Miguel
abriu os olhos lentamente, sentindo a cabeça explodir em confirmação a sua
bebedeira da noite anterior. E se fosse apenas beber não haveria problema.
Poderia lidar com uma ressaca. Difícil é lidar com a loura adormecida ao seu
lado da cama.
-
Acorda, Alejandra! A gente não podia ter feito isso.
Ela
pouco se mexeu na cama. Alejandra sempre teve o sono pesado e odiava acordar
cedo. Então ele foi ao banheiro para jogar água no próprio rosto e procurar
algum comprimido que aliviasse a dor de sua cabeça. Não conhecia aquele lugar.
E não havia quase nada sobre o balcão da pia. Era um hotel. Tinha passado a
noite com sua ex mulher. Logo ela, tantas vezes traída. Aquilo tinha o amargo gosto
de ‘déjà vu’. Olhou
para o relógio e constatou não ser nem 7h30min ainda. Melhor. Precisava chegar
em casa e procurar Elizabeth. Não iria perdê-la. Aquele casamento é importante
como o com Alejandra jamais foi.
-
Acorda, Alejandra!
-
Para...fica quieto Miguel. Eu quero dormir.
-
Alejandra! Vista-se Temos de ir embora. Seja lá onde estamos.
-
Eu estou no meu quarto de hotel. Você vai embora. Não estou impedindo-o. Mas
deixe-me dormir.
-
Infierno! ¿Cómo supiste dónde encontrarme ayer por la noche, Alejandra? –
Estava tão nervoso que não percebeu o idioma.
- Qué
piensas? Su madre me dijo, por supuesto. – Ale respondeu também em espanhol.
A
mãe. É claro. Rúbia ouviu a briga com Elizabeth e aproveitou-se do fato de
Alejandra estar na cidade para sugerir que fosse encontrá-lo. O bar era fácil
descobrir. Não eram muitos os que ofereciam a descrição necessária a um homem
de sua classe social. Depois cobraria explicações de sua mãe. A verdade, porém,
era que o maior responsável por todo aquele emaranhado de coisas ruins era ele.
Fora ele a esconder fatos importantes de Liz, fora ele a sugerir a Louis um
crime e, por fim, fora ele a embebedar-se e fazer sexo com sua ex mulher num
quarto de hotel.
Miguel
não fazia ideia de onde estava seu caro. Então pegou um táxi e após dar a
indicação do destino ao motorista, ligou para sua secretária mandar alguém
resgatar o veículo das proximidades do bar. No restante do trajeto apenas
pensou em como faria para contar a verdade sem perder Liz para sempre. Não
sentia nada por Alejandra. Nunca a amou. Tinha apenas usado seu corpo para
esquecer-se dos problemas. E já estava arrependido. Estava bêbado. E Ale estava
ali, linda e se oferecendo sem pedir nada em troca. Ele caiu na
armadilha.
Quando
chegou ao destino, a sede da BTez, estava com os cabelos bagunçados e os botões
da camisa em casas desencontradas. Era o legítimo bêbado de ressaca. Pegou o
elevador privativo e entrou em sua sala agradecendo ter em seu banheiro um
traje completo. Quando saiu de lá, era novamente Miguel De La Vega Benitez , um
empresário sério, casado e honrado. Por dentro, estava em desespero. Numa
atitude impensada, encomendou um buquê de flores para ser entregue para Liz no
polícia. Ela estava nervosa, muito nervosa, mas iria perdoá-lo. Elizabeth o
amava. E mulheres que amam os maridos os perdoam quando fazem bobagens. Além
disso, homens sempre faziam bobagens. Iriam superar isso.
-
Será assim. É claro. – Repetiu olhando seu celular. Ela não telefonou nenhuma
vez desde a noite anterior.
Quando
Elizabeth recebeu as flores viu-as como um atestado de culpa. Ele estava se
desculpando. Mas pelo que? Por lhe mentir? Ou pedir ao advogado para sumir com
um criminoso? Ou, ainda, por passar a noite fora? Não que pudesse condená-lo
por isso. Ela, na hora da raiva, também tinha deixado o lar. Foi dormir na casa
de Rebecca. Conversaram, ela desabafou e quando o dia clareou, foi encontrá-lo
e descobriu que não estava lá.
- Às
15hs você poderá interrogar nosso homem. Ele foi identificado como Caleb
Estevam.
-
Ótimo. – Eram 13hs e ela havia acabado de comer um sanduíche. – Vou analisar
outros casos enquanto isso.
-
E não vai se concentrar em nada enquanto não falar com Miguel. Vá vê-lo, Liz. Irá
trabalhar melhor depois. Além disso, você não fez horário de almoço.
Ela
odiava interferir no trabalho de Miguel. Tantas vezes pediu que ele não
atrapalhasse sua vida profissional. Como ela iria invadir seu escritório a todo
momento? Mas era por um bom motivo. Aquela noite tinha sido tão triste sem ele.
Não desejava que ficassem brigados mais tempo. Afinal, tudo o que ele fez foi
para lhe proteger.
-
Sra. Benitez. – A secretária recepcionou-a, surpresa. – O Sr. Benitez não avisou
que viria.
-
Ele não sabe. Mas posso voltar depois se ele estiver ocupado.
-
Não, não. Ele está sozinho. E não me desculparia caso eu impedisse sua entrada.
Por favor, venha.
Miguel
estava ao telefone e a não ser pela barba serrada, não feita pela manhã, era o
típico homem de negócios, elegante num terno feito sob medida. Ele olhou-a
surpreso e sorriu antes de dar uma desculpa qualquer e encerrar a ligação.
-
Liz. Eu...é bom ver você. – Ele estava emocionado. Tentada decidir se contava à
esposa o que ocorreu com Ale. Temia demais perdê-la para isso. – Não vejo as flores.
Ao menos dessa vez você não veio devolvê-las.
-
Não. Porque eu devolveria as flores que ganhei do meu marido? Eu vim aqui,
Miguel, só pra te dizer que apesar de tudo, eu te amo.
E
com isso Miguel definitivamente desistiu de contar a verdade. Sua noite com
Alejandra teria de ficar em segredo. Elizabeth veio beijá-lo. Estava disposta
a deixar os erros no passado e esquecer tudo. Então para que criar mais discussões.
Mandaria Alejandra ficar calada e nunca mais aquilo se repetiria. Seria fiel à
sua mulher.
-
Obrigada por me perdoar. – Disse sinceramente. – Eu posso cancelar toda a minha
agenda e ficar com você a tarde toda. Só nós. Vamos para casa ou caminhar no
parque. Você escolhe. Eu só preciso de você, Liz. Só de você.
-
Eu sou sua. Mas não posso cancelar a minha agenda. – Elizabeth beijou o marido
e por um instante desconfiou que havia mais desespero do que deveria naquela
voz. Deixou passar. – Vou interrogar o chantagista em 20 minutos.
-
Eu terei de depor também?
-
Não. O seu nome não apareceu na história, ainda. Ou eu não poderia cuidar desse
caso. Mas, fique atento. Se Caleb falar...vai receber uma intimação.
-
E a BTez volta as manchetes. Droga! Logo agora que os acionistas se acalmaram. Mas
se ocorrer, paciência. Vou lidar com o problema. E se ele não falar, o que
ocorre?
-
Seu advogado, obviamente, não vai denunciá-lo para não ferrar com você e Caleb
sairá em menos de uma semana.
-
Droga!
- É. Mas seja como for,
estamos juntos Miguel. E vamos vencer isso. Agora me beija porque, infelizmente,
preciso ir.
Elizabeth
entrou na sala de interrogatório ladeada por Rebeca e Fred. Tinha naquele
instante uma sensação de desafio. Aquele homem a tinha perseguido, fotografado
e, muito provavelmente, fora ele a tentar matá-la em pelo menos duas
oportunidades. Mas estava impedida de acusá-lo para não prejudicar seu marido.
-
Caleb Estevam, engraçado como eu pareço já conhecer você. Já estivemos frente a
frente antes?
-
Não, investigadora. Eu certamente não a conheço.
-
Tem certeza?
- Absoluta.
– Ele também a desafiava. – Porque eu estou aqui?
-
Talvez porque foi pego junto a uma mala de dinheiro, à noite, num parque
abandonado e sob a mira de algumas armas. É motivo o bastante?
-
Sim, certamente. Para você prender o homem que tentava me matar. Diga-me, cara
investigadora, já sabe quem armou para me matar?
-
Ainda não. – Elizabeth afirmou. Sentia nojo daquele homem. – Porque estava
recebendo dinheiro escondido, Sr. Estevam?
-
O pagamento de um trabalho, apenas.
-
Que tipo de trabalho?
-
Por acaso o Sr. Louis me acusou de algo, investigadora?
-
Não. Nada. Mas eu resolvi ouvir a sua versão. Que tipo de trabalho?
-
A menos que eu seja acusado de algo, me reservarei o direito de ficar calado.
-
Se prefere assim.
-
Prefiro. E quando eu saio daqui?
-
A menos que eu consiga acusá-lo de algo, em no máximo três dias. – Elizabeth fez
um sinal à Rebeca. – Levem de volta para a carceragem.
Elizabeth
havia feito de tudo para manter aquela história longe dos holofotes da mídia. E
conseguiu. A prisão de Caleb não gerou notícias. O que ela desconhecia era o
fato da reportagem de Beatriz, que estamparia os jornais em menos de uma semana,
trazer Caleb como personagem principal. Sem saber o que se passava com a irmã,
Bia naquele momento preparava-se para voltar ao ponto de prostituição onde
encontrou-o. Iria tentar aproximar-se mais uma vez de Caleb e, quem sabe, fazê-lo
lhe propor para deixar o país.
-
Eu preciso apenas de uma proposta para ter a prova do tráfico. – Ela vestia-se de
forma ousada, como sua tarefa exigia, enquanto Willian brincava com Eva e a
observava assustado.
Na
visão de Willian, Beatriz estava indo além do limite do seguro. Estava envolvendo-se
com pessoas perigosas, capazes de matar. Ela iria entrar mais uma vez no território
deles, sem proteção ou apoio policial. E estava animada com isso. Ele se viu na
obrigação de abrir-lhe os olhos. Só não imagina a briga que estava começando.
-
Como pode estar feliz em vestir-se assim e indo desfilar numa área de prostituição
enquanto sua filha ficará aqui?
-
Ela não estará abandonada. Estará com você, Will.
- É,
estará. E você Bia, estará fazendo o quê, exatamente?
Bia
observou o namorado. Tentava descobrir o que realmente incomodava Willian. Certamente
não era o fato de ficar com Eva. Ele adorava sua menina. Eles davam-se muito
bem. Seria então a sua segurança? Ou ciúme? Seja qual fosse a razão, não
mudaria um milímetro de suas ações.
-
Estarei fazendo minha matéria. Como você bem sabe. Qual seu problema, Will?
-
Sua matéria? E uma matéria jornalística vale ISSO? – Ele apontava para o seu
curtíssimo vestido.
-
Vale. – Bia respondeu de forma seca.
-
E valerá também caso o cafetão pedir um...teste? O que fará? Vai se deitar com
ele em uma pocilga qualquer em prol da ‘veracidade das informações’? Será prova
o bastante para sua reportagem?
-
Você está me ofendendo, Willian!
-
E você está me decepcionando, Beatriz. Sempre acreditei que a família estava
acima da sua profissão.
Era
triste. Mas com essas palavras Willian mostrava à Beatriz que talvez eles não
fossem tão perfeitos juntos quanto ela desejava pensar. Aquele homem capaz de
mudar de país por sua causa mostrava desrespeitar sua profissão. E, ainda pior,
parecia não confiar nela. Engolindo o choro, mas fazendo sua escolha, Bia abriu
a porta do apartamento.
-
Minha família é importante sim. E minha profissão também. Se não pode lidar com
isso, aproveite a oportunidade para sair das nossas vidas.
-
Está me dispensando, Bia?
- Estou
te dizendo que eu e Eva precisamos de um parceiro, não alguém para nos
recriminar.
-
E eu devo apoiá-la mesmo vendo-a colocar-se em risco? É isso?
-
Sim. Porque esse é um risco aceito por quem escolhe a minha profissão.
Para
sua completa decepção, Bia viu William beijar a testa de Eva e caminhar para a
porta.
-
Desculpe-me. Eu não posso vê-la fazer isso e me manter calado. É melhor nos
darmos um tempo no nosso relacionamento, Bia. Mesmo que eu continue te amando. Não
posso.
-
Se você prefere assim. – Ela manteve-se firme.
Dizendo
a si mesma que precisava se concentrar no trabalho, Bia levou Eva para a casa
de Matt e deixou-a no colo de Patrícia antes de sair ainda tendo o coração
pesado. Paty e Matt perceberam o tremor em suas mãos.
-
Está tudo bem, Bia? – Matheus lhe perguntou.
-
Sim. Amanhã bem cedo eu a pego.
Matt
e Paty brincaram com a garotinha, que pulou alegremente no colchão. Eva já
estava muito acostumada com os tios e não se intimidava com o apartamento. Tudo
era razão para festa. Ela jantou, ganhou um chocolate como sobremesa e dormiu
entre os dois adultos.
-
Isso colaborou com o seu plano. – Paty sussurrou.
-
Plano? Que plano?
-
De fugir do meu toque, Matt. De me afastar nessa cama.
-
Isso não é verdade. Não te afasto, Paty. Nós dormimos abraçados na noite
passada. Isso é afastamento?
- É.
Porque quando eu tentei te acariciar intimamente você segurou a minha mão e me
mandou dormir como se eu não passasse de uma criança insolente.
Num
gesto afoito ela tinha começado a acariciá-lo. Sentiu o namorado tentar se
afastar, mas logo ser dominado pelo desejo. Salpicou beijos sobre seu peito e
deixou os dedos serpentearem por dentro de sua cueca. Ela encontrou-o duro e
começou a acariciá-lo, ouvindo seus suspiros cada vez mais fortes. Mas quando
levou a outra mão ao cós da cueca com a intenção de despi-lo, Matt a freou,
virou-a de costas para ele, a apoiou em seu peito e lhe disse para fechar os
olhos e dormir.
-
Tudo ao seu tempo, Paty. Nem antes nem depois.
-
Eu te quero, Matheus. Eu sou uma mulher e quero você como homem. Fui clara? Não
vou confundir as coisas. Não o verei como cliente, se é esse o seu medo.
-
Tudo ao seu tempo, Paty. – Foi unicamente o que ele respondeu.
Eles
dormiram novamente sem fazer amor. E Patrícia começava a entrar em combustão. Precisava
daquele homem. Desejava-o completamente. E entendia seus temores em amá-la. Mas teria de
mostrar a ele que estava pronta para ter uma relação sexual saudável e que ele
era seu escolhido para parceiro.
Naquele
momento, Bia caminhava entre prostitutas e clientes e estranhava não ver Caleb.
Ele não estava no ponto. Circulou, livrou-se de alguns possíveis clientes e
observou outro homem, nervoso, ao celular, falar com as garotas. Aproximou-se
dele sentindo um arrepio na nuca. Talvez estivesse mesmo passando do limite. Mas
já estava ali, não sairia sem nada.
-
Oi, você...sabe de Caleb?
O
homem a ignorou inicialmente. Depois encarou-a. Olhava para os lados. Estava
desconfiado. Havia algo de errado.
-
Quem é você, vadia?
-
Sandra...me chamo Sandra. – Ela mentiu, improvisando. – Preciso ver Caleb. Onde
o encontro?
-
O que você deseja com ele?
Sem
muito saber o que fazer, ela arriscou.
-
Ele me fez uma proposta...um esquema de me levar pra fora do país. Ganhar
melhor. Sabe como é.
-
AAAA sim...Caleb te ofereceu entrar no ‘esquema’.
-
Sim. Onde ele está?
-
Ele não vem hoje. Aparece outro dia, Sandra. Ele vai te explicar como funciona.
Beatriz
deixou a rua caminhando lentamente. Teria de voltar ali caso fosse essencial
falar com Caleb. Ou publicaria a matéria com as informações que já tinha. Não
deixaria de publicar por nada. Seria capa do jornal. O homem, porém, estranhou
muito sua passagem por lá. E vendo-a se afastar pela rua fez uma ligação.
-
Segue a vagabunda que está caminhando pela rua, de vestido vermelho curto. Descobre
quem é e onde mora. É muito estranho ela
aparecer aqui justo hoje falando de ir trabalhar no exterior. Logo agora que
Caleb foi preso? Não! Melhor investigar isso.
Pode ser coisa daquela investigadora.
Elizabeth
não fazia ideia de onde sua irmã estava e o perigo que corria. Ela estava à
mesa, jantando, com Miguel e Rúbia. Tudo corria muito bem. Miguel estava
atencioso, doce e perfeito. Ela chegava até a desconfiar, mas preferiu lhe dar
o benefício da dúvida. Desejava fugir de novas brigas com o marido. O plano,
infelizmente, foi por água abaixo, quando Rúbia estragou a noite com um único
comentário.
-
Alejandra me ligou, filho. Para me tranquilizar. Disse que encontrou-o ontem a
noite e você esteve perfeitamente bem...apesar de ter bebido demais.
O
olhar de Liz deixou a sogra para encontrar os olhos de Miguel. E ele soube que
não teria como escapar de mais aquela discussão.
-
Esteve com sua ex mulher ontem a noite, Miguel? Acho que esqueceu de me contar.
– Ela estava apenas começando.
Nenhum comentário:
Postar um comentário