Quando Elizabeth viu Alejandra sair
em retirada depois de ouvir alguns desaforos merecidos, sentiu-se vitoriosa.
Havia engolido desaforos demais tentando transmitir a mesma elegância da rival.
Mas já que Alejandra mostrou-se alguém capaz de enganar, não merecia ser
respeitada. Por isso Elizabeth sentiu-se leve ou ver o rosto da outra ser
tingido de vermelho pela vergonha de ser chamada de vagabunda, palavra que bem
a representava, em voz alta e na frente de outras pessoas. Mesmo assim, foi
ver-se livre da loura e a equipe da clínica se dispersar para, em privacidade,
não saber o que fazer e afastar-se de Miguel.
Fazendo o movimento contrário,
Miguel ficou bem junto da esposa. Se apenas a sua vontade fosse válida, aquele
instante de Liz olhando-o com adoração e defendendo o casamento seria eterno.
Essa era a Liz da qual mais ele gostava. A Liz que a dentadas feito uma tigresa
brava quando provocada e que deixava as marcas de suas garras nele, nos
momentos de raiva, mas também na paixão. Infelizmente, logo que Alejandra deu
às costas, Elizabeth lembrou-se do momento difícil que eles viviam no
casamento. Só que agora que tinha recebido um gostinho de uma reconciliação,
estava disposto a lutar por ela ainda mais.
- Eu gostei do que ouvi. É ótimo
saber que ainda reconhece o nosso casamento, minha Liz. – Miguel disse mesmo
sabendo que aquilo não era bem a verdade.
- Pois tire essa ideia da cabeça e
se mantenha afastado de mim. Não pense que só o fato do destino ter nos pregado
uma peça e eu estar grávida, todos os nossos problemas estarão resolvidos. Não
há casamento algum. E me chame de Elizabeth! – Liza respondeu.
- Chamo de Liz, minha Liz. Porque
você é minha e eu posso chamá-la assim. E você pode até reclamar, mas nós
continuamos casados.
- Suma! Vá cuidar da sua outra
grávida! Vá para sua montadora. Vá achar o que fazer! E me deixe ir trabalhar.
- Sim, vou trabalhar. Mas a noite nós
nos vemos. Levarei minhas malas por volta das 20hs, esteja em casa ou deixe a
chave na portaria, sim?
Elizabeth entendeu o recado. Só não
quis acreditar na ousadia Miguel. Depois de tê-la traído, ele realmente
acreditava que podia lhe dizer aquela frase acompanhada por um sorriso.
- Não adianta você reclamar. Se não
me quer como marido, tudo bem. Posso dormir na sala ou no quarto de hóspedes. Mas
sozinha você não fica mais. Vou cuidar de você e do meu filho que está aí
dentro, pedindo por atenção.
- E só a sua presença no meu
apartamento fará o seu filho crescer saudável! Que modesto da sua parte.
- Mudará que você não sairá de casa
sem café da manhã, nem estará sozinha a noite quando se sentir mal. E terá o
meu incentivo sempre. Pode lhe parecer pouco, mas é esse o papel dos homens
enquanto as mulheres gerem os filhos.
- Falou o expert! E como será?
Segundas, quartas e sextas você cuida da grávida, enquanto as terças quintas e sábados
dedica-se para a número dois? Não seja ridículo, Miguel.
Miguel não ficou irritado com Liz. Preferia
quando ela explodia do que quando permanecia guardando os sentimentos para si.
Elizabeth tinha razão em se revoltar por ter de dividi-lo com outra mulher, mas
isso também lhe revelava como ele era importante em sua vida. Não fosse assim,
ela não se importaria em não ser a mãe de seu único filho.
- Desculpe te fazer passar por algo
assim. Sei que não é o ideal. Posso não suportar Alejandra, mas não poderei
abandonar o bebê que ela espera. Também é meu filho. E tenho responsabilidade
por ele.
- Eu nunca lhe pediria isso.
- Mas só me importo com uma das mães.
Você. E Alejandra, apesar de ser exagerada, teve um início de gestação muito
mais tranquilo. Se você não quer voltar para casa, partir de agora eu moro no
seu apartamento, Liz.
Numa atitude típica, Elizabeth
voltou aos compromissos profissionais e deixou para se preocupar com Miguel
depois do expediente. Ao chegar na polícia federal, sabia do compromisso que tinha.
Ou melhor, que Rebeca tinha. Ela teria apenas de assistir. Mas isso lhe parecia
ainda mais insuportável. Ainda mais quando Pedro Ferraz parecia tentar escapar
por entre os dedos da assistente mesmo quando Rebeca apertava o cerco.
Com o profissionalismo que lhe era
habitual, Rebecca fez as perguntas certas a Pedro. Ele, porém, também era profissional.
Tinha boas respostas, era rápido de raciocínio e parecia nutrir alguma lealdade
para a quadrilha.
- Bandido leal...era só o que me
faltava. – Elizabeth disso, do outro lado do vidro que lhe permitia ver Pedro sem
ser vista. – O que acha dele, Tom?
- Você te motivos para desconfiar. São
vários fios que o unem a quadrilha.
- E, por consequência, à Bia.
- É, se toda a sua teoria estiver
correta. Mas não esqueça que não temos nenhuma prova concreta que Pedro matou
Caleb ou pegou Beatriz, nem mesmo algo que uma esses fatos. São apenas
conjecturas suas.
- Nas quais você acredita, certo?
- Certo. Porque conheço o seu faro. Mas
a investigação do sequestro de Bia não nos foi repassada. E segundo apurei, a
Civil vai arquivar o caso. Para eles, não há indício de sequestro já que não
houve pedido de resgate. Também não acreditam em crime sexual por Bia não se
enquadrar no perfil levado para Europa a fim de se prostituir.
- E a teoria de que se trata de
retaliação contra mim deve ter causado riso neles. Eu já imaginava isso,
Tom. – O que não diminuía sua raiva. – Mas
tudo bem. Não posso investigar o sequestro de Beatriz, mas posso fazer com que
Pedro Ferraz me leve até ela. E eu farei isso.
Tom e Elizabeth seguiram
acompanhando o interrogatório. Primeiro Pedro conseguiu adiar as respostas
exigindo a presença de seu advogado. Enquanto aguardavam o assessor jurídico
chegar. Liz fez a anotação mental de investigar muito bem aquele defensor
legal. Às vezes eles eram ainda piores que os acusados.
- Agora que já está devidamente
escoltado, Pedro, quero saber exatamente qual o seu papel no esquema que leva
mulheres para se prostituir na Europa. Economize o meu tempo, o seu e o do
advogado. – Rebeca pressionou quando o interrogatório enfim teve início.
- Não tenho nada a ver com esquema
algum. Sou um trabalhador liberal, nunca fiz nada ilegal. – Pedro respondeu
tranquilamente, para orgulho do advogado.
- Mentir, Pedro, é uma arte, eu
reconheço. – A frieza de Rebecca despertava orgulho em Elizabeth. – Mas quando
a polícia tem provas documentais contra você, mentir passa a ser um pouco
burro. Você confirmou sua participação em vídeos. Temos fotos
de você aliciando mulheres. Seu nome aparece em registros antigos da quadrilha
que estão com a PF há muito tempo. Até o seu passaporte serve com prova. Você não
tem escapatória. A pergunta é: cai só ou leva alguém junto?
Pedro mostrou-se irredutível. Mais
de 1h depois continuavam na mesma. Quando balançou, o olhar do advogado, Heitor
Batista, pareceu envolvê-lo à convicção. Claro, pensou Elizabeth. Ele não
estava ali para defender Pedro, mas sim para garantir que ele ficaria calado. Tom
até tentou segurar Elizabeth e lhe afirmou que manter sua imagem resguardada
era importante. Mas ela já havia decidido arriscar. Liz invadiu a sala de
interrogatório.
- Boa tarde, senhores! Sou a investigadora
Elizabeth Santos Benitez, responsável há vários anos por investigar um esquema
milionário que pôs fim a centenas de famílias e rende dinheiro a alguns. Esquema
no qual você está envolvido até o pescoço, Ferraz. – Elizabeth estendeu a mão à
frente do rosto dele. – Você está bem aqui. E eu só não te esmaguei ainda
porque quero as informações que pode me dar.
- A senhora está cometendo abuso de
poder. Meu cliente é inocente e não há indícios contra ele. – Disse o advogado.
- Cale a boca! Esse interrogatório é
meu e não lhe dei autorização de falar. – Elizabeth deu um minuto de descanso
para Pedro e voltou-se ao advogado. – Eu tenho mais do que indícios, tenho
provas e se você o orienta a ficar calado é porque seu interesse não está em
Ferraz, mas nos que estão acima dele.
- Está me ofendendo! Posso lhe
causar um processo junto da corregedoria.
- Cause então. Mas não tente me
fazer de idiota! Seu tipo, Batista, me é bem conhecido. E se tentar atrapalhar
minha investigação, eu juro que muito em breve seu nome aparecerá no inquérito
como muito mais do que advogado. Não me atrapalhe mais. – Então ela voltou-se a
quem realmente interessava. – Estou dando esse depoimento por encerrado para
você pensar bem se vai querer me ajudar ou passar a vida na pior prisão que eu
puder lhe arranjar. Eu amarrei você bem demais, Pedro. Não há escapatória. Pense
bem se vai querer pagar por tudo sozinho.
Longe de se sentir satisfeita, mas
sentindo-se um pouco mais confiante, Elizabeth voltou para sua sala. Tinha o
coração acelerado. Aquele era um tipo de adrenalina que muito lhe agradava,
principalmente quando sentia estar no caminho certo. Sua força e o nervosismo
de Heitor Batista mostraram a Pedro quem sairia vitorioso ali.
- O que eu faço caso o advogadozinho
realmente for à corregedoria contra você? – Tom perguntou.
- Faz o que você sabe fazer e limpe
a minha cara. Quando tudo isso acabar, prometo que revejo meus métodos e me
torno a sua investigadora padrão. Juro!
- Não acredito. Mas tudo bem. Duvido
que ele cumpra a ameaça mesmo. É do tipo que tem tanto a esconder que não
deseja mais chamar a atenção.
Quando a noite chegou em Moscou,
Beatriz colocou-se na pista de dança, oferecendo-se conforme Gregory e Samantha
exigiam. Mas naquela noite havia ansiedade. Ela queria saber se ele viria
novamente. Se exigiria mais uma noite de sexo com ela. Só assim poderia afirmar
que sua sedução fez efeito. Talvez por isso tenha se arrumado com mais dedicação
e colocado uma roupa que, acreditava, atrairia Sebastian.
Seu cliente da noite anterior disse
que gostava de seu rosto e que os cabelos não deveriam escondê-lo. Então teve o
cuidado de prender os fios. Desejava seduzir Sebastian, não como uma jovem
apaixonada e cegamente enganada, mas como a mulher de objetivos claros que era.
Se Sebastian é a porta de saída, seria tratado com a dedicação merecida.
Mas Sebastian não apareceu na boate
e Beatriz passou a noite com um cliente qualquer, muito jovem, que não gostou
nem desgostou da roupa negra, desfez seu penteado no primeiro puxão de cabelos
e alcançou a satisfação procurada numa rapidez surpreendente. Ela não sentiu
nada, nem mesmo o nojo que comumente vinha em cada transa por dinheiro. Agora só
fazia o que precisava ser feito da forma mais competente possível, fosse o
cliente belo ou feito, delicado ou bruto. Era capaz de falsos gemidos para
agradá-los, mas, lá no fundo, contava os instantes para que caíssem no sono e
livrassem-na de qualquer contato. Mesmo enquanto estava com o jovem, os
pensamentos estavam em Sebastian, em qual erro havia cometido e em como faria
para se aproximar dele mais uma vez.
A sedução não havia sido errada. Ao
contrário, deixou Sebastian tão intrigado que resolveu saber mais dela. E a
dificuldade que encontrou tornou aquele um desafio muito maior. Depois que ela
foi embora ele dormiu. Mas logo depois de recuperar o corpo de todo o esforço,
voltou suas atenções para reorganizar sua agenda e descobrir mais de Beatriz,
aquela mulher sem sobrenome e muito misteriosa. A primeira coisa que fez foi
adiar seu retorno aos EUA por mais uma semana. Tinham compromissos
profissionais e familiares por lá. Em cinco dias teria de embarcar. Mas antes,
queria mais de Beatriz.
Ele ligou para Gregory, a segunda
ligação em poucos dias. E mais uma vez sentiu no gerente da boate uma reação
estranha. A ilegalidade daquele lugar nunca lhe foi um segredo. Ele e os muitos
outros homens que usavam aquelas mulheres sabiam que a boate era irregular e,
no mínimo, aproveitava-se da falta de alternativa de cada uma delas. Mas no
caso de Beatriz parecia haver algo mais. O tom de Gregory quando falava dela mudava.
- Sebastian, fiquei surpreso. Não
esperava outra ligação sua. Espero que minha garota não o tenha decepcionado.
-Não, longe disso. Beatriz foi
sensacional.
- Que ótimo... – Por alguma razão
Sebastian teve a sensação de que ele não gostou daquela satisfação toda. A voz
de Gregory nunca lhe pareceu mais falsa. – Tenho uma novinha, ruivinha, pele
branca feito papel. Você vai adorar.
- Ainda não...quero mais de Beatriz.
– Sebastian foi direto.
- Mais? Houve tempo que você gostava
de variar.
- Ainda não, já disse Gregory. E não
gosto de me repetir.
- É claro, como quiser. Quer Beatriz
hoje mesmo?
- Não. No final de semana. Alguém da
minha confiança irá buscá-la na sexta-feira e a levará de volta na segunda-feira
até o meio dia. Vocês serão bem pagos.
- Infelizmente isso não será possível,
Sebastian. Beatriz não tem autorização para sair da boate. Quando autorizei sua
ida ao hotel, já relevei uma ordem para satisfazer você.
- Pois então releve outra! Porque
nesse final de semana, é comigo que Beatriz estará. Não está em negociação, Gregory.
Mas se você não quiser se comprometer, posso ir direto aos seus superiores.
- Não. Está bem. Mas muito cuidado
com ela. Beatriz pode tentar usá-lo para escapar. Ela não é ingênua ou
burra...ela...
- Ela o que? Eu estou bem curioso,
Gregory. O que Beatriz tem de especial?
- Nada que mereça a sua atenção. Mas
saiba que ela não é digna de confiança. Beatriz é tão perigosa quanto gostosa.
E eu provei dela tanto quanto você, Sebastian.
Aquela última afirmação incomodou
Sebastian mais do que ele estava preparado para aceitar. Poderia ter
pressionado mais. Poderia ter feito outras perguntas. Mas se calou antes que
falasse demais. Tinha outras coisas para responder até o final de semana
chegar.
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