Observada à distância, aquela cena era incomum.
De perto, beirava o impensável. Naquela mesa apenas Miguel estava única e
verdadeiramente feliz. Os demais estavam perplexos. A começar por Alejandra.
Para ela, o pedido estava longe de ser uma surpresa. Miguel sempre fora um
homem de sentimentos fortes e ações impensadas. Estava na cara o quanto
envolveu-se com a policial. Mesmo assim, jamais imaginou um pedido tão
romântico e apaixonado. E não esperava de Miguel a indelicadeza de pedir outra
em casamento na sua frente. Apesar de divorciados, ela guardava sentimentos por
ele. E não gostava de vê-lo declarar-se para outra. Mulher alguma gostaria. Ela
engoliu mais aquele desaforo, fingindo não se ofender e mantendo a fria
neutralidade que a elegância lhe exigia.
Postura
muito diferente de Rúbia. Elegância era a última das suas preocupações quando
seu filho estava prestes a cometer uma loucura. Não bastava namorar a policial?
Colocá-la dentro de casa? Porque não dormia com ela enquanto tinha vontade e
depois procurava a mulher certa para se unir? Casar não!
- Isso é uma irresponsabilidade, meu filho. Vocês
mal se conhecem. – Ela disse tentando chamar a atenção de Miguel.
Mas Miguel não estava preocupado com
nada ao seu redor. Não tirava os olhos de Elizabeth. Era só a reação dela que
importava. E Liz simplesmente não conseguia reagir. Até aquele momento,
casamento era uma possibilidade distante. Agora passou a realidade urgente.
Miguel conseguiu lhe tirar o chão. Poderia lhe dizer não. Afirmar não combinar
com um sobrenome tão tradicional, lembrá-lo de que jamais lhe daria uma família
numerosa, fugir daquilo tudo. Mas os olhos brilhantes dele lhe calaram qualquer
negativa. Nada era mais importante do que reconhecer o quanto aquela declaração
de amor lhe alentou o coração. Desejava viver com aquele homem, acordar e
dormir com ele.
- Estou esperando uma resposta, Liz.
Te amo. Cásate conmigo? – A voz tinha o leve gaguejar de um homem nervoso.
- Eu também te amo. E mesmo correndo
o risco de ser a pior esposa da história, eu quero me casar com você. Sim,
Miguel.
Ignorada, Rúbia, atirou o guardanapo
sobre a mesa, armou seu leque e subiu as escadas. Por mais desastrosa que fosse
a notícia, não tinha volta. Miguel decidiu assim que pôs os olhos nela.
- Veremos quanto tempo vai durar! –
Disse já em seu quarto.
Só Alejandra ficou à mesa saboreando
as Tapas. Miguel levou Elizabeth para seu quarto com o aviso de que ela
passaria a noite lá. Aos beijos colocou-a no centro de sua cama antes de voltar
à porta e trancá-la. Não queria interrupções.
- Vamos com calma, Miguel. Sua mãe
não me quer aqui. Não precisa provocá-la.
- Dona Rúbia tem de se acostumar a
não ser mais a única Rainha dessa família. Em breve você será Elizabeth De La
Vega Benitez.
- Precisa? – O ‘Santos’ parecia
pesar muito menos sobre seus ombros.
- Eu faço questão que leve meu
sobrenome. Seja uma Benitez.
- Está bem...se é importante para
você. E o casamento? Será logo? Se for algo simples...
- Não, nada simples. Quero você num
lindo vestido branco, uma festa a altura e muitos convidados para me ouvirem
dizer que te amo.
- Nossa! Hoje você está num nível de
romantismo, Miguel!
- É o amor. Agora vem aqui...não
quero mais falar. Quero arrancar a sua roupa.
Era estranho transarem ali. Com Rúbia
num quarto próximo e Alejandra na sala de jantar. Mas aquela agora também era a
casa dela. E apesar disso desagradá-la, Elizabeth não planejava pedir a Miguel
para deixar aquela casa da família. Ele era apegado aquele lugar, à mãe, às
lembranças do pai. Teria de encontrar um meio de facilitar a convivência com
Rúbia. Uma preocupação deixada para depois, afinal Miguel tinha planos bem mais
divertidos. E eles incluíam apresentar Liza a sua banheira.
A noite de Patrícia e Matt estava
bem menos animada. Depois de passar a tarde com as amigas de infância, Matheus
voltou para o apartamento e encontrou-o as escuras. Não havia mesa arrumada nem
jantar fumegante no fogão. Ele experimentou uma pitada de decepção e
preocupou-se de Paty ter saído.
- Patrícia! Está em casa?
- Oi. – Logo ela apareceu na sala. –
Achei que ia passar a noite fora. Por isso nem fiz o jantar.
- Eu já te disse que não é um hábito
passar a noite fora. – Quantas vezes terei de explicar para ela e se desculpar?
- Não tem problema. A gente pede pizza.
- Estava com suas amigas. Eu
entenderia se ficasse por lá.
- Elas são como minhas irmãs. Fomos criados juntos no abrigo.
- Porque não me levou, então? Tem
vergonha de mim?
- Você já as
conhece! Elizabeth foi a investigadora que viu seu caso. Foi ela quem me pediu
para assumir sua defesa e a Beatriz é irmã dela, mãe da Eva, minha afilhada. Depois
combino de sair nos quatro. Aí você as conhece melhor e podem se tornar amigas.
Não te levei hoje porque precisávamos reviver o passado e ter uma conversa como
antes, matar a saudade, uma tarde só entre velhos amigos, e eu não tenho
vergonha de você.
Num ímpeto de coragem, Paty
aproximou-se rapidamente e, quase como uma criança, roubou um beijo de Matt.
Ele retribuiu. Lábios nos lábios alguns segundos se passaram. E quando abriu os
olhos, Paty percebeu que ele a observava durante o beijo. Quando afastou-se,
sentiu que precisava falar algo, mas não sabia o que. Errou feio na escolha das
palavras.
- O que foi esse beijo, Patrícia?
- Foi...foi...um agradecimento. Por
tudo o que você fez por mim. – Gratidão estava longe de ser a razão daquele
beijo, mas ela não queria lhe dizer nada mais. Como Matheus sempre dizia,
aquele era um acordo temporário. Quando fosse possível, ela encontraria outro
emprego, deixaria sua casa e seguiria com a vida. E isso representaria deixar a
dele para sempre. – Você me deu casa, comida e emprego...eu precisava
agradecer.
Matheus lhe virou as costas
instantaneamente. Não queria vê-la. Não queria aquele beijo. Não por aquela
razão. Quando tornou a se virar, tinha os olhos vermelhos pela raiva. Paty
assustou-se com a expressão raivosa.
- Nunca mais! Ouviu bem? Nunca mais
me agradeça assim! Não preciso do seu agradecimento! Muito menos em beijos!
- Mas eu...
- Cala a boca! – Ele foi até a
geladeira, pegou uma cerveja e bateu a porta antes de voltar para a sala e
encarar Patrícia observando-o de cabeça baixa. – Quando vai entender que seu
corpo ou seus carinhos não são pagamento de nada?!?! Não serve de nada
abandonar as ruas, as boates e essa vida, deixar de ter um dono e ganhar uma
nova oportunidade se você continuar a agir como uma vagabunda!
Magoada com as palavras dele,
Patrícia foi para seu quarto improvisado e chorou. Não queria ofendê-lo, muito
menos lembrá-lo de seus tempos de prostituta. Queria apenas agradá-lo e desejou
beijá-lo.
Passaram-se quase 50 minutos antes
de Matheus bater na porta do quarto de hospedes do apartamento. Foi uma batida
tímida e trêmula. E não obteve resposta.
- Abri a porta Paty. – Silêncio. –
Vai...não fica chateada comigo...eu não quis te magoar. – Nenhuma resposta. –
Abre a porta. A pizza chegou. É do seu sabor favorito...vai Paty, fala comigo.
– Nada. E Matheus começou a se desesperar. – Por favor, abre a porta Patrícia.
Grita comigo, briga, mas fala alguma coisa. E me desculpa. Eu errei. Não tinha
o direito de gritar o que eu gritei. Mas abre a porta.
- Não está trancada, Matt. Essa
porta não tem chave. – Ela disse tranquilamente. Magoou, mas ela sabia que Matt
falou sem pensar. E via a apreensão em seus olhos ao abrir a porta. – Qual é o
meu sabor favorito de pizza?
- Eu pedi de quatro queijos,
calabresa, portuguesa e frango. De alguma você deve gostar. – Só queria
agradá-la.
- Vamos ter pizza por uma semana
nessa casa.
- Não importa. Vamos comer? Vem
comigo pra sala.
Ao fim do jantar, sobre o tapete da
sala, com uma garrafa de refrigerante aberta e várias caixas de pizza
espalhadas pelo chão, eles conversavam. Tentavam manter a conversa em assuntos
agradáveis. Evitar novas brigas. Mas aquele beijo continuava ali, pairando
sobre eles.
- Eu quis te beijar, Matt. Não foi
pra...
- Eu não quero estragar a nossa
noite com esse assunto, Paty. Vamos esquecer aquele beijo...você é muito jovem,
não sabe o que quer, está confundindo as coisas. O que sente por mim é
gratidão...e eu gosto de você como uma...uma irmã. Não vai acontecer nada entre
nós. Nunca.
- Se é assim que você quer... – Mas
estava longe do desejo dela.
Elizabeth planejava passar o dia na
cama com Miguel. Não foi assim. Era dia de trabalho para ele e a BTez não
parava de exigir atenção. E Miguel ainda havia se comprometido em levar
Alejandra até o aeroporto. Já que não poderiam ficar juntos, ela resolveu ir
embora logo ao amanhecer, sem tomar café. Afinal, provocar Rúbia com mais uma
refeição em família não era do seu agrado.
- Depois irei contatá-la, Elizabeth.
– Sua futura sogra avisou. – Faço questão de organizar o casamento de meu
filho. Deverá ser mais simples do que a união com Alejandra, afinal é o segundo
matrimônio. Não tem a mesma relevância. Porém deve ter uma comemoração junto
aos nossos amigos e familiares.
- É, claro. Aguardarei seu contato,
Rúbia.
- Nada simples, Madre. Quero uma
festa linda.
O pedido de casamento, a noite de
amor com Liz e a despedida pela manhã foram agradáveis, mas não fizeram Miguel
esquecer do jantar desastroso na noite anterior. A comida apimentada na
primeira refeição de sua namorada na casa fora um coincidência grande demais
para passar despercebida. Logo após a saída de Liz e antes de tomar café,
Miguel foi até a cozinha e encontrou com a mãe e Juliana.
- Como aconteceu aquele ‘engano’ no
jantar de ontem? Juliana você nunca errou a receita de Puchero. Porque havia
pimenta?
- Eu não sei Miguel. Só coloquei sal
e os outros condimentos de sempre. Não quis incomodar a senhora Elizabeth.
- Foi você quem temperou? – Em
Juliana ele acreditava.
- Sim. Foi Juliana, Miguel. – Rúbia
intrometeu-se na conversa. – Eu comprei os ingredientes e ela temperou. – E
misturado pimenta ao tempero que Juliana sempre colocava. – Não havia nada de
errado com a comida. A não ser a frescura de sua namorada.
- Minha noiva, Madre, Elizabeth é
minha noiva agora. Juliana, por favor, vá terminar de arrumar a mesa do café lá
na sala e avise Alejandra para descer. Logo sairemos. – Quando ficou só com a
mãe, Miguel olhou-a nos olhos e avisou. – Eu entendo que você prefira Alejandra
ou que não goste Elizabeth. Mas nunca mais interfira nos meus planos assim. Eu
vou me casar e essa casa terá outra dona, ou, se preferir, vou morar em outro
lugar com minha mulher.
- Então a aceito ou perco você. É
isso?
- Exatamente. É bom aproveitar os
preparativos do casamento para se aproximar de Elizabeth e aprender a conviver,
Madre. Apronte algo mais e eu não avisarei novamente, apenas farei as malas.
Mal humorado, Miguel largou
Alejandra na sala de embarque do aeroporto e sem muitas despedidas rumou para a
BTez. Lá, ainda enfrentava turbulência devido investigação. Após a morte de
Javier precisava convencer o mercado de que os problemas findaram e a empresa
estava forte como sempre. Ao reunir-se com o conselho, apresentou seu plano
para aquecer o mercado o investir no próximo lançamento da montadora.
- O diretor de desenvolvimento
aposta no sucesso do novo modelo esportivo e na nova geração de motores de alta
tecnologia. As perspectivas de vendas são as melhores para classe A e B. Também
lançaremos um modelo popular. Isso recuperará os índices de venda e lucro. E a
meta é, ao fim de um ano, estarmos completamente recuperados. Nossas ações
valerão mais do que antes do escândalo.
- Parece ótimo...desde que você não
se envolva em outro. – Um dos acionistas mais raivosos disse.
- Não está nos meus planos.
Ao fim da manhã, conversou com
Elizabeth e ela o avisou que teria de depor na corregedoria da polícia federal
e explicar sua posição quanto as acusações de Gabriella.
- Precisa de ajuda? Um advogado? O
setor jurídico da BTez está à sua disposição.
- Não. Por enquanto é só uma
investigação interna. Se precisar eu falarei com o Matt.
- Está bem. Eu vou visitar uma das
fábricas hoje a tarde. A noite nos falamos. Te quiero! Siempre te amare!
- Também te amo, Miguel.
Elizabeth conversou com seus colegas
que a investigavam e contou em detalhes toda a investigação que a levou a
desconfiar dos Benitez, inicialmente Miguel e depois o tio. Contou da operação
que retirou mulheres de bordéis da Europa e do assassinato de duas delas mais
tarde. E teve de assumir seu erro ao envolver-se com Miguel.
- Não o protegi de nada. Prendi
Javier Alencastro Benitez certa de sua culpa e tive sua confissão após ser
capturado nos EUA. Errei, mas meu relacionamento em nada afetou minha atuação
como policial.
- Em que circunstância conseguiu a
confissão?
- Legalmente, é claro. Javier contou
que esquematizou o crime e usou a BTez para lavar dinheiro do tráfico. Ele era
apenas um braço da quadrilha. Os outros estão por aí.
- A filha de Javier a acusa de jogar
a culpa sobre o pai para livrar Miguel e a empresa. O que tem a dizer sobre
isso?
- Que ela está sofrendo a morte dele
não conseguiu pensar com clareza.
- E sobre a morte de seu acusado?
- Tem de cobrar da chefia do
presídio. Eu tenho anos de serviço prestado com respeito ao meu distintivo.
Jamais mataria ou mandaria alguém assassinar um homem cujo eu investiguei e
prendi. Fico ofendida com essa acusação.
- Foi apenas uma pergunta, não uma
acusação, Senhorita Santos.
Ao fim do interrogatório, Elizabeth
foi informada de que deveria aguardar a decisão quanto a sindicância interna.
Caso fosse considerada inocente, voltaria ao cargo em alguns dias. Se culpada,
as penas iam de repreensão até demissão, passando por suspensão e detenção
disciplinar.
- Você pode ser presa? – Beatriz se
apavorou quando, à noite, a irmã lhe contou.
- Sou policial, Bia. Existem
punições internar duras. E a detenção é uma delas. Mas falei com Tom e ele
disse ser quase impossível me prenderem. Não tem nenhuma indicação de que eu
seja culpada da morte de Javier. Mas ele acha que não serei inocentada. Porque
deveria ter me afastado do caso assim que me envolvi com Miguel...e ele está
certo. Eu errei.
- Já falou com Miguel?
- Já! Eu liguei pra ele e contei.
Está revoltado. Queria vir pra cá...eu pedi para ficar sozinha. – Estava mal
com tudo isso. – Vou para meu quarto. Não vai sair com Will?
- Não. Ele está de plantão essa
noite. Nós almoçamos juntos. Ficarei com Eva vendo televisão aqui no sofá.
- Boa noite então.
Passaram-se angustiantes nove dias
até que a corregedoria enviou uma correspondência para Elizabeth informando que
saíra a resposta. Na manhã seguinte ela deveria apresentar-se à Central de
Polícia e ouvir a leitura da decisão. Qualquer que fosse o resultado,era melhor
que a espera. Passou os dias nervosa e esquivando-se de Rúbia. A sogra desejava
sua opinião sobre a lista de convidados e cardápio do casamento ainda sem data
definitiva.
- Eu não tenho cabeça para isso,
Rúbia. Por favor! Depois nós conversamos!
Ao ouvir ao lado de Tom e Miguel a
decisão, Liza já esperava. Não foi surpresa, apesar de decepcionante. Ela e Tom
já haviam conversado e a absolvição seria muita sorte. Ela não veio. Mas também
não pegou a pena mais rígida. Isso não acalmou Miguel.
- Um mês de suspensão! Isso é um
absurdo! Você já está fora do seu trabalho há quase duas semanas! É um absurdo.
- É, Miguel. Mas não tem saída. –
Tom concordou. Por mais um mês teria que trabalhar às escondidas com sua melhor
policial. – Porém é melhor ser suspensa que a detenção. Por isso, comemorem. E
Elizabeth, saiba que ficarão de olho em você. Quando seu casamento for
anunciado será mais holofotes sobre você. Mantenha-se discreta e, ao receber o
distintivo, cuidado. Qualquer erro ganhará destaque.
- Eu sei.
Elizabeth decidiu aproveitar aquele
período para organizar seu casamento. Se deixa-se tudo nas mãos da sogra, era
capaz de transformar tudo em um show onde seus convidados seriam barrados na
porta e os amigos da família Benitez sequer soubessem se tratar de uma união.
Nas duas semanas seguintes, ela e
Miguel definiram a data e decidiram por uma cerimônia religiosa e festa na
própria casa da família. Cerca de 130 convidados, bem menos do que Rúbia
desejava. No jantar Elizabeth jurou não se envolver, mas ela e Miguel provaram
o recheio do bolo. No fim, ela até gostou de organizar seu casamento. Ela, Bia e
Patrícia foram escolher o vestido de noiva. Estavam se aproximando da jovem
companheira de apartamento de Matt. A garota era esperta e simpática. Bia logo
se afeiçoou. Com Elizabeth tão ocupada, Bia e Patrícia tornaram-se boas amigas.
- Hoje a noite eu e Matt vamos
jantar com a família da faxineira lá do escritório. – Ela contou durante o
almoço.
- Sério?
- Sim, Bia. Matt gosta muito dela.
Parece que até ajudou seu filho a encontrar um trabalho.
- Legal. O Matt é assim mesmo. –
Liza concordou. – Ele ajuda a todos. Por falar nisso, Paty, como você está? Já
faz um tempinho que Matt te levou pra casa. Está adaptada?
- Sim. É bom viver aqui. Sair na rua
quando eu desejo, comer sempre que tenho vontade...só queria...
- Diz. – Bia incentivou. – O que te
falta?
- Eu só queria que o Matt parasse de
me tratar como a irmãzinha mais nova.
- Acho que nós podemos te ajudar
nisso! Vamos ao salão, você vai se arrumar e mostrar pra ele que é uma mulher!
- Será?
- Não caia nas ideias da Bia, Paty.
Ela se empolga! – Liza avisou. – E você voltou ao médico depois que foi
liberada?
- Médico? Pra que médico?
- Ginecologista, por exemplo. Toda
mulher deve visitar o seu, com frequência. Ainda mais com a profissão que você
já teve.
- Liza! Não fale isso! – Bia gritou.
- Por quê? Faz parte da vida de
Patrícia e eu acho um trabalho tão digno quanto qualquer outro. Desde que seja
uma escolha pessoal, e não exploradas por uma quadrilha. Vou marcar uma hora
com o ginecologista que atende eu e Bia.
- Ele é ótimo! – Bia confirmou.
- E depois a minha louquinha irmã
leva você ao salão de beleza para seduzir Matt.
Beatriz podia brincar e rir com as
amigas para descontrair, porém enfrentava um problema sério. Desde que Rafael a
viu jantar com Willian, começou a fazer visitas à filha e na tarde de ontem ela
recebeu uma notificação judicial informando que o pai estava solicitando guarda
compartilhada. Rafael jamais teve tempo para Eva. Nunca lhe deu atenção. Não a
amava. Beatriz tinha certeza de que ficaria renegada aos cuidados dos avós. Por
isso, logo após deixar Elizabeth e Patrícia, foi até a casa onde seu ex morava
com os pais para tentar colocar alguma razão nele.
- Eu quero meus direitos sobre minha
filha. Pago pensão desde que ela nasceu e confiei a você a criação dela. Agora
me arrependi. – Rafael não voltaria na decisão.
- Você não tem tempo para Eva!
- Agora terei! Ela é minha filha! E
a lei me garante o direito a minha filha comigo por dois finais de semana no
mês. Será assim!
- Por quê? Se nunca a quis!
- Agora eu quero. Assim você tem
tempo para sair com seus homens por aí...
Até o pais de Rafael
surpreenderam-se com sua agressividade. Ele sempre fora um homem controlado e
calmo. Lidou bem com o divórcio e aceitou tranquilamente a guarda da filha ser
da ex mulher com ele arcando com as despesas. Mas vê-la com outro homem o
afetou demais. Estava descontrolado.
- Me respeite! Meus homens nada! Eu
estava com o meu namorado!
Rafael prensou-a contra a parede de
frente da casa e deixou-a com medo. Rafael estava mesmo muito mudado. Parecia
ter desperto um sentimento de posse que anteriormente não existia.
- Me solta agora, Rafael. Eu não
estou brincando!
- Me...me desculpa...eu não queria
te machucar.
- Não machucou. Mas trate de colocar
essa cabeça no lugar! E se continuar com essa palhaçada, é bom cuidar bem de
Eva. Se ela aparecer em casa com um arranhão eu te arrebento!
Quando Beatriz chegou em casa,
estava com raiva, muita raiva. Mas se manteve controlada. Era uma
característica daquelas irmãs. Ela e Liz não eram dadas a atitudes impensadas.
Elas planejavam para agir com sucesso. E quando olhou para Elizabeth, percebeu
que ela planejava algo.
- O que foi, Liza? Tudo bem?
- Sim...Matt ligou. Vai trazer Eva
logo mais.
- Então porque essa cara?
- Liguei pra Miguel...e ele está tão
estranho. Não quis vir aqui, nem que eu fosse vê-lo. Não era o meu Miguel. Não
sei...não parece ele.
- Então vá vê-lo. Logo serão marido
e mulher, não pode esconder nada de você.
- Não sei...está tão estranho. As
vezes eu acho que Miguel está arrependido.
Miguel estava realmente estranho e
escondia algo muito sério de Elizabeth. Mas estava longe de ser arrependimento.
Pelo contrário. Preocupava-se em conseguir levar seus planos até o final. Até
uma semana atrás estava muito feliz. Curtindo as ‘férias forçadas’ de Liz para
organizar seu casamento e levando a BTez para a calmaria de sempre.
Agora já não podia ser assim. Estava
preocupado em resolver um problema grave e surpreendente, sem envolver
Elizabeth. Há exatamente uma semana chegou ao seu escritório um pacote. Ao
abrir encontrou uma foto de Elizabeth nas ruas, se salto alto, micro saia e
blusa decotada. No rosto uma maquiagem tão forte que sequer aparentava a policial
do dia-a-dia.
Ele lembrava-se daquela noite. Foi
quando Elizabeth invadiu sua casa e vendo-o com Alejandra e saiu brava. Alguém
tinha visto Elizabeth na rua, aparentando se prostituir e fotografou. Desde
aquele dia Miguel não teve descanso. Esperava por mais. Quem viu Liz também
pôde vê-los juntos, cenas íntimas, enquanto Elizabeth ainda investigava a BTez.
Além disso, quem enviou a foto deveria querer algo. Algum pagamento. Viria
mais, ele não teve dúvida.
E veio mais. Três dias depois chegou
um pendrive. Nele, Liz sendo abordada por um homem e visivelmente negociando um
programa. Se aquilo viesse à tona, Elizabeth teria uma punição muito maior que
afastamento temporário da polícia. Seria expulsa. E Miguel sabia o quanto
aquilo a magoaria.
- Ela nunca se recuperará!
Como já esperava, o chantagista lhe
telefonou naquela manhã. Queria dinheiro em troca daquela informação. Ainda não
tinha falado em valores. Mas dizia contatá-lo em breve para acertar tudo. E ele
teria de esperar e pagar. Ao menos até descobrirem quem era o chantagista a
sugá-lo.
-Alô!
– Disse quando estranhou o número restrito no visor.
-
Sr. De La Veja, temos negócios para tratar.
-
Não te conheço e nem sei quem é. Não faço negócios com desconhecidos.
-
Não se faça de idiota, De La Veja. Você é tão depravado quanto seu tio. Também
gosta de usar as mulheres. E eu tenho fotos nada inocentes que
comprovam isso. Qual é mesmo o nome dela?
Elizabeth!
- Quem é você? E não se atreva a se meter na minha vida e na de minha noiva! Eu
não sei de que fotos você está falando!
Foi muito difícil, mas foi obrigado
a dividir o assunto com um amigo. O único em quem confiava.
- Sabe que ele voltará. – Louis, o
único amigo com quem dividiu o problema, aconselhou-o a dividir com Elizabeth o
ocorrido. – Ela pode ajudar. É da polícia. Pode investigar escondido.
- Não! Vamos casar! Ela não vai se
preocupar com isso.
- Ela criou o problema. Não você!
- Não! Ouviu bem, Louis? Não! E não
faça me arrepender de ter te contado.
Estava grudado no celular esperando.
O chantagista estava apenas brincando com seus nervos.Fazendo-o esperar para
saber quanto e onde deveria fazer o pagamento. Quando o telefone tocou,
decepcionou-se ao ver o nome de Louis no visor. Seu advogado pessoal era de
confiança, apesar de desagradável às vezes. Mais um dia se passou e um novo pacote
chegou, junto com a ligação do chantagista.
-
Vamos com calma, Sr. De La Veja. Abra o envelope branco que está em sua mesa e
vamos ver quem está brincando. Até mais Sr. De Lá Vega e cuidado ao fazer sexo
com sua noiva.
Ele e Elizabeth no capô de seu carro. Ambos aos gritos. Ele tratando-a como uma
vagabunda qualquer. E ela muito satisfeita com isso. Os dois corpos expostos.
Se aquilo fosse divulgado, seria o fim da carreira de Elizabeth na Polícia
Federal e mais um escândalo na trajetória da BTez.
Resolveu não contar para Elizabeth e
resolver tudo ao seu modo. Amava aquela mulher. E já a conhecia o bastante para
saber que se lhe dissesse tudo, ela resolveria ser a heroína, assumiria o erro
publicamente e entregaria seu distintivo. Mas seria vergonhoso demais. Sua
família teria vergonha daquelas imagens. A empresa seria afetada. Não. Ele
resolveria sozinho. E teria de garantir que nunca mais Elizabeth saísse às ruas
daquela forma. Suas ‘brincadeirinhas’ ficariam restritas ao quarto deles.
- Estou rastreando suas ligações
para o caso de resolver virar caçador. – Louis avisou.
- Ótimo. Vamos descobrir quem está
interessado no meu dinheiro e na minha mulher.
- O que te incomoda mais, Miguel? A
chantagem ou o fato dele ter visto você transando com Elizabeth?
- Tudo isso me incomoda, Louis.
Tudo. E minha vontade é arrancar os olhos desse cara pra ele nunca mais ver
mulher alguma. Quero matá-lo. Quero destroçado. – Com raiva, Miguel jogou um
vaso que enfeitava a mesa de seu quarto contra uma parede. – Morto!
Não era só raiva do chantagista. Era
também dele. Não devia ter se exposto e a Elizabeth àquela situação. E também
sentia raiva de Liz. Nunca aceitou o fato dela se oferecer como prostituta nas
ruas. Mesmo tendo ele conhecido a agora sua noiva daquela forma. Sentia raiva.
Sentia ódio vendo aquela gravação. Ela era sua. Aquele corpo lhe pertencia.
Nenhum outro devia olhar. Atirou outra peça de vidro contra a parede e viu-a se
espatifar. Nada arrefecia seu ódio. Nada fazia sua raiva diminuir.
Quando olhou para trás e viu Elizabeth
observando-o, ela não lhe trouxe tranquilidade alguma. Ao contrário. Ficou
apenas mais raivoso. Era como estar a um passo do paraíso e descobrir não ter a
chave. Logo iam se casar, mas estavam prestes a cair em outro escândalo que
poderia destruir aquela união. O que Rúbia faria ao ler no jornal que sua nora
se prostituía e por isso seria expulsa da Polícia? Seria o início de um
inferno.
- Seja quem for do outro lado da
linha, é bom desligar e me contar o que se passa Miguel. – Liz disse entrando e
trancando a porta a chave.
Miguel desligou o telefone. Mas não
pretendia contar-lhe nada. Aquele era um problema que ele ia responder. Dentro
ou fora da lei. E Elizabeth não participaria.
- Quem você quer morto, Miguel? Eu
quero saber agora!
- São problemas meus, Liz. Coisas da
empresa. Eu não pretendo matar ninguém. Fique tranquila.
- Ótimo! Mas qual o problema? – Ela
não desistiria.
- Eu não vou falar! Estou nervoso,
estou estressado, com problemas até a garganta na empresa!
- E não quer dividir comigo? A sua
noiva?
- Não! Não quero!
Ambos gritavam a plenos pulmões. E
Elizabeth previa que não sairiam disso tão cedo. Ambos eram terrivelmente
teimosos. O sangue espanhol de Miguel fervia. Ela sabia o quanto ele era
explosivo. Miguel ia fazer uma besteira se ela não o fizesse relaxar. Sem
pensar, Elizabeth pegou o celular de sua mão e desligou-o.
- O que está fazendo? Pare! – Ele
precisava aguardar a ligação do chantageador.
- Não vai resolver seu problema, seja
qual for, gritando no telefone. Nem quebrando seu quarto.
- E como vou resolver? Igual você?
Saindo na rua à procura de sexo? É assim que os problemas desaparecem para
você? Bancando a vadia batendo bolsinha na calçada?
Ela não entendeu porque Miguel a
estava ofendendo. Bem ele não estava. Qual fosse a razão, ele podia estar muito
perto da saída. O sexo não resolvia o problema, mas era um ótimo relaxante.
- Por quê? É de vagabunda que você
precisa? – Ela atirou sua bolsa no chão e tirou a blusa. – Porque eu posso ser
aquela que você conheceu na esquina sem problema nenhum! Posso bancar a vadia e
fazer bem gostoso pra você esquecer o que te preocupa. Quer? Vem!
- Para! Para de falar assim! Não quero
que faça mais isso! Será minha mulher! Nunca mais vai sair na rua daquele
jeito.
- Na rua posso até não sair...mas no
nosso quarto eu ainda sou aquela que vadia que você quis e é dela que você
precisa agora Miguel.
- Não!! Não!!
Elizabeth abraçou-o com as pernas
enquanto lhe abria a camisa.
- Sim, precisa. Você pode até não
querer me contar seu problema Miguel, mas é em mim que você vai esquecer e
extravasar ele. Porque eu sou sua mulher. Eu quero seu amor...e quero também a
sua raiva, o seu ódio. Eu quero tudo. Vem!
Agradeço todo o apoio e peço desculpas pela demora. A inspiração parece que sumiu. O cap n está dos melhores, mas foi o melhor possível. O próximo será quente. bjss