Na
hora combinada, Miguel estava à frente do prédio de Elizabeth. O porteiro lhe
disse que o deixaria subir sem problemas já que sabia se tratar do marido da
proprietária, mas não adiantaria porque ele não conseguiria entrar sem chave.
Restou-lhe a única alternativa de esperar, de mala na mão, sua esposa chegar.
Isso não colaborou para a melhora do seu humor. E, depois da tarde difícil que
viveu, isso era a última das coisas que precisava.
Quando
foi para a BTez estava satisfeito e até mesmo animado. Uma brecha de esperança
havia se aberto. Foi assim que cumpriu suas primeiras atividades da tarde. Até
que recebeu uma ligação pessoal e ficou sabendo que Alejandra foi rápida em
levar suas queixas à antiga sogra. Ao que parecia, Alejandra foi até sua casa
assim que deixou a clínica, chegou lá chorando e comoveu Rúbia.
-
Talvez eu deva desistir de tudo, Rúbia, voltar para Madri e criar meu filho
sozinha. Miguel parece desejar me ferir cada dia mais, como se eu fosse culpada
pela sua separação. E hoje eu tive a maior das humilhações!
-
Nem pense em ir embora, minha querida. Você é minha nora. Esse bebê é a minha
alegria. O que Miguel lhe fez?
-
Ele sempre diz não ter tempo quando peço que me acompanhe. Nem para comprar o
enxoval ou no curso de mães. Acompanhou-me ao obstetra apenas para me humilhar
pedindo que a médica fizesse um DNA no bebê assim que nascesse.
-
Meu Deus! – Rúbia apavorou-se. Confiava cegamente em Alejandra e esperava do
filho a mesma postura.
-
E hoje eu tive a pior das surpresas. Ele levou Elizabeth à mesma clínica em que
me trato. Ela, que nunca quis lhe dar um filho, engravidou para segurá-lo. E
conseguiu! Miguel está aos seus pés novamente. Viu-a me ofender, me chamar de
vagabunda aos gritos e não me defendeu! Eu estou devasta. Acho até que minha
pressão está tão alta que passarei mal.
Rúbia
sentiu-se tocada pela notícia de que Elizabeth estaria grávida. Se fosse
verdade, a espanhola estava certa em ficar preocupada. Miguel, que já não
manifestava nenhuma vontade em se separar, teria uma desculpa para segurar a
união com a segunda esposa. Outro neto...mesmo para ela seria difícil seguir
ignorando Elizabeth, agora sabendo que ela carregava dentro de si o sangue dos
Benitez. Se isso fosse confirmado.
Depois
de acalmar a nora favorita, ela se arrumou e chamou um táxi para ir até a BTez.
As explicações de que necessitava não poderiam esperar até a noite. Seu filho
bem que tentou, mas não conseguiu despistá-la com a desculpa de estar ocupado.
Ficaram frente a frente.
-
Diga, Madre. O que é tão urgente discutirmos que não pode esperar até em chegar
em casa? – Lá no fundo Miguel já sabia o assunto.
-
Me diga se é verdade que Elizabeth espera um filho!
-
Alejandra não perdeu tempo. Sim, é verdade. A senhora será avó de um filho meu
e de Elizabeth.
-
E como você pode ter certeza absoluta disso? Afinal Elizabeth jamais manifestou
nenhum apresso pela maternidade, nem pelo cuidado para com a família. Nunca se
dedicou ao lar e a você como marido.
-
Chega Madre. Isso é algo particular. – Miguel tentou freá-la.
-
Não mesmo! É o nome Benitez que está em jogo. Ela jamais quis me dar um neto. E quando
Alejandra o faz, de repente, Elizabeth lhe diz estar grávida. Não seria isso um
artifício barato para mantê-lo agarrado emocionalmente nela?
A
expressão estupefata de Miguel pegou de surpresa Rúbia quase tanto quanto a
gravidez. E ele não entendeu a razão. Afinal, fora Liz a pedir o divórcio então
não faria sentido algum ela inventar uma razão para aproximá-los. Mesmo com sua
imensa falta de paciência, ele explicou isso à mãe.
-
Mama, eu teria voltado para Elizabeth em qualquer um dos minutos em que ficamos
afastados. Não precisava de gravidez para isso. Então não faça insinuações.
Além disso, Elizabeth tem quatro meses de gestação, mais do que Alejandra. Não
se trata de uma retaliação.
-
Quatro meses?!?! E você me escondeu isso?
-
Eu não sabia! Elizabeth sempre imaginou que eu iria me envolver com a gravidez
e tentou me afastar. Mas agora que sei, vou lhe dar todos os cuidados e tenho
certeza que ela reconsiderará o nosso divórcio. Fim da história, pode me deixar
trabalhar.
-
Ela o engana! Ela o faz de palhaço e você ainda a quer?
-
Saia, madre! Agora! Não quero brigar. – E estava há poucos passos de explodir.
-
Ainda não! Mesmo que isso tudo seja verdade, você não tem o direito de humilhar
Alejandra exigindo um exame de paternidade ou exibindo sua atenção com
Elizabeth enquanto lhe nega o cuidado que merece. E, ainda mais, não pode
permitir que Elizabeth ofenda Alejandra.
-
A senhora não estava lá!
-
Nem preciso! Conheço ambas e sei qual delas tem elegância e decência. Você deve
respeito a Alejandra. Ela poderia ter se aproveitado do divórcio, mas
manteve-se íntegra. E agora você lhe exige um DNA? É inaceitável.
-
Exijo porque não tenho certeza que é meu. Nós não tínhamos um relacionamento.
-
Então terá de exigir também de Elizabeth porque eu não tenho certeza e não reconheço
esse neto!
-
Problema seu! Eu também não a reconheço mais como mãe mesmo. Não essa mulher
amarga e que vem se deixando ludibriar por Alejandra. Se a minha felicidade não
é o mais importante para minha mãe, sinto muito!
-
Meu filho...sua felicidade é tudo pra mim...eu...
-
Não! Se fosse, não faria de tudo para me ver longe da mulher que amo. Pois lhe
digo, madre, que a partir agora não mais fecharei os olhos para as suas atitudes.
Eu vou me mudar para o apartamento de Liza e vou fazer de tudo para retomar meu
casamento e minha felicidade. E não mais admitirei que se intrometa em minha
vida.
Miguel
não se arrependeu de nenhuma palavra dita, mas sofreu ao ver a tristeza
estampada nos olhos de sua mãe. Muito relevou de suas atitudes por saber de seu
imenso sofrimento e solidão após a perda do marido. Porém, isso não mais
bastava como desculpa para suas atitudes. Agora ela teria de repensar suas
atitudes e escolher se preferiria a solidão ou a família.
Foi
com esse ânimo que Elizabeth o encontrou na portaria do prédio quanto faltavam
apenas cinco minutos para as 22hs. Ele fez questão de que não lhe avisassem que
ele aguardava. Queria que Liza se lembrasse do combinado e, também, precisava
saber se ela continuava trabalhando até tão tarde. Concluir que não para as
duas perguntas, tornou seu humor um pouco mais azedo.
Quando
a viu, percebeu na expressão da esposa muita surpresa e exaustão. Essa
combinação lhe disse que Elizabeth, como de costume, havia trabalhado tanto que
esqueceu-se do resto. E isso fez com que sua raiva suaviza-se e o espaço fosse
tomado pela preocupação. Tudo o que Miguel conseguiu sentir foi o desejo de
cuidar dela.
-
Você veio... – Foi tudo o que Liz disse.
-
Eu disse que viria. E pedi que você chegasse mais cedo.
-
Não vou me desculpar pela hora que cheguei na minha casa após trabalhar o dia
todo. Por isso, nem pense em me criticar se quer alguma chance de entrar.
-
Não vou criticar, apesar de esperar que você repense seus hábitos pelo bem do
nosso filho. Mas vamos entrar e conversar com calma, Liz. Estou cansado também.
Foi
constrangedor tê-lo ali. Não havia forma de não ser depois de toda a história
que já tinham. Ainda assim, aos olhos de Liz, ele parecia natural na sua
cozinha. Elizabeth jamais lhe diria, mas vê-lo ali lhe passava uma alegria
muito grande, uma pitada de esperança na resolução de todos os seus problemas.
Era como se o destino lhe dissesse que havia uma última chance de encontrar com
a felicidade. E por mais cabeça dura que fosse, estava muito tentada a
permitir-se tentar.
-
Vai me contar o que aconteceu para haver essa ruga em sua testa?
-
Primeiro eu preciso de um banho. – Pela primeira vez em tantas semanas Miguel
viu Elizabeth lhe sorrir sinceramente. – Se realmente vai querer dormir aqui,
aconselho a aproveitar o tempo livre pra abrir o sofá cama e pegar os
travesseiros no quarto, porque a sala será o seu lar.
-
Eu topo. Já é um pouquinho mais perto de você.
Ainda
com um sorriso bobo no rosto, Elizabeth ficou algum tempo sob a água do
chuveiro. Não foi um dia fácil. E não apenas pelo encontro com Alejandra.
Considerava sua relação com aquela mulher finalizada. E no seu ponto de vista,
agora finalmente se encaravam como iguais, sem falsidades. E depois de dizer o
estava engasgado em sua garganta, pôde respirar aliviada. Mas resolver uma
parte, pequena, dos seus problemas pessoais, não a impediu de vivenciar os
profissionais. E foi isso a impedi-la de estar em casa para receber Miguel.
Às
19h30min, quando pegava suas chaves para ir embora, foi chamada na carceragem
porque Pedro Ferraz queria lhe dizer algo. Era tentador mandá-lo esperar que
ela quisesse lhe ouvir, mas a esperança de que ele tivesse algo de importante a
lhe dizer a fez ir. E acertou. Pedro havia pensado melhor e percebido que seus
antigos parceiros não estavam interessados em lhe ajudar.
-
É bom fazer valer a pena eu estar aqui, Ferraz. – Disse ao visitá-lo na cela
pouco confortável que lhe servia de lar. Liza percebeu que fez bem ao vir
quando soube que o advogado não fora convidado aquela reunião. – Tem algo para
me dizer?
-
Eu estive sim com a sua irmã. Posso ajudá-la a reencontrá-la. – Ele foi direto.
-
Essa investigação não está na minha jurisdição, Ferraz. Eu investigo uma
quadrilha que trafica pessoas, na qual você é um pau mandado de nível médio.
Grande o bastante para matar um ser rastejante como Caleb, mas pequeno demais
para eles se arriscarem para salvar sua pele. A questão é o quanto você está
disposto a me dizer para aliviar o seu lado.
-
O que lhe interessa mesmo é a jornalista. Eu sei. E estive com ela.
Os
olhos de Elizabeth brilharam. Mas ela sabia que não seria fácil. Pedro não era
um ignorante. Não o bastante para entregar-lhe o outro. Teria que arrancar algo
dele, o quanto pudesse, e tentar um acordo.
-
A quadrilha, Ferraz...quero saber da quadrilha. Deixemos minha irmã de lado. –
Repetiu.
-
Impossível. Ela está com eles. – Ele enfim disse o que Elizabeth já sabia. – E
está viva...até onde sei. Fui eu a entregá-la para os chefes.
-
Quem são os chefes? E para onde ela foi levada?
-
Calma, investigadora Elizabeth Benitez. Primeiro vamos ao nosso acordo. Sabe
como é, podemos virar parceiros.
-
Não sou parceira de bandido, Ferraz. Se me der uma boa razão para acreditar que
você pode me ser útil, sugiro ao juiz um acordo e você limpa um pouco a sua
barra.
-
Um pouco? – Ele parecia desconfiado.
-
Um pouco, conforme o que você falar. Vamos lá...me prove que não é tão
rastejante quanto Caleb e me dê alguma informação que preste.
-
Não até ter a sua oferta de acordo. – Ele respondeu.
-
Se é assim, não haverá acordo.
Elizabeth
não estava interessada em entrar em joguetes com um criminoso. E não o faria.
Estava sim desesperada para encontrar Beatriz, mas se ele visse seu desespero
se colocaria nas mãos dele. Então não mostrou interesse. Pedro tinha de
perceber que assim como na quadrilha, ali ele não estava no topo e não tomava
as decisões. Ela levantou-se e seguiu para a porta.
-
As ruas de Moscou são lindas, Elizabeth. Você não acha? – Pedro enfim lhe
oferecia algo concreto. E lhe confirmava que as respostas estavam na Rússia.
-
Acho, sem dúvida. Qual a sua favorita?
-
Várias. Depois do nosso acordo, com mais tempo, podemos estender esse assinto.
-
É, podemos. – Ela sorria ao sair da carceragem.
Quando
deixou a cadeia a abrigar Pedro, Elizabeth estava cansada e esperançosa. E só
fez melhorar. Quando deixou o chuveiro e foi procurar Miguel na sala do
apartamento, ela estava mais leve e confiante. Vê-lo cozinhando no apertado
ambiente a fez se sentir ainda melhor.
-
Não vou mentir, Miguel. Estou gostando de tê-lo aqui. Não resolve os nossos
problemas, não apaga minha mágoa, mas faz com que me sinta melhor. E o cheiro
dessa comida está me deixando com fome.
-
Ótimo. Dois dos meus objetivos foram alcançados então. Vamos comer? É só uma
omelete, mas acho que você gostará. Senta aqui.
-
E quais são os outros objetivos? – Liz perguntou ao se sentar e provar da
comida.
-
Cuidar de você e recuperar sua confiança, pra começar. Quero ser merecedor da
minha mulher.
Miguel
foi se aproximando, disposto a roubar-lhe um beijo. No meio do caminho parou.
Não queria esticar demais a corda quando ela ainda não tinha força o bastante
para suportar. Sua Liz não era uma mulher fácil e, naquele momento, ainda não
tinha certeza se ela iria aceitá-lo de volta. Não era uma noite o que desejava
ao lado dela. Nada menos que a eternidade o satisfaria. E, para esse tipo de
relacionamento, o alicerce ainda era frágil.
-
Miguel...eu não quero brigar, eu cansei de discutir. Preciso de paz para sair
desse mundo de problemas em que me encontro. – Ela lhe disse numa confissão
muito dura de se fazer.
-
Não precisa me oferecer nada. Só aceitar que eu te apoie. Por favor, Liz. Não
precisamos dividir a cama, se é o que você deseja, mas eu preciso que aceite a
minha presença e os meus cuidados. Por favor.
-
Eu aceito. – As duas palavras bastaram para Miguel voltar a se sentir humano e
a cama improvisada no sofá pareceu bem mais confortável.
Depois
de comer Liz contou para Miguel o que a reteve na delegacia até tão tarde.
Moscou. Agora ela não tinha uma suspeita de país. O suspeito lhe confirmou
estar naquela cidade o coração da quadrilha. Em algum lugar de Moscou estava
Bia. Levando em consideração o tamanho da capital da Rússia, não era uma grande
evolução. Ela disse isso para Miguel. E ele respondeu num tom ameno, mas
sincero.
-
Ainda assim, melhor um passou pequeno à frente que a estagnação. – Isso valia
também ao relacionamento deles.
Em
Moscou, Beatriz passou a semana sem ver Sebastian. E a cada noite, sentia a
esperança se esvair. Não era uma desistência. Apenas a aceitação de que seria
necessário encontrar outra vítima. Sim, era assim que via Sebastian. E se ele
não caísse no golpe, teria de encontrar outro. Foi com esse sentimento que
pisou no salão no início da noite de sexta.
Quando
viu-o chegar, um instante de esperança se criou. Foi rápido. Viu-o circular e
seus olhares se cruzaram. Mas Sebastian não veio até ela. Quando o viu se
aproximar da mesa onde Gregory ficava, pensou que ele fosse pagar por ela. Mas
não. Ele pagou por uma negra recém chegada e subiu com ela para o quarto no
minuto seguinte.
-
Se aguardava por ele, espero que tenha perdido as esperanças. – Natacha lhe
sussurrou.
-
Não aguardava por ninguém. – Respondeu, tentando convencer a si mesma.
Num
vestido vermelho que parecia gritar p-u-t-a em cada centímetro ela se ofereceu
para alguns homens. Muitos desejaram, poucos estavam dispostos a pagar. Uns
porque preferiam ninfetas. Outros porque foram ali com um alvo certo. Alguns
queriam apenas beber. Outros não tinham dinheiro para pagar seu preço. Até que
um homem, de cerca de 30 anos, levou-a para o quarto.
Falava
uma língua estranha que Beatriz nem sabia dizer se era um dialeto árabe ou
indígena. Fosse qual a nacionalidade, estava descartado como porta de saída.
Restou a Beatriz apenas lhe dar o que buscava e sair à procura do próximo.
Levou 2h20min com ele no quarto. O suficiente para fazê-lo beber, gozar e cair
adormecido. Então se arrumou para descer. Ao caminhar pelo corredor onde muitos
quartos estavam disponíveis, viu um tumulto.
Alexia,
a negra que subiu com Sebastian, deixou um dos quartos sendo ajudada por outras
meninas. Estava com o corpo e o rosto machucados. Beatriz parou para observar o
que acontecia. E então viu Gregory e Samantha dentro do quarto, junto de
Sebastian. Ele se vestia com mãos trêmulas e pernas bambas. Estava caindo de
tão bêbado. Essa era uma lição que precisava aprender. Tesão e álcool eram uma
combinação perigosa em Sebastian.
-
Você! – Gritou em português ao vê-la no corredor. – Eu quero você!
-
Beatriz suma daqui! – Gregory respondeu enxotando-a.
Mas
Sebastian não estava tão bêbado assim. Ele afastou-se de Gregory e Samantha e caminhou
até Beatriz. Não se importou em ter uma plateia assistindo-os e passou as mãos
subindo da parte de trás de seus joelhos até poder apertar as curvas do quadril
farto dela. Os dentes foram direto ao pescoço, mas logo ele tirou o rosto de
seus cabelos.
-
Quero você! Mas antes vai tomar um banho. Não gosto de sentir o cheiro de outro
na sua carne. Vamos. – Disse pegando-a pelo braço.
Um
segurança tentou bloquear a saída, mas, com um olhar para Gregory, conseguiu o
que desejava.
-
Deixe o Senhor Gonzáles sair. Ele enviará a garota de volta no domingo à noite.
– Sem alternativa, Gregory concedeu. No fundo, aquilo estava irritando-o mais
do que podia demonstrar com Samantha ao seu lado.
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