Quando Miguel voltou para a piscina e encontrou
Elizabeth secando o corpo ferozmente com a toalha, pressentiu que o tempo de
amor e folga dos problemas havia acabado.
Mesmo na madrugada aquela ligação, de seja quem for, trouxe problemas. A
palidez que viu em sua pele e a postura quase militar o alertaram para uma
situação grave.
- Eu pedi para trazerem um
jantar...mas desconfio que você tem outros planos. O que foi, Liz?
Antes de falar Elizabeth olhou-o com
atenção. Mesmo após todos os problemas trazidos por Javier à BTez, ele era tio
de Miguel. E se a notícia de uma morte era difícil de ser dada, o que dizer de
um assassinato?
- O Tom ligou. É sobre seu tio. -
Questões familiares nunca foram fáceis para ela. Não teve tios e primos com
quem lidar. Não sabia como era melhor abordar o assunto.
- O que foi de tão grave?
- É...Miguel...eu não sei como
aconteceu, mas, ao que parece...
- Fala de uma vez, Elizabeth!
Enrolar não é do seu estilo.
- Ele morreu, Miguel. Tom acha que
foi envenenado. Eu...eu...sinto muito.
Miguel levou alguns segundos para
realmente entender o poder daquela notícia em trazer uma nova tempestade para
sua vida. Dessa vez não apenas profissional, mas também familiar. Sua mãe ainda
tinha dificuldades para aceitar Javier como o culpado pela crise que atingiu a
Benitez. E mesmo que internamente reconhecesse que o cunhado pudesse não ser
inocente, iria sentir essa morte. Ele mesmo não ficou confortável com aquela
notícia.
- Miguel? Você está me ouvindo? -
Liza tirou-o dos pensamentos.
- Sim, sim...eu...como é possível,
Liz? Envenenado?
- Eu ainda não sei detalhes. Mas eu
te prometo que vou investigar. Eu farei o possível para não deixar impune, Miguel.
- No
entiendo. Mi padre,
ahora Javier ...
la BTez y mi
madre ... ahora todo es mi responsabilidad.
- Calma. - Elizabeth reconhecia
agora aquele Miguel que misturava português e espanhol quando nervoso. O mesmo
homem confuso que conheceu há mais de um ano e com quem passou a noite sem
saber que um dia seria seu namorado. - Tudo dará certo, Miguel. A empresa está
em melhores mãos com você. Seu pai confiaria em você. Sabe disso. E Rúbia o ama
mais que tudo. Ela vai superar.
- Cuida
de ti mismo, ¿no? . – De repente ele percebeu o idioma usado. - Se cuida, tá?
Tem muita coisa estranha acontecendo. Não quero que nada de ruim te aconteça.
- Não tenha medo por mim. Eu estou
sempre atenta.
Depois de mais alguns beijos e
afagos que em nada lembravam a sensualidade dos trocados há poucas horas, eles
vestiram as roupas e saíram para o dia. O sol nascia tímido e indicava um tempo
nebuloso como se para combinar com o estado de espírito de ambos. Enquanto
Elizabeth seguiu para a detenção Miguel foi para casa. Encontrou tudo muito
silencioso, natural àquela hora. Sem saber exatamente como dar a notícia a
Rúbia, passou na cozinha e pegou uma xícara de café expresso. Bebeu lentamente
enquanto separava as roupas que usaria e tentava organizar os pensamentos.
Javier não tinha mais papel algum no conselho da BTez desde que as suspeitas
criminosas passaram a afetá-lo. Mesmo assim, a montadora teria de suportar
outro escândalo. Viriam mais entrevistas, mais quedas nas ações, mais
explicações à diretoria.
- Você está preparado para tudo
isso. Você é Miguel De La Vega Benitez. Você sabe o que tem de fazer na empresa
da sua família. - Disse olhando para seu reflexo no espelho.
Encarar Rúbia seria mais difícil.
Mesmo assim, logo que deu o nó na gravata e desceu para a sala estava decidido
a não proteger Rúbia de nada. A mãe era uma espanhola típica. Doce com quem
amava, mas dura quando precisava. A ideia de enganá-la ou minimizar uma
situação para diminuir seu sofrimento era descabida.
- Bom dia, Miguel. - Alejandra disse
ao vê-lo. - Faz tantos dias que não te vejo que até esqueci que vive aqui.
- Olá, Ale. Bom dia. Já você parece
ter tornado essa casa o seu lar novamente. - Não costuma ser desagradável com a
ex em respeito a forma deselegante com que o casamento terminou e por sua
relação carinhosa com Rúbia. Mas estava cansado de tê-la ali todos os dias e
com pouca paciência para ser simpático. - Desculpe, Alejandra. Eu...estou com a
cabeça cheia. Onde madre está? Já saiu do quarto?
- Si, querido. Ela foi ao jardim ver
suas azaleias...mas já vem para o café.
- Ótimo. Na mesa do café preciso
falar com vocês duas. - Ele disse retirando-se.
- Está bem. E Miguel...eu embarco
para Espanha amanhã no voo das 7hs. Será nosso último café da manhã juntos,
querido.
Esteve longe de ser um café da manhã
amigável. Rúbia percebeu nos olhos do filho o inferno que se aproximava. De alguma
forma já desconfiava tratar-se do cunhado.
Nunca, porém, imaginou que ele estava morto. Fora assassinado dentro da
cadeia. Ela precisava de um culpado. Alguém em quem descarregar toda a sua
raiva. Ela não teve dúvida de quem seria.
- Aquela mulher é a culpada! Tudo
culpa dela! - Rúbia gritou.
- No, mamá. Y lo sabes! Liz cumpriu sua função e investigou um
crime. E no último depoimento ele confessou ser culpado.
- E agora não está vivo para se
defender! Ela fez seu tio fugir. Incriminou-o, sujou nossa honra, nossa
história, nossa moral. Até nas páginas policiais dos jornais de Madri a nossa
foto está estampada! Tudo culpa dela! Como pode defendê-la?!
- Acalme-se, Rúbia. - Alejandra
tentou interferir. - Miguel sabe o que faz. Se confia na policial ela deve ter
suas qualidades.
- SI! Muitas qualidades. Deve ser
boa na cama! Enfeitiçou-o a ponto dele esquecer a família!
- Madre! Basta! Elizabeth nada tem
com essa conversa. Muito menos a nossa intimidade. Respeite minha namorada!
- Namorada? Ela não é sua namorada!
É uma rameira qualquer com quem você dorme! Nunca vou aceitá-la em minha casa,
em minha família.
- Faça como quiser! Não vou ficar
discutindo. Aviso quando o corpo por liberado para enterrarmos. Teremos de
fazer da forma mais discreta possível. Ligue para Gabriela e dê a notícia.
Prefiro que ela saiba pela família do que pela polícia. Vou para BTez.
A primeira coisa que fez ao chegar
em sua sala na BTez foi ligar para Elizabeth em busca de notícias. Desistiu
quando o celular tocou repetidas vezes até cair na caixa postal Recados não lhe
bastavam naquele momento.
Elizabeth não atendeu ao celular
vibrando no bolso traseiro de sua calça. O momento não era o ideal. Naquele
instante encarava o corpo de Javier sem vida. Pálido e já enrijecido pela
morte, parecia desafiá-la a chegar ao fim de seu caso agora que ele não lhe
daria as informações.
- Um inútil até depois de morto. -
Disse ao médico legista que também estava no IML. - Podia ter deixado pra
morrer depois de concretizarmos o acordo.
- Sério que não sente absolutamente
nada olhando para um morto? Tem um coração aí dentro Liza? - Já se conheciam há
vários anos e tinham olhado juntos para uma dezena de mortos.
- Sim, tem um coração, Daniel. Mas
definitivamente ele não sente nada por esse aí? Lembra-se daquelas garotas
mortas após nos ajudar numa investigação? Esse aí foi o responsável. Teve o que
mereceu. Nada a mais. Já tem o laudo oficial?
- Não o definitivo. Não é o único
morto que tenho pra analisar hoje, Liza. Se visse o que me espera na câmara
fria...é praticamente um quebra cabeça tamanha quantidade de pedaços com que o
retalharam.
- Vamos nos concentrar nesse morto,
Daniel. O que já pode me oferecer?
- Foi uma droga forte e discreta. Tá
complicado descobrir qual. Ela acelerou o coração. Se não fosse por estar na
cadeia, podia ter passado despercebido e no laudo constar só enfarto. Mas os
exames mostraram que foi sim envenenamento. Só não consegui a droga ainda.
- Ok. Quando o corpo estará
liberado?
- Me dá mais três horas.
- Perfeito. Vou avisar a família.
- Ouvi comentários que você anda bem
próxima dos Benitez. Prepara o lencinho pra chorar nesse velório. - Daniel
brincou. Anos e anos trabalhando com mortos o permitiam fazer piada em qualquer
momento.
- Vai plantar coquinho, vai. - Mas
Liz estava longe de chateada com o colega e amigo. - Vou encarar o Tom agora. E
depois os jornalistas...aposto que os urubus já estão sabendo do defunto e
terei de dar uma coletiva.
-Será que Bia estará entre os
'urubus'?
- É bem provável. Ela adora a editoria
policial. Até depois Daniel.
Miguel
não preocupou-se em ver a entrevista coletiva de Elizabeth. Ela já havia lhe
enviado uma mensagem informando que o envenenamento fora confirmado e a
liberação do corpo estava prevista para a madrugada do sábado. Quando poderiam
enterrar o tio e dar adeus àquele assunto.
Gabriela
viria dos EUA acompanhar os trâmites e Alejandra, por pedido de Rúbia, tinha
adiado seu retorno a Madri. As três juntas manifestavam sua revolta pelo
ocorrido e não escondiam sua insatisfação com Elizabeth. Deixando a parte
pessoal do problema para depois, Miguel resolveu acalmar os acionistas com um
memorando aberto a todos os funcionários onde manifestava seus pêsames pela
morte do tio, mas destacava que seu falecimento ou a forma como ocorreu
afetavam a BTez. Javier já estava afastado e a Companhia não sofreria nenhum
desgaste. Também cancelou a viajem que faria à Argentina na manhã seguinte e
pediu que Clarisse chamasse seu advogado para falarem.
-
Louis está aqui, senhor Benitez. – Avisou a secretária alguns minutos depois.
Discutiu
com Louis uma estratégia para manter seu nome blindado de tudo o que viria nos
próximos dias. O advogado tinha ordem para entrar com processos e exigir
retratação de qualquer jornal ou revista que sugerisse que ele era beneficiado
pela morte do tio. Era verdade que Javier morrer após confessar ser o
responsável por lavar dinheiro do tráfico de pessoas na BTez era ‘confortável’
para ele e a empresa. Porém jamais forjaria um benefício desses à custa da vida
de alguém.
Ele
e Liz tiveram um dia terrível. Ela lidando com as cobranças de Tomaz e dos
jornalistas que desejavam detalhes e confirmações que ainda não existiam. Ele,
por sua vez, encarava o conselho administrativo e as ligações de Rúbia.
Ao
fim daquela tarde encontraram-se apenas por alguns minutos quando ele foi
buscá-la no trabalho. Não cogitaram passar aquela noite juntos. Ele tinha a
família para cuidar. E ela precisava descansar. Despediram-se com um beijo na
frente do apartamento de Elizabeth e Beatriz.
-
Eu amo você. Descansa e não se preocupa com mais nada. As coisas vão se acalmar
lá em casa. – Miguel disse ao se despedir.
-
Eu sei. É só que...isso tudo faz sua mãe me odiar ainda mais.
-
Não é ódio. Ela não conhece você.
-
Que seja! Não deixarei de ser o que sou para agradar Dona Rúbia. – Ela não iria
se dobrar à matriarca espanhola. – Descanse você também. E não brigue por minha
causa.
O
relógio marcava 19hs e Matt também levava Patrícia para seu ‘lar temporário’.
Ela já estava se adaptando ao serviço. Fátima era só elogios à jovem que agora
a ajudava e até mesmo Raúl, afeito a ideia de colocar alguém com o histórico de
Patrícia ali, agora rendia-se a delicadeza com que atendia a todos. Ele não
poderia estar mais feliz com o acerto daquela contratação. O escritório estava
ganhando e ela tinha um emprego honesto, legalizado e digno. Pena que Patrícia
hoje não parecia tão feliz e estava calada no carro.
-
O ruim de ganhar carona pra casa é que tem de me esperar todos os dias. Vou
tentar não fazer hora extra e te enrolar muito tempo por lá. – Ele disse
brincando.
-
Que isso. Não tem problema. Se viesse de ônibus chegaria ainda mais tarde. – E
viu apenas um sorriso curto. Ela não estava normal.
Preferindo
não insistir e deixar para ela lhe falar do problema quando se sentisse
confortável, ele guiou o carro até a pensão onde havia instalado Patrícia e fez
questão de acompanhá-la até o quarto. Ela não reclamou. Na verdade não disse
nada.
-
Está tudo bem, Patrícia?
-
Sim...claro. Vamos subir. – Se ele antes não pretendesse entrar, agora estava
decidido a descobrir o que a incomodava.
Quando
Patrícia estava destravando a fechadura outro hóspede também passou pelo
corredor. Um rapaz de pouco mais de 18 anos, vestindo bermuda e camiseta enquanto
carregava um skate.
-
Oi ‘lorinha’. Trazendo o ‘trampo’ pra casa hemmm. Vai trabalhar a noite toda é?
-
Oi, Bruno...não é isso. Esse é o Matheus. Ele é meu chefe. Só veio me trazer.
Matt
não entendeu o porquê de tanta explicação a um estranho. Mas evitou comentar e
apenas entrou no quarto quando ela abriu a porta. Estava tudo limpo e
organizado.
-
Aquilo que o o... ‘seu vizinho’ falou de trampo eu não entendi.
-
Você aqui no quarto e arrumadinho assim...ele deve ter pensado que eu
vim..fazer hora extra com você.
- Acha
que você vai passar a noite toda ‘trabalhando’ fazendo programa comigo. – Que
absurdo. Patrícia estava linda e bem vestida. Não aparentava ser uma prostituta
nem de longe. – Qualquer mulher que viva aqui sofre esse tipo de preconceito?
-
Eu devo ter escrito na testa o que já fiz na vida, Matt. Sei lá...também não é
assim tão difícil perceber. Uma garota sem estudo vivendo aqui bancada por um
advogado. Devem pensar que sou sua exclusiva, sua amante. Sei lá.
-
Isso está errado. Eu não devia ter subido aqui. Não quero gerar esse tipo de
comentários e...vou embora Patrícia. Amanhã a gente se vê.
Ele
simplesmente não sabia como lidar com aquela situação. Tentava ajudar Patrícia
e não forçá-la a passar por constrangimentos. Para piorar a situação, quando se
despedia dela outra moradora do lugar saiu no corredor. Essa uma idosa, com
cara de poucos amigos.
-
Vou reclamar que está trazendo homens para cá, garotinha. Aqui não é lugar para
trazer clientes. – Gritou enquanto batia a bengala na porta.
Pasmo
com a situação, Matheus não conseguiu ir embora e dar às costas à nova
funcionária. Era muita humilhação não poder receber um amigo ali sem que pensem
se tratar de um encontro sexual. Ela não era uma prostituta, não mais.
-
Pega suas coisas. Vai embora daqui agora. Não precisa ser tratada assim.
-
Não precisa. É normal. Pra qualquer lugar que me levar vão pensar o mesmo,
Matt. Não liga. Logo acostumam comigo e...
-
Pegue suas coisas agora, Patrícia. Pra onde levarei você, será muito bem
tratada e respeitada.
-
Posso saber onde é? – Respondeu enquanto colocava as roubas numa sacola.
-
Meu apartamento...temporariamente, pelo menos.
Patrícia
sentiu-se um tanto constrangida ao entrar no apartamento de Matt. Era um
ambiente totalmente masculino e quase profissional. Na mesa da sala havia
processos em que ele trabalhava e muitos papéis coloridos com recados. Na
cozinha uma caixa de brinquedos chamou sua atenção.
-
Você tem um bebê?
-
Nãooo. Acho que enlouqueceria se tivesse um, apesar de adorar crianças. São da
Eva, minha afilhada de um ano e dois meses. Ela é filha da irmã de Elizabeth.
Você vai conhecê-la no sábado. Prometi passar o dia com ela então provavelmente
Eva irá espalhar esses brinquedos pela casa toda.
-
Legal. Criança é sempre divertido.
-
É...vem aqui. Eu tenho um quarto de hóspedes só que está cheio de coisas que
não uso. Tá meio bagunçado. No domingo eu prometo que o arrumo pra você.
Enquanto isso a gente vai ter de se virar.
-
Matt...tem certeza de que não vou te atrapalhar? É a sua casa.
-
Está decidido, Patrícia. Você fica comigo por enquanto. Depois de estruturar a
sua vida, vai poder pensar em onde quer morar. Aqui estará segura até lá.
A
manhã seguinte já seria tumultuada apenas pela turbulência normal do caso. A
situação piorou ainda mais por um dos principais jornais do país ter publicado
foto em que a investigadora do caso aparecia beijando um dos investigados no
meio da rua.
Não havia o
que negar. Elizabeth havia se envolvido com Miguel Benitez. E agora a filha de
Javier, Gabriela Alencastro, alegava que Elizabeth havia forjado o depoimento e
chegava a sugerir que ela poderia ser culpada pela morte de seu pai.
Quando foi
chamada às pressas no gabinete de Tomaz, Elizabeth já sabia do que se tratava.
Miguel a havia alertado e avisado que o jornal seria processado por aquela
invasão de privacidade.
- Qual
privacidade se estávamos na rua? E de que adianta uma retratação se a foto era
verdadeira se realmente estamos juntos? – Ela disse sozinha em sua sala. Não
tinha nenhum plano de inventar desculpas ou esconder nada. Iria assumir seu
erro.
Entrou na
sala de Tom com a cabeça erguida. O chefe já sabia do relacionamento dos dois e
guardou aquele segredo. O problema é que agora não apenas sua investigação
estava sendo questionada, mas a atuação da Policia Federal no caso.
- Eu acabo
de receber uma ligação da Ministra da Segurança, Elizabeth.
- Sério? – A
PF era um órgão federal, porém independente. – E qual foi a orientação?
- Que nós
não deixemos mais nenhum furo nesse caso. Teremos de provar que o seu
relacionamento com o Benitez não influiu em nada na investigação e prisão de
Javier. E, muito menos, em sua morte.
- Não
influenciou em nada! Estou segura de que Miguel é inocente. Eu tenho confissão
gravada de Javier! Por favor, Tom! Você me conhece!
- Eu sei,
Elizabeth. Mas teremos de provar isso. Hoje é sexta feira. Você dará uma
entrevista coletiva onde apresentaremos parte do depoimento de Javier. Vamos
provar que ele não falou sob tortura ou nada do tipo. Ele assumiu a culpa e deu
detalhes. Isso tirará qualquer desconfiança sobre BTez. Amanhã eles receberão o
corpo e farão o enterro. E depois disso você será o mais discreta possível até
isso cair em esquecimento. Ok?
- Claro! Sou
a mais interessada nisso.
Quando o
sábado chegou Elizabeth tardou a sair da cama. Estava exausta. Seu corpo e sua
mente pediam por descanso. A entrevista coletiva sugou suas forças. Nunca
gostou de jornalistas, à exceção era Beatriz. Tinha a sensação que eles a
estavam interrogando de uma forma mais cruel do que ela fazia com os
criminosos. Mas precisava reconhecer que a estratégia de Tom havia funcionado.
O vídeo em que Javier não só assumia a culpa como contava o porque de entrar
para o crime tirava os holofotes de sobre ela e a Polícia Federal. Além disse,
como ele comprometera-se com ela a fazer um acordo de delação premiada. Sendo
assim, a polícia foi e ela como investigadora do caso, foi prejudicada com o
assassinato.
Essa, no
entanto, foi a parte mais fácil da entrevista. Difícil foi falar de sua vida
pessoa. Quando as perguntas enveredaram por esse caminho, ela cortou os
repórteres e deu apenas um pronunciamento. “Sim. A foto divulgada na manhã de hoje
é verdadeira, assim como o relacionamento que ela sugere. Eu e Miguel Benitez
temos um relacionamento. Quero deixar claro aqui que esse relacionamento
começou apenas após eu ter certeza de sua inocência. Jamais iria me envolver
com um criminoso. Miguel não é réu nesse caso e nós somos namorados. Não direi
mais nenhuma palavra sobre isso”.
Aquele
depoimento alegrou muito a Miguel. Ele veio passar a noite com ela no
apartamento e não escondeu sua felicidade por agora não terem mais de se esconder.
Claro que a situação não era das melhores, mas ainda assim era bom poder dizer
a todos que ela era sua namorada. Infelizmente aquele sábado tinha compromissos
desagradáveis.
- Vai me
acompanhar ao enterro? – Miguel perguntou ainda abraçando-a debaixo dos
lençóis.
- Você acha
que devo? Sua família não vai encarar como provocação? Rúbia? Gabriela?
- Acho que
será um bom recado à elas todas. Você faz parte de minha vida, gostem ou não. E
Gabriela passou de todos os limites ao sugerir que eu possa ter gostado da
morte de meu tio. Eu convive muito mais com Javier do que ela. Essa garota
sequer nos conhece. Não pertence à família.
- Se você
deseja minha companhia, estarei lá. – Não podia abandoná-lo naquele momento.
Quem também
estaria por lá, mas a trabalho, era Bia. Enquanto Miguel e Liz tomavam café na
cozinha, Bia arrumava Eva para passar o dia com Matt.
- Falei com
ele ontem e Patrícia está morando lá. Você sabia? – Bia perguntou à irmã.
- Não! Mas
ele me pareceu mesmo muito apegado nela. Eu aposto que Matt vai acabar
apaixonado.
- Será que
não é só pena da menina?
- Não
sei...mas se ela tirou a sorte grande. Matt é um homem fantástico.- Liza
respondeu.
- EI! Assim
sinto ciúme. – Miguel brincou.
- Não tão
fantástico quanto você. – Elizabeth beijou o namorado.
- E você
Bia? Como vai com Will? Fisgou tão bem o meu amigo que ele resolveu ficar de
vez pelo Brasil.
- Talvez eu
tenha minha cota de responsabilidade nisso, Miguel. Hoje nós vamos jantar
juntos. Eu e ele estamos de plantão no trabalho, mas, a noite, nos veremos. Bom
dia pra vocês.
Matt estava
felicíssimo em ter Patrícia no apartamento. A vida morando sozinho podia ser um
tanto chata e vazia. Na maior parte das noites ele fazia um sanduíche por não
ter vontade de cozinhar só para si. Também não tinha vontade de abrir uma
garrafa de vinho apenas para si. Agora tinha Patrícia ali com ele. E ela era
uma companhia agradável.
O único
problema era que, ao acordar naquela manhã, esqueceu que já não morava sozinho
e causou algum constrangimento ao ir para sala ainda se vestindo. Percebeu o
olhar de Patrícia passeou por seu abdômen.
- Desculpa eu...vou
buscar o café. – Ela disse ao se ver flagrada observando-o.
- Não precisa ficar
tímida, Patrícia. Eu esqueci de você. Vou me vestir no quarto daqui pra frente.
Mas somos dois adultos...não há nada de errado acontecendo aqui.
- Sim, claro. – O único
erro, pensava Patrícia, era passar a desejar o homem que a via como uma
irmãzinha mais nova e a estava ajudando tanto. – Vem tomar café. Sua afilhada
logo vai chegar.
Com seu tradicional
leque em punho, Rúbia tomou às rédeas do cerimonial em homenagem a Javier.
Culpado ou não, ele era um Benitez e merecia ser enterrado de acordo com as
regras de Deus. Deu suas condolências à Gabriela mesmo não perdoando-a por
cogitar Miguel estar envolvida na morte.
- Entendo que em sua
dor pode ter se excedido, Gabriela. Mas nunca mais ataque meu filho dessa
forma. Ou sentira o peso de minha raiva. Compreende?
- Sim, titia. Fui mal
compreendida em minha declaração. Não acho que Miguel tenha colaborado pela
morte de papai. Mas não tenho tanta certeza quanto àquela investigadora. E a
BTez foi beneficiada, disso não há dúvidas.
- Seu pai assumiu o
crime. Por mais que não suporte Elizabeth, disso não posso condená-la. Eu mesma
vi pela televisão. Ele confessou.
- Não acredito naquela
confissão! Mas posso, em respeito à senhora, não tocar mais no assunto.
- Ótimo, faça isso! Atinja
Miguel com seu ódio novamente e eu não serei não pacienciosa.
- Está bem! Deveria
usar sua raiva contra quem está entrando agora, de mãos dadas com seu filho! –
Com isso Gabriela conseguia exatamente o que desejava. Saia do alvo de Rúbia e
jogava Elizabeth na fogueira.
Amparada por Alejandra,
Rúbia observou Miguel e Elizabeth entrarem cumprimentando os presentes. Ninguém
iria comentar por respeito a família, mas era muito estranho o que se passava.
Ela não deveria estar ali. Quando Miguel guiou-a em direção à Rúbia, Elizabeth
experimentou a estranha sensação de nervoso.
- Madre. Como estás? –
Miguel cumprimentou a mãe.
- Bem. O que ela faz
aqui, Miguel? Deixei claro que apenas a família estava convidada a prestar as
últimas homenagens a Javier.
- Senhora Benitez eu
não vim para criar problemas. Eu apenas...
- Então vá embora
agora! Não te quero aqui!
- Madre! Basta!
Elizabeth veio por pedido meu. E vai ficar enquanto eu estiver aqui.
- Não! Ela não é da
família! Trazer essa rameira para junto de nós é um desrespeito comigo. Um
desrespeito com Alejandra que é a sua esposa!
- Por favor, Rúbia. –
Alejandra interferiu. – Ex esposa. Você sabe que Miguel não me deve mais nenhum
respeito ou satisfação.
- Infelizmente! Olhe
para você e olhe para essa outra. Nunca será digna de ser a Sr. De La Vega
Benitez. Não há comparação.
Miguel estava possesso.
Todos na sala ouviam o escândalo.
- Tem razão, mãe. Não
há o que comparar. Alejandra é minha ex mulher, é meu passado. Elizabeth é meu
futuro. Ela é minha namorada e, você gostando ou não, em breve ela pode sim ser
minha esposa.
- Nunca! Jamais! –
Rúbia gritava e se abanava com o leque.
- Miguel, por favor.
Pense no coração de sua mãe. – Alejandra
- Ela tem razão,
Miguel. Vamos embora. – Já bastava daquela humilhação. – Eu não quero mais
ficar aqui.
Atendendo ao pedido da
namorada e também muito constrangido com tudo aquilo Miguel levou Elizabeth
para casa. Nenhum deles comentou a discussão nem as acusações de Rúbia.
Elizabeth não levou a sério Miguel cogitando um casamento entre eles. Não
esperava isso dele. Na verdade nunca pensou em se casar.
- Não fica chateada com
isso. Não nos afeta.
- Afeta sim. É sua mãe.
E não me suporta.
- Ela vai se acostumar.
- Talvez. Mas se não
acostumar, fará da nossa vida juntos um inferno. Eu não sei lidar com isso,
Miguel. Não tenho mãe para me controlar, então é muito estranho ter de aturar a
sua. Eu tenho paciência pra isso, Miguel! Não quero encontrá-la mais.
- Você não vai poder
fugir dela, Liz. É minha mãe. Vocês terão de aprender a conviver.
Sem chegar a nenhum
acordo, Miguel e Elizabeth desistiram dos planos de passar o final de semana
juntos e foram cada um para sua casa. Se a intenção de Rúbia era gerar um
problema, ela conseguiu.
Em casa e com uma taça
de sorvete na mão Elizabeth observou Bia arrumar-se para jantar com Willian. Há
tempos não via a irmã tão sorridente. Era bom que ao menos alguém estivesse feliz.
- Estou bem assim?
- Está linda, Bia. Will
vai achá-la encantadora.
Não havia mesmo como
ele achá-la menos do que encantadora. Ainda mais porque assim que o viu Bia
abraçou-o como se há dias não o visse. Ela era assim, efusiva e feliz. E essas
características o faziam não querer perdê-la de vista nunca.
- Eu cheguei cedo
porque estava ansioso para te ver. – Ele disse assim que ela o largou.
- Ótimo! Eu também me
arrumei cedo.
- Vamos então? Fiz
reserva num restaurante que gosto muito,
- Sim, vamos. Tchau
Liz! Você cuida de Eva depois? Matt a trará logo mais.
- Claro. Deixa comigo.
Aproveitem a noite.
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