Quando Neal saiu lhe atirando um beijo e dizendo
que voltava logo trazendo a manga que tanto desejava, Rachel correu para o
banheiro para vestir um hobby e pentear os cabelos. Não estranhou quando ouviu
a batida na porta. Era Jones que veio lhe fazer companhia enquanto Neal estava
fora.
Abriu a porta sem pensar e se deparou com Harabo
segurando Jones com um braço em seu pescoço e a arma apontada para a cabeça. Os
pensamentos de Rachel rapidamente tomaram forma. Ela estava no terceiro andar,
June não ouviria nada porque estava no térreo e a arma de Harabo tinha
silenciador. Neal ainda levaria no mínimo meia hora para chegar. George dormia
no cômodo ao lado, ela não tinha nenhuma arma a mão e Harabo estava
completamente louco.
- Como devo chamá-la? Agente Turner ou cadelinha do
FBI? – Ele olhava para sua tornozeleira.
- Eu poderia dizer que foi um desprazer de rever,
Harabo. Mas ao menos você parou com os recadinhos idiotas. O que quer de mim?
- Ora, ora, ora...nem uns tempos na cadeia fazem
você perder a pose. Vamos ver se eu não faço você me respeitar. Mas isso são
assuntos particulares. Vamos resolver à sós. – Com um empurrão ele joga Jones
no chão, mantendo-o na mira da arma.
- Nem pense em tentar nada, agentezinho! Mexa-se e
eu atiro! Vamos Turner!
- Eu não vou a lugar nenhum com você! – Rachel
respondeu. – Deixe-o. Ele não tem nada com isso. É a mim que você quer, Harabo.
- É. Isso é verdade. Ele não me serve pra nada. – Ele
disse com um sorriso sarcástico no rosto.
Jones percebeu o completo descontrole de Harabo.
Sabia que ia morrer. Então tentou atacar na esperança de conseguir se livrar
naquele maníaco. Jogou-se contra Harabo e tentou lhe arrancar arma.
- Seu demente! – Jones gritou tentando lhe dar uma
rasteira.
Não conseguiu mais do que fazê-lo dar um passo para
trás e levar algumas coisas que estavam sobre a mesa ao chão. Sem nenhum aviso
Harabo disparou a arma duas vezes seguidas. Os dois tiros acertaram o centro do
peito de Jones.
– Pronto! Eu não precisava dele mesmo. – Disse
completamente alucinado.
Apesar de toda a competência de Jones, não havia
sido páreo para a loucura de ódio de Harabo. Ele não era um criminoso qualquer.
Era um fanático sem nenhum sentimento, ética ou responsabilidade.
- Desgraçado! – Rachel disse.
- Agora você vai largar
o celular no chão e colocar essa máscara no rosto, e nós vamos sair daqui,
calmamente.
- Eu não vou com você
para lugar nenhum! – Ela repetiu. Se saísse com ele estaria perdida.
- Vai...e sabe porque,
Rachel? Você vai comigo e bem quietinha porque eu tenho essa arma bem carregada
e não me custa nada gastar uma bala no bebê de olhos azuis que está aqui nessa
casa.
- Não toque no meu
filho!
- Também posso esperar
o seu ladrãozinho voltar e meter uma bala bem no meio da testa dele. – Ele
esperou apenas um segundo. – Coloque a máscara agora!
Sem poder enxergar nada,
ela sentiu quando ele puxou suas mãos às costas e algemou. A essa altura,
Rachel só torcia para George não chorar e Neal não chegar. Louco como estava,
Harabo realmente poderia matá-los a qualquer instante. Lentamente foi guiada
escada a baixo. Sentia a arma tocando-lhe a lateral da cabeça. Harabo não dizia
nada.
Rachel soube que estava
na rua quando sentiu o ar fresco lhe tocar a pele e arma se afastar de sua
cabeça para encostar na barriga. Ele sabia....sabia de Lis.
- Vadias feito você não
deviam se reproduzir, Rachel. Não deviam. – Ele lhe puxou os cabelos. – Você
vai entrar num carro agora e nós vamos dar um passeio. Se der um grito que
seja, garanto que corto a sua garganta na hora.
A apreensão, o grito de angústia preso na garganta,
a sensação de impotência frente a algo sem precedentes. Seu apartamento havia
sido palco de um assassinato, sua mulher havia sido sequestrada e tudo que os
policiais conseguiam lhe falar era que teve sorte de encontrar seu filho vivo.
Sorte? Essa palavra já havia lhe virado as costas há algum tempo.
- Neal... – June lhe chamou. – Me desculpe. Eu não
ouvi nada.
- Eu sei June. Não foi sua culpa.
- Temos que ter fé. Ela já saiu de muita coisa ruim
antes.
A casa de June estava cheia de policiais. Além da
Colarinho Branco e da MI5 que já procuravam por Harabo, a divisão de Homicídios
estava ali.
- O corpo do Jones foi levado para a central e será
liberado para a família em algumas horas. – Peter lhe disse. – Ele já me tirou
um agente, Neal. Nós vamos garantir que Rachel não seja a próxima.
- Ótimo! Agora me diga como! – Neal estava
completamente descontrolado.
- Começando com você mantendo a cabeça no lugar! – Peter
entendia como ele estava se sentindo. Mas precisava que Neal usasse sua
habitual competência ou realmente não teriam nenhuma chance. – Se ele quisesse
uma execução, teria feito aqui e fugido. Se a levou, é porque Rachel está viva.
Então nós vamos lutar!
A primeira atitude do FBI foi buscar pelo sinal da
tornozeleira. Ninguém acreditava que Harabo poderia ter deixado isso passar,
mas precisavam começar por algum lugar. Também estavam buscando os registros de
câmeras de segurança da região. Com Neal sem estrutura emocional e Mozzie
entrando e saindo de casa falando ao telefone, Elizabeth e June cuidavam de
George. Ou tentavam. Com mais de 10 meses o menino percebia o ambiente ruim e
sentia a falta da mãe. George passou aquela madrugada entre acordado e em um
sono tumultuado. Agora choramingava e pedia por carinho.
- Neal...Neal querido... - Ele não respondia e June chamava tentando
manter a própria angústia presa dentro do peito. – Neal...você me ouve?
- O que é?!?!? – Gritou. – Desculpe June...eu não
quis gritar com você. Me perdoe...
- Meu menino, não precisa se desculpar. – Ela
segurava George firmemente. – Ell está preparando uma mamadeira, acha que ele
se sentirá melhor...mas eu acho que George precisa de você agora. E você
precisa dele.
- Pa! Pa! Pa! – George ainda não sabia dizer
‘papai’, mas ele tentava enquanto esticava os braços à procura de um abraço.
- Vem filho. Papai pega você. – Sem muita firmeza
Neal o segurou e levou para a sacada. Foram ter uma conversa de pai e filho. –
A mamãe está longe, filho, o papai não sabe onde ela está. Mas nós vamos
descobrir. Eu, o tio Peter, o tio Mozz...a gente não vai parar antes de
encontrar a mamãe. E ela é durona. Você sabe! É a nossa garota! Ela não vai se
deixar vencer fácil. Ela e a Lis estão bem, seja onde for. A mamãe vai lutar,
vai vencer e vai voltar pra nós. Ela sempre consegue. Ela vai voltar pra nós.
Vai sim.
Peter estava destroçado. Um homem de sua equipe
estava morto. E sentia medo, muito medo pela vida de Rachel. Só de pensar na
criança sentia um calafrio. Chegava a se questionar se não tinha cometido um
erro fatal ao não enviá-la de volta ao presídio assim que soube da gravidez. Ao
menos o bebê estaria a salvo.
Esse caso tinha duas peculiaridades. A primeira era
que Harabo não estava movido por nada racional. Simplesmente queria vingança e
só o fato de não ter matado Rachel assim que esteve a sua frente já era um
indicativo de que ele tinha seu plano muito bem armado. A segunda era que
simplesmente não podia contar com a esperteza de Neal Caffrey. Seu consultor
havia perdido o foco, perdido o chão e apenas andava em círculos pelo
apartamento. Não podia contar com ele.
Então recorreu a segunda melhor pessoa para lhe
ajudar a imaginar o que Harabo pretendia.
- Mozz! Vem cá! – Não queria falar na frente de
Neal. – Eu sei que você andou fazendo investigações.
- Eu não nego nem confirmo nada antes de saber suas
intenções, Engravatado.
- Pare, Mozzie. Não é hora para brincadeiras nem
para segredos. Você tem imunidade total nesse momento. – Dizer isso para Mozz
era um risco tremendo, mas Peter estava disposto a corrê-lo. – Viu o estado de
Neal?
- Claro. – Mozz olhou o amigo discretamente. – Ele
não está assim só por Rachel.
- É pela filha. – Tinha que ser. Qualquer homem
estaria em desespero.
- Não, Peter. Olhe para ele. Não te lembra nada?
Quando Neal ficou dessa forma antes?
Vendo Neal segurar George mesmo com as mãos
tremendo, Peter lembrou exatamente do que Mozzie se referia. Só o tinha visto
assim uma vez. Quando aquele avião explodiu levando Kate embora, após ele lutar
por tanto tempo para tê-la novamente.
- Ele está revivendo tudo. Ele procurou por Kate
tendo a fé de reencontrá-la. E ela terminou morta! Neal está em pânico por medo
de a história se repetir e, mais uma vez, a família dele se perder.
- Eu preciso da sua ajuda, Mozz. Eu sei que você
investigou Harabo. Me traga qualquer coisa que tenha encontrado. Qualquer
pista. – Implorou Peter.
Não era sem razão que Mozz passou as últimas duas
horas entre várias ligações. Tinha uma rede de contatos, uns amigos e outros
nem tanto, capazes de captar em uma espécie de radar do crime. A rede estava em
alerta e o radar pronto para captar qualquer sinal de Joseph Harabo.
- Eu ainda não tenho nada concreto para falar. Mas
terei...em breve. – Respondeu a Peter.
- Ótimo. E Mozz...traga a nós as suas informações,
não ao Neal. Ele não está em condições de iniciar uma caçada ao Harabo. Ele faz
bobagens quando está assim.
Quando a casa encheu-se ainda mais, Peter não soube
o que fazer. Não podia lidar com o nervosismo de Nicolle e do Richard. O médico
amigo da família que veio à cidade para atender Rachel resolveu agora ficar e
se colocou a disposição para ajudar. Não tendo tempo nem disposição para nada a
não ser lidar com a investigação, pediu que June levasse a todos para o primeiro
andar e os mantivesse por lá o máximo que pudesse. Uma babá já estava lá
olhando Sophia e Teddy. A missão de Ell era ficar atenta a Neal. Apoiá-lo, sim,
mas, principalmente, evitar que fizesse qualquer bobagem.
Tinha uma missão, no entanto, que só ele podia
cumprir. E ela se impôs na hora em que Henrique e Shepherd entraram no apartamento.
- Eu sinto pelo seu homem, Peter. Jones foi um
agente que honrou o distintivo. – Shepherd disse ao lhe estender a mão. – Meus
sentimentos a equipe e a família.
- Eu agradeço, Shepherd. Mas precisamos manter o
foco agora em Rachel.
- Alguma notícia? – Henrique perguntou. Estava
visivelmente abalado.
- Tivemos algumas pistas, mas não temos um local
para fazer buscas.
- Confio em Turner! – Shepherd falou dura e
firmemente. – Se há alguém capaz de sair dessa situação ilesa, é ela. Conheço a
agente que eu e John treinamos. Ela não se deixará derrubar. Lutará com Harabo e
tem chances de vencê-lo. Já o derrotou anteriormente.
Peter sentiu que não podia mais esconder
informações. Teriam que trabalhar em equipe.
- Só que dessa vez Rachel não deve tentar lutar com
Harabo, Shepherd. E eu não acho que ela vá fazer isso. Ela está grávida de
cinco meses.
- Mas... - Shepherd
foi pego em completa surpresa. – Ela não disse nada.
- É uma longa história. Eu também não fui informado
quando deveria. Mas agora o que importa é que nós precisamos concentrar nossos
esforços ao máximo. Rachel e sua filha precisam de nós. Ao trabalho!
Com a certeza de que nesse caso a MI5 o ajudaria e
contando com as informações que Mozzie conseguiria, Peter reuniu-se com Diana.
Muito abalada e raivosa pela morte de Jones, colega com quem trabalhou por
vários anos, Diana se esmerava em fazer um trabalho ainda mais meticuloso do
que sempre realiza.
- Uma câmera registrou essa van preta saindo em
alta velocidade numa avenida próxima a da casa de Neal.
- Mas não há garantias de que seja esse o carro? –
Peter farejava uma evidência mais forte. – E a tornozeleira?
- Aí é que está, chefe! O sinal da tornozeleira foi
disparado quando ela saiu do raio, mas seguiu funcionando após ser jogada em
uma lixeira de rua. Rua pela qual esse carro passou. Tudo indica que Rachel,
Harabo e mais alguém estavam nessa van.
- Vamos apostar nisso então. Consiga a placa e
vamos descobrir para que região da cidade foram.
- A placa já tenho! – Respondeu Diana.
- Ótimo! Vamos caçar esse desgraçado. E Diana, me
faça dois favores: trabalhe em parceria com Mozz e mantenha detalhes longe de
Neal.
- Claro. Ele está fora de si.
Rachel não sabia onde estava. Até tentou registrar
cada curva que o carro fez com ela vendada e algemada lá dentro, mas foram
tantas que acabou por perder a noção de espaço. Em certo momento sentiu um soco
estourar em seu maxilar.
- Ficou bem quieta com essa coleira no pé, hem!
Acha que sou idiota?!?!? – Harabo gritou enquanto puxava sua perna para cima e
arrancava a tornozeleira.
Ela percebeu uma breve parada na qual,
provavelmente, Harabo livrou-se do rastreador. Rachel a todo o momento pensava
em arriscar algo. Qualquer coisa que o fizesse lhe tirar ao menos a venda. Lhe
devolvesse minimamente a igualdade em uma luta. Mas não podia se expor. Não
tendo Lis ali com ela. Então ficou calada e se manteve a mercê das loucuras de
seu sequestrador.
Já amanhecia quando Diana levou a Peter, Henrique, Shepherd e Mozz uma novidade
importante. Ela se aproveitou do momento em que Neal tentava fazer George
dormir para passar a informação.
- Conseguimos essa imagem do motorista da Van. Foi
feita quando ele parou em um semáforo localizado já a mais de duas horas daqui.
Eles rodaram bastante. A imagem está granulada, mas bate com os registros desse
homem. – Agora ela mostrava uma foto em boa qualidade. – Michel Newman. Fixa
policial comum, pequenos crimes.
- Alguma possível ligação com Harabo? – Shepherd questionou.
- Nenhuma. Newman é peixe pequeno e não há indícios
de ter participado de crimes fora dos EUA.
Computadores trabalhavam sem parar na busca por
informações. Precisavam descobrir onde Michael Newman esteve recentemente e
talvez isso lhes desse uma pista de onde estariam. Neal, que até o momento
esteve perdido no próprio sofrimento ou dando atenção a George, agora se
juntava a eles e exigia participar. Logo bradou que era o mais interessado e
tinha o direito de participar do que fosse feito na busca por sua mulher.
- O nome Michael Newman te diz algo? – Shepherd
questionou com a precisão de sempre.
- Não, porque? – Neal respondeu.
- Por que aparentemente é ele a dirigir a van na
qual Harabo sequestrou Rachel. Estamos tentando descobrir algo mais.
Um instante depois Mozzie desligou o celular. Não
disse nem pretendia dizer quem lhe ajudou a conseguir a informação, mas recebeu
duas ou três dicas de codinomes usados pro Newman em seus golpes e, com a ajuda
de uma fonte muito melhor do que qualquer agente da inteligência do FBI,
descobriu o rastro das ultimas atividades financeiras dele.
- Ele alugou três casas, cada uma usando um nome
diferente, segundo os cartões de crédito com que pagou. Uma ainda em Nova York,
as demais já depois da fronteira.
- A primeira servirá de cativeiro, as outras usará
na fuga. – Peter concluiu. – Como teve acesso tão rápido ao sigilo bancário de
‘pessoas’ que nem existem?
- Tenho fontes seguras. Pode confiar. – Não diria
mais nada. – Podem não existir, mas Newman alugou casas usando contas bancárias
com seus nomes.
Enquanto Diana já pesquisava os endereços, Peter e Shepherd
montavam uma estratégia de ação. Não poderiam cometer nenhum erro. Queriam
acreditar que Rachel ainda vivia, mas sabiam que se Harabo percebesse qualquer
aproximação, colocaria fim nela instantaneamente. Teria que ser uma ação
precisa e discreta.
- Teremos um problema. – Diana destacou. – Não é
uma casa que funciona desse endereço. É uma fábrica desativada. Tem três
andares. Trabalharam com aço lá por três décadas. Só que o lugar hoje é
abandonado e não há vizinhos. Dificilmente nossa chegada passaria despercebida.
- Então teremos de ser discretos. Vamos?! O que
estamos esperando? – Neal questionou.
Todos se olharam. E concordaram que não havia a
possibilidade de Neal participar da ação.
- Você não vai, Neal. Nem pensar! – Peter decretou.
- Como não?!?! É claro que eu vou. June e Ell ficam
com George e...
- Seu filho precisa de você aqui. – Foi a resposta
categórica de Peter. – Eu vou. E eu farei tudo o que puder, com o máximo de
esforço. Confie em nós, Neal. Vamos encontrá-la.
- Eu não posso ficar aqui, Peter.
- Pode e vai! – Ele recorreu a Shepherd. – A MI5
vai controlar a operação daqui. Vou deixar um para ficar de olho em você, Neal.
Por favor, não o faça te dar voz de prisão!
- Isso é um absurdo!
- Eu preciso de tranquilidade para fazer meu
trabalho e isso não inclui você sumindo armado como já fez na tentativa de
conseguir vingança. Confie na minha equipe, Neal. Harabo já me custou um
agente, não vou permitir que leve outra integrante da minha equipe.
Ouvir Peter se referir a Rachel como uma integrante
da equipe era algo importante para Neal. Ele daria a vida por seus agentes.
Faria tudo o que pudesse. Mesmo a contragosto Neal aceitou ficar na base, mas
exigiria se manter informado.
Diana, Henrique, Peter, Shepherd e outros três
homens seguiram em direção ao endereço. Mozzie não perguntou nada, mas quando
todos vestiam seus coletes a prova de balas, simplesmente entrou na sala,
vestiu uma das proteções e depois se juntou a eles em um dos carros.
- Ok, Mozz, você tem autorização para nos
acompanhar. – Peter disse.
- Eu não perguntei nada, Engravatado. – A frase
poderia soar como brincadeira, mas não era. – Menino George não pode ficar sem
a mãe...estou fazendo a minha parte.
- Obrigado, Mozz.
Rachel não soube o que a fez apagar ainda no carro.
Não sabia quanto tempo passou em viagem nem como chegou naquele lugar. Mas
acordou sem grandes dores no corpo, podendo ver claramente e com a mãos livres.
Só o latejar no queixo lhe afirmava que tudo era real, não um terrível
pesadelo. Olhou em volta. Espaço amplo, máquinas antigas empilhadas próximas a
uma parede de tijolos à vista. Ouviu uma porta antiga ranger e logo viu Harabo
se aproximar.
- Porque me trouxe para esse lugar? Onde estamos?
- Longe o bastante dos seus parceiros...ou
carrascos. Você é crime e polícia ao mesmo tempo, Rachel. É perita em dar
rasteiras! Mas agora é fim de linha, Turner.
Automaticamente, ela levou uma das mãos a barriga e
acariciou a filha. Estava livre e podia lutar, mas tinha medo de ferir Lis.
- Se vai me matar...porque me trouxe aqui? Pra que
matar Jones e me levar?
- Ele eu matei simplesmente porque não faz
diferença nenhuma no mundo. É mais um agentezinho. Podia ter matado você lá
mesmo. O meu plano era esse. Me aproximar de você e te matar com um ou dois
tiros. Nada rápido. Queria te deixar sofrer um pouco. Mas aí eu vi aquela cena
linda. Você, o ladrãozinho, uma cria de vocês se arrastando pelo chão e, para
coroar a cena, a prova no seu corpo, de que um ser desprezível feito você, num
engano da natureza, pode se reproduzir. Deveria ser seca.
- Nós nos odiamos, eu sei. Mas minha filha não tem
culpa. – Disse sem saber o que fazer.
- Está vendo essa marca aqui no meu pescoço? Esse
nosso encontro é para eu devolver adequadamente. Porque você me esfaqueou,
Turner? Vamos relembrar? Porque? Diz!
- Nós lutamos! Você também tinha uma faca. Se eu
não o tivesse golpeado, você teria me matado.
Ele riu.
- É. Teria mesmo. E sabe porque? Só pelo gostinho
de acabar com você e me livrar da agente chata que vinha me caçando pela morte
do papai. Aliás...seu pai já foi uma pedra no sapato. Só que ele deu menos
trabalho para morrer do que você. Um atentadozinho só e bateu as botas. Você
não!
- Meu pai estava com provas contra você, seu
desgraçado! Então você o matou! – O ódio foi tomando conta de Rachel e ela
avançou sobre ele.
Conseguiu apenas ser jogada no chão novamente e
para proteger Lis abraçou o abdômen.
- Sim, matei! E se soubesse que ganharia você como
minha sombra, teria matado os dois na mesma emboscada! E é bom ficar aí mesmo,
no chão, antes que eu te arrebente agora mesmo...vou te dar mais alguns minutos
de vida. Porque quero relembrar umas coisas com você.
Rachel não queria relembrar nada. Queria apenas que
ele abrisse a guarda e ela conseguisse uma brecha para derrubá-lo e escapar.
Mas não pode evitar quando ele começou a falar. Foi levada para anos atrás
quando teve o confronto com Harabo.
À época, estava no auge de seu preparo físico e
psicológico. Em muitos sentidos poderia ser considerada uma atleta. Mantinha
seus casos e, paralelamente, cuidava de investigar Harabo. A morte de seu pai
seria vingada. Não conseguiu descobrir nenhuma prova de que a emboscada foi
armada por ele, mas pode recuperar os arquivos de John e seguiu até que
conseguiu um dossiê tão bem amarrado que juiz nenhum seria capaz de negar a
prisão.
Sua decepção com a MI5 já era gigantesca. Poucos
realmente se lembravam de John. Ele era um agente qualquer. Terminar o que seu
pai começou e fazer uso do treinamento que ele havia lhe dado eram as únicas
coisas realmente importantes. Suas únicas prioridades na vida eram cumprir a
promessa de encontrar o diamante, prender Harabo e provar à MI5 o valor dos
Turner.
Fez Harabo de idiota para levá-lo até a emboscada e
até forjou algumas provas para piorar sua situação com a justiça. Se
dificultasse a prisão, sairia dali morto, não tinha alternativa. E se esse
fosse seu destino, ela não ficaria nenhum pouco triste. Chegou a emboscada acompanhada
de Henrique, Shepherd e outros dois agentes. Mas ela lideraria a ação. Harabo
era seu.
Exatamente
como esperava, ele não se rendeu e ela brincou com seu ego. Era um homem jovem
e forte. Ela se ofereceu para uma luta. Ele caiu na provocação.
-
Sou capaz de vencê-lo. Sem armas. Só preciso de meu corpo para te derrubar. –
Disse e esperou o resultado sabendo que ele viria.
-
Que seja. UM, DOIS, TRÊS. – Ele contou e ambos jogaram as pistolas longe.
Ela
realmente não se surpreendeu ao apanhar
durante a luta. Ele sim. Nunca imaginou que uma mulher batesse tão forte.
Quando sentiu que ia perder, Harabo sacou uma faca da cintura. Também não era
novidade. A ‘deslealdade’ era uma característica que John destacou nos
relatórios como principais em Joseph Harabo. Só que ela também podia ser
desleal e antes dele dar o primeiro golpe, ambos estavam em igualdade.
-
Subestimei você, ruivinha. – Ele reconheceu em meio a luta.
-
Cometem esse engano com certa frequência. Uma pena!
-
Agora vou ter de te matar para concertar.
-
Você pode tentar. – Ela havia respondido um instante antes de lhe dar uma
rasteira e fazê-lo cair.
-
Vadia! – Gritou Harabo levantando-se e empunhando a faca contra ela. Correu em
sua direção e ia cortá-la quando sentiu a navalha lhe rasgar a parte de baixo
do maxilar e seguir pescoço abaixo.
Apagou
achando que estava morto. Quando abriu os olhos novamente percebeu que fora
pior. Havia sido preso e poderia jamais sair. Além disso, teria que conviver o
resto de seus dias com a marca deixada por ela em seu pescoço.
Foi um barulho metálico que tirou Rachel do
passado. Harabo estava mexendo nas antigas máquinas enquanto falava. Procurava
por algo. Ela não queria saber o que era. Apenas torcia para o FBI estar
procurando-a com a mesma ênfase do passado. Agora ela e Lis precisavam deles.
- Então, Turner, achou mesmo que eu ia deixar
barato? – Ele falava e mexia nas estruturas de ferro. – Nunca. Só não fugi
antes porque você mostrou as garrinhas e traiu a MI5. Adorei saber que esteve
enjaulada. Mas agora achei que estava bem demais e que era hora do nosso acerto
de contas.
Um barulho forte se fez ouvir quando Harabo puxou
parte de uma estrutura metálica. Era similar a uma barra de ferro e o objetivo
era claramente usar como arma. Rachel preparou-se para se defender e lutar como
podia.
Conseguiu se esquivar do primeiro golpe e tentou
revidar com um rasteira. O peso alterado e o centro de equilíbrio afetado com a
gravidez lhe prejudicaram e o golpe não surtiu o efeito que no passado
ocorreria. Ela caiu. E não demorou a sentir um golpe com a barra lhe atingir a
parte de trás das costas, bem na linha da cintura. Por mais que odiasse
demonstrar fraqueza, um segundo depois estava caída de joelhos no chão e
gritando pela dor.
Peter se aproximava do prédio usando um comunicador
no relógio. Conforme ia ganhando terreno e garantindo que não havia ninguém
vigiando, avisava a equipe que estava esperando à grande distância. Quando
chegou ao prédio viu que o primeiro andar não tinha janelas. Mesmo assim podia
ouvir as vozes. Rachel estava lá dentro. Estavam lutando.
- Mande uma ambulância vir e ficar a postos, Diana.
Eu vou tentar entrar pelo alto, usando a escada de incêndio dos fundos. Se
puder rendê-lo, dou sinal para vocês invadirem.
- Entendido...e chefe...avisaram da central que o
Caffrey não está onde deveria.
- Merda! – Disse ele já subindo a escada. – Que seja.
Eu já imaginava que ele não ficaria mesmo. Só espero que não faça bobagem.
Pelo terceiro andar Peter conseguiu entrar no
prédio com certa facilidade. Fez um rápido conhecimento do lugar e viu que não
havia nada além de pó e restos da produção da antiga fábrica. Procurando não
fazer barulho algum, começou a descer ao segundo andar.
Bem mais limpo e organizado, mas também com perceptíveis
sinais de abandono, não viu nada e se preparou para continuar descendo. Foi
quando sentiu a arma ser encostada em seu crânio.
- Vai largar a sua arma e chutar para longe agora. –
Disse uma voz que ele não conhecia. Peter foi obrigado a fazer o que ele pediu.
– O mesmo com o celular. Agora. – Novamente Peter obedeceu apenas para ver
algemas lhe serem estendidas. – Coloque nos pulsos.
Com uma arma encostada em sua cabeça, era mais
sensato obedecer. Porém, aproveitou para ligar o comunicador do relógio e falar
algo que ajudasse Diana.
- Você deve ser Michael Newman...ok, me pegou.
Harabo está lá no térreo com Turner, eu sei. Ele vai se safar, Newman e você
vai se ferrar com isso.
- Calado!
Isso foi o aviso para Diana , Shepherd e Henrique. Naquele momento eles se
reuniram para decidir o que fazer. Invadir era arriscado, mas não podiam ficar
ali parados. O ideal seria manter alguém ali para centralizar as informações e
também receber o reforça que se aproxima junto com a ajuda médica.
- O baixinho pode fazer isso! – Disse Henrique.
- Sim, pode....Mozzie! Mozz...- Diana chamou e não
teve nenhuma resposta. – Para onde ele foi?
- Acho que sabemos. – Shepherd respondeu. Estava
nervoso e cabisbaixo. Sentia-se responsável por Rachel e a cada minuto a sua
confiança num final feliz diminuía. Harabo não a deixaria viva. – O que estamos
esperando? Vamos!
Enquanto isso, na antiga construção, Michel levou
Peter ao encontro de Harabo e Rachel. A cena que ele viu ao descer as escadas
foi dolorosa. Sangue pelo chão. Harabo descontrolado caminhando envolta de Rachel
e gritando coisas incompreensíveis enquanto, entre as frases, golpeava-a com
algo que trazia na mão. Viu quando por três vezes a acertou nas costas e no
quadril. Peter não sabia como, mas Rachel mantinha a consciência e viu quando
ele se aproximou.
- Encontrei um rato lá em cima. – Disse Newton.
- Ora...ora...- Largando a arma com a qual agredia
Rachel, Harabo se aproximou de Peter e pegou a credencial do bolso do paletó. –
Peter Burke, FBI. Chegou sua cavalaria, Rachel.
Cruelmente Harabo desferiu um chute na barriga
dela. Ele podia estar descontrolado, mas sabia exatamente o que desejava fazer.
Matá-la, porém da forma mais dolorosa. Ela estava sangrando muito. Não
aguentaria muito tempo.
- Onde estão os outros, Burke? Diga! Estão vindo? –
Ele colocou uma arma na cintura e pegou uma mochila que estava pelo chão. E
olhou para Rachel no chão. - Não tem problema. Ela está morrendo. Você não
poderá fazer nada. Fique aí e assista ela morrer...aliás...eu li que ela matou
um agente do FBI. Como era mesmo o nome? A sim...David Siegel. O FBI podia até
me agradecer por acabar com ela. Assista a morte dela Burke.
O plano de Harabo era pegar a moto que estava ao
lado do prédio e fugir daqui antes que a
polícia o encontrasse. Ninguém sobreviveria naquelas condições. Tinha certeza
que Turner logo estaria morta.
- Nós já vamos, Harabo? – Ele ouviu Newman
perguntar também pegando sua mochila.
- Desculpe, Michel. Mas peso extra é um problema. –
Apenas com um tiro na cabeça matou o comparsa.
Quando viu Harabo sair trancando a pesada porta de
ferro, Peter achou que era o fim. Ao longe, ouviu o rugido da moto. Ele estava
fugindo. Rachel estava pálida e deitada sobre uma poça feita com seu próprio
sangue. Sem assistência médica, morreria logo. Tentando pensar rápido, Peter
percebeu que Michel deveria ter algum celular com ele. Com as mãos algemadas a
frente do corpo mexeu nos bolsos do morto até encontrar e ligar para Diana.
- Harabo fugiu! Invadam. E ela precisa de
assistência médica. Urgente, Diana. Cerque a área! Temos que recapturar esse
maníaco. – Peter disse várias ordens ao mesmo tempo.
Sem saber muito o que fazer enquanto isso e apenas
verificando o pulso de Rachel ficar mais fraco a cada momento, Peter ouviu a
porta ser aberta. Não era Diana. Era Neal. Mas ao longe pode ouvir a ambulância
se aproximando.
- Como você sabia para onde vir? – Peter perguntou,
mas quando viu Mozz se aproximar entendeu. – Claro. Ele te passou todos nossos
passos.
Neal olhava para Rachel, para o sangue e para a
barra de metal jogada por perto. Peter sabia exatamente o que ele estava
imaginando. Havia visto. E não ia esquecer pelas próximas décadas a cena cruel.
Neal tocava-a e sentia que ainda estava viva no exato momento em que os agentes
e os paramédicos invadiam o lugar. Pediram para ele se afastar. Foram
sumariamente ignorados. Não porque ele desejar atrapalhar, mas por não
conseguir sair dalí. Não tinha energia para mais nada.
- Diana...eu vou ficar com Neal. Você está no
comando junto com Shepherd. Eu autorizo qualquer coisa. Se precisar falsificar
minha assinatura em qualquer formulário, falsifique. Mas encontre Harabo nem
que seja no inferno. – Foi a ordem mais ferrenha que Peter já havia dado em
toda a sua carreira.
Num estado de completa letargia, Neal acompanhou o
resgate. Os médicos não permitiram que ele entrasse na ambulância. Isso dava o
tom da gravidade da situação. Os dois foram juntos com Mozz no carro seguindo a
ambulância.
- Neal, qual o telefone do médico que atendeu
Rachel durante a gravidez? – Peter perguntou.
Ele não respondeu nada. Não se mexia. Não
interagia. Estava irreconhecível. Peter e Mozz trocaram um olhar preocupado.
- Eu tenho o número do Dr. Richard. Vou ligar e
pedir para nos encontrar no hospital. – Disse Mozzie.
- Ótimo. Ele conhece o estado de saúde dela. Poderá
ajudar.
A última imagem que Neal e seus parceiros viram foi
a equipe médica levando-a com urgência. Não faziam ideia de quanto tempo
esperariam ou o que receberiam de notícia.
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