3 semanas
depois...
Enfim
Diego estava em casa, sem enfermeiros, remédios, nem equipamentos médicos por perto. Mas com seguranças por
perto. Quando a equipe hospitalar enfim sinalizou que era possível retornar ao
lar, ele deu-se conta que já não sabia exatamente onde morava. O Brasil não era
o seu lugar no mundo, a sede de sua empresa não estava ali, nem o apartamento
em que viveu nos últimos anos. Por outro lado, não mais se imaginava dormindo
naquele lugar noite após noite. Porque aquele apartamento havia se transformado
no sinônimo da solidão. E agora ele tinha uma família para cuidar.
-
Como assim não sabe para onde vamos? – Ariella olhou-o como se desconfiasse de
sua sanidade no momento em que ele externou a preocupação. – Para minha casa, é
claro. A tranquilidade de acordar com o barulho da rebentação é tudo o que
precisamos.
Ela
tinha razão. Não apenas óbvio, o destino lhe agradava muito. Porém, a palavra
tranquilidade não era a primeira a lhe vir à mente quando pensava naquela casa.
Saiu de lá desacordado, sangrando após levar tiros e pessoas que desejavam
roubar ou sequestrar sua esposa. Assim que saiu do coma e convenceu Ariella de
que poderia ser informado dos detalhes o que ocorria. Afinal, ao abrir os olhos
viu o homem que mais odiava ameaçar Ariella à frente de seu leito. Não era mais
possível ignorar o que se passava. Ela concordo e lhe relatou o que sabia da
investigação policial e das desconfianças pessoais. Para ela, o assalto era um
problema e a briga com o pai outro.
-
Mas são dois fatos muito bem amarrados. – Ele tinha certeza. Faltava a polícia
provar e ele encontrar um meio pra proteger Ariella de mais esse sofrimento.
Seu
objetivo, no entanto, não era fazer nada de forma afobada. Ao contrário do passado
de ações impensadas, agora ele tinha responsabilidades. Ariella já havia
sofrido muito por erros dele. Agora ela lhe perdoara e, a despeito do momento
difícil, ambos viviam as alegrias de esperar um filho. Conversaria com o
delegado e acompanharia o caso de perto, mas servindo de escudo para que
Ariella não mais fosse machucada.
Murilo,
ao saber que eles pretendiam voltar para a casa de Ariella e lá seguir pelos
próximos meses, entendeu que sobre seus ombros pesariam muitas
responsabilidades. Agora não mais de forma emergencial e à revelia do fundador
da empresa. Ele e Diego conversaram seriamente e definiram que enquanto um
voltaria para Espanha e gerenciaria as atividades europeias, o outro, do
Brasil, responderia pelas latinas.
-
Você será financeiramente recompensado, Murilo. E espero que isso não lhe cause
problemas com Dulce. Sei o quanto ela reclama da sua carga de trabalho. – Diego
ponderou com o amigo.
-
Sim ela reclama. E diz que só aceitará engravidar quando eu viajar menos. – O
executivo, que não escondia o desejo de ser pai, reconheceu. – Mas ela também
adora me acompanhar nas viagens. E eu gosto muito do que faço. Por isso, fique
tranquilo. Apenas...desculpe a intromissão...
-
Fale, Murilo. Sem rodeios, por favor.
-
Acho que você devia reforçar a segurança da casa, se pretende realmente viver
aqui. Se Ariella já era um alvo, você certamente é um ainda mais chamativo.
Diego
acatou o pedido do amigo. E agora, além da espuma das ondas, a vista de sua
janela contava com alguns carros padronizados de sua equipe de segurança. Isso
servia para tranquilizar os amigos que, depois de tanto tempo dedicados a eles,
iriam seguir suas vidas normalmente. Na primeira noite em casa ocorreu uma
pequena comemoração. Taças com bebidas que os anfitriões não podiam beber
passearam pela casa.
-
Seja feliz, minha amiga. – Dulce afirmou abraçando Ariella. – Ainda acho que o
seu conde tem um lado sapo muito forte, mas se é ele que faz disparar seu
coração, aproveite.
-
Eu o amo demais para permitir que qualquer outro se aproxime.
-
Sim. – Ela viu isso no passar dos anos. Mas avise-o que estarei de olho...só
por garantia.
Quando
a recepção terminou, os dois permaneceram na beira do bar, agradecendo pelo que
parecia ser o final de um pesadelo.
-
Não me lembro de ter sido tão feliz em nenhum outro momento de minha vida. Nem
parece certo...
-
Ser feliz? Achei que era para isso que nascíamos. – Diego respondeu.
Ela
riu antes de responder.
-
É estranho me sentir culpada...eu sei. É que, nós estamos aqui curtindo tudo
isso enquanto papai...não sei o que ocorreu com ele. Às vezes me sinto uma
péssima filha, apesar de tudo.
-
Ele foi um péssimo pai, Ariella. Usou-a e, sei que você prefere não acreditar,
mas eu sei que ele estava envolvido nesse atentado.
-
Não é questão de querer Diego, sei da possibilidade. Apenas me sentiria melhor
caso a polícia descubra que foi apenas um assalta. Coloque-se no meu lugar.
Ele
entendia, apenas não podia se permitir tratar do assunto com sentimentalismo.
Fora Afonso. E ele pagaria por isso, mesmo sendo algo triste para Ariella.
-
Vamos entrar? Acho que podemos terminar a festa lá no quarto. – Ele sugeriu.
-
Acho que você está muito saidinho para quem acaba de sair do hospital.
Comporte-se!
Eles não ficavam sozinhos
em momento nenhum do dia, sempre sob os olhos atentos de seguranças e
funcionários da total confiança. O que não os impedia de fingir esquecer-se dos
problemas e viver uma falsa lua de mel. Diego passava o tempo todo cuidando de
Ariella, física e emocionalmente, dando carinho e conferindo se ela estava bem
o bastante.
Esse
desejo de protegê-la, por vezes gerou problemas. Ela estava há tempo demais
resolvendo sua via sozinha e, ter um parceiro lhe cobrando e verificando a todo
o momento não era fácil. E o contrário também era verdadeiro.
-
Preciso lembrá-lo qual e nós dois estava hospitalizado? – Ela o lembrava sempre
que Diego demonstrava alguma preocupação.
Isso
não o convencia quase nunca. Mesmo quando sua fraqueza momentânea ficava clara,
como quando sentiu-se tonto e precisou apoiar-se em uma mesa para não cair. O
tempo longo preso à cama hospitalar poderia causar isso, a médica tinha
alertado. Sentir essa dependência, na prática, era mais complicado que o aviso
teórico. E ele sentiu-se ofendido quando Ariella passou o braço por sua cintura
e tentou suportar seu peso.
-
Nem pensa! – Ele, apesar de sentir as pernas fracas, desvencilhou-se ela.
-
Você tem de se deitar um pouco e não pode chegar no quarto sozinho. – Ela
argumentou.
-
Chame um dos seguranças. Você não pode me levar.
Não
se tratava de machismo, como Ariella pareceu encarar sua ordem. Nem poderia,
afinal, ela se mostrara a pessoa mais forte que ele já conhecera. Mas era sua
responsabilidade zelar por ela e pelo bebê deles e enquanto ele era cuidado por
todos no hospital, ela corria de um lado para o outro. E se nem mesmo preso ao
leito deixava de perceber quando, após um sumiço longo, ela retornava ao quarto
pálida feito um papel e sempre segurando uma garrafa d’água ele deixa de perceber
suas crises de enjoo, agora elas eram ainda mais óbvias. Assim como o resultado
delas no seu estado geral de saúde. Ariella carregava olheiras sob os olhos, no
final do dia estava mais cansada do que o normal e era impossível deixar de
perceber o quando vinha mancando mais do que o normal. Um antigo funcionário da
casa, lhe confidenciou a razão.
-
Com tudo o que aconteceu, a patroa abandonou as sessões de fisioterapia. –
Explicou o rapaz que parecia ter muito respeito pela empregadora.
Desde
que soube de tudo, Diego tomou uma decisão. A relação deles de forma alguma
poderia prejudicar Ariella e tirar o que ela conquistou no decorrer dos anos,
sobretudo no que se referia a saúde ou a recuperação do acidente sofrido na
Espanha. Já lhe era muito duro aceitar que, independente de quando dinheiro
investisse nos melhores tratamentos, ela jamais voltaria a andar como antes
porque ficara com uma perna centímetros menor. A ideia dela ter a qualidade de
vida sacrificada por cuidar dele era inaceitável.
-
Eu não quero falar de problemas médicos, Diego. Passei anos consultando
ortopedistas. Aceitei minha situação. Faça isso você também. – Ela foi direta.
Aquele assunto ainda doía. – Assunto encerrado.
-
Não...venha cá Ariella. Esse assunto não pode ficar entre nós.
-
Não está entre nós! – Ela ergueu a voz. – É que você ficou longe muito tempo e
não se acostumou a ver as cicatrizes. Elas te incomodam. Mas eu as vejo há 10
anos.
O
que ele sentia nada tinha a ver com os riscos que cobriam a pele dela. Era a
dor que eles comprovavam a lhe ferir. Quando ela mostrava dificuldade em dar
alguns passos, era sinal de que sofria e esse era o se maior incômodo.
-
Você vai retomar a fisioterapia e nós conversaremos com a sua obstetra. Quero
me assegurar que o peso que você ganhará durante a gestação não lhe cause mais
dificuldades. Sou o pai esse bebê. Tenho direito de conversar com a médica e
acompanhar o seu estado de perto.
Ariella
não tinha dúvidas desse direito nem pensava em questionar. Apenas preferia que Diego
conseguisse deixar o passado enterrado. Mas a que parecia, ele tendia a sempre
esperar que alguma sombra viesse da década passada para engolir sua felicidade.
Ao menos a consulta com a obstetra serviu para acalmar o coração do pai de seu
bebê. E eles ouviram atentamente todas as orientações da médica, ditas após ela
analisar uma série de exames feitos recentemente, mas que ainda não haviam sido
levados até o consultório antes.
-
Eu ainda não estou convencida, doutora. Afinal, esse cansaço que vejo em
Ariella não é normal. Eu a conheço há muitos anos...
-
Mas nunca conviveu com ela grávida, suponho. É natural que algumas
características mudem, sobretudo no começo, quando os enjoos são frequentes e o
corpo ainda se adapta as questões hormonais.
Diego
não saiu do consultório totalmente satisfeito. Porém, havia conquistado o apoio
da médica em coisas importantes como Ariella repousas durante uma hora durante
a tarde. Já da alimentação, a obstetra foi mais severa e destacou que exageros
alimentares só prejudicariam o bebê e Ariella.
-
Não gosto de médicos que insistem em dietas desnecessárias. Por que uma grávida
faria uma dieta restritiva se por séculos elas foram orientadas a “comer por
dois” e a técnica funcionava? – Diego argumentou, no carro.
-
Porque se eu comer muito virarei uma baleia e sofrerei mais para recuperar meu
corpo depois. – A parte de que o peso extra prejudicaria sua dificuldade de
locomoção ela deixou de fora pelas reações exageradas de Diego nesse assunto.
-
Alguns quilinhos a mais não lhe fariam mal. – Mas ele preferiu trocar de
assunto.
Policiais
chegaram a ir a casa de Ariella para interrogar Diego. Mas Ariella não os
permitiu entrar. Avisou que Diego ainda não estava completamente restabelecido
e precisava de repouso. Não era bem verdade. No fundo, ela desejava atrasar o
quanto pudesse aquele depoimento e seguir fingindo ser uma mulher apaixonada e
vivendo feliz com o amante enquanto esperam um filho.
-
Quem era? – Diego perguntou.
-
A polícia...queriam o seu depoimento. E eu os mandei embora.
-
Ariella...
-
Eu sei, não podemos fugir eternamente. Mas eu prefiro ser feliz enquanto posso.
E sinto que mexer nisso só trará mais dor.
-
Não sei. – Diego seguia preocupado. – Amanhã eu vou à polícia depor. Quanto
antes eles descobrirem o que aconteceu é melhor. Quem tentou sequestrar você,
pode não ter desistido. – E isso ele não permitiria.
...
Na Argentina...
Afonso
andava de um lado para o outro, atendendo ligações e dando explicações a
credores. O cerco se fechava cada vez mais porque, contando com o dinheiro da
filha, ofereceu promessas e promissórias de que pagaria as dívidas. Agora seus
agiotas estavam agitados e exigindo o dinheiro.
-
Meu plano não deu certo...ainda. Só precisam ter paciência. Não adiante pressionarem.
Enquanto eu não tiver o dinheiro, não poderei pagar a vocês.
A
resposta do outro lado da linha não o agradou.
-
Não adianta me ameaçarem. Eu já paguei tantas vezes. Não é verdade? E se me
matarem só conseguirão não receber jamais. Qual o lucro disso?
Apesar
do argumento ser válido, resolveria por muito tempo. E Afonso sabia que
precisaria de bem mais para acalmar seus cobradores.
-
Talvez unir forças fosse mais proveitoso. Eu sei da onde tirar o
dinheiro...apenas não está fácil atingir ao alvo. Vocês entram nesse jogo,
ganham a sua bolada e eu saio bem. O que acham?
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