Há cinco dias Sebastian
vivia em família, com a mãe, a filha e Beatriz. Já nem se lembrava de quando
passou tanto tempo sem sair de casa, seja por uma viagem internacional ou séries
intermináveis de reuniões. Angelina estava encantada com Bia, sua “nora” como
não parava de dizer. Essa estada feliz em sua casa, porém, trouxe problemas.
Não foi fácil convencer sua mãe de que Beatriz não podia sair de casa para
fazer compras ou, nem mesmo, para ir num parque qualquer. E Luisa estava
avisada de que nenhuma coleguinha de escola deveria vir na casa por agora.
-
Você gosta de estar com a Bia, não é mesmo?
-
Sim, papai.
-
Então não deve contar para ninguém que ela está conosco. Ou Bia terá de ir
embora. – Sebastian explicou.
O
pedido funcionou e a menina se comportou muito bem. Nada falou na escola ou na
vizinhança, passando muito tempo em casa junto de sua mais nova amiga. Todos
esses alertas e cuidados, porém, deixaram Angelina muito desconfiada. E ela
chamou o filho para uma conversa séria. A mãe estava muito distante da verdade,
porém, percebia claramente que algo de muito errado ocorria na vida de seu
filho.
-
Ela tem problemas com a lei? Ou um marido perigoso? Diga o que há de errado com
Beatriz, Sebastian. Estou preocupada.
-
Você gosta dela?
-
É claro, é uma moça agradável, educada e muito atenciosa com minha neta. Mas
isso não me faz fechar os olhos para o que ocorre em minha casa. Obviamente,
ela não está aqui por problemas no encanamento! – Angelina, discreta como de
costume, falou em tom baixo, mas firme, ao único filho.
Em
silêncio Sebastian encarou a mãe e cogitou contar-lhe toda a verdade. Porém,
como dizer a uma senhora idosa que ele, um empresário sério e de credibilidade,
frequentava boates clandestinas e havia comprado uma prostituta. Sorriu ao
pensar que de tudo o que tinha para contar, certamente o que menos preocupara
Angelina era o passado de Beatriz. Encantada como estava com nova nora, ela
muito provavelmente só teria críticas ao seu comportamento como filho e pai de
família, que dera um péssimo exemplo à filha.
-
Do que está rindo?
-
Nada mamãe. É só que...você está certa. Eu tenho coisas a lhe contar. Mas ainda
não é hora.
-
E quando será? - Angelina estava realmente preocupada com o filho.
-
Logo. Eu prometo.
Ele
então resolveu que precisava sair, respirar outro ar e arejar os pensamentos.
Porém, a ideia de sair sozinho não o agradava. Na verdade, a ideia de viver
sozinho nunca lhe pareceu tão sem graça quanto agora. Enquanto Luísa estava na
escola, avisou que Beatriz deveria se arrumar para sair com ele, iriam passear
em um lugar qualquer.
-
Passear? – Beatriz viveu feliz nesses dias, mesmo que lá no fundo a consciência
lhe lembrasse minuto a minuto que muito longe dali uma família sofria por ela.
– Eu não tenho roupa pra me arrumar muito.
-
Nós vamos resolver esse problema no passeio. Vista qualquer coisa e estará
linda.
Primeiro
sozinhos enquanto Luisa estava na escola e depois acompanhados da menina, Beatriz
e Sebastian tiveram um dia especial. Ele não se sentia completamente livre, por
isso manteve-se longe das áreas mais movimentadas e disfarçou sua identidade
com roupas esportivas e um boné que cobria parte de seu rosto. Também
manteve-se distante dos lugares que normalmente frequentava e dos centros de
compras mais badalados e levou Beatriz para ver lugares discretos, mas que
satisfaziam a ambos.
As
compras foram rápidas e simples. Somente o necessário ao que ela precisava para
viver, já que Francisco trouxe algumas coisas que ficaram no apartamento.
Sebastian já havia aprendido que Beatriz é uma mulher prática e daquelas que
não gasta tempo além do necessário com cuidados de beleza. Ela escolheu algumas
peças, ele as deixou no carro e, depois, foram aproveitar o dia. Depois de
pegarem Luisa na escola, levaram-na para um parque e simplesmente observaram
enquanto ela brincava.
-
Há muito eu não via minha filha tão feliz. – Sebastian reconheceu enquanto
acariciava os cabelos da companheira de passeio. – Você é responsável por isso.
Tenho de te agradecer.
-
Bobagem. Sua filha é uma criança maravilhosa. Aceitaria bem qualquer mulher que
estivesse em sua casa.
-
Pode ser. – Ele, porém, jamais tinha levado nenhuma outra. – Mas ela não sorria
assim pra mim. Nem eu passava tanto tempo em casa para vê-la feliz.
-
Que bom que isso mudou, então. Luisa está crescendo. Um dia a infância dela
terá fim e ficarão apenas as lembranças. – Assim como ocorria com Eva. E ela
estava perdendo o crescimento de sua bebê. – Momentos assim não voltam,
Sebastian.
-
Conte-me sobre sua filha. Se ela está com sua irmã, diga-me o nome dela e onde
vivem. – Sebastian percebia a oferta que estava prestes a fazer. Errada e muito
arriscada. Ainda assim, fez. – Eu a busca e nós viveremos todos aqui. Minha
filha e a sua crescerão juntas.
Beatriz
encarou Sebastian e, por um momento, quis que tudo aquilo fosse possível.
Imaginou Eva ali nos EUA, com Luisa como irmã e Sebastian como pai. Aquele
conto de fadas fora sonhado por ela em um momento de sua vida. Por isso
casou-se com um homem que não conhecia tanto assim e foi mãe antes de estar
pronta para isso. Queria apenas forma uma família. Só que agora, depois de tudo
o que viveu nos últimos meses, não mais acreditava em contos de fadas finalizados
por finais felizes.
-
Não, Sebastian. Nós dois sabemos que o nosso relacionamento não permite isso.
Por favor, eu não quero falar de Eva.
Sebastian
foi para casa chateado. Não com Beatriz, mas com a situação em que a vida
deixou os dois. A vida e, ele reconhecia, suas próprias atitudes repletas de
erros. Algumas ações cometidas na vida jamais poderiam ser concertadas. Comprar
uma mulher é uma delas. Por isso, por mais dolorido que fosse aceitar, ele
reconhecia as razões de Beatriz e não lhe confiar qualquer informação a
respeito de sua filha. Respeitava a decisão dela, porém, lutaria com as
próprias armas. E assim que chegou em casa, cobrou por telefone o profissional
que deveria lhe enviar o relatório de investigação a respeito de Bia, Gabriela
e Miguel Benitez. Algo lhe dizia que Gabriela teve motivos escusos para
procurá-lo e a resposta estaria em Miguel.
-
Eu lhe falei que levaria tempo. – O detetive e conhecido de muitos anos
afirmou. – Até tenho um relatório preliminar a te oferecer, mas o final ainda
demora.
-
Que seja o preliminar então, Clark. É urgente. Me envie o que tiver e alerte
imediatamente, qualquer avanço.
-
Está bem. Estará na sua caixa de e-mail em alguns minutos.
Longos
cinco minutos se passaram até que a correspondência eletrônica enfim chegasse.
Sebastian trancou-se no escritório na clara mensagem de que não desejava ser
incomodado. E então começou a ler a sequência de informações. Conforme as
linhas iam sendo vencidas, preocupava-se cada vez mais. Não poderia ter se
enganado mais com Beatriz.
-
É claro que ela não é uma prostituta qualquer. – Esso esse já imaginava há
bastante tempo. Porém, os esclarecimentos trouxeram coisas bem preocupantes.
As
informações se sucederam. Em pouco mais de meia hora Sebastian descobriu que
Beatriz fora uma repórter num dos jornais de maior circulação de São Paulo.
Acostumada a atuar em matérias cotidianas e de política, um de seus últimos
trabalhos fora uma reportagem investigativa. O tema chamou a atenção de Clark,
que fez questão de incluir uma cópia da matéria no relatório.
-
Você investigou o esquema de tráfico de pessoas que levava mulheres à
prostituição na Europa. – Enchendo o copo com mais uma dose de bebida,
Sebastian demorava a acreditar em tudo aquilo.
A
jornalista Beatriz Santos, ele seguiu lendo, desapareceu a cerca de oito meses após
uma emboscada que matou seu namorado a tiros. Até hoje o crime não foi
esclarecido pela polícia brasileira, que encerrou o caso.
-
A polícia acredita que Beatriz está morta. – Sebastian, por um momento, teve
esperança de que pudesse viver aquela mentira eternamente. Até que seguiu lendo
e descobriu que tinha pouco tempo para tentar resolver tudo aquilo se não
quisesse terminar sem Beatriz ou, até mesmo, preso.
A
Polícia Civil havia engavetado o caso, mas ele continuava sendo revirado por
uma investigadora da Polícia Federal. Não por acaso. A policial Elizabeth
Santos Benitez, casada com Miguel Benitez, investiga o tráfico de pessoas há
muitos anos. Fora a partir dela que a irmã, Beatriz, conseguiu informações
precisas para construir a reportagem que a levaram até muito próximo da
quadrilha que denunciou. Próximo demais. Aparentemente, Elizabeth não conseguiu
convencer seus colegas de polícia de que os fatos estavam interligados. Porém,
sabia que ao investigar a quadrilha que sempre prosseguiu, também chegaria na
irmã.
E
chegou. Pessoalmente, ela foi à Rússia e invadiu a Noxotb um dia depois que ele
havia comprado e levado Beatriz de lá. Se a tarefa mostrou-se inócua para rever
sua irmã, ao menos Elizabeth conseguiu desbaratar a quadrilha e prender um de
seus principais líderes.
-
Gregory! – O homem, com quem pessoalmente negociou o preso por Beatriz. E que
segundo o relatório acabara de ser morto numa prisão brasileira.
Algumas
coisas começavam a fazer sentido para Sebastian. Em especial a forma diferente
com que Beatriz era tratada na Noxotb. Obviamente, ela não estava lá para dar
lucro através de programas, mas como uma retaliação ao que fez e a investigação
da irmã. O que Sebastian ainda não entendia era a ligação de Gabriela com o
assunto. Porém, não seria ingênuo a ponto de acreditar em coincidências.
O
relatório nada dizia sobre Gabriela. Ao que parecia, o que ela escondia estava
tão bem guardado que, ao menos por enquanto, Clark nada tinha descoberto.
Porém, algumas suposições começaram a surgir em sua mente quando leu um trecho
a respeito de Miguel Benitez. O primo de Gabriela e atual presidente da BTez
Motors conheceu sua atual esposa ao ser preso por ela. Ele esteve envolvido
numa investigação que o acusava de lavar dinheiro utilizando a montadora.
Depois descobriu-se que outro diretor, Javier Alencastro Benitez, o pai de
Gabriela Alencastro era o culpado. Apesar de jamais ter conseguido provar,
Elizabeth chegou a declarar publicamente que acreditava que o dinheiro ilegal
lavado na BTez vinha de prostituição.
-
É essa a ligação. Javier lavava o dinheiro que Gabriela conseguia escravizando
mulheres. – Sebastian enfim entendeu tudo. – E ela quer Beatriz morta.
Eram
muitas novidades e muitas decisões que precisavam ser tomadas. Sebastian
decidiu nada fazer naquela noite. Nada, a não ser pôr fim às mentiras que feito
um muro seguiam entre ele e Beatriz. Engolindo o último gole de bebida que
restava em seu copo, Sebastian decidiu que era necessário resolver tudo aquilo
e que essa solução passava por dar o nome certo àquela relação e trazê-la para
a luz. Há muito Beatriz já não era uma prostituta para ele, apesar de tê-la
comprado, jamais a viu como um objeto sob sua posse. A desejava ao seu lado
para sempre, porém, não em meio a fugas e mentiras. Entrou em seu quarto e
encontrou-a arrumando-se para dormir após o banho. Sempre gostava de vê-la com
o rosto livre de maquiagem, numa beleza liberta e fascinantemente verdadeira.
-
Você demorou tanto. Pensei que iria dormir no escritório. – Beatriz disse, sem
entender o que acontecia, mas percebendo algo de diferente no olhar e na
postura de Sebastian. – Você esteve bebendo.
-
Sim. – E não fora pouco. – Às vezes um homem precisa da ajuda do álcool para
ter coragem. Temos de conversar, Beatriz.
Em
poucas e duras palavras, Sebastian contou tudo o que acabara de ler a respeito
da vida daquela mulher. Desnudou-a a ela mesma, sem censurar nenhuma palavra.
Ao final, perguntou como a jornalista se sentia diante da maior e mais extensa
matéria de sua vida. E viu aquela mulher, que tanto havia suportado, desmoronar
frente a verdade.
-
Me tiraram do jornalismo já faz algum tempo, Sebastian. Me tiraram da minha
família. Da minha vida toda. – Mesmo lutando para frear as emoções, Beatriz
começou a chorar. – Eu mudei tanto que...que nem mesmo sei se me encaixo
naquela vida novamente.
Sebastian
também não sabia como ele iria se encaixar na vida da jornalista Beatriz
Santos, aquela que denunciou homens como ele. Mas não tinham alternativa.
Somente quando o choro de Beatriz cessou é que Sebastian continuou o assunto.
Faltava confirmar o encaixe da última peça.
-
Por que Gabriela Alencastro quer você morta? – Perguntou claramente. – Eu
estava com ela, no Brasil, quando coincidentemente você foi atacada. Tenho
claras razões para pensar que você é um alvo dela.
-
Fique longe dela! – Beatriz jamais imaginou que Gabriela viria atrás de
Sebastian. – Essa mulher é um demônio.
-
Eu fiz uma pergunta, Beatriz! Quero a resposta, não conselhos! – Irritado, ele
respondeu.
-
Eu conheci Gabriela através de fotos, quando minha irmã começou a investigar a
família Benitez. Mas jamais Elizabeth a considerou suspeita. Então, quando
atacaram Will...e o mataram na minha frente...me levaram e...e então ela
apareceu. Gabriela foi a assassina de Willian, um homem bom, um médico que só
fez coisas boas por todos, por mim e por Eva. Ele morreu por estar comigo, só
pelo prazer dela.
-
Você ainda o ama? – Sebastian não gostou daquela definição de Willian feita por
Bia. Lhe soava muito injusto ouvir os elogios que ela fazia aquele homem, aos
olhos dela tão perfeito, quando ele mesmo estava cheio de defeitos. Enquanto
Will morreu defendendo-a, ele a tinha usado e escravizado. – Responda!
-
Não! – Beatriz respondeu, sendo completamente sincera. – Aquela Beatriz o ama.
Mas ela também morreu naquela madrugada. Essa aqui é outra...nasceu
naquele...bordel onde você me encontrou vendendo bebidas e alugando meu corpo.
E tudo por culpa da crueldade de Gabriela. Ela podia ter me matado naquela
noite, mas disse que me faria viver o inferno. E cumpriu direitinho a promessa.
-
Ao que me parece, você representa mais do que uma vingança pessoal. Sempre foi
a apólice de seguro dela contra Elizabeth. Se a investigação de sua irmã
avança-se, ela poderia usá-la para atingir a investigadora do caso. Mas então,
estranhamente, Gregory resolve leiloá-la e eu a compro.
-
Não foi Gregory, mas sim Samantha. Ela não suportava o interesse pessoal do
marido por mim.
-
Você é uma mulher que desperta muitos amores, Beatriz. Isso é inegável.
-
Eles não me renderam muitas alegrias. Veja a situação em que nos encontramos. –
Havia uma melancolia na voz dela. Claramente, chegava ao ponto final. Mas ela
ainda tinha o que lhe falar. – Sebastian...depois disso tudo...não sei o que
vai acontecer, mas preciso que você saiba que em algum momento desses meses
você se tornou alguém muito especial pra mim. Você cicatrizou a ferida que se
formou quando me tiraram Will e me fez encontrar a felicidade, mesmo no meio
disso tudo. Às vezes eu cheguei a me sentir constrangida em ser feliz, quando
minha filha está tão longe.
Sebastian
desejava poder lhe prometer que logo estaria junto de Eva, mas isso não seria
tarefa fácil de cumprir. Não só pelas dificuldades da lei como também porque
ele necessitaria ter bons sentimentos dentro de si para abrir mão de Beatriz. E
ele não tinha certeza de que conseguiria fazer isso, mesmo em nome de fazê-la
feliz.
-
Agora você sabe da minha vida inteira, da mais bela parte, até o trecho mais
vergonhoso. – Beatriz disse observando-o tirar a roupa e se atirar na cama. –
Acho que é minha vez de conhecer você. Sei tão pouco ao seu respeito.
-
Amanhã. Vamos dormir. Hoje estou exausto. – Em todos os sentidos,
principalmente emocional. Ele manteve essa parte da resposta só para si.
Sebastian,
porém, não dormiu nada naquela madrugada. Passou-a em claro, observando Beatriz
dormir e tomando as mais importantes decisões de sua vida. Era hora de enfrentar
todos os seus erros e arcar com as consequências, mesmo as mais dolorosas. Iria
lutar para que nada o fizesse perder Beatriz, mas caso essa fosse a decisão
dela, aceitaria.
Na
manhã seguinte, quando Bia acordou, Sebastian já não estava mais na cama. Ele
havia saído ao amanhecer e cheio de decisões tomadas. Chamou seu advogado de
confiança e depois de abrir o jogo ao jurista, ordenou algumas coisas
surpreendentes.
-
Quero que Beatriz tenha seus documentos de volta. Tudo, inclusive o passaporte.
E que com isso retorne ao Brasil, de cabeça erguida, como ela merece. Custe o
que custar. – Afirmou.
-
Pode custar a sua liberdade. – O advogado afirmou. – Como você pretende
explicar que uma mulher desaparece no Brasil e surge na sua casa? Na melhor das
hipóteses, e contando com um depoimento favorável dela, você responderia por
cárcere privado. Se vier à tona que a comprou de uma quadrilha de tráfico de
pessoas, a situação se complica ainda mais.
Sebastian
ouviu uma série de conselhos. E, ao final, apenas repetiu:
-
Custe o que custar. – E se retirou.
Elizabeth
vivia momentos decisivos e difíceis na Polícia Federal. Decisivos porque nos
últimos dias a investigação evoluiu muito, fazendo com que Elizabeth sentisse
nos lábios um gosto conhecido. Ela sentia estar próxima de pôr as mãos em
Gabriela, agora que estava convencida de ter encontrado o grande peixe que
buscava.
-
Uma sereia, eu diria. – Rebeca lembrou-a. – O que faz uma mulher rica, de boa
família e linda assim ir para o crime?
-
Não sei. Mas me lembre de perguntar quando for interrogá-la. Por mim, ela pode
ser linda o bastante para ser a miss presídio, não importa. – Elizabeth
respondeu. – E o nosso mister? O que temos? Seu último relatório foi bom, mas
acho que ainda temos o que descobrir.
O
primeiro relatório apresentado por Rebeca fora muito completo. Mas apesar de
oferecer um grande panorama a respeito do empresário Sebastian Gonzáles, homem
de reconhecida capacidade profissional e de boa reputação. Porém, eram as
entrelinhas que mais interessava a Elizabeth. E Rebeca fora muito eficiente em
comprovar que ele tinha outro lado em sua vida, um lado bem mais obscuro. Se
nos EUA Sebastian nadava em águas tranquilas e agia de forma muito familiar e
responsável, quando ia para Europa ele frequentava lugares bem diferentes. Não
se tratava apenas de alguém que curtia sair com prostitutas. Ele parecia
extravasar a pior face de sua personalidade por lá. Porém, Elizabeth ainda
acreditava ter mais.
-
Tem de ter uma explicação para ele ter vindo ao Brasil junto de Gabriela.
Sebastian tem envolvimento com o tráfico. Essa é a minha aposta. – Liz disse.
-
Não encontrei absolutamente nada que levasse a isso.
-
Eu sei. Mas são indícios demais. Ele não deve frequentar tantas boates e sair
com essas mulheres apenas por prazer. Ele deve estar envolvido sim.
-
Eu, se fosse você, preocupava-me mais com Gabriela do que com Sebastian. Ele
não me parece perigoso.
-
Os piores são os que não parecem, Beca. – Liz respondeu. Reconhecia a si mesma
que havia desenvolvido certa implicância contra Sebastian. – Estou de olho em
Gabriela. Só preciso de uma prova, ligando-a ao que seu pai fez. Quero-a presa,
seja qual for o motivo. E ela está sentindo isso. Sabe que eu estou perto. Por
isso ordenou a morte de Gregory. Mas vou pegá-la. Vamos analisar as
transferências bancárias dos dois nos últimos cinco anos. Eles não tinham medo
algum da justiça, duvido que Gabriela possa explicar cada uma das
transferências que seu papai deve ter lhe feito.
Duas
noites atrás Gabriela Alencastro tinha lhe feito uma visita. No início da noite
apareceu no apartamento, dizendo procurar pelo primo.
-
Ele ainda não chegou. Mas chega logo. Quer ficar para jantar? – Liz a tinha
tratado com a falsidade que lhe é habitual.
-
Acho que não. Afinal, você, com essa barriga, e depois de um dia de trabalho,
deve estar exausta.
-
Pouca coisa. Não me falta energia para colocar atrás das grades quem não merece
viver em liberdade.
Apesar
de não se permitir transparecer em nada aquela sensação, por alguns instantes
Elizabeth temeu que Gabriela sacasse uma arma e atirasse à queima roupa.
Racionalmente, porém, sabia que ela havia passado pela portaria e deixado
rastros, seria entregar-se à justiça. Gabriela veio ali para algo, obviamente,
mas não seria cometer um assassinato. Porém, a chegada de Miguel, mais cedo do
que o normal, a impediu de descobrir.
Miguel
por muito pouco não conseguiu se segurar e acabou por expulsar a prima. Apenas
o olhar de Liz o fez se calar e manter-se naquela farsa dolorosa. A ideia de
ter Liz e seu filho ao alcance de Gabriela o assustava. O ar tornou-se mais
denso. E fora a loura a colocar fim no encontro após Miguel colocar-se entre
ambas as mulheres.
-
Acho que está na hora de todos repousarmos, meu amor. – Disse beijando os
lábios de Liz. – Podemos jantar outro dia, não é mesmo, Gabriela?
-
É claro. – Ela respondeu. – Qualquer dia desses.
-
Sim. Mas ligue antes de aparecer. É melhor. – O aviso de Miguel fora claro.
Aquela
estranha visita, além de preocupação de Elizabeth, gerou uma briga com Miguel.
No fundo, apesar de divergirem, eles concordavam na preocupação e temiam pelo
filho. Elizabeth sempre lidou com criminosos e estava habituada com o risco,
mas agora carregava outra vida dentro de si. E essa responsabilidade lhe pesava
tanto quanto aquela barriga.
-
Está na hora de você sair de licença. – Miguel lembrou-a.
-
Sim, está. Mas eu preciso pôr fim nesse caso antes de Benício nascer. – Há
poucos dias, enfim, haviam decidido o nome de seu menino. – Você sabe que não
tenho escolha, Miguel. Gabriela não pode ficar impune!
Ele
sabia. Porém, assim como se orgulhava da policial com quem se casara, temia
pela esposa e pelo filho. O que ela fazia não é saudável. Miguel não era o
único a estar preocupado com a licença maternidade de Elizabeth. Tomaz, seu
chefe, apesar de todas as desculpas ditas em resposta, não parecia mais
disposto a adiar os prazos.
-
Já era para você estar de licença, Elizabeth. Não pode parir aqui na Polícia
Federal. Por favor! Quer me causar um problema grave.
-
Não estou no serviço de campo. Qual o problema? – Ela conhecia as regras da
polícia e sabia que as estava infringindo. – Quero trabalhar até meu filho
nascer como tantas mães fazem!
-
Elas não lidam com criminosos.
-
Eu tenho um caso a resolver. E você sabe o quanto é importante.
-
E você sabe que a sua equipe é competente. Assinei a sua ordem de entrada de
licença com data para início em cinco dias. E não tente me fazer voltar atrás,
seu filho e você merecem esse tempo de descanso. – Ele avisou e saiu da sala.
Chateada
com aquele ultimato e muito cansada, Liz deixou a Polícia naquela noite. Ligou
para Miguel avisando que estava indo e rumou para a rua. Devido a barriga muito
grande não estava mais dirigindo e, como Miguel ainda estava na BTez, esperá-lo
para pegar carona não foi uma opção. Parou na calçada e ficou tentando atacar
um táxi. Apenas não percebeu que era observada atentamente de dentro de um
carro.
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