Cinco dias depois...
Era fim de tarde e Neal foi fazer
uma corrida pela orla da praia enquanto Rachel buscava George da tarde de
brincadeiras com os pequenos amigos. A vida infantil era agitada em Marselha. O
garotinho costumava voltar tão cansado que dificilmente fazia muito mais do que
tomar banho, jantar e dormir.
Não era apenas a rotina de George a ser cansativa.
A deles também. Em especial por manterem algumas investigações paralelas. Uma
visava apenas encontrar o diamante para montar uma estratégia de roubo e,
finalmente, ter a pedra em mãos. Era apenas dinheiro. As outras investigações
eram mais pessoais. Eles queriam descobrir os próprios passados. Queriam dar a
George a verdade sobre seus avós.
A todos que perguntavam, Neal sempre dizia que a
mãe estava morta. E de certa forma ela realmente estava. Não se viam desde que
ela sumiu após a prisão de seu pai. Ela sofreu muito na época e não aguentou a
pressão de ver o marido, policial, ser preso por corrupção. Os dois foram
levados para um abrigo do governo e tentaram sobreviver com a ajuda da então
parceira polícia do pai: Helen. Quando a mãe parou de lhe dar atenção, foi
Helen quem ajudou a criá-lo.
Nunca mais teve notícias da mãe. Poderia
estar viva ou morta. Já do pai era ele a não desejar um reencontro.
Aproveitando-se da boa vontade de Helen, enganada já próxima da morte, ele
aproximou-se do filho e apenas o usou para conseguir algo que precisava. Sumiu
no mundo e ainda cometeu um assassinado deixando Peter como suspeito. Para
livrar o amigo, ele fraudou uma gravação. Não queria nunca mais ver o pai. Mas
tinha esperança de rever a mãe e dar outra avó para George e para a pequena
Helen.
Quanto ao passado de Rachel, havia mais fios para
puxar. Ela só não buscou pela própria história antes porque não tinha certeza
se desejava mexer nesse assunto. Tinha a convicção de que seus pais adotivos ao
resgatá-la de um acidente de trânsito onde os demais ocupantes do carro
morreram, investigaram e descobriram que era uma criança traficada. Ela foi
tomada dos verdadeiros genitores e vendida para aqueles que morreram no
acidente. Se John, seu pai, havia realmente, ao menos iniciado uma
investigação, Nicolle, sua mãe teria alguma pista. Mas ela estava em NY e
qualquer contato poderia ser rastreado pelo FBI.
Mozzie vinha ajudando-os nas três investigações. A
pista do diamante levava até New York, da mãe de Neal a última notícia vinha de
antes do sumiço, há 15 anos, no abrigo de testemunhas. A menos que o pai lhe
tivesse mentido. E as pistas sobre a família de Rachel estavam nas pesquisas de
John e na memória de Nicolle. Ou seja? Tudo nos EUA. De Marselha pouco poderiam
fazer. E ir até os EUA representava o risco de ficarem presos.
Continuando a corrida, ao longe
pode ver a esposa caminhando pela areia a passos lentos. Ficou esperando-a
chegar calmamente até ele, vestindo uma saia longa e estampada e apenas a parte
de cima de uma biquíni. A barriga à mostra, como ela gostava. Helen era exibida
pela praia diariamente, assim como os cabelos ruivos.
- Será que posso acompanhá-lo nessa caminhada? –
Ela perguntou, sorridente.
- É claro. Como minha filha está?
- Agitada, por isso vim caminhar um pouco. Ver se
no balanço ela se acalma. – Ela guiou a mão de Neal até a lateral da barriga. –
Aqui está o pezinho. Sente.
Eles ainda caminharam de mãos dadas um pouco antes
de voltar a falar. Com o sol já se pondo e a temperatura amena, a praia era um
convite aos namorados. E eles ainda se sentiam assim.
- Estava pensando em como descobrir o nosso passado
sem arriscar o futuro. – Foi Neal a puxar o assunto. – Eu quero continuar as
investigações sem nos expor.
- Eu também. Mas queremos o impossível. Tudo parece
nos levar de volta a NY. Justo NY. – Ela ficou triste. Queria poder voltar e
esclarecer tudo. Nessas horas um ódio profundo por Josef Harabo a dominava. Por
culta dele voltou a ser uma procurada pela justiça. – E se recorrêssemos a Peter?
- A chance dele fazer algo ilegal é zero. Isso
inclui nos ajudar, a menos que resolvamos nos entregar. Isso significaria nós
dois presos e distantes de Helen e George.
- Não...não consigo nem pensar. – Ela abraçou-o. –
Mas você não é procurado por nenhum crime grave. Apenas por facilitar a minha
fuga. Tenho certeza que para um crime assim, mesmo com seu histórico, Peter
consegue um acordo. O FBI sabe como você é útil. Você pode voltar a NY.
- Voltar a usar tornozeleira? – O rastreador lhe
fez companhia por anos e não trazia saudade. – Acho que não, amor. E qualquer
acordo incluiria entregar a sua localização. Isso eu não farei. Não vou privar
meus filhos do convívio com a mãe. Entre meu passado e meu futuro, eu fico com
o futuro aqui, com você.
Ao voltarem para casa, encontraram Mozzie e George
assistindo a um DVD infantil. Na verdade apenas Mozz assistia, ria e imitava as
falas dos animaizinhos que dançavam animadamente. George já havia dormido no
colo do amigo.
- Eu lhe dei um sanduíche e ele apagou.
- Obrigada, Mozz. Eu vou colocá-lo na cama. – Neal
pegou o pequeno e levou para o quarto.
- Como vai a ‘baby-Helena’? – Claro que ele já
havia apelidado a nova integrante da família.
- Muito bem, Mozz. Estávamos caminhando na praia e
ela se acalmou. Deve estar tirando um cochilo. – De repente Rachel ficou séria.
– Nós falamos sobre a necessidade de investigar em NY. Não podemos arriscar,
Mozz.
- Nem precisam! Eu sou o ‘invisible man’. Vou e
volto com as informações sem cair no radar dos engravatados.
- Nem no radar de Peter? – Neal perguntou ao voltar
para sala.
- Eu reconheço que Peter é um engravatado
melhor...nós lhe ensinamos muito. Mas ele não conhece todos meus truques. Eu
consigo.
- Vamos amadurecer melhor essa ideia, Mozz. –
Rachel finalizou a conversa. Iriam mais uma vez deixar essa decisão para o dia
seguinte.
A noite foi de um amor terno e calmo, como se
pressentissem o fim de sua calmaria. Já era tarde e deveriam estar deitados,
mas ela abraçou o marido sem deixar-lhe dúvidas do que queria. Neal sentiu as
mãos da esposa serpenteando por seu peito, descendo com destino certo. Rachel
não era a mais delicada das mulheres para deixar claro que desejava sexo. Era
direta e não tinha pudores em ser feliz na cama.
- Eu tenho um marido sexy demais para não usá-lo.
Apreciar esse corpinho é o mínimo que eu posso fazer para agradecer a todos os
exercícios que você faz, meu amor. E eu faço questão de agradecer diariamente.
Se ele mantinha exatamente o mesmo corpo de quando
se conheceram, o dela estava bem diferente. Arredondado devido ao crescimento
de Helen, o corpo dela estava farto e sensível a qualquer toque. Ela, já
normalmente movida pelas emoções, grávida ficava ainda mais receptiva. Todos os
sentimentos eram exacerbadas, inclusive a euforia do prazer. Por enquanto, a
barriga não lhe atrapalhava nenhum pouco.
- É tarde...você deveria estar dormindo já. – Ele
disse apenas para provocá-la. Não queria parar.
- Eu quero você. – Ela sequer deu atenção a
provocação. Sabia que ele não lhe negaria o prazer. – Eu tenho a vida toda pra
dormir e depois nós vamos ter o resguardo...preciso aproveitar agora.
- Então vamos aproveitar...vem pra cama vem.
Ao amanhecer Neal tinha planos claros. Levaria a
família para um piquenique. Queria ficar na praia e curtir aquele momento.
George andava perguntando por que a mãe não podia pegá-lo mais no colo e,
apesar de não ter muito ciúme, estranhava a nova situação. Em breve ele não
seria mais o bebê da família. O tempo só com eles iria lhe fazer bem.
- Bom dia, marido meu. – Rachel entrou no banheiro
quando ele se preparava para fazer a barba. - Deixa assim. Eu gosto. Fico
arrepiada.
Agradá-la era fácil e ele resolveu manter a barba
por mais um ou dois dias. Nunca gostou de usá-la, mas combinava com o ambiente
descontraído de Marselha. Utilizada por muitos turistas, era comum ver homens
que a deixavam crescer durante a estadia ali.
Juntos, passaram a manhã brincando com George e
animando-o para a chegada de Helen.
- Ela vai jogar bola com você quando crescer. –
Neal lembrou ao filho.
- É...e vídeogame. – George concordou. Ele tinham
uma coleção de joguinhos no tablet da mãe.
- E você vai cuidar dela? – Rachel perguntou.
- Vo sim...ela é muitooo pequena e eu sou grande.
- É! – Rachel riu. Parecia um adulto apesar de
ainda nem ter completado três anos. – É o meu meninão lindo.
- Então vamos dar um beijo da Helen, George? Vamos?
– Neal provocou-o antes de erguê-lo até a barriga da mãe.
Enquanto isso, os Burks desembarcavam em Marselha.
O FBI tinha não fazia ideia de nada. A princípio, Peter estava em férias por
uma semana. As únicas pessoas que sabiam da verdade eram Diana, Henrique e
Sara. Eles esperavam que no retorno, Neal, Rachel, Mozz e George os
acompanhassem. Mas primeiro, precisavam encontrá-los.
- Eu vou à praia papai? – Sofia perguntou.
- Sim, vai, querida. Depois. Primeiro vamos procurar
o tio Mozz.
Mas não seria fácil. Foram a agência bancária onde
Ana Assunção realizava os saques e nenhum atendente conhecia um morador com
esse nome. Como tratavam-se de registros frequentes, era claro se tratar de uma
moradora da praia que só utiliza os automáticos. Era um indício de que Sara
estava na pista correta. Mas lhe dificultava a busca. Não faziam ideia de onde
estavam ou quais nomes usavam.
Normalmente, Peter exigiria as gravações de
segurança e buscaria imagens dos dias em que a conta teve movimentação, mas ele
estava fora de seu país, em férias e, o mais importante, isso alertaria a
polícia local. E não deseja criar problemas para Neal. Prometeu isso a Ell,
Sara e Henrique. Ele voltaria aos EUA por vontade própria. Apenas isso. Se dissessem
não, iriam embora sem denunciá-los. A saída era então uma só: perguntar para a
população utilizando fotos.
As primeiras duas horas renderam
abssolutamente nada. E preocupado com o esforço físico de Ell, pararam num bar
para se refrescar. Ela sequer deveria ter vindo naquela viagem no sexto mês de
gravidez, mas discordar dela naqueles meses era quase impossível. Ela ficava
furiosa e gritava ou deprimida e chorava. Peter não sabia lidar com nenhuma das
alternativas. Então fazia todas as suas vontades.
- Eu quero morangos. – Ela lhe
disse olhando a banca de frutas do outro lado da rua. – Frescos. Aqueles
morangos frescos ali!
- Morangos frescos? Porque
não...já te trago.
A barraquinha simples de frutas
era de um simpático vendedor. Ele lhe garantiu que os morangos eram sim frescos
e ainda lhe sugeriu pontos turisticos da praia, lhe desejando boas férias.
Peter não quis perder a oportunidade.
- Na verdade...nós estamos
procurando um casal de amigos. Você os conhece? – Ao mostrar a foto, Peter teve
o cuidado de não dizer nomes.
- Sim....claro. Os pais do menino
George!
- Isso! Os pais do menino George!
– Peter não se aguentava de felicidade. – Pode me levar até sua casa?
- Não posso deixar a banca...mas
lhe indico como chegar. Srª Helena e Sr. Bernard gostam de tranquilidade. Moram
numa parte mais afastada. Preferem criar George longe da agitação dos turistas.
Aquele menino é tão inteligente...se puxar aos pais...
- Nem me fale. Eu tenho até medo.
– Ele torcia para George ter gostos menos arriscados que Neal e Rachel. – Mas
me diga como chego lá?
- Vai ter de alugar um carro.
Pegue a estrada a beira mar e siga até uma placa que indica a aproximação da
Praia do Prado. Ao fim dessa estrada encontrará uma única e bela casa. Fica
numa elevada, de frente para o mar.
- Muito obrigada pela ajuda!
Sem saber a
revolução que estava prestes a ocorrer, Neal trabalhava em uma escultura na
parte de trás da casa quando ouviu a campainha tocar. Rachel e George tinham
ido brincar na areia da praia e ela jamais esquecia as chaves. Era raro eles
receberem visitas. Aquela casa foi escolhida por manter a privacidade deles e,
caso fosse necessário, possibilitar uma fuga rápida, por terra ou por água.
Manter seus segredos bem guardados também era o motivo para não manterem empregados.
Apenas uma empresa de limpeza vinha uma vez por semana. Assim não criavam
vínculos. Tinha de ser assim.
Um tanto
desconfiado, vestiu uma camisa e foi atender a porta. Nada o tinha preparado
para ver Peter ali, sorrindo e com a expressão tranquila. Não parecia o perseguidor
das outras vezes...aliás, não parecia um agente do FBI. Discretamente, olhou em
volta a procura dos policiais de apoio. Sairia daqui algemado? Rachel e Mozz
conseguiriam escapar?
- Não vai me
convidar para entrar, Neal? Ou devo dizer Bernard? – Peter via a confusão em
seus olhos. Era natural. Precisavam conversar. Por isso Ell e Sofia tinham
ficado para trás. Eles precisavam conversar antes.
- Não vai me
prender?
- Não, Neal. Nem
posso. Estou fora da minha jurisdição e de férias. Além disso, a França não...
- Faz acordos de extradição.
É! O Mozz pesquisou isso.
- Eu não esperava
menos dele, Neal. E já que eu vim sem algemas...será que posso te dar um
abraço?
Peter não esperou
pela resposta e abraçou-o. Era como se reencontrasse mais que um amigo. Neal
era como um filho. Daqueles que é tão amado quanto problemático.
- Senti sua falta garoto!
- Eu também!
Depois do longo abraço e de efetivamente entrar na
casa de Bernard, Peter anunciou o que era obvio. Por mais carinho que houvesse
entre eles, tinham assuntos sérios a falar.
- Rachel e George estão?
- Não...eles saíram. – Neal não confiou o bastante
para dizer que estavam chegando. Para Peter, fora ela a matar Harabo. E ele nunca
teve muita simpatia por Rachel. Peter podia ter vontade de protegê-lo, mas
nunca manifestou a mesma intenção por Rachel. Melhor deixar isso e a gravidez para
falar depois. Peter não era muito chegado em bebês mesmo. – Ell e Sofia vieram
com você...nas férias?
- Sim...Ell achou melhor a gente conversar à sós
primeiro. – Não lhes disse que elas foram na praia ali perto e nem que
Elizabeth esperava um bebê. O amigo e Rachel haviam perdido uma filha. Não
sabia como haviam superado o assunto.
Assim, ainda cheios de segredos e desconfianças,
eles se encaravam. Era um recomeço. Mas parecia bastante com o que viveram por
anos em NY.
- Nós precisamos ter uma conversa muito importante,
Neal.
Ja tinha lido esse cap mais vou começar tudo de novo amandoooooo
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