas precisava saber o que Pablo realmente desejava. Por
algumas vezes discutiu com ele porque sabia que ele inventa inverdades para lhe
criar problemas com Diego. Como se precisassem de mais razões para brigar. E
Ariella não era mulher de engolir desagrados calada.
- O que quer em ‘sombra’? Certamente é mais do que
me seguir por essa casa! – Acusou-o.
- Apenas cumpro as ordens do padrão, senhora. –
Pablo respondeu. Friamente.
- Não passa de um tarado que não consegue ver a
bunda de uma mulher ser se excitar isso sim.
O problema, para Ariella, é que a história chegou
até Diego contada de outra forma. Segundo Pablo repassou ao patrão, Ariella
vinha expondo seu corpo em longos banhos de piscina para, ao tentar seduzi-lo,
facilitar uma fuga. Tomado pelo ciúme, ele voltou para casa fora de hora para
surpreendê-la e encontrou-a semi-nua caminhando pela casa. Razão mais do que
suficiente para uma briga ter início.
- Mi sol! – Diego gritou ao surpreendê-la na área
da piscina. Ariella estava deitada sobre uma espreguiçadeira vestindo um
minúsculo biquíni branco. Seus cabelos brilhavam ao sol e a pele, muito branca,
parecia ganhar apenas um levíssimo bronzeado. – Cuidado para não queimar a
pele.
- Você a essa hora em casa? Veio me vigiar também?
Não precisava se preocupar, querido. Como pode ver, Pablo sempre sabe
exatamente onde minha bunda está.
- São ordens de seu marido não tirar os olhos da
senhora, madame, nem mesmo dentro da residência. – Pablo repetiu.
- O que você adora, tenho certeza. Me diga, devo
deixar a porta do box aberta quando for me banhar? Quem sabe não tenho o plano
de fugir pelo ralo, não é mesmo! Mas olhe bem então, sei que não perde a
oportunidade de cobiçar o que não pode ter. – Ela ergueu-se da espreguiçadeira
e abriu os braços, desfilando as curvas totalmente amostra. Conseguiu despertar
o desejo de Pablo e a ira de Diego.
Diego viu o desfile exibicionista de Ariella e
sentiu a raiva crescer. A proximidade dela com outro homem nunca lhe agradou.
Aceitou a presença de Pablo apenas como uma medida necessária. E quando disse
ao segurança que não deveria perder Ariella de vista, não estava referindo-se
aqueles momentos de intimidade. Estava claro que ela planejava fazer uso de sua
beleza para atrair o outro e conseguir deixá-lo.
- Vista-se agora Ariella, eu falo sério e não
pretendo repetir. – Falou em um tom baixo e que não deixava margem à discussão.
- Ou fará o que? Mandará seu capanga me dar um tiro
com essa arma que ele esconde sob a roupa? Pois o faça! Mas isso não tira a sua
responsabilidade. O assassino será você!
- Ninguém falou em tiros ou assassinatos, Ariella.
Vista-se enquanto eu converso com Pablo. Logo conversaremos.
Diego
voltou a falar apenas quando ficou frente a frente com Pablo. De repente
passava a ter algumas dúvidas quanto a presença daquele homem tão perto de sua
esposa, mesmo que suas recomendações fossem as melhores. Olívia já tinha lhe
reclamado da presença muito incisiva e de seus modos pouco educados para com
Ariella, mas, como a antiga empregada da casa tinha muita simpatia pela nova
moradora, acreditou não ser tão grave.
Hoje,
no tom indignado de Ariella, percebeu que não era bem assim. Apesar de Ariella
gritar o contrário, ele já a conhecia bem e viu em sua reação uma real
indignação. Ariella não estava tentando seduzir Pablo, como ele alegava. Ela
estava realmente incomodada com a sua presença. E aquela arma também não o
agradava. Por questões de segurança, sua equipe sempre se manteve armada do
lado de fora da casa. Aquele costume de Pablo de andar pelos corredores sempre
com uma das mãos em uma pistola lhe parecia exagerado o desagradava.
-
Quem lhe autorizou a observar minha mulher na piscina? – Perguntou claramente.
- É
necessário. Por duas vezes a vi próxima das grades, tenho certeza que
averiguava meios para uma fuga. – Pablo mentiu. Ariella poucas vezes deixou a
casa e, quando o fez, jamais seguiu até a grade.
- Há
segurança nos portões. Ela não conseguiria escapar.
-
Essa mulher é mais esperta do que parece.
-
“Essa” não, Pablo. Dirija-se com respeito a dona dessa casa. – Diego falou. As
razões que levaram Ariella aquela casa não interessavam ao segurança e não
deveriam interferir na forma como a tratavam. – Ariella é minha mulher e você
deve manter uma distância respeitável quando ela estiver usando a piscina.
- Com
todo o respeito, patrão, é ela quem pro...
-
Mantenha-se longe de Ariella o suficiente para que ela tenha privacidade dentro
das dependências da casa. Apenas quando sair é que você se manterá junto dela.
Fui claro? – Lá no fundo Diego pensava que deveria tirar aquele homem de dentro
de sua casa, mas, sem ele Ariella realmente tentaria escapar. – Me dê sua arma.
- O
que? – Pablo não gostava de estar desarmado.
-
Você me ouviu. Deixe a pistola sobre a minha mesa.
-
Todos os seus homens andam armados...
-
Nenhum deles fica dentro de casa e tão próximo de minha mulher. Jamais lhe
autorizei a ameaçá-la. Me diga, Pablo, o que faria caso minha mulher tentasse
fugir? Como impediria a sua fuga?
- Eu
dispararia, é claro. Mas nunca em áreas fatais, jamais para matar. – Pablo
respondeu com sinceridade. – Sou treinado para isso.
-
Pois então, Pablo, deixe essa arma sobre a mesa e nem pense em arranjar outra.
Porque se um dia disparar contra Ariella, nem que fosse em um fio de seus
cabelos, eu mesmo matava você. Seu trabalho é manter minha esposa em segurança
e impedi-la de sair de casa sem a minha permissão, feri-la ou ofendê-la estão
fora de suas atribuições. Estamos entendidos?
- É
claro, Diego. - Ele largou a arma sobre a mesa e viu Diego trancá-la em uma
gaveta do escritório. - Como quiser, mas que fique registrado que em minha
avaliação profissional a sua mulher necessita de uma vigilância mais
ferrenha.
-
Considere registrado.
Diego
encontrou Ariella no quarto que dividiam. Ainda estava nervoso, mas acreditava
ter feito a coisa certa. Apesar de tudo, não desejava ferir Ariella, não fisicamente,
ao menos. E naquelas semanas eles conseguiram estabelecer uma relação minimante
aceitável. Ele lhe permitiu sair de casa e conhecer Madri. Ela não mais fazia
escândalos no portão de casa. E até mesmo na cama, tinham encontrado um padrão.
Ariella o desejava e não mais fingia ser um sacrifício recebê-lo. As únicas
discussões que continuavam a ganhar gritos e escândalos eram o desejo dele de
engravidá-la e a insistência de Ariella em não pedir ao pai para colaborar e se
afastar das empresas.
- Não
conte com aminha ajuda para derrubar meu pai, Diego. Jamais. – Ela sempre lhe
dizia. – Posso ficar eternamente sob a sua tutela, não pedirei que meu pai
‘pague’ pelo meu resgate.
- Bem
lá no fundo você sabe que seu pai não merece essa dedicação toda. Se fosse um
homem honrado não a teria deixado aqui para manter uma empresa falida. Prefere
manter a pose de empresário do que ter a filha junto de si. E, ainda assim,
você lhe é fiel.
-
Pode ser. Porque, ainda assim, Afonso é o meu pai. – Ela lhe respondeu e, por
um momento, Diego sentiu pena de Ariella. – Eu costumo ser leal, mesmo a quem
não me ama. Você, por exemplo, nem mesmo finge alguma simpatia e eu estou aqui
lhe sorrindo e aguentando essa sua fantasia familiar.
- Não
é fantasia, Ariella. Nosso casamento é real e legal.
- A
fantasia está na sua cabeça, Diego. Pensa que terá de volta, comigo, a família
que meu pai te tomou. Isso é um delírio que jamais se concretizará.
- Sei
que jamais terei aquela família de volta. Não me engano, Ariella, não sou
louco. Nós formaremos a nossa família. Eu, você e nosso filho. Talvez você até
mesmo esteja grávida já. Ou eu estou muito enganado ou sua menstruação está
atrasada esse mês.
- Não
estou grávida. E não pretendo discutir minha menstruação com você!
-
Ótimo. Também não quero discutir nada. Tenho que voltar ao escritório, mas vim
lhe falar que Pablo está proibido de observá-la na piscina e está orientado a
lhe dar privacidade dentro de casa.
-
Devo agradecer?
-
Adoro essa sua petulância, mi sol, mexe comigo. Me faz ter vontade de tirar esses panos
que não te cobrem direito e tomar o que é só meu. Não precisa agradecer. Só não
tente fugir, porque se o fizer, terei de voltar a colocar uma sombra em você.
Não quero brigar...quero te provar que podemos viver bem e será gostoso.
- Bem gostoso? – Ela beijou-o
sabendo que ele pretendia voltar ao trabalho. – Quero você.
Ela
conseguiu tê-lo, como sempre. Lá no fundo Ariella aprendeu a gostar da
companhia de Diego, na cama e fora dela. A despeito de suas obsessões vingativas,
Diego sempre agia de forma justa. Tratava bem cada um de seus empregados e
jamais destratava alguém por questões financeiras. Na verdade, parecia que
Diego reservava a ela o seu pior e dava aos outros as melhores partes de sua
personalidade. As vezes ela se pegava invejando o que os empregados e amigos
recebiam dele.
Depois
de transarem, como estava se tornando um hábito, Diego ficou na cama junto
dela. Às vezes ele deseja tê-la conhecido em outras circunstancias. Desejava
que Ariella não tivesse nascido daqueles pais, que não fosse o sangue de Afonso
Amaral a correr em suas veias e que ela não lhe despertasse sentimentos tão
contraditórios. Olhar para Ariella ainda lhe despertava um rancor muito grande,
mas também alguma esperança. Nunca na vida havia sido tão feliz,se sentido tão
vivo quanto agora, tendo-a
ali. Mesmo quando ela o provocava e enervava, sentia-se
mais vivo do que nunca.
-
Queria ficar aqui com você até amanhã pela manhã. – Diego disse, sincero. – Mas
tenho de voltar ao escritório.
-
Está bem. Já estou acostumada a não ter nada para fazer mesmo.
-
Pode sair. É só avisar Pablo.
-
Quero saber o que acontece no mundo, Diego. Quero um computador. – Isso seria
uma
grande liberdade e lhe daria a chance de escapar. Era melhor do que tentar uma
fuga com Pablo por perto.
-
Não. – Diego respondeu sem dar explicações. – Minha resposta quanto a isso não
mudará. Se quer saber as notícias, lhe comprarei jornais e revistas. Da
internet, você ficará distante, mi sol. Você é esperta demais.
O
celular de Diego começou a vibrar e ao olhar a mensagem que chegou, um susto
instantâneo o tomou. Não que ele já não esperasse. Demorou até demais. A
mensagem de Murilo afirmava que uma belíssima loura gritava na frente da
administração exigindo por um encontro com ele. Ainda na frente de Ariella, ele
ligou para o amigo de infância.
- Há
como despachá-la?
- Nem
pensar. Ela diz saber que você está em Madri e com Ariella. E afirma que, se
não a colocar na frente de sua amiga ainda hoje, irá aos jornais e a polícia.
Nas palavras dela “fará da sua vida um inferno”.
Sem
saída, Diego teve de mudar seus planos.
-
Avise que eu não estou disponível para nenhuma reunião e instale essa senhorita
em um hotel. Diga que às 20hs meu motorista irá buscá-la para jantar aqui em
casa, junto de minha esposa e eu. Você também estará presente. – Um jantar em
família, pensou Diego.
- Mas
Diego...
-
Faça o que eu estou mandando. – Diego desligou o telefone e voltou a atenção
novamente a Ariella. Dessa vez ela o olhava desconfiado. – Queria notícias da
Argentina? As terá agora. Dulce vem jantar conosco hoje.
-
Dulce....mas como?
- Não
sei exatamente. Mas não é difícil encontrar notícias minhas na internet. Você é
que jamais pesquisou, minha querida.
-
Você não parece nenhum pouco assustado com a chegada dela.
- Não
estou. – Era mentira. Dulce poderia estragar tudo caso descobrisse a verdade. –
Estamos casados e nada mudará isso. Preste a atenção no que irei te dizer. Sua
amiga jantará aqui essa noite e ao final da sobremesa deverá ter certeza do
nosso amor. E voltar para a Argentina satisfeita porque você está feliz e
entregue a uma paixão tão forte que a fez desejar ficar aqui, na nossa casa,
para sempre. Você não falará nada diferente disso.
-
Minha amiga me conhece demais para acreditar nisso.
- Se
você gosta de Dulce, Ariella, vai fazer com que ela acredite. Porque não
permitirei que tudo o que planejei por anos se perca por uma intrometida.
Descobrir a verdade será muito ruim para Dulce.
Diego
não fazia ideia da esperteza e motivação de Dulce. Naquelas semanas ela entrou
em contato com qualquer pessoa que pudesse lhe ajudar a chegar até Diego Bueno.
A internet a ajudou bastante. Descobriu muito da reputação daquele homem e da
história um tanto estranha de sua família. A mãe morreu num acidente de carro e
o pai afundou-se em depressão quando ela se foi. Jogou uma fortuna fora
enquanto bebia e afundava os negócios. A fortuna do filho fora construída bem
depois, com a criação de uma cadeia de hotéis. O estranho é que Diego não
parecia ter uma vida além disso. Não achou registros em
sites de fofoca. Ele parecia mais do que discreto. Diego lhe soava como um
homem que tinha algo a esconder.
Naquele
momento, ela seguia ao lado daquele jovem que parecia trabalhar para Diego.
Murilo, como se apresentou, tentou lhe mandar embora, mas, percebendo que não a
convenceria, ligou para Diego. Ao que parecia, teria um encontro com Ariella
naquela noite.
- É
bom que seja verdade porque se não, bonitinho, seu patrão vai preso rapidinho e
eu vou adorar colocá-lo na capa de todas as revistas de fofoca como
‘sequestrador’ de garotas indefesas. Diga para ele ser pontual.
O
‘bonitinho’ foi uma provocação, mas bem que não podia negar. O tal de Murilo
tinha um sorriso encantador. Se não estivesse na Espanha em uma missão de
amizade, iria convidá-lo para lhe apresentar Madri.
- Não
são as mulheres a normalmente se atrasarem? – Murilo a provocou.
- Não
nesse caso. Às 20hs, em ponto, estarei pronta e com as garras afiadas. Louca
para cravá-las no seu amiguinho, caso ele não me convença de que Ariella está
aqui pela própria vontade e feliz. Avise a ele.
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